Os fundos de curto prazo, incluindo os que investem no mercado monetário, formam uma das fatias mais poderosas no negócio da gestão de ativos. Em Portugal, três em cada oito euros aplicados em fundos mobiliários são encaminhados para estes produtos de baixo risco. É possível que o leitor seja subscritor de um destes instrumentos, porque há cerca de 250 mil investidores nestes fundos de curto prazo, segundo as últimas estatísticas.

Se tem um fundo de curto prazo na carteira, saiba que é provável que os gestores estejam a fazer algo por si – contratar depósitos bancários – que faria melhor sozinho.

Excluindo algumas exceções, os fundos de curto prazo têm alcançado rentabilidades baixas, mas geralmente positivas para os aforradores. Nos últimos 12 meses, estes produtos renderam, em média, -1,06%. Todavia, este resultado está enviesado pelo mau desempenho do Patris Tesouraria, que perdeu 18,95%. Retirando este fundo da lista, o ganho médio foi praticamente nulo no último ano. É um registo longe dos valores dos últimos anos.

Retornos em dieta
A rentabilidade anual dos fundos de curto prazo está próxima de zero, excluindo o Patris Tesouraria, que perdeu 18,95% nos últimos 12 meses.
Fundo Rentabilidade anualizada Comercialização
1 ano 3 anos 5 anos
CA Monetário 0,36% 0,93% 1,56% Crédito Agrícola
Santander Multitesouraria 0,25% 0,14% 0,74% Banco Best, Banco Big, Santander Totta
NB Liquidez 0,24% 1,25% n.a. Banco Best, Banco Invest, Novo Banco
Montepio Tesouraria 0,21% 0,43% 1,49% Montepio
IMGA Extra Tesouraria III 0,16% 0,68% 1,58% Millennium bcp
Caixagest Liquidez 0,14% 0,53% 1,04% Banco Best, Caixa Geral de Depósitos
Caixa Fundo Monetário 0,14% 0,62% 1,22% Caixa Geral de Depósitos
NB Tesouraria Ativa 0,13% 0,92% 2,30% Banco Best, Banco Invest, Novo Banco
IMGA Liquidez 0,09% 0,46% 1,17% ActivoBank, Millennium bcp
BPI Liquidez 0,08% 0,43% 1,02% Banco BPI
Lynx Euro Tesouraria 0,04% 0,33% 0,81% Lynx Asset Managers
Montepio Monetário Plus 0,04% 0,29% 0,76% Montepio
BPI Monetário Curto Prazo 0,03% 0,33% 0,95% Banco BPI
Montepio Monetário de Curto Prazo 0,03% 0,22% 0,73% Montepio
Banif Euro Tesouraria -0,05% 1,22% 2,66% Banif – Banco de Investimento
Popular Tesouraria -0,41% 0,56% 1,94% Banco Popular
Banco BIC Tesouraria A EUR -1,59% 0,73% 3,10% Banco Best, Banco BIC, Banco Invest, Dunas Capital
Patris Tesouraria -18,95% -4,97% -1,92% Fincor
Fonte: Observador. Dados: CMVM. Rentabilidades a 3 de maio de 2016. n.a. = não aplicável.

À medida que os gestores destes produtos aumentam a aplicação em depósitos a prazo, não espere que os desempenhos se mantenham nos próximos 12 meses.

Que se passa com o Patris Tesouraria?

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O Patris Tesouraria “está quase morto”, diz Martim Amaral Neto, responsável pelos fundos de investimento da Patris Gestão de Activos. A sociedade gestora decidiu encerrar o fundo em 2015, mas enfrenta uma dificuldade: a carteira inclui papel comercial da Abengoa para o qual não encontram comprador. Em novembro, a Abengoa iniciou um processo de insolvência, dificultando a venda dos títulos. No dia do anúncio da Abengoa, o Patris Tesouraria desvalorizou 9,52%.

Patris Tesouraria
Valor da unidade de participação entre maio de 2011 e maio de 2016

Dados: Bloomberg.

Três quartos em depósitos

Os fundos de curto prazo investem maioritariamente no mercado monetário. Os seus gestores não podem, por exemplo, aplicar o dinheiro dos aforradores em ações ou em mercadorias. Normalmente, as carteiras são compostas por ativos cujas maturidades são atingidas nos próximos 12 meses. Em alguns casos, como nos fundos do mercado monetário de curto prazo, a maturidade residual é inferior a quatro meses, em média.

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No final de março de 2016, quando as sociedades gestoras divulgaram pela última vez as carteiras dos produtos, 75% do património dos fundos de curto prazo estavam parqueados em depósitos à ordem e a prazo. “É uma situação natural na atual conjuntura de mercado”, diz José Veiga Sarmento, presidente da Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios. “O que se vinha verificando é que a maioria das emissões de instrumentos do mercado monetário era efetuada por bancos que agora estão mais limitados nessas operações em virtude das novas regras em matéria de solvência e de requisitos de capital que lhes são impostos”, o que conduziu a uma “escassez de instrumentos do mercado monetário”, explica o líder da APFIPP. “À falta de instrumentos do mercado monetário disponíveis e elegíveis, estes fundos têm que investir em depósitos.”

Até 100% em depósitos
Os gestores de fundos de curto prazo têm investido cada vez mais em depósitos bancários.
Fundos Proporção da carteira em depósitos Taxa média dos depósitos Taxa de encargos correntes
(31 de março de 2016) (última informação disponível)
Eurobox 100,12% 0,00% 0,56%
Caixa Fundo Monetário 94,27% 1,00% 0,43%
Montepio Monetário de Curto Prazo 93,52% 0,32% 0,39%
Montepio Monetário Plus 92,70% 0,31% 0,42%
Caixagest Liquidez 89,58% 0,31% 0,41%
CA Monetário 86,83% 0,33% 0,27%
IMGA Extra Tesouraria III 82,61% 0,50% 0,36%
BPI Monetário Curto Prazo 63,74% 0,13% 0,17%
NB Liquidez 55,80% 0,19% 0,55%
Montepio Tesouraria 50,31% 0,56% 0,73%
Lynx Euro Tesouraria 49,13% 0,55% 0,78%
Banco BIC Tesouraria 47,71% 0,60% 0,90%
IMGA Liquidez 46,93% 0,37% 0,38%
BPI Liquidez 43,47% 0,32% 0,31%
Banif Euro Tesouraria 33,63% 0,02% 0,52%
Santander Multitesouraria 31,79% 0,40% 0,88%
Patris Tesouraria 25,19% 0,00% 0,75%
Popular Tesouraria 10,12% 0,00% 0,65%
NB Tesouraria Ativa 4,82% 0,00% 0,59%
Fonte: entidades gestoras via CMVM.

“Sendo o objetivo do fundo a preservação de capital, é normal que os depósitos assumam uma grande expressão nos investimentos, uma vez que estes contribuem para uma volatilidade muito reduzida da rendibilidade do fundo”, explica José Valente, o gestor do CA Monetário, o fundo mais rentável no último ano.

O Eurobox levava o investimento em depósitos ao extremo. Todos os ativos deste produto eram depósitos bancários no final de março. Aliás, as aplicações em liquidez ultrapassavam 100% do património, porque o fundo tinha um ligeiro passivo. Alguns dias depois, a administração da sociedade gestora, a Fund Box, decidiu liquidar o Eurobox, o que foi concretizado no final de abril. “Perdemos interesse na gestão de um fundo de mercado monetário”, conta Rui Alpalhão, administrador e acionista da Fund Box. Alpalhão revela que a Fund Box tem em curso o registo como sociedade gestora de organismos de investimento alternativo e que irá “concentrar-se na gestão deste tipo de fundos”.

Do ponto de vista dos gestores de fundos de curto prazo, os depósitos têm uma vantagem: são os únicos ativos que, por força da lei, não desvalorizam. Mesmo assim, alguns fundos de curto prazo continuam afastados dos depósitos a prazo. Muitas vezes, como no caso do NB Tesouraria Ativa, o regulamento de gestão limita o peso que os depósitos podem ter na carteira do fundo.

Há taxas mais altas

A análise do Observador revela que os 816 depósitos constituídos pelos fundos de curto prazo rendem uma taxa anual bruta média de 0,32%, de acordo com a composição detalhada das carteiras em março de 2016, publicadas através do portal da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários. Esse valor compara desfavoravelmente com as taxas de juro dos depósitos a prazo disponíveis aos particulares. Nesse mês de março, os novos depósitos a prazo até um ano contratados em Portugal receberam uma taxa média de 0,47%, segundo o Banco de Portugal.

Não conte que os fundos de curto prazo continuem a contratar taxas médias de 0,32%. Muitos dos depósitos foram subscritos pelos gestores de fundos em 2015, quando as taxas de juro estavam mais altas. Entre os 816 depósitos analisados, o Banco BIC Tesouraria tinha o mais generoso: em maio de 2015, os gestores conseguiram 1,85% em aplicações de cerca de um milhão de euros durante um ano. Nem mesmo os maiores depósitos recentes conseguem taxas mais elevadas. O maior depósito, de 150 milhões de euros, foi feito pelo Caixagest Liquidez junto do BBVA em março passado, mas conseguiu apenas uma taxa anual de 0,07% para um prazo de 14 dias.

Um gigante chamado Caixagest Liquidez

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Um terço de todo o dinheiro em fundos de curto prazo está no fundo do mercado monetário Caixagest Liquidez. Tem uma carteira de 1,6 mil milhões de euros, a maior entre todos os fundos geridos em Portugal. O segundo maior, o seu irmão Caixa Fundo Monetário, não chega aos 630 milhões de euros.

Vale tudo para conseguir taxas mais generosas nos depósitos. Os gestores do IMGA Extra Tesouraria III transferiram dinheiro para fora da Portugal: fizeram aplicações no espanhol Sabadell, que lhes deu, no máximo, 0,40%.

Mesmo que as taxas dos depósitos se mantenham em 0,32%, os investidores deverão perder dinheiro pela via das comissões cobradas. Como se pode ver no quadro anterior, os fundos de curto prazo têm taxas de encargos correntes, que refletem o peso das comissões e de outros custos ao longo de um ano, de 0,53%, em média. Estas percentagens indiciam perdas futuras para a maioria dos subscritores.

Se o seu banco não lhe paga taxas brutas superiores a 0,32% na contratação de depósitos a prazo – a Caixa Geral de Depósitos não vai além de 0,25% e o Banco BPI não passa de zero a 12 meses, por exemplo –, pondere abrir conta noutra instituição com depósitos mais atraentes.

Em que bancos consegue mais?
Estes são os depósitos a prazo não promocionais até 1 ano que pagam as taxas de juro mais altas em Portugal. Recebe entre 0,9% e 2% por ano depois de descontar impostos.
Banco Depósito Taxa anual bruta Mínimo Máximo
BNI Europa BNI Europa 92 dias 2,78% 10.000€ 50.000€
BNI Europa BNI Europa 183 dias 2,10% 10.000€ 50.000€
BNI Europa BNI Europa 366 dias 2,00% 10.000€ 500.000€
BNI Europa Depósito 183 dias 1,75% 10.000€ 50.000€
BNI Europa Depósito 92 dias 1,50% 10.000€ 500.000€
Montepio Montepio 4D 1,30%* 5.000€ 100.000€
Atlântico Europa Atlântico Plus 12 Meses 1,25% 25.000,01€ 250.000€
Atlântico Europa Juro Mensal (360 dias) 1,25% 10.000€ 250.000€
Fonte: bancos a 9 de maio de 2016. *Taxa média. Exige quatro produtos ou serviços do Montepio.

Os depósitos a prazo não têm custos, mas as contas à ordem que lhes serve de base podem ter. Confirme a ausência de custos antes de abrir uma conta à ordem para contratar um depósito a prazo.

Que vantagens têm os fundos de curto prazo?

Não só é possível ganhar claramente mais em depósitos a prazo do que em fundos de curto prazo, como os depósitos em bancos portugueses estão protegidos pelo Fundo de Garantia de Depósitos. Caso o dinheiro aplicado por particulares no depósito a prazo fique indisponível, o Fundo de Garantia de Depósitos paga até 100 mil euros por cada depositante.

Os depósitos na maioria dos Créditos Agrícolas têm uma proteção semelhante pelo Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo. Quando os depósitos são realizados em sucursais de bancos estrangeiros, a segurança, normalmente também de 100 mil euros por titular, é dada por fundos de garantia estrangeiros. Por exemplo, os depósitos no espanhol Bankinter estão protegidos pelo Fondo de Garantía de Depósitos de Entidades de Crédito.

José Veiga Sarmento, presidente da APFIPP, confirma que os fundos de curto prazo não são abrangidos por um fundo de garantia, mas salienta uma “vantagem enorme”: liquidez. “Num depósito a prazo, o investidor tem, na maioria dos casos, que permanecer até final do prazo contratado para receber a remuneração estipulada, perdendo o direito ao recebimento de juros em caso de reembolso antecipado”, recorda. “Nos fundos do mercado monetário, não há esse constrangimento, e a todo o tempo o investidor pode solicitar o resgate das suas unidades de participação, mantendo a rendibilidade que acumulou com a sua participação”, acrescenta. Veiga Sarmento defende que estes fundos são mais uma “alternativa remunerada aos depósitos à ordem” do que comparáveis aos depósitos a prazo.

Se tem a certeza sobre o prazo do seu aforro, em vez de fundos de curto prazo, prefira a segurança de um depósito a prazo para aplicações até um ano, mesmo que seja preciso abrir conta noutro banco. Se a sua aplicação é para um prazo superior, pense nos produtos do Estado, como o Observador recomendou para 2016, mas não avance para a subscrição das novas Obrigações do Tesouro de Rendimento Variável.

David Almas é analista financeiro independente registado na CMVM com o número oito. O autor trabalha subordinado ao Código Deontológico dos Jornalistas.