De sorriso fácil, a irmã mais nova de Kim Jong Un, Kim Yo Jong, tem sido a estrela dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2018 que decorrem na vizinha e inimiga Coreia do Sul. O papel da norte-coreana de 30 anos levou a que o Washington Post a chamasse de “Ivanka Trump da Coreia do Norte” e a CNN a atribuir-lhe uma “medalha de ouro” numa fictícia modalidade: “Dança diplomática“.

E essa nota artística diplomática contou com alguns detalhes numa operação de charme do regime norte-coreano liderada por Kim Yo Jong. Além do sorriso, a irmã de Kim marcou pontos com o aperto de mão que deu ao presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, e também com uma mensagem histórica que escreveu no livro de visitas presidencial sul-coreano:

Espero que Pyongyang e Seul se aproximem dos corações de nossos povos e avancem para uma unificação próspera no futuro.”

A ascensão de Kim Yo Jong no regime está a ser vista por especialistas em política norte-coreana, ouvidos pela CNN, como a resposta do seu irmão à forma como Donald Trump utiliza a filha Ivanka Trump na sua estratégia. É a “first sister” de Kim contra a “first daughter” de Trump.

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[Veja no vídeo o aparato da chegada à Coreia do Sul da irmã de Kim, rodeada de guarda-costas]

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A reunião entre a irmã de Kim Jong Un e o presidente sul-coreano é o encontro de mais alto nível nos últimos dez anos entre funcionários dos dois regimes. Desse encontro partiu um convite. O líder norte-coreano convidou o homólogo Moon Jae-in para uma visita a Pyongyang.

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A ida de Kim Yo Jong aos Jogos Olímpicos é simbólica, uma vez que é a primeira vez que um membro da dinastia que lidera a Coreia do Norte visita a Coreia do Sul desde que terminou a guerra das Coreias, em 1953. Além disso, as imagens da reunião do almoço no Blue House — que foi transmitido ao vivo na televisão estatal sul-coreana — mostraram Moon sentado à frente da irmã de Kim, em vez de Kim Yong Nam (uma espécie de ministro do Protocolo), que seria, teoricamente, o mais alto funcionário presente na reunião.

O Washington Post relata ainda que Kim Yo Jong foi tratada por Seul como se fosse um membro da realeza. O governo sul-coreano cedeu um Hyundai Genesis, um carro de luxo que se percebia ser à prova de bala, para as deslocações da irmã do líder coreano. Kim — que faz parte da cúpula de um país pobre que enfrenta fortes sanções da ONU — ficou hospedada no hotel Sheraton Grande Walkerhill, de cinco estrelas, nos arredores de Seul. Ao almoço, a delegação norte-coreana comeu peixe grelhado.

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Os responsáveis políticos dos dois países estiveram ainda juntos num jantar num hotel em Gangneug, em que Kim Yo Jong apareceu vestida com um casaco cor de vinho e umas calças pretas. O anfitrião do evento foi o ministro da unificação da Coreia do Sul, Cho Myoung-gyon.

Kim Yo Jong assistiu depois à partida de hóquei da equipa da Coreia contra a Suíça. A irmã do líder norte-coreano sentou-se ao lado de Kim Yong Nam, de Moon e da sua mulher, Kim Jung-sook. A Suíça acabou por ganhar 8-0. A adversária da Coreia neste jogo será um país que diz muito a Kim Yo Jong, já que terá sido em Berna que a irmã de Kim Jong Un fez parte da sua formação.

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Quem é a irmã sorridente de Kim Jong Un?

Kim Yo Jong terá sido promovida pelo irmão em outubro de 2017, passando a fazer parte do Politburo — o órgão mais importante de tomada de decisão no Partido dos Trabalhadores da Coreia. É a ela que é atribuída a gestão da imagem pública do irmão.

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Não se sabe ao certo que idade tem, mas, segundo a CNN, terá nascido em 1987. Era raro Kim Yo Jong aparecer em público até 2010, quando surgiu numa conferência do Partido dos Trabalhadores e passou a ser vista com regularidade na comitiva do pai, o então líder Kim Jong-il. No ano seguinte, no funeral do pai, foi uma das figuras em destaque.

Mas é em 2014 que começa a ter todas as atenções da imprensa. Acompanhou o irmão durante as eleições para a assembleia popular suprema e houve relatos de que foi ela a responsável por todos os assuntos de Estado quando Kim Jong-un teve um problema de saúde em outubro desse ano.

A promoção tornada pública em outubro de 2017 demonstra a total confiança que Kim Jong-un deposita na irmã mais nova e cimenta a sua posição enquanto segunda mulher mais poderosa da Coreia do Norte, logo depois da mulher do líder, Ri Sol-ju. Kim Yo Jong foi designada vice-presidente do departamento de propaganda do partido no final de 2014 e usou essa posição para criar um fenómeno de culto da personalidade do irmão, representando-o como um homem benevolente, um líder acessível, modelado em larga escala pela memória do avô, o fundador da Coreia do Norte, Kim Il-sung.

Kim  Yo Jong é referida pela imprensa internacional como a cabeça pensante por detrás das visitas do irmão a parques temáticos, escolas e às próprias casas da população; assim como a moderação da atípica amizade com a antiga estrela da NBA Dennis Rodman.

Uma vida de segredos e privilégios

Tal como acontece com todos os outros membros do regime, é quase impossível obter informação verosímil sobre a vida de Kim Yo Jong. A maior parte dos testemunhos afirmam que completou a escola primária em Berna, na Suíça, no final dos anos 90 – tal como o irmão – e que prosseguiu os estudos até ingressar no curso de Ciência Computadorizada na Universidade Kim Il-sung, em Pyongyang. O site North Korea Leadership Watch refere que os irmãos viviam numa residência privada, rodeados de guarda-costas, e que o pai tentou amenizar o seu isolamento ao enviar músicos norte-coreanos para a Suíça para lhe fazerem companhia.

Nada se sabe sobre a vida de Yo Jong desde que terminou o curso até 2007, quando começou a desempenhar um papel quase inexistente no partido da família. Ao que tudo indica, casou em 2015 com Choe Song, o filho do vice-presidente do Partido dos Trabalhadores, e teve um filho em maio desse ano. Também este fim-de-semana, Choe Song foi promovido à comissão militar do partido.

Apesar de ser um nome desconhecido para a Europa, Kim Yo Jong não escapa aos radares dos serviços secretos norte-americanos, que em janeiro a colocaram numa lista de pessoas a ter em conta no que toca a “grave violação dos direitos humanos”.

Kim Yo Jong e Kim Jong-un são filhos da mesma mãe e do mesmo pai: algo raro na família Kim. Esta promoção é relevante principalmente porque, tal como já fez questão de demonstrar, os laços familiares não são muito importantes para o líder norte-coreano vigente. Em 2013, ordenou a execução do tio, Jang Song-Thaek, e permanecem as suspeitas sobre o seu envolvimento no homicídio no meio-irmão, Kim-Jong Nam.

Agora, Kim Yo Jong ganha cada vez mais peso no regime e é vista como uma das mais influentes conselheiras do irmão. “Ela provavelmente é uma das pessoas com mais influência junto do próprio Kim Jong-un, precisamente porque ele tem poucas pessoas em quem pode confiar”, disse Balbina Hwang, professora convidada da Universidade de Georgetown e fundadora da Comité Nacional da Coréia do Norte.

A ida aos Jogos Olímpicos de Inverno foi uma autêntica operação de charme da irmã de Kim Jong-un. Quem não cedeu à propaganda norte-coreana foi o vice-Presidente dos Estados Unidos, Mike Pence, que lidera a comitiva norte-americana. Durante a cerimónia de abertura, Pence ficou sentado a poucos metros da irmã de  Kim Jong-un, mas não interagiu com a representante norte-coreana.