A teoria do copo meio cheio ou meio vazio é um cliché. Mas daqueles que nunca sai de moda.

Quando abordava o encontro com o Desp. Aves, onde o novo técnico dava apenas 2% de hipóteses aos visitados (que seriam 4% ou 5% caso não estivesse a trabalhar com a equipa há tão pouco tempo), Rui Vitória aproveitou para agarrar no chavão quando lhe perguntaram sobre a titularidade de Svilar após o erro com o Manchester United.

“Se temos jogadores menos novos é porque temos de injetar sangue novo, se temos os mais novos é porque se calhar temos de ir à experiência…”, comentou. Mas no caso do Benfica, a coisa é mais fácil: se tem Jonas é melhor, se não tem Jonas é pior. E isto é clarinho como a água num copo meio cheio ou meio vazio. Para o Benfica e para o Desp. Aves, que ganhou outros argumentos depois de ter trocado Adriano pelo veterano Quim.

O lançamento de miúdos é tudo aquilo que nos faz escrever ou falar com os amigos e amantes do futebol. “Vai dar, não vai dar, dá de certeza se melhorar isto, nunca dará se não potenciar aquilo”. E é ótimo para qualquer adepto ver jovens como Rúben Dias, Diogo Gonçalves ou Alexandre Guedes evoluírem em jogo, até por uma perspetiva patriótica de Seleção Nacional. Mas esta Liga ainda é para velhos. O filme do costume.

O Benfica voltou à fórmula habitual, recuperando a dupla atacante Jonas-Seferovic e mantendo Diogo Gonçalves na ala esquerda, mas trouxe uma grande surpresa: Filipe Augusto no lugar de Pizzi. E se do meio-campo para a frente as opções justificaram em pleno, foi no centro e na primeira fase de construção que entroncou o problema encarnados no primeiro tempo, ao ponto de, em determinados períodos, parece haver apenas uma equipa partida com elementos que defendiam e outros que atacavam. Com tudo o que de bom e de mau isso possa ter.

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Ficha de jogo

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Desp. Aves-Benfica, 1-3

9.ª jornada da Primeira Liga

Estádio do CD Aves, na Vila das Aves

Árbitro: Nuno Almeida (AF Algarve)

Desp. Aves: Quim; Pedrinho, Diego Galo, Rodrigo Defendi, Nélson Lenho (Sami, 56′); Vítor Gomes, Washington (Paulo Machado, 56′), Diogo Santos; Amilton, Nildo e Guedes (Derley, 81′)

Suplentes não utilizados: Adriano, Rodrigo Soares, Falcão e Ryan Gauld

Treinador: Lito Vidigal

Benfica: Svilar; André Almeida, Luisão, Rúben Dias, Grimaldo; Fejsa, Filipe Augusto; Salvio (Pizzi, 67′), Diogo Gonçalves, Jonas (Krovinovic, 84′) e Seferovic (Raúl Jiménez, 90′)

Suplentes não utilizados: Júlio César, Lisandro López, Cervi e Gabriel Barbosa

Treinador: Rui Vitória

Golos: Jonas (29′, g.p. e 80′, g.p.), Seferovic (50′) e Rodrigo Defendi (76′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Salvio (60′), Pizzi (90′) e Fejsa (90+2′)

Diogo Gonçalves, logo no segundo minuto de jogo, teve o primeiro grande momento de inspiração individual, fletindo para dentro e rematando em arco para grande intervenção de Quim, que se tornou o jogador mais velho de sempre na Liga (vai fazer 42 anos daqui a três semanas) superando a marca de Manuel Bento. Logo de seguida, Vítor Gomes, após um erro invulgar de Fejsa, ganhou uma bola perto da área dos visitantes e rematou forte para parada difícil do miúdo Svilar, que teve de corrigir a meio a trajetória que estava a fazer (4′).

No entanto, os encarnados (a jogar de cinzento) iriam assumir sem grandes dificuldades o controlo do jogo. Por um lado, o novo Desp. Aves de Lito Vidigal entrou com as linhas demasiado separadas uma das outras, o que propiciava não só inúmeras situações de 1×1 a Salvio e Diogo Gonçalves mas também aquilo que Jonas não pode ter: espaço. Salvio, com um disparo cruzado que Quim defendeu com o pé (11′), teve outra boa oportunidades, Seferovic (que andou sempre um pouco fora dela na primeira parte) também esteve perto de marcar (28′) e, no meio disto, os visitados revelavam grande incapacidade em ligar jogo com Guedes ou pelos corredores laterais.

Aos poucos, e com muitas movimentações no banco de suplentes (e fora dela, o que deu trabalho extra ao quarto árbitro), Lito conseguiu equilibrar mais a equipa em termos posicionais mas há erros individuais difíceis de corrigir, como aquele que deu um penálti desnecessário ao Benfica por entrada fora de tempo de Washington sobre Diogo Gonçalves. Jonas, aos 29′, fez o 1-0 e reforçou a condição de melhor marcador da Primeira Liga.

Pelo que tinha feito até então e pelo que iria ainda fazer (Salvio falhou por pouco em frente à baliza após cruzamento de André Almeida), a vantagem do campeão nacional era justa. Mas bastaram pouco mais de cinco minutos para colocar essa preponderância em causa, com três oportunidades flagrantes do Desp. Aves: Nildo viu um cabeceamento cortado em cima da linha de golo por Rúben Dias com Svilar batido (41′); Vítor Gomes atirou por cima quando estava numa excelente posição na carreira de tiro (42′); e Guedes cabeceou à trave após livre lateral (44′).

Lito Vidigal tentou corrigir posicionamentos de novo ao intervalo, procurando estancar a partida nessa desvantagem mínima para ir arriscando mais e mais com o passar dos minutos. No entanto, tudo o que não poderia ter era mais um golo sofrido. E foi isso mesmo que aconteceu: aproveitando um remate prensado na defesa avense, Salvio conseguiu com um toque tirar Quim da jogada e Seferovic encostou em cima da linha para o 2-0 (50′).

O plano B do Desp. Aves avançou mais cedo do que era suposto, com Paulo Machado e Sami a serem lançados na partida. No entanto, foi o Benfica que viu Quim brilhar, travando os remates perigosos de Jonas e Seferovic, sempre os mais ativos na frente. Por muitas unidades que os visitados tentassem colocar na frente, a verdade é que o problema estava cá atrás, algo que só não ficou mais visível no resultado por causa do guarda-redes avense.

Estávamos perante aqueles encontros onde havia um 2-0 sempre “traiçoeiro”, porque um golo sofrido pode sempre mexer com o jogo. Sobretudo, de bola parada. E depois de um corte de Filipe Augusto num livre lateral que por pouco não traiu Svilar, Paulo Machado marcou bem um canto ao primeiro poste para Rodrigo Defendi aparecer de rompante e reduzir a desvantagem, com o guardião belga a tocar para dentro da baliza (76′).

O jogo estava reaberto, mas demorou apenas dois minutos a fechar: na sequência de mais um penálti, desta feita de Gonçalo Santos sobre Pizzi num lance precedido de falta clara de Jonas sobre Nildo que foi muito protestada pelos homens da casa, Jonas confirmou a frieza do costume e converter o 18.º castigo máximo desde 2014/15.

Muito se irá falar ainda deste encontro. Ou para louvar (de forma justa) a exibição de Quim, ou para discutir se Svilar podia ou não ter feito mais no golo sofrido, ou para enaltecer o killer instinct de Jonas, ou, claro está, para discutir o porquê de não ter havido vídeo-árbitro no lance entre o brasileiro e Nildo antes da falta de Gonçalo Santos sobre Pizzi. Mas, globalmente, o Benfica, mesmo continuando com alguma fragilidade em alguns aspetos defensivos, ganhou bem. E, pela primeira vez na presente temporada, não foi pela margem mínima.