O Governo vai alterar a portaria que enquadra o financiamento das indemnizações aos lesados do papel comercial do BES, para poder emprestar ao fundo o dinheiro necessário para o pagamento das compensações.

No fim de semana foi conhecido que a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) deu autorização para a constituição do fundo de recuperação de créditos que irá pagar indemnizações aos cerca de 2 mil clientes que compraram, aos balcões do Banco Espírito Santo (BES), 400 milhões de euros em papel comercial e cujo investimento foi perdido aquando da queda do banco e do Grupo Espírito Santo (GES), no verão de 2014.

“Neste momento, a Patris [sociedade gestora do fundo], pode enviar aos lesados os contratos de adesão ao fundo, o que deverá começar a ser feito nas próximas semanas”, disse à Lusa o presidente da Associação de Indignados e Enganados do Papel Comercial (AIEPC), Ricardo Ângelo.

Após cada lesado receber o contrato de adesão, em que será especificado o valor de indemnização a receber e os termos de pagamento (será pago em três parcelas), cada lesado terá cerca de três semanas para avaliar se quer aderir ou não à solução proposta. Só depois dos interessados assinarem, acabado o período de subscrição, é que o fundo pagará a primeira ‘tranche’ das indemnizações.

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Este processo poderá ainda demorar alguns meses, até porque há algumas burocracias que faltam.

Desde logo, como avançou esta segunda-feira o Jornal Económico, é necessário alterar a portaria n.º 343-A/2017, de 10 de novembro, que previa que o Estado prestasse garantias para que o fundo se pudesse financiar junto de vários bancos de modo a ter dinheiro para pagar aos lesados.

No entanto, essa ideia foi abandonada, como anunciou em 30 de dezembro o secretário de Estado adjunto e das Finanças, Mourinho Félix, que disse que o Estado decidiu emprestar dinheiro diretamente ao fundo, em vez da garantia, e que já tinha sido assinado um contrato de financiamento de 145 milhões de euros com vista sobretudo ao pagamento da primeira tranche.

O Ministério das Finanças confirmou à Lusa a necessidade de alterar a portaria, referindo que já “foi assinada pelo Ministro das Finanças e aguarda publicação em Diário da República” e explicando que a alteração se tornou necessária porque “o financiamento do Fundo de Recuperação de Créditos para Lesados do BES passa a ser feito, parcialmente, através de empréstimo do Estado”.

Fonte oficial das Finanças adiantou que a portaria “apenas diz respeito à concessão das garantias do Estado, não implicando qualquer alteração no empréstimo celebrado entre a Patris e o Estado no final de 2017”.

Posteriormente, é necessário que a Patris altere o contrato de financiamento do fundo entregue à CMVM.

Só depois de toda a documentação necessária ser entregue corretamente é que o regulador dos mercados financeiros vai avaliar o seu conteúdo e, então, aprovar definitivamente a constituição do fundo.

A Lusa contactou a CMVM sobre este tema, mas fonte oficial disse apenas que a entidade autorizou a “constituição do fundo”, mas acrescentou que a adesão dos lesados à solução “está dependente da entrega de documentação suplementar pela sociedade gestora”, a Patris.

A solução encontrada (entre a associação de lesados, Governo, CMVM, Banco de Portugal, BES ‘mau’ e Novo Banco) propõe que os lesados recuperem 75% do valor investido, num máximo de 250 mil euros, isto se tiverem aplicações até 500 mil euros.

Já acima desse valor, irão recuperar 50% do valor.

Quanto ao pagamento, este será feito pelo fundo de recuperação de crédito, devendo esse pagar 30% da indemnização aos lesados (cerca de 140 milhões de euros) logo após a assinatura do contrato de adesão à solução. O restante valor será pago aos lesados em mais duas parcelas, em 2018 e 2019.

Caso todos os lesados adiram à solução o valor previsto ser atribuído em compensações é de 287 milhões de euros ao longo dos três anos.

Para a primeira tranche deverão ser pagos 140 milhões de euros, que vêm diretamente do Orçamento do Estado.

Quanto às restantes tranches, também o Estado deverá assegurar os montantes em questão, pois o mais provável é que até então não haja decisões judiciais que permitam ao fundo recuperar dinheiro.

Em troca de receberem as indemnizações os lesados vão passar para o fundo os créditos que têm sobre o BES e entidades relacionadas com o banco, de modo a que seja este a litigar em tribunal contra o banco pelos danos causados.

Caso os tribunais decidam em favor dos lesados, será o fundo de recuperação de créditos a receber as indemnizações.

A solução para os clientes do papel comercial foi uma promessa do primeiro-ministro, António Costa, tendo sido apresentada no final de 2016. Contudo, o processo tem-se arrastado e ainda estão para ser pagas as primeiras indemnizações aos lesados.