Sete procuradores timorenses foram condenados disciplinarmente a seis meses de suspensão de atividade, sem vencimento, depois de escreverem aos líderes do país a questionar a liderança do procurador-geral e outros responsáveis do Ministério Público, confirmou a Lusa.

A condenação, pelo Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), envolve sete de um grupo de 18 procuradores que em abril escreveram ao Presidente da República, ao Parlamento Nacional e ao primeiro-ministro a questionar a liderança do Ministério Público (MP).

Os subscritores diziam haver “motivos de grande preocupação” sobre o funcionamento do MP, que consideram funcionar num sistema de “familiarismo, nepotismo e divisionismo”, sem justiça nas promoções na carreira.

O documento aponta alegadas irregularidades, abusos de direitos, critica diretamente um dos assessores estrangeiros do MP, que acusa de “atitudes imorais”, e diz que a liderança do MP gere a instituição “como se fosse a sua companhia privada”.

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O texto acabou por servir como base para uma resolução do Parlamento Nacional, aprovada em maio, em que os deputados pedem a exoneração imediata do procurador-geral, José da Costa Ximenes, “por não reunir condições objetivas para a nomeação do cargo”, considerando que “o seu primeiro mandato se caracteriza pela prática de inconstitucionalidades e ilegalidades graves”.

Na sequência da carta e da resolução, o CSMP, numa deliberação assinada pelo próprio procurador-geral, determina que se mande “instaurar procedimento disciplinar” aos procuradores, considerando o seu comportamento “suscetível de constituir ilícito disciplinar”.

“Tal tipo de comportamento não pode ser encorajado, sob pena de promover a indisciplina e o incumprimento dos deveres a questão adstritos os magistrados” do MP, refere a deliberação.

Em julho os procuradores apresentaram um recurso contencioso pedindo a nulidade, revogação ou anulação da deliberação considerando que “padece de um vicio insanável” porque “ofende o direito de petição” dos procuradores. Contestam também estar assinada pelo próprio procurador-geral que, porque o caso lhe dizia diretamente respeito, se deveria ter autoexcluído das reuniões do CSMP sobre o caso.

O CSMP acaba por deduzir acusação, a que a Lusa também teve acesso, que diz que os subscritores da carta “transmitiram falsamente a imagem de um Ministério Público desorganizado, destituído das suas funções”.

“Os arguidos tinham plena consciência de estarem a colocar os interesses pessoais acima do interesse da nação e do Ministério Público e a prejudicar a boa organização e o bom funcionamento deste último, provocando instabilidade, desunião e perda de confiança nesta instituição, bem como a sua desorganização interna e externa”, refere.

A carta em questão, de 27 de abril, é subscrita por 18 procuradores (mais de metade do total em ativo em Timor-Leste, atualmente 30) ainda que só tenha as assinaturas de sete deles: Domingos Barreto, Renato Bere Nahak, António Tavares da Silva, José Elo, Gustavo Moreira da Silva, Bartolomeu de Araújo e Osório de Deus.

Dos restantes 11 procuradores cujos nomes figuram na carta, a Lusa sabe que dois se distanciaram do documento tendo os restantes nove optado por manter-se em silêncio durante a fase de inquérito conduzida pelo CSMP.

A condenação pelo CSMP, a que Lusa teve acesso, considera que a carta “comporta acusações, expressões, afirmações e insinuações falsas de extrema gravidade, que traduzem falta de respeito devido” ao procurador-geral da República, José da Costa Ximenes, à adjunta do procurador-geral, Zélia Trindade, à procuradora de Díli Angelina Saldanha e à instituição.

“Com tais acusações falsas, imputações e expressões de caráter injurioso, os arguidos beliscaram a honra, o bom nome e a reputação desses dirigentes do Ministério Público”, refere a decisão que aplica aos procuradores a “pena de inatividade”.

O CSMP recorda no texto de condenação, assinado pelo vice-presidente Nelson de Carvalho, que dois dos procuradores, Domingos Barreto e António Tavares da Silva, já foram antes disciplinarmente punidos com pena única de inatividade, respetivamente de um ano e de 90 dias.

Considera ainda que com “pouco mais de 16 meses de carreira na magistratura do Ministério Público” os arguidos Gustavo Augusto da Silva Moreira, Bartolomeu de Araújo e Osório de Deus “tinham a obrigação e o dever de abster-se e demarcar-se do conteúdo da carta, porque tinham um conhecimento incipiente do Ministério Público e dos seus dirigentes”.

“Deixaram-se influenciar pelos magistrados mais antigos ou por entidade ou indivíduos fora do Ministério Público que querem não só destabilizar e desorganizar o Ministério Público, mas também pôr em causa o excelente trabalho que esta instituição e os seus magistrados vêm desenvolvendo”, nota ainda.

A pena de condenação, explica o CSMP, tem em conta a “acusação provada (…), a gravidade das afirmações e acusações, a culpa dos arguidos (…) e a necessidade de prevenir comportamento semelhante no futuro”.

A carta dos procuradores surgiu num momento de crise institucional entre o Parlamento Nacional e o então Presidente da República, Taur Matan Ruak, na sequência das decisões do chefe de Estado sobre a nomeação do novo presidente do Tribunal de Recurso e a renovação do mandato do procurador-geral timorenses.