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Pedro Caixinha, 46 anos de idade, no gabinete do primeiro manager de sempre do Rangers
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Pedro Caixinha, 46 anos de idade, no gabinete do primeiro manager de sempre do Rangers

Pedro Caixinha, 46 anos de idade, no gabinete do primeiro manager de sempre do Rangers

Caixinha. "Peguei a primeira vaca aos cinco anos"

Esta quinta-feira à noite, entra em ação o primeiro treinador português em 2017-18. É ele Pedro Caixinha, ao leme do Rangers, a equipa com mais títulos de campeão nacional do mundo.

Uma caixinha de surpresas, Glasgow. Os condutores guiam à direita, os peões olham primeiro para a esquerda, a língua é impercetível (aquilo não é inglês nem é nada), o tempo está de chuva e há ainda a questão do adaptador de três dentes para encaixar a tomada elétrica do continente. Mind the gap, vá. A primeira troca de ideias dá-se no hotel, onde a rececionista nos elogia a mochila do Euro-2016: “Só é pena este azul, cor do Rangers”. Nem ligamos. Minuto e meio depois, já na rua, um taxista (do Celtic, suspeitamos) recusa-nos amavelmente uma corrida para Ibrox, casa do Rangers. Vale-nos o segundo táxi, cujo condutor é do Arsenal.

Uma caixinha de surpresas, o Pedro. Treinador do Rangers desde março, é ele quem nos recebe em Ibrox com um sorriso aberto e a mão direita estendida para um passou-bem à maneira. Leva-nos para a sala do staff técnico e apresenta-nos os adjuntos, um a um, por ordem de chegada: Pedro Malta, Jonatan Johanson e Hélder Baptista. Oferece-nos um café de máquina e mostra-nos seis garrafas de vinho português Vila Santa para “surpreender o treinador luxemburguês do Progrès Niederkorn” esta quinta-feira à noite, depois do jogo para a 1.ª pré-eliminatória da Liga Europa.

Uma caixinha de surpresas, o Pedro. Again? Again, sim. A caminho do relvado para mais um treino matinal, Pedro leva dois maços de papel, devidamente agrafados. Na mão direita, a contagem crescente do número de jogos em falta para os quatro títulos (campeonato escocês 38, Taça da Liga 4, Taça da Escócia outros 4, Liga Europa 24). Na esquerda, um documento entregue a cada jogador sobre objetivos, estilo de jogo e regras de conduta desportiva para a época 2017-18 – a mais sonante é a proibição das chuteiras verdes. “É a cor da relva?”, perguntamos ingenuamente. “É a cor do Celtic”, responde-nos Pedro. “Estás a ver aquilo ali?” e aponta-nos para uns quantos jogadores com chuteiras verdes, lá ao longe, no outro lado do campo. “A partir de amanhã, ninguém mais calçará as botas daquela cor.” No fim do treino, em que Nico Kranjcar é o melhor em campo pela categórica calma em todos os toques de bola, Caixinha atravessa connosco o túnel de acesso aos balneários. “Isto aqui, na 5.ª feira, vai estar tudo mudado com o slogan ‘we are the people’ estampado nas paredes para tanto os nossos jogadores como os adversários sentirem a força do Rangers.”

Que comece a entrevista com Pedro Caixinha, no primeiro andar do Ibrox, dentro do gabinete do primeiro manager de sempre do clube, ainda no século XIX. Homem de Beja, reconhecido forcado da nossa praça, agora treinador de futebol com um título de campeão no estrangeiro (Santos Laguna, do México, em 2015). Aviso prévio, o homem ri-se à espanhola. Seja por whatsapp, seja por viva voz. Como? É assim, ò: jajajajajajajaja.

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Tourada ou futebol, qual foi o teu primeiro espectáculo ao vivo?
Jajajajajaja, bela pergunta. Quanto é possível ir ao baú da memória, foi a uma tourada.

Em Beja?
Fora de Beja. Vem-me imediatamente à cabeça uma tourada em que o meu pai era do grupo de forcados do Montemor.

O teu pai?
Siiiim, o meu pai foi forcado no grupo de Montemor. Sou de 1970 e o meu pai já pegava há uns 10/15 anos. Foi cabo-fundador do grupo de Beja e era natural para mim viver aquele período intenso da tauromaquia, entre maio e setembro.

O que reténs dessa experiência?
Há dois pontos que me marcam decisivamente: o primeiro, quando peguei uma vaca com cinco anos de idade. Era uma corrida normal, com o cavaleiro Joaquim Veríssimo. Como ele era amador, não podia tourear um touro, só uma vaca. Às tantas, o meu pai chamou-me e peguei a vaca, com mais dois ou três a ajudarem-me.

Pegaste uma vaca assim do nada, sem medo nenhum?
Não sei se sabia o significado da palavra medo aos cinco anos de idade.

E a outra memória?
O meu pai foi fazer uma digressão de um mês ao México, em fevereiro 1980, e lembro-me de estar à espera dele, na rua, em Beja. Quando ele finalmente chegou, o presente mexicano era uma bola de futebol da Voit, que ainda hoje patrocina o campeonato mexicano. Quando cheguei ao México e vi essa bola, veio-me tudo à memória. Incrível.

Passaste da vaca para o touro?
Foi todo um processo, jajajajaja. Com sete, peguei um novilhozito. Só que, entretanto, comecei a estar mais ligado a outros desportos escolares: basquetebol, futebol, andebol. Até aos 14, fui federado no hóquei e futebol.

E o que aconteceu aos 14 anos?
Tive de me decidir e escolhi o futebol.

Peguei duas vacas e senti-me bem. Depois fui para o grupo de Montemor, em 1990. Fiquei lá até 2002, acho. Foram 12 anos cheios em que percebi que as relações entre as pessoas podem mesmo fazer a diferença. Se fizermos um paralelo com o futebol, representar o grupo de forcados de Montemor ou Santarém é a mesma coisa que jogar no Benfica, Sporting ou Porto. Tenho muitos e bons amigos no futebol, mas os verdadeiros são aqueles dos touros, com quem passei mais de uma década.

E os touros?
Só aos 16, naquelas garraiadas pelo Alentejo fora, ali em Beringela, voltou a crescer-me a curiosidade de pegar outra vez e fui lá a uma corrida com um amigo. Disse-lhe ‘vou experimentar pegar a vaca sozinho, sem ter o meu pai a ajudar-me’.

E que tal?
Peguei duas vacas e senti-me bem. Depois fui para o grupo de Montemor, em 1990. Fiquei lá até 2002, acho. Foram 12 anos cheios em que percebi que as relações entre as pessoas podem mesmo fazer a diferença. Se fizermos um paralelo com o futebol, representar o grupo de forcados de Montemor ou Santarém é a mesma coisa que jogar no Benfica, Sporting ou Porto. Tenho muitos e bons amigos no futebol, mas os verdadeiros são aqueles dos touros, com quem passei mais de uma década.

Quantos touros pegaste?
Uns cem. Fazemos a contagem, temos tudo bem contabilizado, jajajajaja.

E saíste porquê?
Comecei a ter mais responsabilidades. Era professor de educação física, o corpo era a minha ferramenta e tinha de estar sempre operacional. Depois veio o casamento, o primeiro filho. Doze anos é bom, chega.

Implicava viagens?
Muitas. Pegámos em Espanha, França e Macau.

Macau?
Há aqui história, vais ver. Nunca fui bom aluno até chegar à faculdade. Só quando entrei na UTAD em 1993 é que me fiz bom aluno. Até fui condecorado, juntamente com um amigo, com uma bolsa de mérito em educação física, média de 17. Fazia tudo por frequência, nunca ia a exame e, portanto, tinha umas férias de três meses e meio, ou mais. Isso permitia-me estar livre para viver a época tauromáquica em cheio. Ora bem, em 1996, fomos pegar em Macau e tive de optar: faço a frequência agora ou deixo a disciplina para exame e vou a Macau?

E?
Fui a Macau, claro. Fomos na altura do ano novo e era o ano do rato. Passei o tempo a ouvir Kung Hei Fat Choi e Lai-si tau loi.

Como?
A primeira é feliz ano novo lunar, a segunda é dá cá o lai-si.

É normal, touradas em Macau?
Soltaram um touro vivo, de 400/500 quilos brutos, limpinho, com toda a força, só para os curiosos.

Curiosos?
Sim, quem quisesse entrava na arena. Lembro-me de ver a miss Macau lá no alto, jajajajajaja. No dia seguinte, o China Morning Post tinha a primeira página com a Miss Macau no 3.º andar. Os gajos eram mesmo kamikazes.

Cada touro é uma experiência nova ou ao 10.º já…?
Cada touro é uma experiência nova. Aquilo é assim: há uma formação, como se fosse a táctica no futebol. O cabo é o treinador e é ele quem analisa o comportamento do touro. O resto do grupo é o plantel.

Plantel?
A formação inclui o cara, o primeiro ajuda, os segundos ajudas, o rabejador e os terceiros ajudas. Que me lembre, a única escola diferente é a de Lisboa, com duplo primeiro ajuda, dois segundos ajudas, o rabejador e mais dois nos terceiros ajudas.

O Pedro era o quê?
Era cara.

Pau para toda a obra?
Ah pois.

Dizem-me que eras o melhor que se viu por aí.
Uyyyy, não, não. Há o João Cortes, o meu pai, o Paulo Vacas, o Pedro Sotero.

Dos tais cem touros que pegaste, alguma experiência desagradável?
[Pedro levanta o queixo e é notório uma cicatriz generosa] Alguns correram mal, sem dúvida. Este aqui foi uma focinhada. Abriu-me uma segunda boca.

Com o focinho?
Siiim. Se fosse com o corno, partia-me a mandíbula, jajajajajajaja.

Bolas.
Ossos do ofício.

Fica-se KO na hora?
Graças a Deus, nunca fiquei KO totalmente. Este deixou-me meio zonzo.

Onde foi essa corrida?
No Campo Pequeno.

É a praça mais mítica?
O Campo Pequeno é o ex-libris. E se pegássemos uma corrida até à bandeirola, aí era o máximo.

Até à bandeirola?
Casa cheia.

Ahhhhh, boa boa.
Ir ao Campo Pequeno e pegar uma corrida até à bandeirola é, de facto, um acontecimento muito muito muito interessante. Durante alguns anos, o Campo Pequeno esteve em remodelação e alguns forcados, grandíssimos forcados, não tiveram a honra de pegar sequer uma corrida.

As touradas no Campo Pequeno eram um evento televisivo, não eram?
Todas as quintas-feiras, lembro-me bem das transmissões da RTP. E quem ia lá eram grupos da primeira linha. E era normal que os forcados ficassem conhecidos para o público em geral, porque apareciam com regularidade na televisão, numa época só com a RTP.

Viste então o teu pai na televisão?
Não tenho essa memória, sabes? Ele enganou-me duas vezes.

Como assim?
No grupo dos velhos, ele era volteado e ia de charola. Ajudei-o duas vezes e, à terceira, disse-lhe para parar, já era hora.

E o que é ver um pai assim volteado e ir de charola?
Na primeira vez, curiosamente no Campo Pequeno, ele está como cara e eu como primeiro ajuda. Ele vai ao chão, o touro ataca-o e eu protejo-o com o corpo. É um pormenor instintivo. Dessa vez, foi obviamente mais tocante porque tratava-se do filho a defender o pai, mas é uma ação comum nos forcados. Há até uma imagem fantástica no grupo de Vila Franca, em que o cara está KO e todos os forcados metem o corpo à frente do touro para defendê-lo.

Os teus filhos conhecem esse passado do pai e do avô?
Sabem, sim. E estou convencido de uma coisa: se a minha filha fosse rapaz, seguiria as nossas pisadas.

Porquê?
Ela tem mais o meu sangue, é mais jogada para a frente. Ele é muito tranquilo, é mais racional. E ele até já pegou uma vaca, mas não acredito que se aventure em mais pegas.

Há quanto tempo não pegas?
Uyyyyyyy, 14 anos.

Onde foi?
Em Montemor, na feira de setembro. O forcado é como um futebolista: há a fase do início, a fase de crescimento, a fase regular e a fase terminal, o final de um ciclo. Que é determinada por ti ou pelo touro. Prefiro a primeira fase, jajajajajaja, e saí de fininho em Montemor.

E correu bem?
Peguei à primeira. Nunca quis fazer uma graaaande despedida, nem me lembro muito bem se entreguei a jaqueta na arena ou no jantar, a terceira parte, que é bastante interessante, jajajajajajaja. Um aspeto interessante: foi nas touradas que aprendi a analisar os vídeos em câmara lenta. Pegava no Carlos Pegado, por exemplo, e observava-o frame por frame: como é que ele punha o pé, como é que fazia os gestos técnicos, os tempos de execução e tal.

Ajudou-o para o futebol?
Sim, na análise dos adversários, por exemplo.

Isso é futebol, já?
Jajajajajajaja. Chega de touros, vamos à bola.

Um bancário, amigo do meu pai, levou-me a Alvalade pela primeira vez. Ainda por cima, quarta-feira europeia, com o Athletic Bilbao [Dezembro 1985]. Acabou 3-0, o guarda-redes deles era o Zubizarreta. Uma sensação fantástica, aquilo foi cá um impacto. Mas não era só o futebol, atenção. Cada vez que íamos de excursão a Fátima ou ao Planetário, aquilo valia por uma vida. Só o facto de passar a ponte já era fantástico. Uma excursão a Lisboa, vamos embora. Ao Mosteiro dos Jerónimos, vamos embora. Ao Planetário, vamos embora.

Quais as primeiras recordações?
Lembro-me de estar no balneário do Desportivo Beja, onde o meu pai era defesa-esquerdo. Jogava lá o Mirobaldo, o Osvaldo [1980-81]. Era a 2.ª divisão, zona sul. No final da primeira volta, íamos em terceiro. Depois, acabámos em 13.º. Lembro-me de ir aos jogos, de sentir aquele ambiente de balneário, antes, durante e depois dos jogos. Lembro-me de beber o cházinho quente ao intervalo. Lembro-me de ser apanha-bolas. Lembro-me de estar com o meu avô na bancada. Lembro-me da barraca do meu padrinho às portas do estádio. Ele era algarvio e um sportinguista ferrenho. Era tradição irmos de Beja ao Bonfim para ver o Sporting, ano após ano. Uma vez, não me levaram.

Uyyy.
Bruto, atirei o meu relógio do Mickey contra o carro em andamento. ‘Ai não me levam? Então fiquem a saber que estou bruto.” jajajajajajaja.

Alvalade, Luz, nada?
Um bancário, amigo do meu pai, levou-me a Alvalade pela primeira vez. Ainda por cima, quarta-feira europeia, com o Athletic Bilbao [dezembro 1985]. Acabou 3-0, o guarda-redes deles era o Zubizarreta. Uma sensação fantástica, aquilo foi cá um impacto. Mas não era só o futebol, atenção. Cada vez que íamos de excursão a Fátima ou ao Planetário, aquilo valia por uma vida. Só o facto de passar a ponte já era fantástico. Uma excursão a Lisboa, vamos embora. Ao Mosteiro dos Jerónimos, vamos embora. Ao Planetário, vamos embora. Agora está tudo muito diferente. Antes, ir de Beja a Lisboa, e falo de um país pequeno como o nosso, era uma aventura. Agora é fácil ir e vir no mesmo dia, com tempo para almoçar e jantar na boa. É por isso que digo aos meus filhos que o mais importante de tudo é ter mundo. Isso é impagável. O ter mundo é o passaporte para uma série de coisas. Digo-lhes sempre para perguntar aos colegas da escola se sabem o que é a prisão de Alcatraz. ‘Se responderem sim, sabem, ou não, mas já vi o filme, vocês podem dizer que estiveram lá e conheceram aquilo.’

E o Pedro Caixinha futebolista, nasce quando?
Comecei a jogar no Zona Azul, nos iniciados. Nos juvenis, já fui para o Desportivo Beja. Nos juniores, representei o Ferreirense. Daí fui para o Portimonense, no ano de fusão com o Torralta. O treinador era o bom gigante, o José Torres. À baliza, o Figueiredo, agora treinador com o Sérgio Conceição, e o Sérgio, aquele que chegou ao Sporting. Como terceiro guarda-redes, o Abelha [Pedro Caixinha é daqueles que fecham o “e” em Abêlha], que acabou por ficar ali em Castro Verde. Eu era o quarto guarda-redes, o dos juniores.

Quem era o vosso avançado?
Espera aí, já me lembro. A equipa era Figueiredo, José Carlos, o do Benfica, Justiniano, Nivaldo, Major, Skoda, Vado, que chegou à seleção, Soerensen, o dinamarquês, e, ah já sei, o César Brito. O nosso avançado era o javali.

Javali?
Era a alcunha dele, desde os tempos da Covilhã.

Vivia-se bem em Portimão?
Muito bem, na torre da Torralta, já dentro da praia.

E depois?
Nunca joguei na 1.ª divisão e voltei ao Beja, para a 3.ª. Ainda joguei uns dois/três anos.

Imagino a diferença.
Havia campos tramaaaaados: o Maria Vitória, do Moura, por exemplo. O do Minas de Aljustrel, outro exemplo.

Tinhas familiares a ver-te na bancada?
O meu avô materno Faustino esteve sempre presente e levava-me aos treinos. No tempo em que ainda não tinha carta, ele deixava-me conduzir o carro até casa, às escondidas dos meus pais.

Li que ainda jogaste lá em cima.
Jajajaja, pois foi. Fui estudar para Vila Real, em Trás-os-Montes. Cinco anos bem bons, na universidade, e joguei um ano no Favaios Futebol Clube, com o professor José Maria a mister.

Como era o Pedro na baliza?
Era pequenino, não tinha muita presença. Era um prega-saltos.

Um quê?
Prega-saltos. Nos treinos do Sporting, o Justino dizia-me ‘pareces mas é um guarda-redes de matraquilhos’. Era arrojado, destemido e adorava treinar, sempre em ação, só que não tinha envergadura nem escola de guarda-redes.

Tinhas algum ídolo?
Vítor Damas. O meu quarto, com 14/16 anos, estava todo forrado a futebol e o Damas à cabeceira.

Acabas a carreira de futebol e quando é que começas a treinar?
Comecei a ganhar gosto pelo treino, em Vila Real, com o professor Vítor Maçãs. E vou treinar os sub14 do Real Clube de Penaguião, um clube de pessoas fantásticas e um grupo de miúdos sensacionais. Foi a primeira experiência. Acabei o curso e voltei para Beja, onde me convidaram logo para treinar os sub14, no campeonato nacional. Fizemos 13 vitórias seguidas, toda a primeira volta. Só perdemos dois jogos nesse campo, com o Farense, campeão, e o Vasco da Gama da Vidigueira. Com a mesma equipa, fomos para o Nacional de Juvenis e obtivemos a manutenção, algo nunca visto nos últimos 15 anos com uma equipa da Associação de Futebol de Beja. Passei a treinar os seniores, na 3.ª divisão, em 2001-02. Na época seguinte, fui treinar o Vasco da Gama da Vidigueira e passámos duas eliminatórias da Taça de Portugal. Conheci então o professor Pedro Mil Homens [diretor da Academia do Sporting de 2001 a 2011] mais o José Peseiro durante o mestrado e entrei no Sporting, ainda com o Bölöni, para fazer a tese.

Já avançámos um grande pedaço da história.
Sai o Bölöni e entra o Fernando Santos. E foi com ele que comecei a trabalhar na equipa principal, como observador dos jogos dos adversários, uma ideia do Mil Homens. O Jorge Garganta era quem analisava os jogos de Coimbra para cima, eu analisava de Leiria para baixo mais as ilhas. De início, só enviava os relatórios, depois comecei a trocar impressões com o engenheiro, como ainda hoje lhe chamo.

Sai o Fernando Santos e entra…
Entra o José Peseiro e aí já entro na equipa técnica. Foi um ano muito trabalhoso, que me permitiu desenvolver todas as valências e capacidades. Primeiro era aquele que vivia mais longe.

Assim de caras?
Vivia em Beja.

Quêêêêêê?
Vivia a 180 km da Academia de Alcochete. Fazia o triângulo Beja-Alcochete-Évora.

Évora?
Dava aulas na universidade.

Chi-ça. Como era o dia-a-dia?
Saía às 6 de Beja, chegava às 7.30 à Academia. Era o primeiro.

Primeiro que o Paulinho?
Jajajajajaja. Antes dele, sim.

E depois?
Saía de Alcochete pouco depois do almoço para estar às 15/16h em Évora. A seguir às aulas, ia para casa em Beja.

“Só” isso?
Como eu ainda era observador do Sporting e esse ano foi fantástico, e só não foi perfeito por culpa daquela última semana, ia ao estrangeiro para ver os adversários da Taça UEFA. Se tivemos 15 jogos europeus, fiz à vontade uns 30 jogos lá fora. Para cada adversário, dois jogos de observação. Ia cedinho, naquelas viagens mais baratinhas, e fazia o serviço todo: analisar os hotéis, analisar os centros de treinos, analisar os comboios, analisar os aeroportos, analisar os estádios, analisar os adversários. Tudo isto era cansativo, claro, e recompensador. Repara, dei um salto improvável nos meus conhecimentos e contatos. Comecei a dar-me com muita gente em toda a Europa. Vê bem, o treinador do Feyenoord era o Gullit, o do AZ era o Co Adriaanse. Já conhecia o Schinpol [aeroporto de Amesterdão] como as minhas mãos. É o que dá trabalhar num grande grupo como o Sporting, cheio de jogadores sensacionais.

Era o Sporting da seleção?
Ricardo, Sá Pinto, Rui Jorge, Beto, Barbosa, Hugo Viana. O Hugo foi um dos jogadores que mais me impressionou.

Então?
No primeiro treino, foi uma coisa impressionante. Pela qualidade, pela velocidade, pela execução, pelo talento. Impressionou-nos mesmo muito quando chegou do Newcastle.

Bom ambiente no grupo?
Sim, sim. Houve até uma matança do porco em Alcochete. É o ano em que começam a jogar os mais novos, como Patrício, Moutinho. O Moutinho, se não me engano, estreou-se com o Feyenoord, lá, na banheira de Roterdão, jogou de 6 e foi fantástico. Também subiu o Miguel Veloso, por exemplo. O Carlos Saleiro. O Nani.

Já, o Nani?
Nani, sim. Quando o Dínamo Moscovo tinha muitos portugueses, naquela primeira vaga de emigração futebolística, com Nuno, Maniche, Costinha, Jorge Ribeiro e sei lá mais quem, eles estagiaram em Portugal e jogaram connosco em Alcochete, a meio da semana. Metemos uma equipa mista, com o Nani lá no meio. E já não enganava, claro.

Como é que se viveu aquele golo do Miguel Garcia em Alkmaar?
Estava no banco, que não o do suplentes. Era um banquinho à parte, que se chamava auxiliar. Quando o Miguel marcou, fui dos muitos a correr lá à frente para abraçá-lo. Ainda por cima, o Miguel é cá dos meus: também é alentejano, ali de Moura.

Ficavas sempre no banco?
Não, só nos jogos europeus, em que se permitia mais elementos. Nos jogos do campeonato nacional, havia uma restrição e via o jogo da bancada, mesmo no enfiamento da linha do meio-campo.

E a final da Taça UEFA, como foi assistir àquela segunda parte?
Houve um momento determinante na segunda parte, quando o Rogério atira aos dois postes e, na transição, eles marcam o 3-1. Depois da nossa primeira parte, em que fomos nitidamente superiores, não esperava aquela reviravolta.

A derrota do Sporting na Luz [em 2005] não fez mossa, posso dizer claramente. A seguir à derrota na Luz, o nosso foco estava na final da Taça UEFA. Depois do 3-1 do CSKA, aí sim, fez mossa. Principalmente porque já não dependíamos de nós para chegarmos ao segundo lugar, de acesso direto à Liga dos Campeões. E aí notou-se, perdemos 4-2 em casa com o Nacional e, se ganhássemos, ficaríamos à frente do Porto, que só empatou em casa com a Académica. Esse 4-2 com o Nacional foi o jogo mais sofrível de todos dessa época.

Que peso teve a derrota na Luz, quatro dias antes?
[antes mesmo de acabar a pergunta] Não fez mossa, posso dizer claramente. A seguir à derrota na Luz, o nosso foco estava na final da Taça UEFA. Depois do 3-1 do CSKA, aí sim, fez mossa. Principalmente porque já não dependíamos de nós para chegarmos ao segundo lugar, de acesso direto à Liga dos Campeões. E aí notou-se, perdemos 4-2 em casa com o Nacional e, se ganhássemos, ficaríamos à frente do Porto, que só empatou em casa com a Académica. Esse 4-2 com o Nacional foi o jogo mais sofrível de todos dessa época.

Esse verão de 2005 foi normal ou sentia-se no ar alguma coisa em relação à saída do Peseiro?
Havia claramente a certeza de que íamos continuar à frente do Sporting. Lembro-me perfeitamente de estudar a Udinese, nosso adversário da pré-eliminatória da Liga dos Campeões.

Eles tinham o Iaquinta.
Esse e o outro pequenino, que fazia golos de todas as maneiras e feitios, o Di Natale. Eram muito bons, fortíssimos. No meio-campo, havia aquele ganês que jogou com o Mourinho no Inter, o Muntari. Eles ganharam-nos 1-0 em Alvalade, golo de penálti muito cedo. Seguiu-se o adeus na Taça UEFA, pelo Halmstad. E depois aquela derrota em casa com a Académica, numa fase em que a equipa já estava desconfiada e foi o precipitar de tudo.

E depois, adeus ao Sporting?
Nem por isso. O Peseiro saiu, o Eduardinho saiu. O Paulo Bento subiu dos juniores e a mim pediram-me para ajudar o departamento de scouting até ao final da época.

E?
Tudo bem, mas queria mais. Aparece então o convite do Peseiro para ir à Arábia Saudita.

Onde?
Em Riade, ao serviço do Al-Hilal.

Que tipo de experiência?
Enriquecedora, num país totalmente diferente, com uma ditadura religiosa.

O que é não se pode fazer?
Não há vida social.

De todo?
No condomínio, sim, é um mundo à parte. Fora, é outro. As mulheres têm de andar com a abaia preta, as mulheres não podem conduzir, os homens não podem usar calções acima do joelho e os Mutaween intervêm.

Quem?
Os Mutaween, a polícia religiosa. Eles advertem quem sai da linha, sobretudo a obrigar as mulheres a tapar o cabelo. Um dia, num centro comercial, a minha mulher foi advertida. Ah, também não há álcool.

Nem sequer nos restaurantes?
Nem aí. E os restaurantes são de top, top, top. Os restaurantes que há no Dubai também os há em Riade. E também no McDonalds, onde havia a “family section” e a “single section”, pegadas uma à outra, sem barreiras visíveis [Caixinha junta os dedos]. Se tu e eu formos comer lá, entramos na “single section”. E é usual ver um árabe a chegar à frente, com três ou quatro mulheres atrás. O que eles fazem? Pedem um biombo e faz-se uma espécie de tenda no meio do McDonalds.

Para?
Para estarem mais à vontade, para poderem tirar a abaia.

No futebol saudita, impensável ver uma mulher no estádio?
Nessa altura, sim, impensável. Agora acho que já mudou um pouco. O futebol era das poucas atividades em que o povo saudita podia dar largas ao seu entusiasmo. De resto, não há nada.

Nada?
Não há um cinema, não há um espetáculo. A única coisa que podíamos fazer era ver a corrida de cavalos e camelos no hipódromo e pouco mais.

Ficaram lá quanto tempo?
Sete meses. Depois passámos para o Panathinaikos.

Uisch, grande salto.
Vivíamos na Riviera ateniense e foi a primeira experiência dos meus filhos a estudar num colégio inglês. Era um clube grande e muito bem organizado, só que o Olympiacos estava mais forte.

É assim há anos e anos, porquê?
O ganhar torna-os cada vez mais fortes, a nível financeiro, a nível da grandeza, a nível da confiança, a nível de tudo.

Sentia-se a rivalidade?
Então não? Só para veres, os adeptos do Panathinaikos estavam proibidos de ir ver o jogo ao Olympiacos e os do Olympiacos proibidos de ir ao Panathinaikos.

https://www.youtube.com/watch?v=23Ydvg6ap24

Nem quero imaginar um dérbi.
O ambiente hostil é o clássico: pedras e bombas à chegada do autocarro.

E no relvado?
Foi engraçado o que aconteceu no estádio do Olympiacos. O nosso preparador físico era espartano e disse-nos para fazermos o aquecimento junto aos adeptos do Olympiacos. De repente, olho para o lado e só vejo um muro laranja. Eram cenouras, cenouras e mais cenouras. ‘Então, o que é isto?’, perguntei ao preparador físico. E ele explicou-me que o Olympiacos chama coelhos ao Panathinaikos.

Qual era a vossa equipa?
Olha, tínhamos o Karagounis e o Fyssas. O avançado era o austríaco Ivanschitz.

E as outras equipas?
O PAOK tinha o Fernando Santos. Ele chegou a meio da época, se não me engano, e só jogámos contra ele em Salónica. Ganhámos 1-0 no Estádio Toumba. E o AEK tinha o Rivaldo, que era impressionante. Que classe, que jogador. O homem era bom a todos os níveis.

Isso é em que época?
2007-08.

Já havia aquelas manifestações na Grécia?
Ainda não, foi depois.

Como era a Grécia?
Atenas é um espetáculo. Um dia livre, quando havia, e dava para levar a família à Acrópole ou ao estádio dos primeiros Jogos Olímpicos ou ao cenário de guerra do filme 300. Aquilo é um mundo de histórias e mais histórias, uma relíquia que só visto. Agora, os serviços públicos era o Deus me acuda. Um simples pagamento por multibanco ou por internet e via-se que as coisas não andavam. Se quisesse ir ao banco para resolver o problema, tinha de fazer com a, b, c, x, z.

Quando é que começaste a trabalhar sozinho, sem ajuda (jajajajajaja)?
Ainda fui com o Peseiro para o Rapid Bucareste, na Roménia, e depois para a seleção da Arábia Saudita, onde jogámos a qualificação do Mundial-2010. Conseguimos o apuramento para o play-off, com o Bahrein, e o vencedor jogava com a Nova Zelândia para o último lugar de acesso ao Mundial na África do Sul. No Bahrain, empatámos 0-0. Em casa, estava 2-1 nos descontos. No último instante, eles fazem o 2-2.

Agora sim, Caixinha a treinador?
Jajajajajaja. Agora sim.

Porquê?
Já tinha avisado o José [Peseiro] que queria ser treinador. Chegou o momento de fechar um ciclo. Como o do forcado. Como o do adjunto.

E?
Cheguei a Portugal e sai o Lito Vidigal, na primeira ou segunda semana de trabalho pelo União de Leiria. Recebo uma chamada do Rui Faria, adjunto do José Mourinho.

Então?
Tive uma relação muito próxima com o Mourinho durante o meu tempo no Sporting. Uma vez, fui observar o Vitória, ao Bonfim, e dividimos o camarote. Depois, estava a analisar o Bahrain na Áustria e apanhei lá o Inter em estágio. Reconheceu-me e quis que fosse almoçar com a equipa. Recusei. Ele aceitou e contra-atacou.

Como?
Insistiu em levar-me no autocarro do Inter até ao jogo de treino. Isso demonstra a qualidade humana do José Mourinho.

Telefona-te o Rui Faria e?
Fala-me dessa possibilidade no Leiria e, através dele, o Bartolomeu contactou-me.

Onde é que estavas?
Na praia, com a família.

No dia seguinte?
Saí da praia, contactei um rapaz que trabalhava comigo desde os sub14 em Beja, só que ele estava indisponível. Então o Rui Faria apresentou-me o Carlos Campos, um indivíduo fantástico, da periodização tática. Conheci-o no outro dia de manhã e apresentámo-nos em Leiria. Fizemos uma primeira volta fantástica e acabámos em quarto, atrás dos três grandes. Na reabertura do mercado, saem N’Gal, Silas e acabámos em 10.º. No ano seguinte, já não podíamos usar o estádio e tínhamos de jogar na Marinha Grande. Daí, fui contratado pelo Nacional e, curiosamente, joguei contra o Leiria, já então treinado pelo Dominguez, na sua despedida na 1.ª divisão

E o Nacional, como foi?
Há coisas do arco da velha e, admito, a vida tem-me sorrido em momentos chave. Estava aqui em Glasgow, a fazer um UEFA Pro, juntamente com o Arlindo Morais. Nesse evento, conheci a Helena Costa, que já trabalhava no scouting do Celtic e agora até vai para o scouting do Eintracht Frankfurt. Às duas por três, perguntam-me do Celtic se estaria interessado em montar um centro de estágio na Península Ibérica. Claro que sim, respondi. Ainda fiz observações e até indiquei um jogador ao Celtic, o sul-coreano Ki Sung-yueng. Jogou lá três anos e agora é do Swansea. Bom, nesse entretanto, recebo uma chamada do Rui Alves e aceitei o convite de treinar o Nacional.

A equipa era quem?
Neto, Candeias, Rondón, Mateus, Diego, Claudemir, Moreno. Fizemos uma pré-época fantástica em que ganhámos jogos em França e ainda levantámos o Ramón Carranza, em Cádiz. Ganhámos ao Osasuna e, na final, ao Rayo Vallecano. A nível português, só Benfica e Nacional ganharam essa taça. E que taça, aquilo era gigantesco, quase não cabia no avião.

E o salto para o México?
Quando estou em Glasgow, no tal UEFA Pro, conheço o diretor-desportivo do Santos Laguna, porque o Santos Laguna e o Celtic são clubes-irmãos. Bom, a amizade ficou estabelecida. No início da segunda época do Nacional, ele liga-me e pergunta-me ‘estás interessado em vir para o México?’ Digo que sim e ele prepara-me para a entrevista.

Entrevista?
Lá, o processo é de seleção, de entrevista, com perguntas e respostas à frente dos dirigentes. Tens de te preparar bem.

E passaste à primeira?
A entrevista foi na manhã do meu dia de anos, a 15 novembro, e assinei nessa noite.

Que tipo de perguntas?
As mesmas que me fizeram aqui no Rangers. Isto aqui não pode ser só pelo brilho dos teus olhos, a cor do teu cabelo ou o currículo, tem de haver um processo de seleção para chegarmos a um entendimento sobre as ideias do treinadores e saber se há um “match” com as ideias da direção em vários tópicos, seja relação formação-equipa principal, ideias de marketing e por aí fora. No Santos Laguna, por exemplo, aquilo era todo um mundo. Havia mais de 100 atividades em seis meses e tinha de escolher entre ir aqui, falhar ali. As reuniões de segunda-feira, outro exemplo, duravam duas horas, com o presidente, que vivia na Cidade do México, diretor- desportivo, vice do futebol, todo o departamento de scouting, responsável médico e responsável pelos media. Um a um, os assuntos eram esgrimidos até todos estarmos sintonizados.

Ganhaste um campeonato?
O campeonato, a Taça e ainda uma competição que eles chamam Campeon de Campeones, entre os dois campeões do ano, o do Apertura e o da Clausura. Tudo em nove meses.

Como foi o campeonato?
Ganhámos 5-0 na 1.ª mão e perdemos 3-0, na 2.ª.

Como 5-0?
Tudo saiu bem e um jogador fez um póquer.

Quem?
Javier Orozco.

Não conheço.
Está agora na 2.ª divisão.

E o 3-0, como foi isso?
Em parte, relaxamento. Em parte, meeeedo. Cénico, puro. Tive de fazer uma substituição aos 35 minutos para acalmar a equipa e, depois, a conversa ao intervalo permitiu equilibrar o jogo.

Havia quantos ao intervalo?
Já 3-0.

A equipa do 3-0 tem o Ronaldinho, certo?
Craque. Esse clube, o Querétaro, quer agora o Fernando Torres. Lá, é tudo à grande. O Gignac, por exemplo, aquele da bola ao poste no último minuto da final do Euro2016 vs Portugal, ganha 4 milhões de dólares por ano.

Como é a realidade mexicana?
Os adeptos vão muito aos treinos abertos e os estádios são fantásticos. O último a ser remodelado é o Azteca, casa da seleção e dos Mundiais 1970 e 1986. Eles querem mudar ali ligeiramente a estrutura para receber jogos de futebol americano. E, já agora, o terceiro Mundial de futebol. Aquilo em matéria de estádios é uma mina [Pedro Caixinha saca do telemóvel e começa a mostrar-nos os estádios todos, o do Chivas, o do Monterrey, estreado pelo Benfica há um ano, o do Cruz Azul, o do America, o do Chiapas].

Qual o teu preferido?
O Azteca tem uma dimensão impressionante, não deixa ninguém indiferente. Vais pelos túneis e tem imagens do Pelé em 1970, do Maradona em 1986, é arrepiante. Agora o do Cruz Azul tem isto aqui ò [e mostra-nos uma praça de touros mesmo mesmo mesmo ao lado do estádio]. Isto é a praça México, a maior praça de touros do mundo, com capacidade para 50 mil pessoas.

E como é que um estrangeiro se impõe no México?
É difícil, porque há muito preconceito. Só para veres, era o único estrangeiro. E só um não-mexicano é que tinha ganho o campeonato, há uns 40 anos.

Quem?
O Bora Milutinovic, que conheci no Qatar há uns tempos.

O preconceito notava-se como?
Se eu tivesse uma reação mais apaixonada no banco, era reprimido pelo quarto árbitro. No banco ao lado, o treinador mexicano não era chamado a atenção por idêntico comportamento. Pequenas coisas.

Os adeptos mexicanos são sensacionais, sempre e em qualquer lado. Primeiro recatados, depois expansivos. Bastava vir o primeiro falar comigo que os outros vinham às paletes, jajajajajajaja. Lembras-te do episódio das férias de família em Alcatraz? Pois bem, uns mexicanos viram-me e pediram-me para tirar fotografias. Já depois de sair do Santos Laguna, estava eu muito bem com a minha mulher num cruzeiro e uns mexicanos conheceram-se. Conversa puxa conversa, fotografias, autógrafos e tal. É preciso pensar nisto: o México tem 120 milhões de habitantes no México. Fora do México, há 40 milhões. 

E os adeptos?
Sensacionais, sempre e em qualquer lado. Primeiro recatados, depois expansivos. Bastava vir o primeiro falar comigo que os outros vinham às paletes, jajajajajajaja. Lembras-te do episódio das férias de família em Alcatraz? Pois bem, uns mexicanos viram-me e pediram-me para tirar fotografias. Já depois de sair do Santos Laguna, estava eu muito bem com a minha mulher num cruzeiro e uns mexicanos conheceram-se. Conversa puxa conversa, fotografias, autógrafos e tal. É preciso pensar nisto: o México tem 120 milhões de habitantes no México. Fora do México, há 40 milhões. São como os japoneses, estão em todo o lado. Ainda hoje recebo imensos telefonemas de jornalistas mexicanos a pedirem-me opiniões sobre isto e aquilo. Até já fui convidado para apresentar a gala do futebol.

Parte final: como aparece o Rangers?
Um dia, liga-me o Pedro Mendes.

O que jogou aqui no Rangers?
Esse aí, ele é empresário e trabalha numa agência com o Fernando Meira e o Nuno Assis [MNM Sports Management]. Ligou-me a perguntar se estava interessado, porque o clube ia trocar de treinador. Vamos embora, disse-lhe. Passado um tempo, confirmou-se e reunimo-nos. Na altura, estava no Al Gharafa, do Qatar. Voei de Doha para Londres e reuni-me com os dirigentes, a tal entrevista. Fui aceite e depois tive de acertar a saída do Qatar. Os árabes são tramados nessa hora, mas tudo correu bem e apresentei-me em Glasgow. As voltas que a vida dá. Estagiei em Glasgow e colaborei com o Celtic, agora estava de regresso para trabalhar no Rangers. Rumo ao 55 [pequeno à parte: o Rangers é o clube com mais títulos de campeão nacional a nível mundial e o último é de 2011, antes da descida à 4.ª divisão por problemas financeiros] [outro à parte: nas épocas de inferno do Rangers, entre a 4.ª e a 2.ª divisões, a média de adeptos em casa é de 49 mil, superior a qualquer um dos três grandes de Portugal].

E so far, so good? Nas ruas, quero dizer, entre os adeptos.
Os do Rangers cheios de esperança, os do Celtic porreiros e animados. É normal, ganham há seis anos seguidos, estão cheio de moral.

Nunca o incomodam?
Só uma vez, no centro, um irlandês do Celtic assim prò bebâdo. Chateou-me, chateou-me, chateou-me e eu nada.

E o centro de Glasgow?
É bonito, como o resto da cidade. Se fores lá aos sábados a partir das 17 horas, já vês muita gente entortada.

A entrevista está feita, saímos de Ibrox e vamos para o centro, de táxi. O condutor tem os seus 50-e-muitos e é do Celtic. “Desde que o senhor chegou, o meu filho, adepto do Rangers, diz-me que comecei a ficar com um ar preocupado. O que acha que vai acontecer este ano?” Caixinha responde-lhe diplomaticamente, sem se aventurar em prognósticos. O senhor ri-se e pergunta-lhe se pode ligar ao filho durante a viagem até ao centro. Meu dito, meu feito. Liga uma vez, nada. Liga duas, nada. À terceira, o filho lá atende.

“Filho, estou aqui com o teu treinador, dá-lhe uma palavra.” Caixinha assume o desafio. “Sean, mafriend, whats up? Good to hear from you. I just heard your father worried about Rangers. Thats a fact, we’ll gonna make him sad lots of days this season.” O táxi estaciona à porta do Café di Parma e saímos a rir. Antes de entrar no restaurante italiano, o taxista volta ao ataque e pede-lhe uma selfie. Depois, mais uma selfie com outro senhor. Lá dentro do Café di Parma, ninguém incomoda Caixinha. “Na última vez aqui, cruzei-me com o Brendan Rogers. Bom tipo.” Quem? O treinador do Celtic. Ouachhhh.

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