É uma das muitas alterações ao Orçamento do Estado de 2018 e, não obstante ser uma nova contribuição, o destino não será o Orçamento do Estado. O Bloco de Esquerda propõe a criação de uma contribuição solidária para a extinção da dívida tarifária. Esta taxa vai aplicar-se às centrais de produção de energia do regime especial que recebem uma remuneração garantida, mas na prática vai incidir apenas sobre os parques eólicos, porque a cogeração vai ficar isenta. A proposta foi aprovada na especialidade na sexta-feira à noite, mas foi chamada a uma nova votação esta segunda-feira.

Para o Bloco de Esquerda seria “uma enorme desilusão” se o PS chumbasse, na segunda-feira, uma medida que “combate as rendas excessivas das elétricas e baixa a conta da luz”, já aprovada e acordada com o Governo.

A aprovação desta medida, com os votos dos socialistas, foi “uma enorme conquista”, considerou a responsável bloquista, falando aos jornalistas no sábado. No entanto, os deputados do Bloco de Esquerda foram “surpreendidos, ao final do dia [de sexta-feira], pelo facto de o PS ter avocado a medida para segunda-feira para ir a votação uma segunda vez”.

“Das duas, uma: ou o fez por reconhecer a importância da medida e quer explicá-la e dar visibilidade a esta decisão ou quer voltar atrás com a sua palavra e não quer afinal esta medida tão importante”, advertiu Catarina Martins.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A iniciativa do Bloco de Esquerda prevê que a receita estimada de 250 milhões de euros possa permitir até uma revisão extraordinária das tarifas da eletricidade, assim que entrar em vigor, ou seja, em 2018. Se esta intenção for para a frente, o preço da eletricidade que, segundo a proposta do regulador deveria baixar 0,2%, pode ainda descer mais. Isto apesar dos preços da energia elétrica no mercado grossista estarem a registar uma forte subida este ano, por causa dos efeitos da seca.

Na prática trata-se de estender a contribuição extraordinária sobre o setor energético (CESE) às renováveis que beneficiam de um regime de remuneração mais favorável que o preço de mercado e que é financiado pelas tarifas de eletricidade pagas pelo consumudor final. Só que há uma nuance em relação à CESE, aqui a receita está consignada, ou seja destina-se na sua totalidade à redução da dívida tarifária, também conhecido défice tarifário da eletricidade. E não irá beneficiar o défice do Estado, isto se for cumprido o que está previsto na proposta de lei do Bloco de Esquerda.

Também a CESE original, criada em 2014 sobre as grandes empresas de energia, deveria contribuir para reduzir o défice tarifário com um terço das receitas, mas na prática isso nunca aconteceu, porque a tutela das Finanças do anterior Governo nunca o viabilizou. Já com este Governo, foram feitas algumas transferências para abater ao défice na energia, mas abaixo do valor previsto.

Jorge Costa do Bloco de Esquerda confirmou ao Observador que esta contribuição poderá render cerca de 250 milhões de euros, considerando que é aplicada uma taxa de 30% sobre a diferença entre o preço médio da eletricidade em mercado e o valor da tarifa garantida no contrato destes centros produtores. É esse sobrecusto que passa para os preços da eletricidade.

Segundo o deputado, o sobrecusto associado às eólicas que são a principal fonte de energias renováveis que tem tarifa com prémio, tem rondado os 900 milhões de euros. Este sobrecusto tem sido um dos fatores a empurrar para cima os preços da eletricidade nos últimos dez anos e a contribuir para o défice tarifário, isto porque anteriores Governos decidiram diluir este sobrecusto ao longo de vários anos, para atenuar o seu impacto no preço da eletricidade. No entanto, e considerando que os preços do mercado grossista tem subido este ano por causa da seca, o sobrecusto verificado em anos recentes pode ser inferior, o que dará uma receita menor.

O diploma proíbe os produtores de passarem este encargo adicional para as tarifas de uso das redes e de uso global do sistema, travando a repercussão no preço final da eletricidade.

A contribuição extraordinária sobre o setor de energia foi criada pelo anterior Governo em 2014 que, no entanto, deixou de fora os produtores de energia eólica com o argumento de que estas licenças, e os respetivos contratos com tarifas bonificadas, tinham sido atribuídos por concurso público ou através de um processo competitivo. O diploma que foi aprovado esta sexta-feira exclui desta contribuição, para além da cogeração, a microgeração, a produção para o autoconsumo, as centrais de biomassa e as mini-hídricas.

Atualizado com declarações de Catarina Martins sobre nova votação da proposta.