Nada como o passado para encher de novidades o futuro. A frase parece um paradoxo mas não é. Há muito tempo que o principal alimento da moda é a nostalgia e nenhum futuro se faz sem ir buscar qualquer coisa ao passado, tal como rapidamente compreenderam os grandes realizadores de ficção científica. Stanley Kubrick que foi buscar a música de Wagner para falar do século XXI, Ridley Scott inspirou-se na moda dos anos 30 para vestir as replicantes de Blade Runner, os irmãos Wachowsky foram buscar os óculos negros e minúsculos inspirados nos modelos dos século XIX para o Matrix. Esta trilogia, de 1999, marcou mesmo a última entrada dos óculos de sol extra-small no imaginário da moda… pelo menos até ao verão de 2017.

Foram portanto quase 18 anos a cobrir o rosto com óculos grandes, variações king size dos modelos anos 70. No entanto, o recente culto do modelo aviador da Ray Ban ou os Oliver People já anunciavam que eram precisas mudanças de fundo no que toca a óculos. As marcas e os criadores mais visionários perceberam essa vaga de fundo, a influente nostalgia dos millenial deu o impulso que faltava e eis que os óculos de sol radicalmente pequenos que fizeram furor nos anos 60 e nos anos 90 voltam para reclamar o reconhecimento do seu papel na história da moda. Afinal eles andam cá desde o século XIX.

Bella Hadid ( ao centro) e as amigas a fazerem um tour completo pela moda dos anos 90: óculos de sol small size, croped top, umbigo à mostra e corpetes. (Phot THOMAS SAMSON/AFP/Getty Images)

É provável que ainda não tenha visto muitos modelos à venda em Portugal, embora algumas lojas já os tenham. O culto ainda está na estratosfera das celebridades, it girls e bloguers de luxo. Ao comando desta revolução na forma de adornar o rosto e esconder os olhos estão as modelos e Bella e Gigi Hadid e a cantora Rihanna que, de há uns meses para cá, sempre que surgem em público têm uns minúsculos óculos geométricos e de ângulos acentuados estilo “cat eye” pendurados na ponta do nariz a ponto de muitos se perguntarem porque usam elas os óculos.

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Se a peculiaridade desta peça a torna carismática, ela também desperta sentimentos extremos: ou se ama ou se odeia. Se, por um lado, eles não serão muito úteis para proteger convenientemente os olhos dos raios e da luz solar, por outro eles deixam o nosso rosto menos agressivamente escondido, logo dão-nos uma ar mais amigável. Inegável é que apesar de renascidos a reboque do vintage dos anos 90, os modelos em voga são muito mais criativos e futuristas que os da década em que pontificavam no rosto das meninas rebeldes como Drew Barrymore, Lisa Bonnet, Aaliyah ou menos rebeldes como Jennifer Aniston.

Os óculos de sol extra-small que ressurgiram este ano estão mais próximos dos anos 60 que dos anos 90, como mostra este modelo usado por Brigitte Bardot no final dessa década

Se Prabal Gurung e Balenciaga deram o tiro de partida deste regresso ao futuro, no passado mês de janeiro, ao integrar os SSS (super small sunnys) nas suas propostas para este Outono/Inverno, Miu Miu e Prada já lhe seguiram as pisadas e, nas suas coleções para a primavera/verão 2018, fizeram pontificar este acessório para trazer o espírito retro-futurista às suas criações, o que significa que dificilmente lhes vamos poder passar ao lado e ainda bem. A moda só é interessante quando nos desafia a “outrarmo-nos” como diria Fernando Pessoa.

Para já o modelo mais cobiçado é o triângulo invertido em tonalidades vintage, como os laranjas vermelhos ou verdes escuros, mas as marcas mais clássicas como a Armani têm à venda modelos em negro, e as lojas de fast fashion como a Top Shop, a Free People ou a Lefties têm modelos coloridos e semi-transparentes. Se nos anos 90 a peça se restringia a uma geometria circular, oval e retangular, agora há uma maior assertividade no desenho e eles surgem em quadrados, retângulos inclinados com ângulos afirmativos, triângulos invertidos, hexágonos. Os aros tendem a desaparecer ou a ocupar um espaço menos relevante deixando à vista o corte no vidro das lentes. Estas opções radicais lembram sobretudo os óculos dos século XIX.

Kendall Jenner tem sido outra das embaixatrizes desta tendência, aqui num modelo menos radical que os das irmãs Hadid (Andreas Rentz/Getty Images)

Para quem prefere atitudes menos drásticas, há também uma variedade de modelos um pouco maiores, com os aros em massa colorida, com linhas futuristas muito ao estilo do final dos anos 60. Na nossa foto galeria mostramos como mais do que uma tendência da moda estes óculos de sol são quase uma homenagem aos nossos antepassados. Para já a proposta parece estar direcionada para o público feminino mas nas mais recentes semanas da moda masculina algumas marcas, como a americana Barragan, ou a Armani também já os foram buscar ao baú.

Modelo redondo, unissexo, da marca Armani, a lembrar Janis Joplin ou John Lennon