Uma semana depois, ainda nos parece fruto da nossa imaginação. Damos um beliscão para termos a certeza que estamos despertos e vamos em busca do vídeo do golo do Eder. E é mesmo verdade: somos campeões da Europa. O nosso orgulho não tira férias, mas os jogadores tiram – e bem merecidas. Com os jogadores vitoriosos a banhos, sugerimos-lhes filmes e séries para descontraírem. No domingo seguinte ao domingo do nosso contentamento, tentamos perceber o que pode agradar a quem participou no jogo da final frente aos franceses. O espaço que se segue é fruto da mais bem intencionada especulação.

Fernando Santos

No filme “Big”, a comédia nos anos 80 que catapultou Tom Hanks para os corações do mundo, um rapazinho de 13 anos deseja acordar adulto. O sonho era inverosímil mas concretizou-se. O Mister passou por um processo semelhante: sonhou tornar a sua equipa que muitos diziam ser pequenina em campeã da Europa e o sonho inacreditável materializou-se em forma de taça levantada. Parece fácil mas não foi. Daí as nossas duas recomendações a Fernando Santos. Primeira: a série “Friday Night Lights”, um drama sobre as agruras de uma equipa do tipo de futebol que não interessa nem ao Menino Jesus – o futebol americano -, mas que resulta em episódios bem escritos e altamente premiados (digamos que tiveram melhor recepção da crítica do que a nossa selecção teve em muita imprensa estrangeira). O personagem principal é o treinador Eric Taylor, pode ser que Santos se reveja nas agruras. A segunda proposta é, claro, a “Guerra dos Tronos” – o mundo da bola por vezes é escorregadio. Mas em 2016 o Trono foi mesmo nosso.

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Rui Patrício

Não esquecer. Nunca esquecer que na final muito ficamos a dever às defesas de Rui Patrício. Daí a recomendação ser o “The Wall”, filme de 1982 baseado no álbum dos Pink Floyd. É que ele foi mesmo uma parede metida em frente à baliza e não houve francês a desviar tijolo. Se quiser gozar o prato de um guarda-redes com menos sorte, é só optar por “A Angústia do Guarda-Redes Antes do Penalti”, um livro de Peter Handke que deu em filme de Wim Wenders. Na final não fomos a penaltis, mas cheira-nos que Patrício não se ia deixar levar pela angústia.

Cedric

Só porque nasceu na Alemanha não lhe vamos fazer a maldade de desejar os Scorpions nem os Modern Talking. Azeite por azeite, venha antes um actor e cantor que não é alemão mas é venerado por aquelas bandas: David Hasselhoff. Gozem à vontade, mas a estrela de “Marés Vivas” e “O Justiceiro” é tão big in Germany que até cantou nas celebrações da queda do muro de Berlim em 1989. Se mesmo assim Cedric não quiser furar um tímpano, pode ver Hasselhoff num dos papéis principais de um daqueles filmes que são tão maus que se tornam maravilhosos: “Sharknado 4”. Sim, já existem quatro filmes sobre um literal tornado feito de tubarões (e durante dez segundos no jogo com a Polónia desejamos um bocadinho atirar Cedric para um tornado por ter deixado passar aquele golo aos 2 minutos. Tudo sanado agora, amigo! Campeõeeees!). “Sharknado 4” estreia no Sci-Fi americano a 31 de Julho.

Pepe

Desistam já da febre do momento. É fútil continuarem a tentar. Se Pepe mete a mão (e os pés e a cabeça) no Pokemon Go é logo para cabazada nos adversários. É rápido, difícil de fintar e vai apanhá-los a todos mais depressa do que o Pikachu consegue pedir cartão amarelo.

https://www.youtube.com/watch?v=d4ZgD19y5KY

José Fonte

É visto como uma promessa, mas a verdade é que já tem 32 anos, o que em idade de jogador dá para aí 110. Há cinco anos andava pela 3ª divisão inglesa, agora é um jogador da competitiva Premier League. Mas calma, José (podemos tratar-te assim? Vá, os campeões devem ter intimidade entre si). Jon Hamm, mundialmente famoso por “Mad Men”, só começou a dar nas vistas com 40 anos. Steve Carrell, um dos maiores actores de comédia do mundo, tinha 35 no ponto alto do Daily Show e 39 quando começou a protagonizar filmes. Optando por vê-los em acção estarás entre iguais.

Raphael Guerreiro

Nascido e desde sempre vivido em França, Raphael Guerreiro mal falava português quando chegou às convocatórias da selecção. Calculamos que ainda precise de treinar – até porque não vai ser agora no Dortmund que vai aprender a língua de Camões. Uns filmes portugueses podem ajudar (e uns livros da Edite Estrela, vá). Há longas metragens para vários gostos, mas para bem aprender a língua é incontornável o “Adão e Eva”. Qualquer pessoa tem de saber dizer “Vai à merda./ Vai tu.” (para outras asneiras o Eder e o CR7 podem ajudar)

William Carvalho

Graham Greene escreveu O Americano Tranquilo, e William é o nosso “Português Tranquilo”, a prova de que os heróis também podem ser pacatos. Mas esse não é o modo habitual do heroísmo épico, nem sequer na cultura pop. Excepção: Manga. A banda desenhada japonesa está repleta de heróis que não partem um prato, até partirem a loiça adversária toda.

o americano tranquilo

Renato Sanches

O puto que muitos acusaram de não ser um puto. Com tanto burburinho com a idade, o melhor mesmo é ver “O Incrível Caso De Benjamin Button”, onde ser velho ou novo trocam de lugar. Talvez Renato já tenha tido 80 anos e tenha agora efectivamente 18. De qualquer modo, tem a carreira pela frente e está a caminho do Bayern. Para que não se perca (não no caminho até Munique, mas no caminho da vida), é ver filmes antigos com o Macaulay Culkin. É possível passar de “next big thing” a “what the hell?” e não é nada disso que temos planeado para ti, miúdo.

Adrien Silva

Nascido em França, vindo para Portugal aos 11 anos, não teve o coração a balançar nem por um segundo quando entrou no Stade de France para defrontar o país que o viu chegar ao mundo. Agradecemos, mas olhar para as origens é sempre bonito. Porque não rever “A Gaiola Dourada”?

https://www.youtube.com/watch?v=EPfwXE_4TQo

João Mário

O seu óptimo Euro 2016 deixou-o ainda mais apetecível para os mercados de transferências. Porém, têm sido muito os negócios que não se concretizam. Poderá ser por um bom motivo: é importante ir parar ao clube certo, onde o seu potencial seja pleno. Daí recomendarmos um filme sobre como fazer as aquisições certas até montar uma equipa imbatível (neste caso de baseball): “Moneyball”. Sim, tem tudo para ser uma estucha, mas na verdade tem um ritmo imbatível, ou não fosse um guião com co-autoria de Aaron Sorkin, um dos argumentistas mais importantes do mundo.

Nani

Nani é fofinho. Nani é o jogador que muitos se esquecem que existe. Nani é aquele que alguns acham que já atingiu o pico e agora não mete medo. Nada de mais errado: quando chega a altura, ele é perigoso. Marcou três golos em três jogos no Euro 2016 e sem ele se calhar não havia final. Ele parece inofensivo, mas é “the one who knocks”. He is the danger. Tal como o protagonista de “Breaking Bad”. É a série para ele, apesar de ficar francamente melhor de cuecas brancas do que o Walter White.

Cristiano Ronaldo

“Oh Captain, My Captain”. O meme com a frase de “O Clube Dos Poetas Mortos” e a cara de Cristino fez o circuito das redes sociais. E bem que ele foi poeta para João Moutinho (já lá vamos). Homem de família, conseguiu transformar a selecção também ela numa unidade familiar. Nem Scolari o fez tão eficazmente. Por isso recomendamos o “Family Ties”, uma sitcom clássica sobre o amor em ambiente doméstico. Mas já agora, é ver também o “Keeping Up With The Kardashians”. Mas só porque estamos mortinhos para que a família Aveiro faça a sua própria versão.

Eder

Eder devia ver o filme “Princess Bride”. Não, não é gozo – o jogador teve disso que chegue durante o campeonato e acabámos a comer as palavras todas com aquele golo na final. É mesmo porque é uma das mais eficazes transposições para ecrã da lógica do patinho feio desajeitado que afinal é um cisne garboso e certeiro. E é uma comédia. Para choradeiras já lhe basta o outro miúdo filmado no Chiado pela CMTV.

https://www.youtube.com/watch?v=VYgcrny2hRs

João Moutinho

Tu bates bem, Moutinho. Confia em ti, porque bates bem Se perdermos que se… Tu percebes, Moutinho. As palavras de alento do capitão no momento dos penaltis face à Polónia entraram para o Panteão Nacional, para o Cancioneiro Popular e para o Plano Nacional de Leitura, tudo ao mesmo tempo. Houve mesmo quem considerasse um poema e declamasse. Se Moutinho tiver ficado um aficionado de poesia, pode sempre ouvir o espólio de palavras ditas por João Villaret. Se preferir uma onda mais moderna, há óptimo spoken word pelo YouTube fora. Silva o Sentinela é uma boa hipótese.

Ricardo Quaresma

Quaresma é um mago com a bola (o que já lhe rendeu a alcunha de Harry Potter), mas tem-se revelado ainda mais mágico na maneira como aborda a sua etnia cigana. Entrevistas sentidas, piadas que espicaçam o preconceito (“Medalha? Se for de ouro vendo-a!”) e uma genuína vontade de que cigano deixe de soar a palavra feia. Se Quaresma nunca viu “Balada de Um Batráquio”, a curta de Leonor Teles que rendeu à jovem um Urso em Berlim, terá de ver urgentemente. A temática dos sapos de loiça que lojistas metem à porta para “espantar ciganos” vai fazer-lhe todo o sentido. Sapo em frangalhos a tapar-lhe as zonas pudendas na próxima capa de revista, OK?

Susana Romana é guionista e professora de escrita criativa