Chegou atrasado para aquela que será a penúltima sessão de um julgamento que começou há ano e meio — em que é acusado de violência doméstica e difamação — porque estava na audiência de um outro processo. Manuel Maria Carrilho entrou de passo acelerado na sala do quinto andar do tribunal e preparado para falar. Num discurso que ora roçava um tom emotivo, ora se exaltava, o ex-ministro da Cultura disse que este processo tinha sido “uma bomba atómica” na sua vida. Um “plano” arquitetado pela ex-mulher, Bárbara Guimarães, e pelo seu advogado Pedro Reis, “um advogado à moda antiga”. “Quero reafirmar ser eu a vítima e ela a agressora”, disse perante a juíza.

Na sala de audiências do Campus de Justiça, em Lisboa, Carrilho discorreu esta segunda-feira sobre a mulher, os dois filhos, a estadia em Paris e até sobre política, onde lembrou que em 2004 afirmou numa entrevista que José Sócrates não reunia as condições para governar o País. Foi sempre tocando no processo, fugindo à questão central e voltando ao que durante um ano e meio se discutiu: um crime de violência doméstica e mais de 20 crimes de difamação.

Carrilho disse que quando se divorciou ficou sem nada. Com um carro, uma mala de roupa, sem casa e sem os filhos. Desde então tem lutado para recuperar tudo. O filho vive com ele desde março, por ordem de uma decisão provisória do Tribunal de Família e Menores. Luta agora pela guarda da filha mais nova.

Sentado, com várias folhas A4 escritas à mão, Carrilho começou por dizer que chegou a ter dúvidas se falaria ou não. Disse-o com a voz embargada, com dificuldades no arranque do discurso, até que o tom de voz começou a aumentar gradualmente. Houve momentos em que se exaltou, nomeadamente quando falou no alegado problema “de álcool” da ex-mulher.”Ela emborcava múltiplas garrafas”, acusou. O ex-governante disse que o processo era um verdadeiro “alvitamento”, que a acusação tinha um “torrencial de fragilidades” e que ele foi o primeiro a tentar que o processo de divórcio não caísse na comunicação social. “Durante oito dias, oito dias (insistiu), propus-lhe mediadores. Ela não aceitou nenhum”, disse.

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A certa altura Carrilho olhou para o advogado de Bárbara Guimarães, Pedro Reis, e insistiu que todo o processo crime não é mais do que “um plano traçado pela ex-mulher e por um advogado à antiga”.

“A Bárbara é a Miss Simpatia, Miss Hipocrisia, Miss Mentira. Não conheço ninguém mais simpático e mais hipócrita que a Bárbara”, disse Manuel Maria Carrilho.

Carrilho foi reiterando sempre que o agressor não era ela, mas a ex-mulher. “Agressor aqui é só um: Bárbara Guimarães”. Mas que estava pronto, e por isso estava ali, para desmontar este “plano miserável que se arrasta há quatro anos”. “Fui alvejado pelas costas por alguém que sabe que estou desarmado e que pretende depois alegar como legitima defesa a violência doméstica”, disse. Carrilho disse ainda que se o processo não envolvesse um ex-ministro e uma apresentadora de televisão “tinha sido arquivado”.

O ex-governante rematou a dizer que se arrependia de “algumas coisas que disse”. “Pelos filhos, pela mãe e por mim. Arrependo-me por esta ordem”, disse exaltado. E repetiu a frase.

Advogados com uma palavra a dizer

A sessão desta segunda-feira destinava-se a ouvir as réplicas dos advogados às alegações finais feitas há uma semana. O advogado de Bárbara Guimarães confrontou o advogado de Carrilho, Paulo Sá e Cunha com algumas das suas declarações. Disse que se era para extrair conclusões dos relatórios psicológicos feitos ao arguido e à vítima — como Sá e Cunha fez em alegações finais — também ele o podia fazer. E leu algumas passagens relativas a Carrilho, que fala nos seus “traços narcísicos e a ansiosos”. “Também sou capaz de retirar coisas do contexto e Bárbara Guimarães não está a ser acusada no processo.”, disse. O advogado admitiu que os crimes de difamação fossem consumidos pelo crime de violência doméstica. E terminou a dizer que vai recorrer da suspensão e da medida da pena da sentença aplicada a Carrilho há cerca de um mês.

Carrilho condenado a pena suspensa de quatro anos e meio de cadeia

Paulo Sá e Cunha, nos 20 minutos que a lei lhe permite, pediu a Pedro Reis que “não se enervasse”. E parafraseou um antigo professor, Oliveira Ascensão: “a paixão não favoreceu a lucidez da análise”. “Custa me vê-lo tão ansioso, peço lhe que não se enerve”, disse. Para depois voltar a defender o seu cliente, Manuel Maria Carrilho. “O que temos aqui é uma versão da assistente que alega ter sido vítima de atos de violência doméstica durante o casamento. E um arguido que nega, mas que assume que em 2013 o casamento sofreu um desagaste. Porquê? A assistente não estava a aceitar bem os 40 anos, estava com menos trabalho na SIC e os seus problemas de alcoolismo agravaram”, resumiu, acusando Bárbara Guimarães de “mentir”.

Processo Carrilho e Bárbara. Que provas tem a juíza?

A sentença deverá ser conhecida, segundo a juíza Joana Ferrer Antunes, a 15 de dezembro pelas 14h00.