Era um dia normal na Universidade de Florença quando uma jovem desesperada ali apareceu à procura de ajuda. A rapariga de 21 anos recorreu aos dermatologistas Roberto Maglie e Marzia Caproni para solucionar um problema que a preocupava há já três anos: transpirava sangue.

O El Español conta que os dois médicos, completamente surpreendidos, pormenorizaram o caso na revista médica Canadian Medical Association Journal. O que acontecia era que, sem feridas ou golpes, o sangue escorria pela cara ou pelas mãos da rapariga – principalmente enquanto dormia ou praticava desporto. Os episódios duravam entre um a cinco minutos.

A jovem italiana foi diagnosticada com hematidrose, uma rara doença descrita pela primeira vez por Aristóteles no século II antes de Cristo, tal como recorda na mesma revista canadiana uma professora de História da Medicina na Queen’s University. Jacalyn Duffin, a professora, tem acompanhado o caso da rapariga italiana.

No artigo que publicou na revista, Duffin separa os casos que encontrou na literatura médica antiga daqueles descobertos entre 1880 e 2017, já que estes últimos estão muito menos associados à mística e à religião do que os anteriores. Apenas 42 pacientes foram diagnosticados neste intervalo temporal, numa média de um a cada três anos, ainda que a grande maioria se concentre nos últimos cinco anos.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Jacalyn Duffin analisou rigorosamente os 28 casos encontrados entre 2004 e 2017 e descobriu diversas características presentes na maioria dos pacientes. Por exemplo, existem casos em todos os continentes exceto na América do Norte, a maior parte dos diagnosticados são mulheres e são sempre jovens – a mais nova tinha apenas 14 anos. A variável que mais mudava de um doente para outro era o local do sangramento: desde a cara, o couro cabeludo, os olhos, as orelhas, as costas e as extremidades.

A rapariga transpirava sangue enquanto dormia ou quando fazia desporto

Metade dos pacientes sofria de stress psicológico grave, acompanhado, por vezes, de depressão ou ansiedade. A maioria revelou ter-se sentido humilhada durante o processo de observação dos médicos para confirmar a veracidade dos sintomas. Ainda que não existam registos de nenhuma morte provocada pela hematidrose, todos os relatos médicos destacam o tremendo medo que esta doença provoca nos doentes.

A professora acaba por concluir que apesar de a literatura médica atual confirmar a existência da doença, ainda existem várias dúvidas sobre a mesma, que atribui à associação deste problema, durante séculos, a um mistério religioso. Isto acontecia devido a passagens no evangelhos de São Lucas e São Marcos: de repente, quando Jesus estava a rezar no jardim de Getsémani, começou a suar sangue. Muitos dos doentes são por isso muitas vezes considerado santos.

No caso desta jovem italiana, os médicos descobriram que sofria de depressão e ansiedade, receitando simultaneamente antidepressivos e propranolol, um betabloqueante que diminuiu em larga escala o sangramento – mas não o eliminou.