Depois de meses de espera, Pedro Dias falou finalmente pela primeira vez em tribunal. As versões dos acontecimentos que apresentou diferem em muito das apresentadas pelas restantes testemunhas e pela tese do Ministério Público, sustentada pela investigação da Polícia Judiciária — sobretudo no que diz respeito à morte do casal Luís Pinto e Liliane Pinto.

Pedro Dias está acusado de cinco crimes de homicídio — dois na forma tentada, do militar António Ferreira e de Lídia Conceição. Nas alegações finais, contudo, o Ministério Público solicitou ao tribunal que passasse a considerar um dos dois crimes de homício na forma tentada como um crime de ofensa à integridade física.

Para cada um destes crimes, há versões contraditórias entre arguido e testemunhas. E até há histórias que não batem certo sobre por onde andaram um suposto pé de cabra e uma arma Glock que matou o casal Pinto.

Como morreu o guarda Carlos Caetano?

Pedro Dias fala de agressões, GNR sobrevivente desmente

Sobre a morte do guarda Carlos Caetano, o primeiro dos crimes que terão sido cometidos por Pedro Dias, as versões só coincidem num facto: Dias estava dentro da sua carrinha Toyota a dormir junto às obras do Hotel das Cavacas. A partir dali, arguido, testemunhas e provas contam histórias diferentes.

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Versão de Pedro Dias

Em tribunal, esta quinta-feira, Pedro Dias explicou que estava a dormir na carrinha quando foi abordado pelos dois guardas, que bateram no vidro. “Levantei-me já com as mãos no ar e o senhor do lado esquerdo perguntou-me o que estava a fazer. Disse que estava a dormir. O senhor agente, que estava do lado esquerdo, disse-me para sair do veículo e volta-me a perguntar o que estava ali a fazer, que era um sítio suspeito”, declarou Pedro Dias.

Os agentes insistiram com ele: aquele era um sítio suspeito para se estar àquela hora. Pedem-lhe a carta de condução, pedido a que Dias acede, e pedem-lhe que se dirija ao carro de patrulha para verificação dos documentos. Naquele momento, o guarda Carlos Caetano regressa para junto do veículo de Pedro Dias e o guarda António Ferreira vai falar ao telefone. Dias segue para junto da sua carrinha com Caetano.

“Ele começou a mexer nas coisas que tinha na carrinha, na porta traseira do passageiro. Eu tinha umas mochilas com muda de roupa”, contou Dias. Entretanto, regressa António Ferreira e Carlos Caetano dirige-se às obras do hotel. Quando Caetano volta para junto do colega e de Pedro Dias, acusa-o de estar ali para roubar e começa a agredi-lo.

“Ele acertou-me com as algemas na mão direita e queixei-me”, diz Pedro Dias. “Atirou-me contra a carrinha e deu-me um pontapé na perna esquerda e começou a fazer-me uma revista. Deu-me um murro, comecei a ficar assustado. Os senhores GNR eram maiores que eu, mesmo a parte física deles era superior à minha. Ainda ouvi o senhor Ferreira a dizer tem calma. Só perguntava o que fiz e ele volta a dar-me dois murros. Eu vou fazer queixa ao meu advogado, isto não pode ficar assim”, continuou o arguido, em tribunal.

“Levo uma joelhada muito grande na zona lombar. Entretanto levo mais uma joelhada na zona dos genitais, levo mais um ou dois murros. Vejo a minha arma e só penso: «Isto tem de parar aqui». E puxo da minha arma”, continuou Pedro Dias, no seu testemunho. Foi nessa altura que disparou sobre o guarda. “Só via vermelho”, disse. De acordo com Dias, o  objetivo não era matar, mas sim assustar Caetano. Depois daquele momento, o arguido obriga o guarda António Ferreira a entrar no carro de patrulha e os dois abandonam o local.

Versão de António Ferreira e do relatório da PJ

A história deste momento daquela noite é contada de forma totalmente diferente no relatório final da Polícia Judiciária, a que o Observador teve acesso. Esse relatório, que se baseia nos depoimentos de inúmeras testemunhas (incluindo do guarda António Ferreira, que depois também testemunhou em tribunal) e nas provas forenses, começa por afirmar que os dois guardas, que estavam de patrulha, abordaram “serenamente” Pedro Dias, que se encontrava a dormir na sua carrinha, pedindo-lhe para sair do veículo e para lhes entregar os seus documentos.

Julgamento. Pedro Dias acusa militar da GNR de ter matado o casal que ia a caminho de Coimbra

É o guarda Carlos Caetano quem guarda a carta de condução de Pedro Dias no seu bolso e se dirige para o carro patrulha, para pedir informações adicionais à central sobre o indivíduo. Depois de fazer vários telefonemas e de ser informado que Pedro Dias era perigoso e que podia estar armado, Caetano regressa para junto do veículo, e confidencia a informação ao seu colega António Ferreira. Nesse momento, ouvem um barulho vindo da vegetação, desviando “momentaneamente” o olhar de Pedro Dias.

Pedro Dias aproveita esse momento para pegar na pistola de calibre 7,65 mm que trazia consigo e disparar à cabeça de Carlos Caetano, matando-o de imediato. Depois, aponta a arma à cabeça de António Ferreira e ameaça-o de morte, obrigando-o a retirar o seu cinturão (e respetiva arma) e a entregar-lho, e a fazer o mesmo com o cinturão do seu colega.

As provas encontradas

  • Um invólucro de 7,65 mm no local
  • Grande mancha de sangue no local onde terá estado o cadáver de Carlos Caetano
  • Carta de condução de Pedro Dias no bolso de Carlos Caetano

Quem matou o casal Luís e Liliane?

Pedro Dias acusa GNR, António Ferreira e a PJ garantem que foi ele

Depois do guarda Carlos Caetano, Pedro Dias terá matado também Luís Pinto e Liliane Pinto, um casal que seguia no seu carro, na N229 em direção a Coimbra, para uma consulta de fertilidade. Também aqui as versões são opostas: enquanto o testemunho de António Ferreira e as provas encontradas parecem apontar para Pedro Dias, como se lê no relatório da Polícia Judiciária, o arguido garante que quem matou o casal foi o próprio guarda António Ferreira — que, segundo a PJ, já nem se encontrava com Dias.

Versão de Pedro Dias

Segundo contou em tribunal, depois da morte do guarda Carlos Caetano, Pedro Dias entrou no carro de patrulha e obrigou o guarda António Ferreira a conduzir durante algum tempo e a fazer comunicações à central, para despistar as autoridades. A dada altura, encostaram o carro na N229, e atrás de si parou um outro carro, em que estavam um homem e uma mulher. Na versão de Pedro Dias, o homem do casal dirige-se ao carro de patrulha para os abordar. “Vê lá o que vais dizer”, terá dito Dias ao guarda Ferreira.

De acordo com Pedro Dias, António Ferreira pega numa das armas Glock de 9 mm (utilizadas pelos guardas) que trazia na sua viatura, sai do carro e dispara por cima do tejadilho, não lhe tendo acertado. Nesse momento, já com Pedro Dias e Luís Pinto fora das viaturas, os dois escondem-se atrás do carro da GNR para se protegerem. “Nessa altura, o senhor Ferreira aproxima-se de mim, eu empurro o senhor [Luís Pinto] para cima dele”, contou Dias. Um novo disparo de Ferreira acaba por atingir Luís Pinto.

Mónica Quintela e Rui da Silva Leal, advogados de Pedro Dias.

Pedro Dias foge depois para o mato e diz ter ouvido mais “dois ou três” disparos. Depois, regressa ao local e surpreende o guarda Ferreira, dizendo-lhe que largue a arma. Nesse momento, diz ter visto a mulher sem se mexer, e Luís Pinto no chão, também inanimado. Dias algema o guarda Ferreira no interior da viatura e os dois saem do local.

Já noutro lugar, Pedro Dias obriga António Ferreira a sair do carro e a algemar-se a um pinheiro. Tendo ouvido “o barulho de fechar as algemas”, diz ter ficado descansado e pôs-se à procura de uma mota, que dizia ter ali deixado há dias. A dada altura, o militar, que afinal não estava algemado ao pinheiro, atira-se para cima de Pedro Dias, que tinha uma arma na mão. Naquela confusão, a arma terá então disparado. “Aí percebi que tinha acertado na face. Fiquei ali sentado, pensei em dar um tiro na minha cabeça”, contou. De seguida carregou o corpo do guarda “uns cinco ou seis metros para dentro” e voltou para o carro da GNR.

Versão de António Ferreira e do relatório da PJ

Ler o relatório da Polícia Judiciária sobre a investigação e o testemunho de António Ferreira é ler uma história totalmente diferente. Logo em primeiro lugar, o relatório da PJ garante que Pedro Dias ia sozinho no carro de patrulha — nesta altura, já tinha baleado António Ferreira, momento que Dias diz ter acontecido só após a morte de Luís Pinto.

Em segundo lugar, há uma aparente contradição sobre a arma Glock. Isto porque, segundo António Ferreira, logo após a morte do guarda Carlos Caetano, Pedro Dias obrigou Ferreira a entregar-lhe a sua arma e a de Caetano. “O arguido Pedro Dias obrigou o militar da GNR António Ferreira a retirar e a entregar-lhe o seu próprio cinturão policial, onde possuía a sua arma de serviço (…), o respetivo carregador e um porta bastão, assim como o obrigou a retirar e a entregar-lhe também o cinturão do seu colega Carlos Caetano, ali caído sobre o solo, no qual se encontrava a sua arma de serviço (…), o respetivo carregador e um par de algemas”, segundo o relatório.

Pedro Dias terá então colocado estas duas armas, e os coldres, na carrinha Toyota. Antes de partir novamente no carro de patrulha, contudo, terá ido à viatura, pegou numa das armas dos guardas e levou-a para dentro do carro. Esta versão não sustenta a do arguido: como seria então possível que Ferreira tivesse uma arma consigo?

Sobre o momento do disparo sobre Luís Pinto, o relatório da Polícia Judiciária também apresenta uma versão contraditória. Segundo o relatório, depois de balear António Ferreira, Pedro Dias encostou o carro da polícia e depois dirigiu-se à N229, junto à Quinta das Lameiras, para tentar arranjar uma nova viatura. Fez sinal de paragem ao carro do casal, que naquele momento ali passava. O Volkswagen dirige-se então a Pedro Dias, convicto de que ele precisava de ajuda.

Ministério Público pede pena máxima para Pedro Dias

Contudo, assim que o carro pára, Dias aponta a arma Glock que tinha pertencido ao guarda Carlos Caetano para o interior do veículo, obrigando Luís e Liliane a saírem. Quando Luís saiu, Dias dispara sobre ele matando-o de imediato. Depois, aponta a arma a Liliane a obriga-a arrastar o cadáver do marido para a vegetação junto à estrada, enquanto mantém a arma apontada à cabeça da mulher. A dada altura, dispara contra ela, fazendo-a cair inanimada no chão.

As provas encontradas

  • Dois cartuchos de 9 mm no quilómetro 45 da N229
  • ADN de Pedro Dias encontrado na Glock usada para matar o casal
  • Vestígios de sangue dentro e fora do carro, na porta e na berma da estrada
  • As roupas de Luís estavam puxadas para cima indiciando que foi arrastado
  • Os dois corpos, de Luís e Liliane, estavam cobertos com vegetação

Como é que Pedro Dias baleou o guarda António Ferreira?

Antes ou depois de balear o casal? Versões divergem

O guarda António Ferreira foi baleado por Pedro Dias na cara. Mas a versão de Pedro Dias é completamente diferente daquela apresentada pelo próprio Ferreira e pela Polícia Judiciária.

A versão de Pedro Dias

Pedro Dias contou em tribunal que o tiro sobre António Ferreira só aconteceu depois do encontro com o casal Luís e Liliane. Naquele momento, Dias obriga o guarda a entrar na viatura da polícia, algema Ferreira à pega lateral da porta do carro e os dois saem do local em direção a um sítio na mata onde Dias teria uma mota. Ao chegarem ao local, Pedro Dias sai do carro e obriga António Ferreira a sair também, mas este, algemado, não consegue libertar-se.

Os dois dirigem-se para a mata e Pedro Dias obriga António Ferreira a algemar-se a um pinheiro. Tendo ouvido “o barulho de fechar as algemas”, fica descansado e começa a procurar a mata. Até que, de repente, o guarda, que afinal não estava algemado, se atira para cima dele. Pedro Dias, que tinha uma arma na mão, disparou. “Aí percebi que tinha acertado na face. Fiquei ali sentado, pensei em dar um tiro na minha cabeça”, contou. Depois, Dias regressou ao carro da GNR e foi embora do local.

A versão de António Ferreira e do relatório da PJ

Segundo o relatório da Polícia Judiciária, este momento acontece antes do encontro com o casal Luís e Liliane — facto que explica por que o guarda não esteve presente nesse encontro. Depois de Pedro Dias e António Ferreira terem dado uma primeira volta no carro patrulha após a morte de Caetano, regressaram ao local original onde estava a carrinha abandonada e o corpo do guarda.

Lá chegados, Dias obrigou Ferreira a carregar o corpo do colega para o porta-bagagens do carro. Depois, ordenou a Ferreira que “algemasse o seu braço esquerdo à pega de apoio superior existente por cima desse banco, localizada, por isso, também do lado direito”. Antes de saírem, Dias foi à Toyota buscar uma das armas da GNR que tinha obrigado Ferreira a entregar-lhe.

É então que Dias entra no carro e vai a conduzir até à N229, no sentido Aguiar da Beira – Viseu. Depois de dar umas voltas mete-se numa estrada de terra batida, “circulando por aí durante aproximadamente mais trinta minutos, até que imobilizou finalmente a viatura”, segundo o relatório. Sai da viatura e obriga Ferreira a sair também. Como Ferreira não consegue libertar-se das algemas, Dias usa o pé de cabra para destruir a pega de apoio do carro.

Pedro Dias força então o guarda a algemar-se a um pinheiro, pedido a que Ferreira acede, dirigindo-se a um dos pinheiros. Durante esses momentos, Dias mantém sempre a sua arma apontada à cabeça de Ferreira, e acaba por disparar à cabeça. O guarda tomba no chão e Dias, julgando-o morto, arrasta-o alguns metros e deixa-o numa zona de mato, cobrindo-o com giestas, ramos e pedras. Ferreira, que na verdade estava vivo, consegue fugir e pedir ajuda a um colega, o cabo Carlos Santos, que vivia ali perto.

Segundo a PJ, é depois deste momento que Pedro Dias segue, sozinho, rumo ao local onde obrigou o carro de Luís e Liliane a parar, roubando-lhes depois a viatura.

As provas apresentadas:

  • Invólucro de calibre 7,65 mm (correspondente à arma de Pedro Dias) encontrado no local
  • Vestígios de sangue perto da zona onde a PJ pensa que Ferreira foi baleado
  • Vegetação partida e vestígios de arrastamento
  • Peça de plástico pertencente ao carro de patrulha
  • Perícia balística conclui que a arma que disparou contra Ferreira foi a mesma que disparo contra Caetano
  • Perícia médica a Ferreira prova que projétil está alojado na cabeça

Pedro Dias agrediu Lídia ou não?

Pedro Dias diz que mulher se magoou porque caíram no chão. Lídia, que teve múltiplos hematomas, diz que Dias a ameaçou

Pedro Dias está acusado de ofensa à integridade física de Lídia da Conceição — o MP deixou cair nas alegações finais o crime de homicídio na forma tentada que apresentava inicialmente. Dias terá sequestrado Lídia, juntamente com António Duarte, a 16 de outubro, numa casa que pertencia à família de Lídia, em Moldes.

Versão de Pedro Dias

O arguido admite que esteve na tal casa de Moldes, a 16 de outubro. No entanto, garante que não agrediu nem tentou matar Lídia da Conceição. Pedro Dias diz que já estava na casa (que não era ocupada todo o ano) e ia começar a tomar banho quando ouviu um carro aproximar-se. Quando Lídia abriu a porta, diz, puxou-a para dentro.

Aos gritos de Lídia de “deixe-me ir embora, deixe-me ir embora”, Pedro Dias garante que respondeu apenas: “Eu é que me vou embora, não estou aqui por mal.” Contudo, diz o arguido, a senhora “continuava muito nervosa e aos berros” e “com aqueles nervos, já tínhamos caído os dois ao chão, ela já se tinha magoado ali no chão”, disse, justificando assim os ferimentos de Lídia da Conceição.

De seguida chegou António Duarte, que estava perto da casa. Puxou-o também, mas reforça nunca o ter agredido. Sustenta que António pediu a Lídia para que parasse de gritar. O testemunho de Pedro Dias não deixa claro se estava armado ou não. Questionado pelo juiz se pediu o relógio a António “com uma arma apontada”, o arguido respondeu: “Não, pedi o relógio.” Pediu depois a António que amarrasse Lídia e, de seguida, amarrou António. Para calar a senhora, foi buscar batatas para lhes colocar na boca, sublinhando que eram “pequenas” e que as lavou.

Questionado pelo juiz sobre se admitiu ter morto outras pessoas, respondeu: “Devo ter dito em desabafo: «dizem que matei tanta gente».” E garantiu não ter tido a intenção de matar Lídia, caso contrário “tinha-lhe dado um murro logo”.

Versões de Lídia da Conceição e António Duarte

As versões dos dois sequestrados sustentam em alguns pontos o relato de Pedro Dias e divergem noutros. Lídia da Conceição teve entretanto um AVC — que uma perícia médica não conseguiu apontar como estando diretamente relacionado à violência que terá sofrido nesse dia — e não está em condições de prestar declarações em tribunal. Em vez disso, o coletivo admitiu que fosse tido em conta o testemunho que prestou na altura à PJ.

Nesse testemunho, Lídia conta que quando abriu a porta foi agarrada pelo pescoço e puxada para dentro de casa. O relatório da PJ diz que o arguido tentou estrangulá-la com a mão esquerda e que, ao mesmo tempo, “com a outra mão agarrou na sua cabeça e bateu, repetidamente e de forma violenta com a mesma no chão”. Os seus gritos terão alertado António Duarte, que entrou na casa.

Tanto Lídia como António garantem que Pedro Dias apontou de imediato uma arma a António Duarte. Lídia diz que o arguido lhe disse: “está quieta, não sabes que esta pistola era de um polícia que eu matei?”.

Já António Duarte começou por testemunhar à PJ que Pedro Dias apontava repetidamente a arma a Lídia, ameaçava matá-la e terá chegado a dizer: “Se eu quisesse, era mais dois (…), já matei quatro ou cinco.” Em tribunal, António não confirmou essa declarações, dizendo que tinha “falhas de memória” e que andava “baralhado”. Acabou por dizer na sala de audiências que tinha “uma vaga ideia” dessas palavras do arguido.

 As provas apresentadas

  • A PJ encontrou impressões digitais de Pedro Dias “em garrafa de água recolhida e apreendida na residência de Lídia da Conceição”, colocando-o sem dúvidas no local.
  • A perícia médica de avaliação de dano corporal a Lídia concluiu que esta tinha seis feridas na cabeça, duas na mão esquerda, múltiplas escoriações pelo corpo e vários hematomas e escoriações na região mandibular.
  • A PJ encontrou ADN de Lídia numa camisola e num par de calças de ganga encontrados numa viatura abandonada em Carro Queimado. As calças continham também ADN de Pedro Dias.

Pé de cabra. Afinal existe ou não?

O arguido nega alguma vez ter tido um, militar Ferreira garante o contrário

A utilização de um pé de cabra por Pedro Dias é sustentada no relatório da PJ, mas negada pelo próprio. O instrumento é relevante porque se revela essencial no relato do GNR António Ferreira quando fala sobre o momento em que ele próprio foi baleado. No entanto, este nunca foi encontrado.

Versão de Pedro Dias

“Tinha dentro da Toyota um pé de cabra e uma arma”, disse o juiz esta quarta-feira em tribunal, ao falar com Pedro Dias, baseando-se na informação dada pelo testemunho do GNR António Ferreira. O arguido negou a existência de um pé de cabra, mas admitiu ter a arma, explicando que a adquiriu por causa de “cães selvagens” que lhe atacavam os rebanhos. Pedro Dias não tinha licença de porte para essa arma.

Versão de António Ferreira

À PJ, quando foi inicialmente interrogado, o GNR António Ferreira declarou por várias vezes que o arguido tinha um pé de cabra. A primeira vez que o menciona é ao relatar um momento ao pé do Hotel das Cavacas, já depois de Caetano ter sido alvejado, em que diz que Pedro Dias retirou da sua viatura Toyota um par de luvas, um pé de cabra e um dos cinturões pertencentes aos militares da GNR, colocando nele a arma Glock que pertencia ao militar Caetano.

“És burro? Não vês que ele está morto?”, disse Pedro Dias ao militar da GNR que sobreviveu

Ferreira diz que, mais tarde, já perto do pinheiro onde alegadamente foi baleado, Pedro Dias usou esse mesmo pé de cabra para “rebentar a pega de apoio” do carro à qual tinha algemado Ferreira. “Questionado, refere não se ter apercebido de onde Pedro Dias tirou retirou o pé de cabra” nesse momento, até porque o carro patrulha onde estavam não tinham nenhum instrumento do género, segundo se pode ler no relatório.

As provas apresentadas

O pé de cabra nunca foi encontrado pela PJ. No entanto, uma “peça em plástico pertencente ao veículo automóvel L2331, da GNR” foi recolhida pelos investigadores na zona designada como “marco geodésico do picoto”, onde também foram detetados vestígios de um “arrastamento, com vegetação tombada e mesmo partida” e uma cápsula de 7,65 mm, de calibre correspondente à arma que Pedro Dias transportava consigo dentro do seu carro.

Dias roubou a arma ao GNR Caetano ou não?

A Glock foi encontrada na Toyota de Pedro Dias, mas este garante que nunca a usou

A Glock que pertencia ao GNR Caetano foi a arma utilizada para matar Luís e Liliane. Segundo o testemunho de Pedro Dias, quem a usou foi o guarda Ferrreira, que a terá tirado do banco de trás do carro-patrulha onde estavam; segundo Ferreira, Pedro Dias levou-a à cintura e, portanto, ele nunca lhe poderia ter tocado.

A versão de Pedro Dias

Em tribunal, o arguido contou que, depois de ter obrigado Ferreira a colocar o corpo de Caetano na mala do carro da GNR, apanhou os coldres com as duas armas dos dois guardas e colocou-as no banco de trás do carro patrulha.

Depois de andarem às voltas, a certa altura encostaram o Skoda. Um outro carro parou atrás deles. O militar, diz Pedro Dias, saiu do carro com o aviso de Dias (“vê lá o que vais fazer”). Nesse momento, o próprio Pedro Dias tenta sair e bate em Luís Pinto, que já estaria ali ao lado da sua porta. Aí, diz, Ferreira pegou numa das armas (que estavam no banco de trás) e tentou disparar sobre Dias, acabando por acertar em Luís. Dias afirma que fugiu então para o mato e ouviu mais “dois ou três disparos”. Depois regressa e surpreende o militar com a sua própria arma, dizendo-lhe para largar a Glock, a que este acede.

A versão de António Ferreira

De acordo com o militar do GNR, não terá sido isso que se passou. Ferreira diz que depois de já ter morto Caetano e obrigado Ferreira a largar a sua própria arma, no Hotel das Cavacas, Pedro Dias terá colocado as duas Glock na sua Toyota e utilizado a sua própria arma para obrigar o GNR a entrar no carro patrulha.

Depois de algumas voltas, em que fazem pedidos de matrícula para perceber se Dias estava a ser seguido, regressam ao Hotel das Cavacas. Aí, diz Ferreira, Pedro Dias obrigou-o a colocar o corpo de Caetano na bagageira do carro patrulha. Depois, foi buscar a Glock de Caetano, que estava na Toyota, e “colocou-a à cintura”. Segundo Ferreira, seguiram depois na Toyota e seguiu-se a tentativa de homícidio do militar, perto do marco geodésico do picoto.

As provas apresentadas

  • A PJ encontrou a Glock com o número de série correspondente à que transportava o guarda Carlos Caetano no Candal, na Serra da Freita, onde estava também a Toyota abandonada.
  • António Duarte, sequestrado em Moldes, garantiu à PJ que na altura Pedro Dias trazia consigo “um cinturão de cor preta” com “aquela coisa de colocar a arma”. Disse também que a certa altura Pedro Dias ameaçou Lídia, dizendo: “queres morrer com uma arma do exército?” No entanto, em tribunal, não confirmou nem desmentiu estas declarações, dizendo estar “baralhado”.