Os últimos incêndios queimaram culturas, estábulos e animais em vários municípios da região Centro. Os pequenos produtores recomeçam a atividade aos poucos, mesmo quando tardam as ajudas prometidas.

Em Serpins, freguesia do concelho da Lousã onde o fogo fez mais estragos nos dias 15 e 16 de outubro, Augusto Manuel Filipe perdeu 22 cabras, 350 fardos de palha e um pavilhão que tinha construído há poucos meses, além de diversas ferramentas.

Todos falam que o Estado está a tratar do assunto. Eu agradecia que isso acontecesse, mas não tenho muita confiança que a gente vá receber alguma coisa”, afirma à agência Lusa o criador, de 49 anos.

Dono de um talho, Nelo, como todos os tratam na localidade, sofreu “para cima de 60 mil euros” de prejuízo, devido ao incêndio que eclodiu há um mês próximo de Vilarinho, no mesmo município do distrito de Coimbra.

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Nelo decidiu não baixar os braços e já comprou outros caprinos na zona de Tomar. Por 25 cabeças, pagou 5.300 euros, incluindo o IVA, mas o vendedor fez questão de lhe oferecer uma. O fogo também lhe destruiu dezenas de oliveiras e videiras jovens, bem como árvores de fruto, pinheiros e eucaliptos.

Nelo disponibilizou-se a carregar na sua viatura 25 cabras que outro criador de Serpins, que perdeu um rebanho com mais de 100 efetivos, precisa de ir buscar ao Ribatejo.

A solidariedade entre vizinhos e pequenos produtores, na sequência da tragédia, pratica-se de um modo geral e Augusto Manuel conta com apoio dos amigos na reconstrução do estábulo, na reposição de vedações e na sementeira de novos pastos.

Acredito mais no povo, que nos vai ajudar lentamente, do que naquilo que possa vir não sei de onde”, reitera o dono da pequena empresa familiar.

Com o incentivo da mulher e a pensar nos três filhos menores, ganhou “força para ir para a frente”, revela, comovido e determinado a reconstruir tudo o que o fogo lhe levou.

Também em Serpins, António José Ferreira teve “bastantes prejuízos” devido ao incêndio. “Não estou a contar com apoio de ninguém”, declara o proprietário, que possui várias parcelas florestais, incluindo uma mancha de castanheiros que produzia “boas castanhas” e que ardeu.

É agora necessário, na sua opinião, assegurar que a madeira queimada será vendida a “preços justos”, cabendo ao Governo criar “parques para que as florestas fiquem limpas”.

No dia 12 de agosto, viveiristas da Lousã, Vila Nova de Poiares, Miranda do Corvo e Coimbra sofreram danos avultados na sequência de um incêndio que começou em Torres do Mondego, neste último concelho.

O Presidente demissionário da Associação de Viveiristas do Distrito de Coimbra, Jorge Alexandre, de 36 anos, foi um dos lesados. Jovem agricultor, com um projeto financiado pelo Programa de Desenvolvimento Rural (Proder), que termina em 2018, o viveirista possui uma estufa em Canas, Miranda do Corvo, e alguns terrenos nas margens do rio Ceira.

Ficamos assim um bocado entregues à nossa sorte. Dizem-nos que não podemos concorrer porque a área ardida no concelho não foi suficiente para podermos concorrer”, lamenta.

Os prejuízos oscilam entre os 50 mil e os 75 mil euros. “Temos metas a cumprir, mas é impossível cumprir”, declara à Lusa, ao realçar que não teve “resposta até ao momento” do Ministério da Agricultura, cujos serviços foram informados dos danos, tanto na estufa, como no sistema de rega e nas plantações.

Em Ferraria de São João, no concelho de Penela, o incêndio que deflagrou em Pedrógão Grande, no dia 17 de junho, “afetou pastagens, equipamentos e armazéns agrícolas”, que os donos “estão a recuperar com apoio das instituições”, segundo o presidente da Câmara.

“São gente que gosta de arregaçar as mangas e dar a volta às adversidades”, salienta Luís Matias à agência Lusa. Para o autarca do PSD, “há que criar condições para que as pessoas possam aqui desenvolver as suas atividades sustentáveis e rentáveis para a sua subsistência”.

Américo dos Santos e José Adelino Gonçalves, de 62 e 48 anos, respetivamente, residem em Ferraria de São João, que integra a rede turística Aldeias do Xisto. Américo salvou duas cabras, mas “muitos coelhos e frangos” não resistiram ao fogo, que lhe destruiu ainda palheiros, alimentos para os animais e um reboque.

Os pequenos ruminantes pastavam também no mato, agora reduzido a cinzas. O agricultor aborda a questão dos apoios do Estado com alguma desconfiança: “Inscrevi-me nisso, mas até ver de concreto nada. Não me disseram que davam nem que não davam”.

As pastagens de José Adelino Gonçalves arderam. “Por estarem no curral”, duas cabras morreram após o incêndio de junho. Este criador, que possui atualmente 24 caprinos, revela que já recebeu ajuda financeira do Ministério da Agricultura para repor vedações. “A gente precisava de mais”, conclui.