A luta vai andar na rua. Numa conferência de imprensa para um ponto de situação do Comité Central do PCP, reunido para analisar os resultados das autárquicas e a “situação política e social”, Jerónimo de Sousa diz que “a luta é inevitável”. Garante que não lança avisos ao “Governo minoritário do PS” – ainda que repetisse a expressão por diversas vezes – mas também refere que os comunistas não estão “amarrados a nenhum acordo”.

Sobre a maior probabilidade de o país vir a ser chamados a umas eleições legislativas antecipadas, Jerónimo diz que “o que determinará o futuro do Governo do PS está nas mãos do próprio PS”. Tudo depende continuação — ou não — do caminho começado há dois anos, com a “reposição de rendimentos e de direitos”. Jerónimo diz que “estamos esta nova fase da vida política nacional, num processo onde repor, devolver até a esperança, leva o PCP a não perder nem uma oportunidade materializar esses avanços”.

Essa oportunidade manifesta-se já nas negociações para o próximo Orçamento do Estado. Ainda que não haja “linhas vermelhas”, o secretário-geral do PCP, traduzindo as conclusões de um comité central comunista que continua reunido, lembra que o salário mínimo deve saltar “para 600 euros em janeiro de 2018”. Isso, a par de um “aumento geral dos salários”, numa agenda de temas que, plasmada no comunicado que saiu da reunião geral dos comunistas, passa também pelo aumento das pensões, aumento do investimento público, a “justa tributação do capital” e o “alívio das camadas da população com mais baixos rendimentos”, por exemplo através da revisão dos escalões do IRS.

Na Assembleia da República, diz Jerónimo, o PCP continuará a fazer o seu trabalho, apresentando propostas próprias e discutindo as de terceiros, mas isso não inviabiliza que a “luta” se faça sentir nas ruas. “É inevitável”, resume o líder comunista. “Sempre foi a luta dos trabalhadores que determinou as soluções” para os seus problemas”, sublinha.

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E, ainda que “nada substitua” esse protesto de rua, os comunistas garantem que estarão empenhados no diálogo com o “governo minoritário do PS”. Não há avisos, garante, mas sempre vai deixando uma mensagem que serve de lembrança a alguns socialistas que se possam ter esquecido da “nova correlação de forças” no Parlamento: “É importante sublinhar e repetir que estamos perante um Governo minoritário onde não existe nenhum acordo parlamentar, nenhum acordo com o Governo”. O que existe, recorda, é “uma posição conjunta que define o grau do compromisso” do PCP com o PS. Uma posição que não impede que cada partido mantenha “a sua independência em relação a esse Governo”.

Aliás, é nesse equilíbrio de posições que se faz a geometria do novo quadro político. Apesar das mensagens de “reconhecimento, mais do que de simpatia” que encontram na rua, os comunistas não conseguiram traduzir esse sentimento em votos nas autárquicas. O próprio PCP vai, por isso, partir para a rua já no final deste mês com uma “jornada nacional de informação e de contacto com os trabalhadores e a população”. Será entre os dias 26 e 28 de outubro e servirá, precisamente, para deixar bem vincados os “avanços e as medidas necessárias para ir mais longe na defesa, reposição e conquista de direitos”.

A mensagem? Está definida: o PS ainda não se conseguiu “libertar dos interesses do capital monopolista”, sendo corresponsável por “alterações negativas ao código do trabalho”, por exemplo com o fim da contratação coletiva. Um PS que “aceita as imposições da União Europeia, querendo fazer a quadratura do circulo” e incapaz de começar “um caminho novo”. Por outras palavras, o PCP é a força política que puxa o PS para a esquerda, uma força sem a qual a tal “reposição de rendimentos e direitos” não teria saído do papel. É esse crédito que o PCP fará por ver ser-lhe reconhecido.

Geringonças nas autarquias? Não contem com o PCP

A reunião do Comité Central do PCP acontece dois dias depois de a CDU ter obtido o seu pior resultado de sempre em números de câmaras municipais conquistadas. Umas eleições que, apesar desse resultado, abriram a porta a uma espécie de geringonças do poder local. Por exemplo em Lisboa, onde o PS perdeu a maioria absoluta, mas também em Almada — bastião comunista a sul da capital e que o PS conquistou por uma margem pequena — ou Loures, onde Bernardino Soares se vê “entalado” entre um PSD com o qual não se revê (e que foi seu parceiro nos últimos quatro anos) e um PS ainda à procura de um posicionamento face à maioria mínima da CDU.

Nos casos em que pode viabilizar maiorias, o PCP está disponível para reeditar soluções como as que dão estabilidade ao atual Governo de António Costa? Jerónimo desfaz a dúvida de uma passagem apenas. “Não vai haver repetição da solução política encontrada nesta fase da vida política nacional”, diz o secretário-geral comunista. E, agora, mais concretamente sobre a situação na capital: “Em Lisboa, não existirá essa possibilidade de encontrar um modelo parecido com o que foi encontrado no plano nacional”, diz Jerónimo. A bola passa para o lado do Bloco de Esquerda, que esta noite reúne os seus dirigentes também a pensar numa análise aos resultados eleitorais, depois de ter conseguido eleger um vereador, Ricardo Robles.

Do lado do PCP, uma duas garantias. Primeiro, “continuaremos a trabalhar em maioria ou minoria para resolver os problemas de cada concelho”, acrescenta. A posição do PCP será, por isso, conhecida proposta a proposta, medida a medida. Nunca passará por integrar maiorias de terceiros. Mas também não será o PCP a impedir qualquer câmara de funcionar. Segunda garantia: “Não vão encontrar, por parte da CDU, uma posição destrutiva ou de bloqueio.”