Verde mais verde não há: os Açores apresentaram esta semana a candidatura a destino do turismo sustentável, no decorrer de uma conferência que reuniu especialistas regionais, nacionais e internacionais da área. A iniciativa da Secretaria Regional da Energia, Ambiente e Turismo do Governo Regional culminou com 41 empresas a assinarem uma cartilha de sustentabilidade, assumindo, assim, o compromisso de “internalizar os objetivos do desenvolvimento sustentável” em 2018, tal como se lê no comunicado de imprensa enviado às redações.

Contas feitas, se tudo correr bem, os Açores serão o primeiro arquipélago do mundo de turismo sustentável. Mas enquanto a candidatura avança e ganha fôlego (só são conhecidos resultados em 2019), já alguns projetos açorianos mostram o que valem — é o caso dos quatro que selecionámos, onde a sustentabilidade há muito que é a alma do negócio.

Café Nunes

Há sensivelmente 40 anos, Manuel Nunes comprou um terreno com plantas de café nas traseiras. Durante duas décadas, o açoriano aproveitou a bebida para consumo caseiro, sem nunca pensar que nos pequenos grãos estava a sua fama e fortuna. O café sempre fez parte da vida dos Nunes — Dina, a filha de 31 anos, ainda se lembra de brincar entre as dezenas de plantas na parte detrás da casa –, mas a relação só se tornou séria no dia que Manuel abriu o seu próprio estabelecimento.

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No Café Nunes todo o expresso vendido é biológico: por obra e graça do destino, as plantas (que hoje são 500, todas da variedade arábica) não precisam de quaisquer tratamentos químicos. “Pode haver folha roída, mas nenhuma praga vai afetar o grão de café”, explica Dina, que vai ajudando os pais como pode. Tudo isto é negócio de família: se no piso de baixo o pai serve chávenas (umas atrás das outras, sobretudo no verão), no de cima, mãe e tia fazem pequenas sacas à base de algodão e estopa de linho em teares manuais de madeira, onde é depositado e vendido café a granel (50 e 100 gramas, 20 e 30 euros).

Este é o único café da Fajã dos Vimes — uma das 70 fajãs de São Jorge — e é aos Nunes que cabe, até ver, o título de “maior plantação de café da Europa”, motivo mais do que suficiente para ser procurado por vários turistas, venham eles de onde vierem. “A publicidade sempre funcionou de boca em boca. Ainda hoje é assim. Nunca pensámos que viéssemos a ter tanta fama”, conta Dina ao Observador. É precisamente por isso que, a partir de janeiro, as visitas às plantações e à sala dos teares vão começar a ser cobradas. É de aproveitar até ao final do ano.

Morada: Fajã dos Vimes, São Jorge
Contacto: 295 416 717

Aldeia da Cuada

Um total de 20 casas de pedra basáltica, ainda com a traça original, e um restaurante compõem a Aldeia da Cuada. Antes de ser um aldeamento de turismo rural aqui viveram açorianos que, nos idos anos 60, trocaram a ínsula rumo à terra prometida, à América — a aldeia foi criada em 1676 e já era seguramente habitada no início do século XVII. Para trás ficaram construções e um modo de vida que Teotónia e Carlos Silva, os atuais proprietários, foram reconstruido pouco a pouco. O resultado é uma pequena aldeia parada no tempo, que goza do isolamento que a Ilha das Flores consegue oferecer, um casamento bem conseguido entre o passado e o presente: as habitações originais foram recuperadas e adaptadas às “exigências necessárias para umas férias de sonho”, sendo que no interior ainda se avistam cortinas de renda e camas com cabeceiras em ferro, a título de exemplo. De referir que as diferentes casas foram batizadas em homenagem a quem antes ali viveu, pelo que não é de estranhar que entre as sugestões de pernoita esteja a “Casa do Fagundes”, a “Casa da Fátima” ou o “Palheiro do Pimentel”. A Aldeia da Cuada foi eleita, em 2017, pela associação Zero como “o quarto hotel mais sustentável do país”.

Morada: Fajã Grande, Lajes das Flores, Ilha das Flores
Contacto: 292 590 040
Preço: noites a partir de 75 euros

Quinta dos Sabores

À cozinha deste restaurante, aberto desde 2014 em Rabo de Peixe, em São Miguel, chega tudo o que cresce nas terras em seu redor. Tudo é aproveitado e não há qualquer desperdício alimentar. Os produtos cultivados que não vão para o tacho, são vendidos para fora em jeito de cabazes ou na forma de chás, compotas ou almofadinhas de cheiros, por exemplo. Já a carne e o peixe são comprados a produtores locais — por cá, a sustentabilidade é assunto sério. A Quinta dos Sabores é projeto de vida de Inês Sá da Bandeira e Paulo Decq, que deixaram o continente em 2001 para abraçar a quinta deixada pela família de Paulo.

O restaurante, que só está de portas abertas à noite, é propositadamente intimista — contam-se apenas nove mesas — e serve para ajudar a escoar o stock do que é produzido nas estufas de Inês e Paulo. A ideia é servir refeições de deixar o estômago aconchegado num ambiente que faz lembrar os jantar de família formais q.b. O espaço só funciona mediante reservas (de forma a assegurar que as compras são feitas na medida certa, nem mais, nem menos) e não há carta, apenas um menu que vai variando conforme os produtos disponíveis e que obedece à seguinte estrutura: entrada, sopa, prato de peixe, prato de carne e sobremesa. As restrições alimentares são sempre tidas em conta e há vinho a copo e vinho alentejano da casa (da família de Inês).

Aqui já foram servidos pratos como chicharro marinado com salada fresca, sopa de agrião ou caldeirada de encharéu. As receitas são obra do casal e os cozinhados ficam entregues a Tiago, de 23 anos, e Graça, 20 anos mais velha — ele estudou cozinha e ela trabalhou em casas de família. O projeto pequeno demorou 17 anos a ser construído e tem gozado da fama do boca a boca. Paulo pode ter crescido em Almada e vivido em Lisboa, mas assegura que é aqui que quer morrer. “Aos 70 anos espero estar a fazer exatamente a mesma coisa”, diz o homem que tem um desejo muito claro — que a Quinta dos Sabores seja o ponto de encontro de diferentes gerações, todas elas de estômago cheio.

Morada: Ribeira Grande, Rabo de Peixe, Caminho da Selada, 10
Contacto: 926 333 114
Preço de menu: 35 euros por pessoa (sem bebidas incluídas)

https://www.instagram.com/p/BWoAgg7gmD0/?tagged=quintadossabores

Quinta do Bom Despacho

A sustentabilidade é o pilar central da Quinta do Bom Despacho. Está mesmo tudo pensado ao pormenor e não se dá ponto sem nó: por cá só se compra o necessário, tudo é reciclado, os detergentes para a loiça são feitos com óleos vegetais, os sabonetes são artesanais e os aquecimentos são eficientes. Há ainda uma piscina biológica (isto é, sem a utilização de químicos para a oxigenação e purificação da água), um jardim sensorial e uma horta biológica cujos produtos podem ser utilizados pelos hóspedes na cozinha da quinta. Não é brincadeira: a quinta está certificada como alojamento sustentável pelo Green Growth 2050 Global Standard e cumpre mais de 400 critérios que atestam a responsabilidade económica, ambiental e social.

As irmãs Joana e Susana Borges Coutinho estão à frente do projeto que, em boa verdade, abriu as portas em tempo recorde, em 2015. A Quinta do Bom Despacho ocupa a casa que está na família há 400 anos, cuja traça original foi mantida — foi ali que Joana cresceu até rumar à faculdade, para se licenciar em agricultura biológica, e foi ali que se passaram verões inteiros em família. Ao todo, existem 10 quartos (dois deles são familiares), incluindo divisões adaptadas a pessoas de mobilidade reduzida, sendo que há capacidade para alojar até 25 pessoas.

Morada: Rua do Lagedo, 62 — Quinta do Bom Despacho, Ponta Delgada
Contactos: 296 683 054 / 960 272 754
Preço: noite a partir de 40 euros, em época baixa. Lista de preços completa aqui.