Isaura, compositora, e Cláudia Pascoal, intérprete, estão confiantes de que podem deixar uma boa imagem no Festival Eurovisão da Canção. “Vamos dar o nosso melhor, queremos deixar os portugueses orgulhosos e vamos dar luta”, apontou a primeira, em conferência de imprensa coletiva após a vitória da dupla no Festival da Canção, este domingo, 4 de março.

Aquilo que o Salvador e a Luísa Sobral conquistaram para nós, no ano passado, é um feito histórico, não é fácil repetir. Mas acho que isso nos deu garra e vontade de trabalhar. Não quero falhar a ninguém que votou, que gosta da canção e que acredita que devemos ser nós a ir representar Portugal”, referiu Isaura.

As duas apresentaram-se cansadas: “Acho que vou ser a primeira pessoa a adormecer no hotel”, disse Isaura, para logo sublinhar a dificuldade de expressar em palavras o que sentia: “Eu desatei a chorar em direto. Eu que tenho sempre imensas palavras, parece que tenho uma branca na cabeça”. A cantora que venceu o concurso, Cláudia Pascoal, corroborou: “Não estou a acreditar que tenho mil pessoas com telemóveis apontados”.

A dupla sublinhou a qualidade desta edição do Festival da Canção: “Sino que os compositores e intérpretes esforçaram-se ao máximo para honrar aquilo que o Salvado e a Luísa nos deixaram. Tínhamos aqui muitas canções bonitas e podiam ter ganho outras”, referiu a autora do tema, elogiado pela sua intérprete, a cantora vencedora do Festival da Canção. “Quando eu ouvi a música da Isaura emocionei-me. Fala de saudade, uma saudade dolorosa mas reconfortante. Se calhar as pessoas sentiram o que eu senti [quando se emocionou, na sua semifinal] com a perda da minha avó, dos meus amigos que já partiram”.

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Acho que todos nós já tivemos de nos despedir de alguém e se calhar isso tocou no coração das pessoas”, resumiu Isaura, tentando assim explicar o sucesso do tema junto do público, que o elegeu como preferido, ao contrário do júri nacional, que colocou “O Jardim” em segundo lugar e “Para Sorrir Eu Não Preciso de Nada”, de Júlio Resende/Catarina Miranda, em primeiro.

Ser sucessora de Salvador Sobral como representante nacional da Eurovisão e “jogar em casa” traz “mais responsabilidade”, admitiu Cláudia Pascoal. “Mas é um reconforto enorme. Estar em Lisboa a representar Portugal é inigualável, vai ser tão bom jogar em casa.”, acrescentou a cantora.

Isaura, mais habituada a compor canções em inglês, recordou ainda como encarou o convite da RTP para participar no Festival da Canção este ano: “Assim que recebi o convite, quis logo aceitá-lo. Se há coisa de que gosto muito é de escrever em português. Neste momento estou a trabalhar outra sonoridade [em inglês] e esta foi uma oportunidade belíssima. Pensei: vai ser a minha primeira canção em português, vou-me esforçar e quero que seja muito bonita”.

Do suspense aos planos estragados: a final do festival, canção a canção

A autora do tema tem o seu primeiro álbum quase a sair — deverá chegar já em abril, lembrou — e refere que está igualmente empenhada nesse projeto paralelo ao festival: “Estou há um ano e meio a trabalhar no meu álbum, estou cheia de vontade que saia. Ele fala muito da história que está aqui nesta canção, também. É um bocadinho do meu coração que está ali escondido e que quero mostrar às pessoas”.

Isaura falou ainda da discussão sobre um possível plágio de Diogo Piçarra no Festival da Canção, que originou a desistência do concorrente: “Custa-me falar sobre isso porque é um assunto que a minha vontade é que termine. Incomoda-me que esse assunto tenha sido falado tanto tempo. Na altura escrevi o que tinha a dizer. O Diogo tenho a certeza que nunca se teria colocado naquela posição se conhecesse a canção [dos anos 1970, que foi comparada à do cantor]. Não faz sentido continuar a discutir isto”.

Quem é Cláudia Pascoal:

Natural de São Pedro da Cova, Gondomar, Cláudia Pascoal tem 24 anos e começou a tocar guitarra aos 15. Participou em concursos como o Ídolos e mais recentemente o The Voice Portugal, onde conheceu o cantor Pedro Gonçalves, com quem recentemente lançou um single, Ocasionalidades. Numa entrevista ao Observador antes da final, enquanto passeava por Guimarães — cidade onde este domingo se tornou a próxima representante de Portugal na Eurovisão –, Cláudia descrevia-se assim:

A Cláudia Pascoal é uma miúda que muda de carreira de meio em meio ano e muda de cabelo de semana em semana. Gosto imenso de mudar, canso-me facilmente das coisas mas imponho-me sempre a 100% em todas elas. Agora estou-me a empenhar 100% na música e acho que esta é a carreira que vai ficar, acho que encontrei o meu lugar. Portanto, a Cláudia Pascoal… canta.”

A cantora revelou mais ao Observador: disse que quando recebeu uma mensagem de Isaura no Facebook a sua reação foi atirar-se “para o chão, chamar a minha mãe e começar a chorar” e que não sentia “grande pressão” para a final. “Qualquer um que ganhe fico genuinamente feliz porque quero é que Portugal esteja muito bem representado na Eurovisão para ver se ganhamos outra vez. Temos uma possibilidade forte, temos no Festival da Canção músicas muito diferentes em estilos muito diferentes, com intérpretes também eles muito diferente e com personalidades muito definidas e acho que quem quer que ganhe vai trazer algo de único para o palco da Eurovisão. Espero mesmo que Portugal ganhe [novamente]”.

Eu tenho três cursos. Tirei ourivesaria, depois tirei licenciatura em Artes Plásticas e depois tirei mestrado em Produção e Realização em Audivisual. Fui trabalhar para a SIC Radical, apresentei também um bocadinho do Curto Circuito, o CC Allstars, depois fui para a música. Este é o meu caminho, tive sempre vertentes muito diferentes mas acho que vou estancar por aqui, acho que vou ficar pela música. Acho que é o universo com que me identifico mais e me dá mais prazer.

A música que lhe mudou a vida, contou, “foi a ‘Take Five’ do Dave Brubeck. Eu achei aquilo genial. Eu nem ouvia muito jazz mas quando ouvi aquilo eu disse: “Opá é isto que eu quero fazer”. Mas há vários artistas que eu admiro e que me relaciono quando componho. Portugueses adoro o David Fonseca, a Luísa Sobral…”.

https://observador.pt/videos/atualidade/quando-a-isaura-me-convidou-atirei-me-para-o-chao-chamei-a-minha-mae-comecei-a-chorar/

Na altura, Cláudia Pascoal preferia nem pensar na possibilidade de vencer o Festival da Canção. “Acho que isso dá azar sabes? Gosto sempre de pensar que as coisas vão correr muito mal, pelo menos se correrem mal eu já estava preparada, portanto se correrem bem, vai-me saber ainda melhor”.

Acho que o Festival da Canção não só é uma coisa notória a nível musical, mas também é quase uma montra para mostrar novos talentos. Temos aqui nomes já conhecidos mas também nomes que não são assim tão conhecidos e que estão a revelar uma grande capacidade musical e um grande talento. Tanto que acho que o Festival de certa maneira vai-me ajudar a lançar as minhas músicas”, dizia a então concorrente, atual vencedora, do Festival da Canção.

Quem é Isaura:

Quase a publicar o seu primeiro álbum, em que tem andado a trabalhar há um ano e meio — revelou a própria esta noite, em conferência de imprensa coletiva depois de vencer o Festival da Canção –, Isaura compõe maioritariamente pop eletrónica alternativa, reminscente de grupos como os The XX, London Grammar e Florence & the Machine.

[Oiça “Busy Tone”, single do primeiro álbum de Isaura, ainda por lançar:]

Em entrevista recente, Isaura revelou que “desde os 10 anos” que sentia vontade de “aprender a tocar guitarra e outros tantos instrumentos”.

Nunca quis aprender guitarra para tocar as canções dos outros. Eu gostava muito de escrever e de rabiscar ideias e percebi desde cedo que a música era, para mim, uma forma de expressão. (…) Toquei em bares, num programa de televisão, e sempre tentei encontrar aquele que seria o meu lugar nesta forma de expressão. Mais tarde (…) tentei traduzir esse trabalho da guitarra para produções mais contemporâneas. Acho que foi assim que cheguei à minha sonoridade de agora”, mais eletrónica, dizia ainda.

Ao Observador, depois de carimbar a passagem à final do Festival do Canção — que venceu este domingo — Isaura explicava o porquê da escolha de Cláudia Pascoal para interpretar “O Jardim”: “Eu andava maluca porque não encontrava ninguém com a voz que queria. Queria uma coisa muito específica que tinha na cabeça até que finalmente, depois de tantos vídeos que vi de tantos intérpretes, mostraram-me a Cláudia. Foi amor à primeira vista.”

Aquilo que a Cláudia fez com esta canção deixa-me muito contente porque acho que conseguiu transformar o que eu queria dizer numa coisa ainda mais bonita”, dizia ainda Isaura.

“Fiquei muito surpreendida com o convite mas também muito contente e agradecida. O leque de compositores que aqui está são os que eu ouvia quando era miúda. O respeito é gigante e ter a oportunidade de estar aqui entre eles, tentar representar Portugal na Europa e fazer uma canção que vai ficar na história do festival, porque é isso que acontece com as canções que aqui passam — as pessoas recordam-se delas — é muito gratificante. Tive de aceitar instantaneamente”, disse ainda a compositora ao Observador.