Artur Bordalo, nascido em Lisboa em 1987, pinta na rua desde “muito novo”, sendo o espaço público onde mais se sente à vontade, como disse em entrevista à Lusa a propósito da inauguração de “Attero” (desperdício, em latim).

Bordalo II – o primeiro era o avô, artista plástico Real Bordalo, que morreu em junho, aos 91 anos – começou pelo ‘graffiti’, que lhe deu “alguma bagagem” para o trabalho pelo qual se tornou conhecido: esculturas feitas com recurso a lixo e desperdícios.

“Comecei a fazer peças mais pequenas, às quais ia adicionando objetos de desperdício (embalagens, cartões, latas esmagadas), apenas como experiência. Gradualmente comecei a querer utilizar materiais mais robustos, com uma escala diferente, que me obrigaram a voltar para a rua outra vez”, contou.

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Inicialmente gostou do efeito criado pela junção de embalagens, mas, mais do que isso, percebeu “o potencial que podia ter a utilização do lixo, não só a nível estético, mas a nível conceptual”.

“Trabalhando com o lixo estamos criar um trabalho com uma mensagem forte e relevante para o público”, referiu o artista que muitas vezes fala na primeira pessoa do plural, já que a construção das peças implica que tenha uma equipa a trabalhar com ele.

No âmbito da exposição criou três peças na rua, que fazem parte da série “Big Trash Animals” (algo como Grandes Animais de Lixo): uma raposa na avenida 24 de Julho, um sapo na rua da Manutenção e um macaco no pátio do armazém onde está patente “Attero”, no n.º 49 da rua de Xabregas.

Raposa do Deserto, da série Mixed Trash Animals

A escolha dos animais é “uma forma de fazer retratos da natureza, uma composição das vítimas com aquilo que as destrói”.

“Podia fazer rostos humanos, mas a parte humana já está presente neste trabalho a tempo inteiro, por ser criada por um humano e porque todo este material que utilizamos já é humano. Todo este lixo é nosso, não é da Natureza”, referiu.

Os animais são feitos com “plástico de grande escala”, como ecopontos, caixotes do lixo, para-choques ou tabliers de carros, “a matéria-prima perfeita para moldar, cortar, dobrar e conseguir criar todas as formas até chegar à peça final”.

Os trabalhos expostos em “Attero” são feitos “com materiais totalmente diferentes daqueles que são utilizados na rua, porque podem ter um grau de detalhe muito diferente”.

No entanto, “há sempre uma relação, não só de escala mas do tipo de material utilizado”.

“As peças que faço para dentro são quase como um complemento das peças que eu faço cá fora, por isso há uma relação entre uma coisa e outra”, explicou Bordalo II.

A curadora da exposição, Lara Seixo Rodrigues, destaca o “reencontro que as pessoas vão ter com coisas que desperdiçam e aqui ganham outro sentido e outro valor”.

Circus Abuse, da série World Gone Crazy

“Vai ser muito interessante os visitantes viajarem pela exposição e por aquilo que faz parte de nós, o nosso lixo”, afirmou.

Na mostra haverá também um espaço com imagens do que Bordalo II tem feito pelo mundo, no âmbito da série “Big Trash Animals”, “para que as pessoas tenham noção da amplitude do trabalho dele, as 88 peças pelos três continentes, em 18 países (excluindo Portugal)”.

Nesse espaço estará também à venda um livro, que inclui testemunhos sobre o trabalho de Bordalo II, “de vários pontos de vista”, de pessoas ligadas às artes a ambientalistas, passando pelo atual ministro do Ambiente, Matos Fernandes.

“Attero” inclui também várias atividades, como “visitas guiadas, visitas para as escolas, mediante marcação, apresentações muito interessantes, uma delas pelo biólogo João Farinha que vai falar sobre peculiaridades dos animais tendo por base os animais que estão expostos, apresentação de produtos parceiros da exposição, altamente ecológicos e inovadores, apresentação de um projeto da Câmara de Lisboa e ‘workshops’ para crianças”.

A exposição, de entrada livre, fica patente entre sábado e 26 de novembro.