No lançamento do jogo, Jorge Simão não evitou um sorriso quando lhe falaram nas bolas paradas. Bolas paradas ofensivas, entenda-se, porque essa é uma das principais armas do Boavista e porque essa pode ser uma arma letal contra um grande. Mas entre o sorriso houve uma resposta que parecia adivinhar o que se iria passar.

“Temos feito alguns golos de bola parada e não é pela altura… Somos quase uma equipa de anões, perdoe-se-me a expressão. O Sporting tem três jogadores acima dos 1,90 metros e nós temos vários com menos de 1,78 metros”, comentou na antevisão o técnico boavisteiro.

Foi por aí, “no quinto momento do jogo”, como Jorge Jesus costuma descrever (aliás, na altura, há muitos anos, até chegou a reivindicar a criação desse novo momento), que o Sporting ganhou o jogo porque, em terra de anões, quem teve cabeça foi rei. E bastaram 230 segundos loucos na segunda parte para tudo ficar decidido.

Ficha de jogo

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Boavista-Sporting, 1-3

14.ª jornada da Primeira Liga

Estádio do Bessa, no Porto

Árbitro: Luís Godinho (AF Évora)

Boavista: Vagner; Carraça, Raphael Rossi, Sparagna, Talocha; Idris, David Simão; Rochinha, Fábio Espinho (Aymen Tahar, 81′), Vítor Bruno (Rui Pedro, 67′) e Kuca (Mateus, 61′)

Suplentes não utilizados: Assis, Robson, Aidi e Clarke

Treinador: Jorge Simão

Sporting: Rui Patrício; Piccini, Coates, Mathieu, Fábio Coentrão; William Carvalho, Bruno Fernandes (Bryan Ruíz, 87′); Gelson Martins, Bruno César (Acuña, 58′), Podence (Battaglia, 62′) e Bas Dost

Suplentes não utilizados: Salin, André Pinto, Alan Ruíz e Doumbia

Treinador: Jorge Jesus

Golos: Fábio Coentrão (45+3′), Bas Dost (63′ e 67′) e Mateus (65′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Coates (24′), Fábio Coentrão (88′) e Sparagna (90+2′)

 

Ao contrário do que seria de esperar, Jorge Jesus apresentou um meio-campo sem Battaglia e Podence nas costas de Bas Dost. Foi uma surpresa, na medida em que, como se viu nos jogos do Boavista com o Benfica (vitória por 2-1) e o FC Porto (derrota por 3-0), era no corredor central que se decidiria o resto. A ideia era desequilibrar, mas as equipas não podiam ter ficado mais equilibradas no plano tático. E esse encaixe, por muito estimulante que possa ser (e é) para quem gosta de olhar para a dimensão mais teórica de um jogo, secou os motivos práticos de interesse.

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Até aos 45′, houve apenas um remate digno desse nome e não intercetado (Fábio Coentrão, aos 20′, após cruzamento da direita de Gelson Martins com posterior simulação de Bruno César na área); de resto, completo encaixe com o Sporting a ter mais posse mas sem profundidade em termos ofensivos e o Boavista a apostar nas transições com Kuca e Rochinha. Houve muito mérito na forma como os axadrezados conseguiram secar a primeira fase de construção verde e branca e os movimentos entrelinhas de Podence e Gelson Martins, da mesma forma como houve demérito na maneira como os leões se colocaram a jeito para serem controlados no último terço.

Entre méritos e deméritos de um plano coletivo, acabou por sobressair a figura individual nos descontos, neste caso com Podence. A pequena grande pérola (com um novo look) da formação leonina que vai ziguezagueando entre a promessa e a certeza consoante as luas táticas de Jesus fez a diferença à direita, deixou Talocha no chão à procura da sua sombra e cruzou de feição para o segundo poste onde apareceu o improvável Coentrão a marcar, de cabeça na pequena área, o primeiro golo desde que assinou pelo Sporting (há quase dois anos que o lateral não festejava).

Esse golo tardio acabou por fazer mossa na forma como a segunda parte iria decorrer: por um lado, o Sporting conseguiu ser muito mais incisivo na forma como atacava a baliza do Boavista, jogando em ataque posicional muitos metros à frente do que estava a fazer; por outro, o Boavista deixou de ter capacidade para sair em transições, o que obrigava os jogadores leoninos a posicionamentos mais baixos no terreno para não serem apanhados em contra pé. Ainda assim, e se foi no jogo corrido que os comandados de Jesus mais melhoraram, foi em lances de estratégia que conseguiram dar a volta. E foi aos 62.19 minutos que Dost abriu 230 segundos de loucura no Bessa, fazendo o 2-0 após um cabeceamento de Mathieu ao poste que o holandês desviou depois na pequena área.

No entanto, quando muitos adeptos leoninos ainda estavam em pé, Coates fez questão de arrefecer a festa. Já no lance em que viu cartão amarelo na primeira parte, por entrada dura sobre Rochinha, o uruguaio tinha facilitado em demasia numa primeira fase; desta vez, decidiu sair a jogar com bola, perdeu-a a deu oportunidade ao Boavista para criar a sua primeira oportunidade de golo (e remate enquadrado), com Mateus a encostar na pequena área isolado uma assistência de Vítor Bruno. Tudo menos de dois minutos depois do primeiro golo de Dost (65′) e com ajuda do vídeo-árbitro, que ratificou um lance que tinha deixado dúvidas no posicionamento do angolano.

Mas cá se fazem, cá se pagam e 128 segundos depois do golo de Mateus (e 230 segundos depois do 2-0), Bas Dost bisou. E bisou porque, na sequência de um livre lateral batido por Bruno Fernandes, Mathieu foi lá acima ao segundo andar assistir de forma eficaz o goleador holandês, que desviou sem hipóteses para Vágner (67′).

Bruno Fernandes, num lance onde parecia querer cruzar mas que quase ia marcando, ficou muito perto do 4-1, mas não mais o resultado iria alterar-se até porque, ao longo de toda a partida, a defesa verde e branca esteve sempre certinha (a não ser na “goela” de Coates para o golo dos visitados) e Rui Patrício fez apenas uma defesa num lance quase sem perigo. O Boavista mexeu (entrou Rui Pedro), mas poucos resultados práticos conseguiu obter. E os leões subiram à liderança isolada pelo menos durante 24 horas, até ao final do V. Setúbal-FC Porto.