Habilidosos, criativos e autodidatas. Há cerca de sete anos, Nicholas e Inês abriram as portas de casa com uma agenda de workshops de técnicas como a encadernação, o desenho e a pintura. O projeto cresceu e acabou por despejar os próprios mentores, transformando a residência do casal num estúdio de ofícios. Em 2016, publicaram os primeiros livros infantis. Agora, inaugurado o capítulo das edições caseiras, antecipam uma solução para uma das frases que mais ouviram nos últimos anos: não sei desenhar.

“Tínhamos este projeto na gaveta”, explica Nicholas Carvalho. “Temos dado formação a adultos e crianças e esta frase é comum a todos, mesmo a quem sabe efetivamente desenhar”, adiciona. Para o casal, há muito que a pedagogia ia além das aulas dadas em casa. Nos últimos tempos, Nicholas e Inês visitaram escolas, editaram livros didáticos e, com a pandemia, tiveram de adaptar os conteúdos a workshops remotos disponibilizados em vídeo.

6 fotos

Agora, “Não sei desenhar” dirige-se ao público infantil com um conjunto de exercícios que estimulam e desenvolvem, passo a passo, a habilidade para o desenho, seja desafiando os mais pequenos a desenhar de olhos fechados ou a usarem materiais menos comuns. “Ensinar as pessoas a desenhar e provar-lhes que toda a gente consegue fazer qualquer coisa é quase uma missão”, reforça Nicholas.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“A personagem do livro também começa por dizer essa frase — que não sabe desenhar — e depois embarca numa espécie de viagem. Em cada página, são sugeridos exercícios e técnicas que o vão desbloqueando e fazendo ganhar confiança. No final, já se acha capaz”, esclarece o autor. A mesma edição independente — à semelhança de títulos anteriores como “Em Casa” e “Girassol” — procura distanciar-se dos habituais livros de exercícios. “Por vezes, os livros didáticos têm aquele ar de manual, então quisemos aprimorar o aspeto até chegar a algo visualmente apelativo”, conclui.

Produzir um livro sem recorrer a uma editora tem muito que se lhe diga, sobretudo no que toca a despesas. Nicholas e Inês perceberam que era preciso um empurrão para que “Não sei desenhar” saísse da gaveta e lançaram, no início de junho, uma campanha de crowdfunding com o objetivo de financiar a publicação de 1.000 exemplares. A meta foi fixada nos 2.500 euros. A campanha decorre até ao final de julho e já angariou quase 3.500 euros. O apoio dos internautas foi além das expectativas e permitirá ao casal aumentar a tiragem ou melhorar os acabamentos do livro.

Casa Nic e Inês: dos workshops em casa ao casamento na Lx Factory

Nicholas Carvalho e Inês Almeida conheceram-se na Faculdade de Belas Artes, em Lisboa. Foi amor à primeira vista, entre os dois pelo livro de artista, formato que começaram a desenvolver em conjunto. Durante a crise, viram muitos dos amigos emigrarem em busca de novas oportunidades na área criativa. Quanto ao casal, respondeu com o que tinha à mão — abriu a porta da própria casa, um T1 na Estefânia, em Lisboa, e começou a dar workshops de técnicas manuais, mas também a receber autores e artistas para conversas e leituras. Nascia o projeto Casa Nic e Inês.

2013 foi mesmo um ano em cheio. Para assinalar a primeira exposição, na Lx Factory, Nicholas e Inês casaram no próprio momento da inauguração. Já como marido e mulher, fizeram as malas três anos depois. Durante 100 dias, correram o mundo — uma viagem que começou nos Estados Unidos, percorreu vários países asiáticos e acabou na Austrália e durante qual realizaram oficinas de trabalhos manuais para crianças e visitaram os ateliers de artistas e artesãos.

Uma aula na Casa Nic e Inês

No regresso, mudaram de casa. O velho T1 ficou como atelier e permitiu dar resposta ao volume crescente de inscrições em workshops e cursos semanais, mas também incluir novas disciplinas, nomeadamente a cerâmica. Em dezembro do ano passado, editaram “Em casa”. Inicialmente, o livro passou despercebido, mas durante o estado de emergência, uma das professoras de telescola escolheu-o para uma leitura durante as aulas e a procura disparou. A história é especialmente relevante nos tempos que correm, com alguns conselhos sobre como manter a casa limpa e organizada.

“Na quarentena, fomos obrigados a ver outras maneiras de trabalhar. No início, ficámos em pânico porque o nosso trabalho é estar com pessoas, mas acabámos por fazer alguns workshops online. Encadernação, carimbos e aguarelas foram algumas das aulas dadas através do Facebook. A adesão foi significativa, embora o desconfinamento já tenha levado à retoma de algumas aulas. A normalidade, tal como era, ainda é uma visão distante. No final do verão, chega o novo livro para ajudar a atenuar a distância.