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Zombies, dragões, vampiros. Ou então simples rapazes e raparigas. ETs, pais e filhos, médicos, advogados, polícias e ladrões, até coveiros. Não importam realmente os ingredientes; importa o talento de quem conta a história – e as séries de televisão são por excelência, o formato dos contadores de histórias. Não é por acaso que, nos filmes, o último crédito de abertura é o “directed by” e nas séries o “created by”: os primeiros são assinados pelos realizadores, os segundos pelos argumentistas.

Nos últimos anos, a televisão, que já tinha sobre o cinema a vantagem de oferecer aos escritores muito mais tempo para desenvolver personagens e situações, ganhou encantos adicionais. A crise económica de 2008, a pirataria e a evolução tecnológica puseram o cinema a jogar pelo seguro: ficaram os super blockbusters e os pequenos independentes – nada no meio. As televisões generalistas refugiram-se em overdoses de late night e reality shows mais ou menos envergonhados. Mas a ficção, que é cara, encontrou um lugar no cabo e na venda directa pela internet por gente disposta a pagar por qualidade, se possível, livre de anúncios e cedências a anunciantes e administrações. O resultado tem sido uma sólida era de ouro da televisão que nos tem dado, uma atrás de outra, grandes séries de ficção.

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Mas com as séries desenvolvemos um tipo de relação que faz com que não nos importe apenas a qualidade intrínseca que possuam. Talvez seja por nos entrarem casa adentro quando estamos, não poucas vezes, despenteados e de pijama, vergonhosamente afundados no sofá entre tigelas de cereais e pacotes de batatas fritas. Talvez seja por poderem, nos casos bons, acompanhar-nos e nós a elas ao longo de anos. A verdade é que construímos com as séries uma relação que é menos do domínio da arte e mais do da vida. Menos estética e mais hábito, vício, coabitação. E é aí que entram elementos importantes para que uma série se torne realmente inesquecível para cada um de nós: o genérico, a música, aquele bordão repetido, aquele tique do actor, as pequeninas coisas, o ambiente – que é aquela coisa enorme, mas impalpável a que queremos voltar todas as semanas. Ou que nos faz ressacar durante a longa espera por uma nova temporada.

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Este é um Top das melhores séries de sempre. Ou melhor, uma lista das séries que nunca esqueceremos. Uma escolha tão subjectiva, discutível, formidavelmente errada, incompleta e injusta como qualquer outra.

“Modelo & Detective”

  • Criador: Glenn Gordon Caron
  • ABC, 1985-1989
  • Em Portugal: RTP
  • Temporadas: 5
  • Episódios: 66

Comecemos por aquele que é, provavelmente, o título menos consensual da lista. O contacto com as reprises fez alguns achar que envelheceu mal, mas, para nós, continua a merecer um lugar entre as inesquecíveis. “Modelo & Detective” foi a série que recuperou Cybill Shepherd – que fora, muitos anos antes, a menina dos olhos dos cinéfilos com o histórico “The Last Picture Show”, de Peter Bogdanovich — e que lançou Bruce Willis para o estrelato. Só por estes dois feitos, já mereceria um lugar na história; mas fez mais. Criada por Glenn Gordon Caron – também autor da contemporânea “Medium” – era um misto de policial, comédia e drama romântico, que ainda hoje lhe confere um lugar à parte entre os géneros televisivos. Amplamente copiada com péssimos resultados, contava a história de uma singular agência de detectives privados que consistia, basicamente, da sua proprietária e ex-modelo arruinada (Maddie Hayes) e do seu investigador e, às vezes, pretendente David Addison.

O título original era “Moonlighting”, que significa um segundo trabalho que se faz à noite, frequentemente de carácter duvidoso – uma vida dupla, enfim; caso não gostem da tradução para “Modelo & Detective”, tenham presente que, no Brasil, se chamou “A Gata e o Rato”. Foi dos primeiros produtos televisivos mainstream a romper algumas regras do próprio mainstream, furando a parede da ilusão (Maddie e David discutindo porque estão a dizer o que estão a dizer um ao outro e a verificarem no guião se foi ou não o que os guionistas escreveram, por exemplo). E essa liberdade é, quanto a nós, uma das três coisas que a tornam única, ainda hoje. As outras duas são: a) a tensão permanente entre David e Maddie (Willis e Shepherd), que deixou o público durante cinco anos a querer vê-los juntos e, se possível, com prolongamento na vida real; e b) o tema de abertura, na voz melosa de Al Jarreau, e que trintão ou quarentão que se preze ainda não esqueceu. Teve, como todas as séries, altos e baixos, mas a atracção mal disfarçada que mantinha pelo nonsense podia salvar até os momentos mais desinspirados. Seguida por homens como por mulheres (outro feito raro), “Modelo & Detective” é também todo o testemunho de uma época do mais lamentável que já se viu no que a roupas e cabelos dizia respeito.

“Os Simpsons”

  • Criador: Matt Groening
  • Fox, 1989 – (…)
  • Em Portugal: RTP
  • Temporadas: 28
  • Episódios: 614 (And counting…)

Começou como uma série de pequenos sketches que serviam de separadores ao ”Tracey Ullman Show”; 29 anos depois, a pergunta é: quem é a Tracey Ullman? “Os Simpsons” foram uma encomenda do produtor James L. Brooks a Matt Groening que, alegadamente, os criou a partir da sua própria família disfuncional, nomes e tudo, com excepção do dele, que de “Matt” passou a “Bart”. Três temporadas a servir de vinheta depois, conquistaram o direito à independência. Estrearam a uma semana do Natal de 1989 e, desde então, nunca mais saíram do ar, já lá vão 28 temporadas e uns absolutamente esmagadores 614 episódios. Nenhuma outra sitcom norte-americana esteve tanto tempo no ar e haverá muito pouca criatura no mundo que não saiba quem são. Homer Simpson é presença assídua em votações para as melhores personagens de sempre e o seu célebre “d’oh!” (polissémica interjeição de etimologia imperscrutável) figura, desde há alguns anos, nas páginas do insuspeito OED, dicionário de Inglês da Universidade de Oxford.

Chefe de uma família que começou como sátira ao americano médio e se emancipou para ser ela própria, Homer liderou a revolução. “American Dad”, “Family Guy”, “Futurama” e, não será injusto dizê-lo, até “South Park”, fazem parte de uma genealogia que não seria possível sem os Simpsons. Com eles, a animação comercial deixou de ser infantil e doce, tornou-se provocante, sarcástica, adulta, incorrecta. E nós, adultos da geração X e millenials, recebemos o atestado que confirmava, em definitivo, que seríamos sempre um pouco putos toda a vida. A música de Danny Elfman, o gag da frase sempre nova que Bart tem de escrever no quadro, os donuts cheios de creme, a bebé que só fala por sons de chupeta, o corte de cabelo impossível de Marge, o absurdo tom de pele amarelo das personagens que, ao fim de meia dúzia de episódios, já aceitávamos como o mais naturalista do mundo, os telefonemas para o bar do Moe, o exemplar Ned Flanders, o vicioso Mr. Burns… Tudo isto catapultou “Os Simpsons” para a galeria dos imortais. A ponto de, por vezes, um banal céu azul com nuvens brancas – esse mesmo céu azul com nuvens brancas que está aqui desde que ainda nem havia humanidade – nos parecer um fotograma extraído do genérico desta proeza da história da televisão

“Ficheiros Secretos”

  • Fox, 1993-2002, 2016
  • Em Portugal: TVI
  • Criador: Chris Carter
  • Temporadas: 10
  • Episódios: 207

Foi, durante alguns anos, o grande contributo de uma então 4 / TVI / televisão da igreja, canal-depois-da-SIC, para a felicidade do consumidor português: dois episódios seguidos de “X-Files” às sextas-feiras à noite. Uma unidade especial do FBI destinada a investigar os casos arquivados sem solução, um agente crente e crédulo, uma agente racional e pragmática, a fé e a ciência, o envolvimento pessoal e o distanciamento, a história de amor mais homeopaticamente gerida da história da televisão. Mulder & Scully. Não podiam ter menos a ver com Maddie Hayes e David Addison. Um acidental toque de mãos entre eles equivalia a uma tórrida cena de amassos noutras paragens quaisquer. Escreveram-se canções sobre eles, fizeram-se muitos trocadilhos com Duchovny e Dujovnis e a causa das ruivas ganhou uma nova porta-estandarte. Poucas séries na história da televisão misturaram também os dois formatos tradicionais: o procedural – a série de episódios fechados, autónomos – e o serial – de plots abertos, com histórias em contínuo, que é preciso seguir semana após semana.

De um lado estavam os casos insólitos de monstros e milagres resolvidos em 50 minutos; de outro, a trama de fundo da conspiração extraterrestre para criar uma espécie híbrida sabe-se lá com que fim. O ambiente quase sempre nocturno, os oráculos indicando as localizações, a fantasmagórica música de Mark Snow, tudo isto construía o ambiente mistérico de “Ficheiros Secretos”. Pela primeira vez, os geeks tornaram-se moda. Fizeram-se ícones de uma certa cultura pop fin de siècle. “The truth is out there”, “Trust no one” e “I want to believe” tornaram-se mantras repetidos por uma geração que começava a ver o seu entretenimento como uma coisa cada vez mais séria. Regressaram este ano à tv, 14 anos depois da última vez, para uns seis episódios que, depois de um começo constrangedor, se saíram, afinal, surpreendentemente bem. Se é para continuar? Sabe-se lá. Os tempos estão mais de mortos-vivos. As naves espaciais são coisa do passado – quem diria?

“Os Sopranos”

  • HBO, 1997-2007
  • Em Portugal: RTP
  • Criador: David Chase
  • Temporadas: 6
  • Episódios: 86

Pensávamos que já tínhamos visto todos os grandes argumentos e personagens que o universo da máfia tinha para dar – a mistura entre crime e família, honra e traição, amor e crueldade, noções complexas de bem e de mal – e, de repente, David Chase tira da manga uma personagem como Tony Soprano. O episódio-piloto permanece uma das obras mais deliciosas que a arte do argumento televisivo já produziu. O novo chefe da máfia da New Jersey, encavacado, diante de uma psiquiatra que, aos poucos, lhe há-de sacar toda a verdade sobre o ataque de pânico de que foi vítima depois da fuga da família de patos que lhe tinha vindo morar na piscina.

A família, o amor, a pertença, o conflito de gerações e formas de estar na vida, tudo isso está em jogo na série que fez da marca HBO o selo de qualidade mais procurado da televisão por cabo. Para muitos, a melhor série de sempre, varreu ao longo dos anos, entre muitos outros prémios, cinco globos de ouro e 21 Emmy. Em 2013, a guilda dos argumentistas norte-americanos elegeu-a série mais bem escrita de todos os tempos. Com efeito, desafiam-se os cépticos a dizerem mais sobre a vida sem nunca deixarem de falar de patos.

“The Wire”

  • HBO, 2002-2008
  • Em Portugal: Obrigado, DVD
  • Criador: David Simon / Ed Burns
  • Temporadas: 5
  • Episódios: 60

Fez a sua discreta estreia a 2 de Junho de 2002. Era uma série policial sem uma só estrela no elenco, escrita por um ex-jornalista e um ex-polícia, ambientada em Baltimore, que é como quem diz, numa espécie de Amadora, longe das cidades telegénicas que estávamos habituados a ver no ar – as NYs, LAs, Vegas, Miamis e afins. Foi, portanto, sem surpresa que cumpriu as suas cinco temporadas no ar sempre com audiências, digamos, modestas. Só que seus poucos e, porém, fiéis seguidores nunca se cansaram de espalhar a palavra e “The Wire”, em Portugal “A Escuta”, teria uma segunda e muito mais gloriosa vida em DVD. Série de culto entre muito profissional do métier, tem por peculiaridade mais evidente um protagonista que não é uma pessoa, mas um espaço: a própria cidade de Baltimore. É ela que está sempre no foco enquanto as temporadas vão passando e mudando de ângulo.

A primeira acontece entre traficantes de droga nos bairros sociais, a segunda nas docas, a terceira nas ruas, a quarta nas escolas, a quinta na câmara e nos jornais. Dizer que “The Wire” é uma série policial é pouco. É um grande romance escrito com o vagar da literatura, onde arcos de história e personagens se desenvolvem lenta e inapelavelmente. Um tratado sobre a condição humana que é também televisão da mais madura que alguma vez vimos, acompanhando os pretensos bons e os supostos maus, os polícias, os ladrões, as famílias, até os entender de igual modo ou já não os distinguir sequer. A Entertainment Weekly votou-a melhor série de todos os tempos. Não sabemos. Sabemos que nunca esqueceremos personagens como Bunk, Lester, Proposition Joe, Stringer Bell ou Omar Little.

“The Office”

  • BBC, 2001-2003
  • Em Portugal: Obrigado DVD II
  • Criador: Ricky Gervais
  • Temporadas: 2
  • Episódios: 14

Ricky Gervais fez programas de rádio, teve bandas pop nos anos 80 e até chegou a ser manager dos Suede, mas o estrelato só chegou aos 40 anos, quando estreou esta falsa série documental sobre uma empresa de papel num subúrbio inglês que virou completamente do avesso a ideia de sitcom. Afinal, o humor em televisão podia ser tão mais do que uma família ou um grupo de amigos e um apartamento… Humor que recusa declaradamente a ideia das punchlines, assente no incómodo e na estranheza do desconforto e da vergonha alheia, “The Office” estranhava-se realmente primeiro, para depois se entranhar ao ponto de não se querer já outro tipo de humor.

Bastaram duas pequenas temporadas de seis episódios, mais dois episódios especiais emitidos pela BBC2 no Natal de 2003, para fazer o culto. A história da empresa de David Brent, o chefe falhado convencido de ser o mais cool e carismático dos líderes, e da sua luta para não ser encerrado pela holding-mãe, já teve remakes nos EUA, Canadá e França. Outros poderão vir a caminho no Chile e na Rússia. Para muitos, é a melhor coisa que aconteceu à comédia depois dos Monty Python. Para outros, é absolutamente intragável e um fenómeno próximo do incompreensível. De uma maneira ou de outra, será sempre a série que deu Gervais ao mundo. E toda a teoria de humor contida no bordão: “Are you having a laugh?”

“Monty Python’s Flying Circus”

  • BBC, 1969-74
  • Em Portugal: RTP
  • Criadores: John Cleese, Eric Idle, Graham Chapman, Michael Palin, Terry Jones, Terry Gilliam
  • Temporadas: 4
  • Episódios: 45

São de tal maneira património mundial que, provavelmente, não nos lembramos de que eram, na origem, um produto televisivo. “Os Malucos do Circo” foi o não propriamente empolgante título dado entre nós ao mítico começo dos Monty Python. A série estreou em 1969 na tão respeitável como cinzenta BBC e, ainda hoje, parece estranha, inventiva, revolucionária, incómoda, torrencial. Bíblia por que se guiam ainda muitos dos melhores humoristas de todo o mundo, “Flying Circus” foi talvez a primeira grande reflexão da televisão sobre ela própria.

Desconstruía formatos, personagens e linguagens, atravessava descontroladamente géneros da sátira ao nonsense e ainda se dava ao luxo de fazer piadas sobre História e Filosofia. Estão aqui alguns dos melhores momentos de comédia de todos os tempos, como os lendários sketches do “Ministério dos Andares Idiotas”, “A Inquisição Espanhola” e “O Papagaio Morto”. Teve n’ “O Tal Canal” um descendente português directo e muito digno.

“Os Três Duques”

  • CBS, 1979-1985
  • Em Portugal: RTP
  • Criador: Gy Waldron
  • Temporadas: 7
  • Episódios: 146

Não estamos aqui para enganar ninguém. Há certamente autores respeitáveis, noutras paragens, a fazerem e a justificarem muito bem selecções canónicas sobre as melhores séries de sempre. A nós o que importa não é isso. É falar das séries que nunca esqueceremos, daquelas para com as quais estaremos sempre em dívida e, nesse capítulo, há poucas a quem a rapaziada de certa idade deva tanto como “The Dukes of Hazzard”. No Brasil, chamou-se “Os Gatões” e não admira que tenha tido audiências lamentáveis entre o público masculino; por cá, foi um bem mais inclusivo “Os Três Duques”. E quem eram eles? Os irmãos Luke (Tom Wopat) e Bo (John Schneider) e a prima – suspiro – Daisy (Catherine Bach). Mas a verdadeira personagem era o carro: um Dodge Charger vermelho, de 1969, com um “01” nas portas, a bandeira da Confederação pintada no tejadilho e que até tinha direito a nome: General Lee, por inspiração do general histórico, real, Robert E. Lee (sim, “Os Três Duques” também eram cultura). A trama tinha lugar no condado de Hazzard e no eixo estavam as aventuras dos jovens Dukes, fugindo às autoridades – personalizadas no xerife Rosco Coltrane (James Best) – para comercializarem o whisky clandestino historicamente produzido pela família, então corporizada na figura do tio Jesse (Denver Pyle”. Tendo em conta o que retemos de memória e a carreira que nenhum dos envolvidos, autor incluído, faria depois, vistos à luz de hoje “Os Três Duques” iriam, muito provavelmente, doer de mauzinhos, mas cumpriram, no seu tempo, uma tarefa fundamental: ajudaram uma série de rapazolas e moçoilas desse mundo a crescer.

https://www.youtube.com/watch?v=jBwrWKo25tA

“Os Três Duques” eram pura aventura e diversão, com as fugas de carro, os saltos na estrada, os pneus a chiarem e o princípio daquela relação nem sempre pacífica com a polícia. Com o detalhe de os tipos nunca entrarem pela porta do carro, mas saltando pela janela, que fazia toda a diferença e que era exactamente como todos queríamos e bem tentávamos, em vão, entrar no carro do nosso pai. Por mais ligeiros que pudessem ser, os “Os Três Duques” eram capazes daquele sortilégio de fazer com que, mais do que querer acompanhar as personagens, nos sentíssemos as personagens. Os rapazes escolhiam se queriam ser o louro ou o moreno e as raparigas eram todas, obviamente, a Daisy. E a Daisy… A Daisy merecia um artigo só para ela. Foi com os calçõezinhos de ganga da Daisy que o autor deste artigo primeiro percebeu que algo no género oposto mexia com um rapaz. Com ela e com a voz de Lena d’Água no “Sempre que o Amor me Quiser”. As meninas não eram apenas diferentes; eram… interessantes. Ainda não sabia bem porquê ou de que forma – isso só viria anos depois – mas, para já, era ponto assente aquele friozinho, aquele nervoso que provocavam na barriga. A verdade é que, em língua inglesa, os calções de ganga ainda se chamam, muitas vezes, “daisy dukes”, e a moça Catherine Bach, hoje uma jovem de 62 anos (Wopat tem 64, Schneider 56 e Best faleceu o ano passado com 88) a única que ostenta no currículo algum trabalho com caução (e não calção) intelectual: o papel de Melody n’ “A Última Golpada”, de Cimino, ao lado de Clint Eastwood e Jeff Bridges. O resto, amigos, é história.

“The West Wing”

  • NBC, 1999-2006
  • Em Portugal: TVI
  • Criador: Aaron Sorkin
  • Temporadas: 7
  • Episódios: 155

Entre nós, passava nas madrugadas da TVI, aquele horário que os canais de televisão portugueses guardavam piedosamente para as séries, antes de perceberem que, sozinhas, elas tinham poder de atracção suficiente para acabar com os próprios canais de televisão e porem as pessoas a comprarem directamente os conteúdos aos produtores. “West Wing” apresentou a muita gente o estilo frenético, palavroso e, não poucas vezes, brilhante da escrita de Aaron Sorkin, enquanto nos revelava os bastidores da Casa Branca, ou melhor, o gabinete do Presidente Bartlet (aliás, Martin Sheen).

Josh Lyman, Sam Seaborn, C.J., são personagens que muito assessor, adjunto e político em geral aprendeu a respeitar e tomar como inspiração por esse mundo fora – o mesmo mundo que, hoje, na iminência de levar com Trumps, Le Pens e outras figuras de semelhante gabarito, suspira por reis-filósofos como Bartlet. Uma das séries mais premiadas da história da televisão, “West Wing” poderia, sem dúvida, inspirar um remake português. Mas os guionistas americanos não teriam pedalada para a criatividade do político nacional.

“Breaking Bad”

  • AMC, 2008-2013
  • Em Portugal: SIC Radical
  • Criador: Vince Gilligan
  • Temporadas: 5
  • Episódios: 62

Gilligan, que foi guionista de “X-Files”, colocou a si mesmo este desafio: fazer uma série “character driven” (isto é, guiada pelas personagens e não pela trama) a partir de um protagonista cuja unidade adviria não da permanência, mas da transformação. Da mudança, da evolução, do caminho de protagonista para antagonista, herói a vilão, vítima a caçador. O resultado foi Walter White, um pai e professor de química a quem é diagnosticado um cancro de pulmão e dados dois anos de vida, que vai fabricar e vender metanfetaminas para assegurar a sobrevivência financeira da família depois de ele morrer.

Bryan Cranston, que, por muito pouco, o mundo não desperdiçou numa carreira inteira de papéis secundários no cinema, dá corpo, alma e cicatrizes à personagem de White que, por sua vez, carrega em ombros “Breaking Bad”, série particularmente amada entre argumentistas e outra daquelas poucas tidas como uma das mais bem escritas de sempre.

“Guerra dos Tronos”

  • HBO, 2011-…
  • Em Portugal: Sci-Fi
  • Criador: David Benioff & D.B.Weiss
  • Temporadas: 6 (Até à data)
  • Episódios: 60 (Até à data)

Só há dois tipos de pessoas: as que não compreendem como se pode não gostar de “Game of Thrones” e as que não compreendem como é que as coisas chegaram a este ponto. De maneira que não vale a pena estar aqui com grandes resumos da série – o amigo leitor ou já sabe o que é ou não sabe nem quer saber. “GoT”, como também lhe chamam os maluquinhos, é a série mais pirateada de sempre e um concentrado do espírito do tempo: para tentar combater os downloads ilegais, os episódios são transmitidos para todo o mundo um dia depois da estreia americana.

Como agora passamos metade do dia nas redes sociais a contar o que nos aconteceu durante a outra metade, corre tudo a ver o episódio enquanto é tempo, que é como quem diz, antes que um amigo chico-esperto nos estrague com spoilers todo o prazer da descoberta. E é assim que nós, que somos todos muito modernaços, passamos o dia seguinte no trabalho ou no café a discutir o episódio da véspera, que é exactamente a mesma coisa que as senhoras antigas faziam no cabeleireiro, mas com a telenovela. Afinal, a lógica é uma batata e o prazer de partilhar histórias em volta da fogueira o mesmo desde o inicio dos tempos.

“Agora Escolha”

· RTP
· 1986-1994

Era um programa muito à frente do seu tempo que permitia a interactividade antes de a palavra sequer ter sido inventada. Vera Roquette dava-nos a escolher entre o Bloco A e o Bloco B de programação possível para aquela tarde e o pessoal telefonava a votar naquilo que queria ver. No caso, serve para deixar a última vaga deste top10 à sua consideração. “24”? “Lost”? “Walking Dead”? Ou o estilo de “Mad Men”, o cinismo de “Nip/Tuck”, o humor negro de “Sete Palmos de Terra”? “House, “Dexter”, “Sherlock”, “Mr. Robot”, “Narcos”? – vivemos, com efeito, uma era de ouro da ficção televisiva e não faltam grandes séries. Ou será que só conquistam um lugar na categoria dos inesquecíveis histórias que sobreviveram, de facto, ao teste do tempo?

https://www.youtube.com/watch?v=l4Vw69sZynw

Michael Knight falando com o carro em “O Justiceiro”? Pamela Anderson correndo em câmara lenta no genérico de “Baywatch”? E “MacGyver” e o seu canivete, a “Missão Impossível” e a mensagem que se vai auto-destruir em cinco segundos, a aversão às peúgas de Don Johnson em “Miami Vice” e os curtos calções da Daisy dos “Três Duques”? A poltrona de Archie Bunker n’ “Uma Família às Direitas”, o perfil do mestre Hitchcock em “Alfred Hitchcock Apresenta”, o humor sobre nada de “Seinfeld”? A lista não acaba. “Twilight Zone”, “Alf”, “O Fugitivo”, “Twin Peaks”, “Friends”, “Sim, Senhor Ministro”, “Alô, Alô”. E o “Duarte & Companhia”. Teremos sempre o “Duarte & Companhia”. Você decide. Que foi outro programa muito bom apresentado pelo António Sala.

Alexandre Borges é escritor e guionista. Assinou os documentários “A Arte no Tempo da Sida” e “O Capitão Desconhecido”. É autor do romance “Todas as Viúvas de Lisboa” (Quetzal).