(notícia atualizada com declaração de António Costa na tomada de posse)

“Parece que o Governo não aprendeu mesmo nada” com os incêndios dos últimos meses, diz o Bloco de Esquerda, citado pelo Público. Os bloquistas, pela voz do deputado Pedro Soares, mostram-se muito críticos em relação à escolha do Governo para liderar a Unidade de Missão contra os incêndios florestais: Tiago Oliveira. Porquê críticas tão duras? Porque Tiago Oliveira, “independentemente das suas qualidades técnicas”, trabalha(va) para a papeleira Navigator (Ex-Portucel).

“É surpreendente que o Governo indique para presidir a uma estrutura e para um lugar que parece ser equivalente a secretário de Estado uma pessoa que, independentemente das suas qualidades técnicas, tenha estado ligado à indústria das celuloses, nomeadamente na Portucel e na Navigator Company, que tem tanta responsabilidade no caos em que a floresta se encontra”, lamenta Pedro Soares, deputado do BE, em declarações ao Público.

Tiago Martins Oliveira, que tomou esta manhã posse como presidente da estrutura de missão para a instalação do Sistema de Gestão Integrado de Fogos Rurais, é doutorado em gestão de riscos florestais e participou no estudo que foi rejeitado pelo governo Sócrates em 2006 (enquanto António Costa era ministro da Administração Interna). Engenheiro florestal, com 48 anos, doutorado em Governança de Risco de incêndio foi durante muitos anos responsável pela área da proteção florestal do grupo Navigator. Desde 2016 liderava a área de inovação e desenvolvimento florestal da Navigator.

Tiago Oliveira foi também um dos principais autores dos relatório técnico para a proteção da floresta entregue ao Governo em 2005, um estudo cujas conclusões foram no essencial ignoradas pelo governo de então, liderado por José Sócrates e tendo como ministro da Administração Interna António Costa.

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Na tomada de posse, António Costa diz que “poucas pessoas estariam em melhores condições para assumir este desafio” do que Tiago Oliveira, por aliar “conhecimento académico e experiência no terreno”. O primeiro-ministro não respondeu a perguntas dos jornalistas.

A posição dos bloquistas contrasta com as primeiras reações de alguns dos especialistas que integraram a Comissão Técnica Independente, caso de Paulo Fernandes, professor na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, que na sua página no Facebook escreveu simplesmente: “temos homem”. Também no Facebook, o arquitecto paisagista Henrique Pereira dos Santos notou que “um primeiro sinal de que António Costa terá aprendido alguma coisa sobre a questão dos fogos: acaba de nomear como presidente da estrutura de missão um dos principais responsáveis pelas propostas técnicas que António Costa torpedeou em 2006”.

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Para contestar a escolha, o BE regressa às suas críticas às empresas ligadas à produção de celulose, que responsabiliza pela mistura que existe em várias zonas do país entre pinheiro e eucalipto, uma mistura que na opinião dos bloquistas “tem tido um papel explosivo na falta de controlo dos incêndios”. Ao ir buscar Tiago Oliveira ao setor privado, à Navigator, Pedro Soares defende que o Governo está a cometer um erro e deve “reponderar a escolha”. Isto porque o novo responsável tem, diz o partido, uma “marca indelével da ligação às celuloses, que não abona nada a favor da independência que se exige a uma Estrutura de Missão”.

O mesmo Henrique Pereira dos Santos já reagiu no Facebook a esta tomada de posição do BE: “A posição do Bloco de Esquerda sobre a nomeação do Tiago Oliveira é não só completamente troglodita como um violento ataque aos direitos dos trabalhadores, um retrocesso civilizacional brutal, ao pretender limitar a liberdade dos trabalhadores mudarem de entidade patronal, inibindo o exercício de funções públicas em função da avaliação política da atuação das suas entidades patronais.”