David Justino até nem queria responder às declarações de Paula Teixeira da Cruz, que considerou a escolha de Elina Fraga para a direção do PSD um “prémio” à “traição” de todos aqueles que criticaram o líder cessante “nas horas mais difíceis”. Numa entrevista ao Observador no Centro de Congressos de Lisboa, onde decorre o 37º Congresso do PSD, o vice-presidente de Rui Rio — que será eleito este domingo –, lembrou que é preciso “tolerância” para quem, no desempenho de certas funções, defende a instituição que representa. Nesta caso, Elina Fraga era a bastonária da Ordem dos Advogados. Para Pedro Passos Coelho também estava guardada uma mensagem: “O PSD tem de mudar protagonistas, estratégia e discurso.”

O coordenador da moção que Rui Rio defendeu a ideia de que “as pessoas no desempenho de determinadas funções têm de defender a instituição que estão a dirigir”. A resposta vinha a propósito das duras críticas de Teixeira da Cruz a Rui Rio. Justino lembrou o seu próprio caso: enquanto presidente do Conselho Nacional de Educação, teve de criticar Nuno Crato, ministro da Educação, seu amigo. “Ninguém acredita que eu estava a querer traí-lo”, argumenta.

Menos Economia no discurso para falar de outras áreas

Antes, David Justino já tinha deixado clara outra ideia: a eleição de Rui Rio traça uma linha entre aquilo que será o PSD sob a sua batuta e aquilo que foi o partido nos mandatos de Pedro Passos Coelho. O PSD, diz, “tem de mudar protagonistas, estratégia e discurso”. Tem de cortar com o passado, que empobreceu a amplitude da intervenção dos sociais-democratas, reduzindo-a ao discurso hermético do “economês”. Para o homem que desenhou a moção de Rui Rio, é esse um dos contributos do novo líder do PSD.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Este fim-de-semana, depois de ouvir as intervenções do líder cessante e do líder que está a chegar, o ex-ministro da Educação de Durão Barroso encontra pontos de “continuidade” e de “rutura” entre Passos e Rio, mas aponta críticas à “excessiva concentração nos temas económico-financeiros” do anterior e espera que Rui Rio consiga traçar aí uma parte da sua identidade.

A intervenção de Passos Coelho, na noite de sexta-feira, mostra a faceta do PSD dos últimos dois anos, defende David Justino. O líder cessante “reafirmou aquilo que têm sido os argumentos e os princípios orientadores da sua posição política” desde 2011. Rio será a nova página.

“Se há algum elemento de diferenciação” entre quem sai e quem chega à liderança do PSD, ele passa pela importância de o PSD “tocar noutro domínio da vida política e social” sem esquecer a economia e as finanças, assinala Justino.

Mas o calendário é apertado para essa mudança de agulha – uma nota que se cristalizou em cada militante que faz a antevisão do mandato de Rui Rio. “Até às europeias, vamos ter menos de um ano e meio” assinala, a propósito, o autor da moção do novo líder do PSD. “Vai ser um esforço enorme”, o de “construir, através da estratégia da moção e de intervenções, um programa de Governo, a apresentar aos portugueses”. Programa que “tem de estar orientado por uma solução europeias-legislativas-autárquicas”, já fora do mandato que arranca no domingo. Será um “trabalho enorme” passar “das grandes linhas para medidas concretas”, admite.

Parte da mudança assenta na reabertura de vias de diálogo com o PS. Não há, ainda, portas abertas. E essa também não será uma tarefa fácil, antevê Justino, que ficou “muito esclarecido” sobre a (falta de) intenção do PS para dialogar com o PSD, depois de mencionar um artigo do secretário de Estado Pedro Nuno Santos publicado no Público. “Nós fizemos o nosso papel”, assinala. Faltou “a outra parte” desta equação.

Apesar disso, insiste, “é necessário criar uma cultura de compromisso” e fazer com que o “interesse nacional” se sobreponha ao partidário. Quando esse interesse geral se sobrepuser ao do PSD, “é óbvio que tem de ser ponderado”, sublinha David Justino. “Temos de transmitir aos portugueses a convicção de que somos um partido responsável, temos uma missão, ideia e modelo do que desejamos para Portugal”. É essa a nova mensagem.

Houve, ainda, tempo para recados. Para Hugo Soares, que pediu um chumbo cego ao Orçamento do Estado para 2019: um “foclore”, um “ritual” que “faz parte da politiquice” de que o novo PSD se afasta; para Luís Montenegro, que nada anunciando lá deixou a pairar a ideia de que poderá voltar para reclamar a liderança do PSD – “daqui a dois anos vamos ver o que ele quer fazer, mas nós estaremos cá também”.