Caitlyn Jenner ficou com o grande palco da Web Summit só para ela, nesta última tarde de conferências em Lisboa. Tudo para responder a uma única questão: podemos realmente definir género? A transgénero mais mediática da atualidade e, consequentemente, embaixadora da comunidade não podia ter começado a responder por nenhum outro ponto senão pela sua própria história.

“Comecei neste negócio dos discursos há 40 anos. Desde então que falo de motivação e de como ultrapassar obstáculos difíceis na vida. Contei a minha história ano após ano, mas no fundo sentia que estava a enganar toda a gente. Pensava: ‘Vocês não me conhecem. Eu não quero ser reconhecida por aquelas horas dos Jogos Olímpicos de 1976’. Sentia-me uma fraude porque não estava realmente a contar a minha história. Era assim a minha vida, até de finalmente decidi que era tempo de mostrar o meu “eu” autêntico. Agora, finalmente, debaixo desta saia tenho mesmo um soutien. Não tenho mais segredos”, afirmou.

No momento seguinte, Caitlyn, de 68 anos, dirigiu-se ao público feminino da Altice Arena com a pergunta: “Quando é que souberam que eram uma rapariga?”. Jenner prosseguiu.

“É algo dado como garantido, mas no caso dos transgéneros isso afeta a mente 24 horas por dia, 365 dias por ano. É por isso que a transição não tem nada a ver com sexualidade, tem a ver com identidade”, completa.

Caitlyn falou da vida em família, na forma como se refugiou nos filhos, mas também dos problemas que, mesmo assim, não desapareceram. “A primeira coisa que tive de fazer foi falar com a minha família. Quando se passa por algo assim não se trata apenas da nossa transição, da mudança drástica em que vamos entrar: a nossa família também passa por tudo isso”, contou emocionada.

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Depois da família, Jenner admitiu em palco que a fé foi a última barreira que ultrapassou. Lembra-se de pensar para si próprio ‘Talvez Deus tenha uma razão para isto’ ou ‘Talvez, neste momento da minha vida, esta seja a coisa certa a fazer’. Ao ter avançado, Caitlyn Jenner tornou-se um símbolo para a comunidade transgénero e é com a luta pelos direitos dessa mesma comunidade que se tem empenhado, não só nos Estados Unidos mas, como a própria disse “no mundo inteiro”.

Minutos depois, numa sessão de Q&A (perguntas e respostas), Caitlyn foi questionada por uma transgénero americana sobre o porquê de ter votado em Donald Trump, há um ano. A pergunta teve direito a aplausos, mais do que a resposta: “Eu cresci no lado conservador e sempre estive do lado republicano, onde sempre importaram as questões sociais e a ajuda às pessoas. Nunca votei num democrata, mas também nunca votei para ser ele (Trump) o candidato, nem o apoiei durante a campanha. Falei com ele uma vez, quando era candidato nas primárias. Mesmo durante a campanha, ele disse algumas coisas que achei bastante boas e limitei-me a ser otimista. E a Hillary não era uma boa candidata. Se vou votar outra vez no Trump, logo se vê, ainda há três anos pela frente”.

No mesmo dia, Catlyn Jenner também falou sobre os Jogos Olímpicos

Durante a manhã de quinta-feira, Caitlyn Jenner pisou o palco da Altice Arena, inserida num painel de convidados. Ao lado de George Papandreou, ex-primeiro-ministro grego, da campeã olímpica Allison Wagner, e de David Rowan, editor da revista Wired, Jenner, atleta medalhado (foi campeão olímpico de decatlo), mostrou-se desiludida com o rumo tomado pelas olimpíadas. “Os Jogos de Montreal de 1996 foram os últimos Jogos Olímpicos puros. Gostava disso: havia pureza nesta marca”, confessa.

Em debate esteve também o rigor do controlo anti-doping. Allison Wagner recordou que metade dos atletas não são testados com “a desculpa de que não os conseguem encontrar”. Jenner aproveitou ainda para fazer a ponte com o tema da sua segunda conferência, referindo a abertura do comité olímpico a questões como a transexualidade. “Neste assuntos, os Jogos Olímpicos estão muito mais à frente do que o resto do mundo”, concluiu.