Luis Murillo, Emmanuel Mora e Marcela Salas são três jovens naturais da Costa Rica, um país que partilha com Portugal um problema grave: os avassaladores incêndios florestais que se repetem todos os verões. Os três engenheiros de software decidiram pôr mãos à obra o melhor sabem. A convite da Centro Clima Costa Rica, uma organização ligada ao Governo costa-riquenho para estudar as alterações climáticas e promover a consciência ambiental no país, criaram a aplicação Forest Guardian, uma plataforma que pretende colocar em comunicação cidadãos, corporações de bombeiros, autoridades e Governo, e reunir o maior número de informação possível sobre condições meteorológicas, cursos de água ou vias rodoviárias.

Num ano em que os incêndios mataram mais de uma centena de pessoas em Portugal, fomos conversar com Emmanuel Mora, o engenheiro informático por detrás da construção da aplicação, para tentar perceber de que forma a tecnologia pode contribuir para atenuar o problema dos incêndios florestais, e testámos o protótipo da aplicação Forest Guardian. Os três jovens, apoiados pelo Centro Clima Costa Rica, que financiou a primeira parte do projeto, estão agora à procura de investidores que lhes permitam continuar a desenvolver a aplicação.

Emmanuel Mora é o engenheiro informático costa-riquenho por trás da aplicação Forest Guardian (JOÃO FRANCISCO GOMES/OBSERVADOR)

Como surgiu a ideia de criar esta aplicação?
Começámos há três anos. A ideia nesse momento foi a de criar uma aplicação para, de alguma forma, prever e prevenir fogos florestais. Estamos a trabalhar com alguns instituições na Costa Rica e para já o nosso objetivo é a aplicação ser usada em toda a América Central. É também uma resposta direta aos bombeiros que têm de lidar com o problema dos fogos florestais todos os dias. Fomos contactados pelo Centro Clima Costa Rica, que tinha esta ideia de usar a tecnologia para ajudar no combate aos incêndios florestais. Porque na Costa Rica temos fogos florestais muito fortes todos os anos.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Por isso, começámos a trabalhar com eles e fizemos um protótipo num hackathon [maratona de programação] e é isso que podemos ver aqui já. Neste momento temos uma aplicação móvel e uma versão para computador. Estamos à procura de financiamento para ver se conseguimos continuar o projeto.

Como funciona a aplicação?
A base é um mapa do mundo simples, que utiliza informação do MODIS, sistema de recolha de imagens da NASA, para identificar a localização dos incêndios florestais em todo o mundo. A cada 24 horas, temos um novo conjunto de informações dos satélites e fazemos uma atualização do mapa. O que vemos aqui são os fogos florestais em todo o mundo captados pelo sistema MODIS ontem.

Depois, podemos sobrepor a este mapa outras camadas que desenvolvemos. Temos uma camada que são os níveis de precipitação, temos uma outra que ainda é bastante lenta a carregar e que queremos melhorar, que é o tipo de floresta em cada zona, e ainda uma terceira camada com a força e direção dos ventos. Com estas três camadas, que são as que temos para já, conseguimos começar um trabalho de previsão das zonas mais vulneráveis a incêndios florestais, cruzando as várias informações das várias camadas.

Mas pelo que percebi, não é só informação. Também é possível reportar incêndios.
Sim, também temos a funcionalidade de reportar. Qualquer pessoa que veja um incêndio pode reportá-lo, assinalando-o no mapa. Isso irá automaticamente enviar uma mensagem a todos os utilizadores que estejam por perto a notificá-lo de que foi reportado um incêndio nas proximidades. A nossa ideia é que a plataforma também possa ser usada pelos bombeiros, para que os bombeiros locais, a corporação mais próxima, também tenha acesso à informação de imediato e possa logo começar a tomar conta dessa ocorrência.

Portanto, o objetivo é ligar diretamente todas as pessoas envolvidas: do utilizador que vê o incêndio no início às autoridades responsáveis pelo combate?
Exatamente. Estamos a tentar tornar o processo todo mais rápido. Na Costa Rica, também há muita burocracia envolvida no despacho de meios. Mas temos algumas experiências com corporações locais de bombeiros, falámos com eles e testámos algumas funcionalidades e concluímos que efetivamente é possível tornar este processo mais rápido, agilizar a resposta de emergência, se as pessoas estiverem ligadas em rede numa plataforma dedicada à questão dos incêndios.

Esperam ter o apoio e o envolvimento de governos nacionais para que a vossa plataforma possa integrar o dispositivo de resposta de emergência em situações de incêndio?
Sim, essa é a nossa ideia. Aliás, o Centro Clima Costa Rica já é uma organização ligada ao Governo costa-riquenho, que está empenhada em vários projetos ambientais, e eles querem mesmo que consigamos criar uma aplicação que ajude no combate aos incêndios.

6 fotos

Esta aplicação é dirigida a quem? Sobretudo a bombeiros e autoridades, ou também aos cidadãos comuns?
Este primeiro protótipo está na Play Store [loja de aplicações para dispositivos Android] e qualquer pessoa pode fazer o download gratuito. Ainda está em fase de desenvolvimento, vamos lançando atualizações com frequência. Neste momento, a aplicação apenas tem funcionalidades para os cidadãos comuns porque as outras que desejamos implementar já vão depender das organizações governamentais e das autoridades.

Para já, o que é que o utilizador pode fazer?
O utilizador tem acesso ao mapa com todas estas informações, com as três camadas de informação que referi e com a localização dos incêndios ativos através das informações do sistema MODIS. Nesta parte do mapa, trata-se apenas de informação. Depois, tem a possibilidade de reportar incêndios que observem. Basta clicar em reportar e o incêndio fica identificado na posição GPS onde o utilizador se encontra. Depois, podem ser inseridas as informações que existirem. Detalhes sobre a localização, comentários, indicações sobre o caminho para lá chegar, e até fotografias. Guarda-se e fica lá o ponto no mapa. Isto vai enviar uma notificação para os utilizadores que estão perto.

Vejo que a aplicação identifica de imediato os Bombeiros Voluntários de Moscavide e o Rio Tejo. O que é isso?
Sim. Temos uma grande base de dados sobre as corporações de bombeiros e sobre os cursos de água para que essa informação seja apresentada com respeito a cada incêndio: o utilizador fica de imediato a saber qual a corporação de bombeiros mais próxima e qual o curso de água mais próximo. Isto faz parte já da nossa ideia para o futuro. Idealmente, esta corporação de bombeiros aqui identificada também estaria ligada à plataforma e receberia de imediato uma notificação para, pelo menos, avaliar o que foi reportado.

Há uma outra funcionalidade em que ainda estamos a trabalhar, que tem a ver com as estradas. Com base na localização do incêndio e na expansão das frentes de fogo, o que queremos é que a aplicação consiga sugerir os caminhos mais adequados para os bombeiros chegarem ao local. Aqui o grande desafio é a informação disponível, por exemplo, as estradas que estão cortadas pelo fogo. Neste momento, estamos apenas a depender de informação pública, mas queríamos inserir o máximo de fontes de informação possível na aplicação.

Qual é o vosso objetivo na Web Summit?
Nós arrancámos o projeto com algum financiamento do Centro Clima Costa Rica, mas agora precisamos de mais financiamento para continuar a desenvolver a aplicação. Temos feito alguns contactos aqui em Lisboa e é disso que estamos à procura: alguém que invista em nós para continuarmos a desenvolver estas funcionalidades que temos em mente.