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Agora foi o Brad Pitt e a Angelina Jolie. Brangelina, se preferirem – mas avisa-se desde já que estes nomes com que a imprensa confunde milénios de civilização e junta dois indivíduos num são, geralmente, sintoma certinho de que a coisa não dura muito. Veja-se TomKat – Tom Cruise e Katie Holmes. Ou Bennifer – aliás, Ben Affleck e Jennifer Garner, mais tarde adaptados a Ben&Jen, o que também daria um excelente nome para uma dupla de desenhos animados, uma gelataria, ou mesmo uma sociedade cabeleireiro/unhas de gel. Não dá. Isso de sermos um só pode ter dado muita canção pop, mas é uma impossibilidade física e filosófica. Para o bem ou para o mal, estamos condenados a estar sozinhos dentro destes sapatos, atrás destes olhos, toda a vida à procura de sermos compreendidos. Da arte ao amor, todo o esforço humano vai nessa direcção – todo. O cinema faz-nos sonhar que tudo isto é possível; o brutal “the end” subentendido no final das histórias reais deixa-nos mais perdidos do que antes. A verdade é que, em matéria de histórias de amor, há de tudo em Hollywood – até as que correm bem. E isto é o que temos aprendido com elas.

Angelina Jolie & Brad Pitt (2005-2016)

LONDON, ENGLAND - MAY 08: Brad Pitt and Angelina Jolie attend a private reception as costumes and props from Disney's "Maleficent" are exhibited in support of Great Ormond Street Hospital at Kensington Palace on May 8, 2014 in London, England. (Photo by Anthony Harvey/Getty Images)

Bem vistas as coisas, tratava-se de um caso escandaloso de distribuição desigual da beleza. Eram provavelmente o homem mais bonito e a mulher mais bonita do mundo quando se conheceram na rodagem de “Mr. & Mrs. Smith”. Deixaram para trás as listas de celebridades que já tinham frequentado as suas vidas sentimentais e fecharam para balanço. Nos intervalos dos processos de adopção de um décimo dos órfãos do planeta, davam seguimento às respectivas carreiras, ambos com muito talento, mas ele com mais jeito para escolher guiões. 11 anos depois, ela põe-lhe as malas à porta. Para muitos, é o fim do conto de fadas perfeito e o sinal definitivo de que já nada é para sempre. Da nossa parte, nunca esperámos outra coisa – Billy Bob Thornton, anterior marido de Angelina, já o explicara: isso de querer salvar o mundo é muito bonito, mas há dias em que um homem só quer ver o seu jogo de futebol e beber a sua cerveja.

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Gloria McLean & James Stewart (1949-1994)

29th August 1950: Film star James Stewart (1908 - 1997) with his wife Gloria Hatricck McLean. (Photo by Harold Clements/Express/Getty Images)

Contracenou com algumas das mais espampanantes louras de Hitchcock – Grace Kelly, Doris Day, Kim Novak – mas foi encontrar o amor ao lado da discreta morena Gloria McLean. Embora tivesse sido uma das maiores estrelas da Hollywood do seu tempo, a Jimmy nunca se lhe conheceu o típico currículo amoroso em série habitualmente anexo ao estatuto. Tinha já 41 anos quando casou pela primeira e única vez na vida, adoptando os dois filhos de Gloria que, apesar de dez anos mais nova, já trazia um casamento e um divórcio para contar. Tiveram mais dois filhos e viveram juntos 45 anos, até ao dia em que Gloria morreu. Três anos mais tarde, quando chegou a vez de Jimmy, estas foram as suas últimas palavras: “Agora, vou ter com a Gloria.”. Ensinamento: é possível.

Joanne Woodward & Paul Newman (1958-2008)

American actor Paul Newman (1925 - 2008) with his wife, actress Joanne Woodward, 3rd February 1958. (Photo by Alan Meek/Daily Express/Hulton Archive/Getty Images

Parece que foi amor à primeira vista. Mas, quando se conheceram nos ensaios de “Picnic”, peça de William Inge, Paul era casado e tinha a mulher, Jacqueline, à espera de um filho. Só que o que tem de ser tem muita força. Cinco anos depois, voltaram a encontrar-se, então para a rodagem de (nem de propósito) “Paixões que Escaldam”, de Martin Ritt. Dessa vez, tiveram a certeza… Paul pediu o divórcio a Jacqueline e casou com Joanne no dia seguinte. Impulsivo? Talvez. A verdade é que estiveram juntos até Paul morrer, 50 anos depois. Durante esse meio século, retiraram-se da feira de vaidades de Hollywood para o sossego do Connecticut, tiveram três filhas, conduziram a altas velocidades sempre que puderam e arriscaram tudo numa coisa muito maluca: voltar a trabalhar juntos. Uma e outra e outra vez – e, às vezes, até com um a mandar no outro, como no idos de 68, quando Paul dirigiu Joanne em “Raquel, Raquel” e ela foi nomeada ao Óscar de melhor actriz. Em 1990, já ela tinha 60 anos e ele 65 e ainda andavam a contracenar no “Mr. & Mrs. Bridge” de James Ivory. Nunca se cansaram um do outro. Para Paul, a questão era simples: “Isto pode soar um bocadinho tonto, mas é verdade. Eu tenho bife em casa. Porque é que hei-de ir à rua comer um hambúrguer?” Noutra ocasião, cansado das perguntas sobre o segredo de casamento tão duradouro, soltou apenas: “Não sei o que é que ela põe na minha comida.” Ensinamento: sentido de humor, rapaziada. Isto o que é preciso é gostar do outro e ter muito sentido de humor.

Elizabeth Taylor & Richard Burton (1964-74; 1975-76)

6th March 1964: Elizabeth Taylor gives her future husband Richard Burton (1925-1984) a cursory haircut. (Photo by William Lovelace/Express/Getty Images)

Há o pessoal que acreditou, há o pessoal que se desiludiu e depois há estes dois. Elizabeth Taylor e Richard Burton amavam-se tão estupidamente que casaram duas vezes. Um com o outro, queremos dizer. Aliás, de uma forma geral, Elizabeth e Richard eram dois corações generosos, dois apaixonados, dois crentes. No total, ela casou oito vezes e teve sete maridos; ele não conseguiu tanto, mas não desmereceu: cinco casamentos e quatro mulheres. Viveram juntos 10 loucos anos no auge das respectivas carreiras de 1964 a 74, e voltaram para o encore na temporada 1975/76, como quem regressa ao lugar aonde já foi feliz, ou ao local do crime, ou como quem fica à espera do raio que afinal nunca cai duas vezes no mesmo sítio, ou aquece o café que arrefeceu e não volta a ter o mesmo sabor, enfim, essas coisas todas que sempre se dizem. Só durou um ano, mas como lhes resistir? No fim, Liz deixou bem claro: continuava a amar Richard com toda a sua alma, mas não podiam estar juntos; juntos destruíam-se. Contracenaram em 11 filmes, incluindo históricos como “Cleópatra” ou “Quem Tem Medo de Virginia Woolf?”. Em 1969, ele ofereceu-lhe um dos maiores diamantes do mundo – uma pedra colossal de 244 quilates, mais conhecida como “o diamante Taylor-Burton”. Depois dos divórcios, ela vendeu-o, não por despeito, mas para financiar um hospital no Botswana. Querem melhor do que isto? Nem nos filmes. É o que Hollywood tem aqui para nos mostrar: os diamantes podem ser para sempre, mas ninguém disse que seriam sempre nossos.

Mia Farrow & Woody Allen (1980-1992)

UNDATED FILE PHOTO: Woody Allen and Mia Farrow. (Photo by Diane Freed)

Fizeram 13 filmes juntos, incluindo alguns dos melhores das respectivas carreiras: “Zelig”, “A Rosa Púrpura do Cairo”, “Ana e as suas Irmãs”, “Crimes e Escapadelas”. Eram um casal dentro e fora do plateau e, de algum modo, o símbolo de um certo romantismo que também era possível no mundo intelectual, filosófico, irónico e quantas vezes cínico da vasta claque de Allen. Até que Mia descobriu que Woody tinha um caso com uma das filhas adoptivas dela: Soon-Yi Previn, então uma jovem coreana de 21 anos, que Farrow e o ex-marido, André Previn, retirara das ruas de Seul. Bom, aqui o ensinamento é mais ou menos simples: se queres que a coisa corra bem, tenta manter-te longe dos filhos e enteados do outro. Contudo, há uma segunda maneira de olhar para o caso: a verdade é que Woody foi casado três vezes, mas nenhuma das quais com Mia. Durante aqueles 12 anos, de resto, nem viviam na mesma casa, mas em apartamentos quase em frente um ao outro, porém separados pelo Central Park. Ele foi casado com Harlene Rosen de 1956 a 59, Louise Lasser de 1966 a 70 e… com Soon-Yi – até hoje. Isto é, a verdadeira história de amor não era com Mia, mas com a enteada. Estão juntos há 24 anos e, graças a isso, Woody até pôs termo à outra grande relação da sua vida: os 37 anos de consultas de psicoterapia.

Nicole Kidman & Tom Cruise (1990-2001)

U.S. actor Tom Cruise and his wife Nicole Kidman pose for photographers 18 May, 1992 prior to the screening of the film "Far and Away" by U.S. director Ron Howard at the end of the 45th Cannes Film Festival. (Photo credit should read MICHEL GANGNE/AFP/GettyImages)

Hoje pode parecer mentira, mas houve ali uma altura em que toda a gente acreditava neste casal. Conheceram-se em “Dias de Tempestade”, era já Cruise um dos actores mais populares e poderosos de Hollywood e Kidman uma menina bonita com aspirações a um lugar ao sol. A verdade é que, durante aqueles 11 anos, Cruise fez os seus melhores trabalhos: “Uma Questão de Honra”, “Entrevista com o Vampiro”, “Magnólia”, “De Olhos Bem Fechados”. Neste último, o derradeiro Kubrick, contracenava justamente com Kidman (então a provar ser, pelo menos, tão actriz como ele), no papel de um casal a passar uma dura crise de confiança. Dois anos depois, separaram-se e, a seguir, foi sempre a descer. Kidman viveria entre os problemas de alcoolismo do segundo marido, o músico de terceira linha Keith Urban, e os seus próprios problemas com o envelhecimento e as plásticas; Cruise entraria numa impressionante espiral que o haveria de levar de mais amada a mais detestada estrela de Hollywood e que, ainda hoje, carece de explicação. Andou com Penélope Cruz, separou-se de Penélope Cruz, casou com Katie Holmes, separou-se de Katie Holmes, tornou-se mais conhecido como porta-voz da Cientologia do que pela sua fabulosa carreira no cinema. Diz-se, aliás, que era a igreja quem lhe selecionava as namoradas – e não eram fontes anónimas; Paul Haggis, respeitado argumentista e realizador e ex-membro do culto, foi daqueles que, a dado momento, confirmou a história. Cruise, que antes de Kidman já fora casado com Mimi Rogers, outra actriz aspirante, e que antes disso namorara com Cher (moça que tinha à época quase o dobro da idade dele) tem hoje 54 anos e quase o mesmo aspecto de há 30, quando foi o Maverick de “Top Gun”, de maneira que, se tem alguma relação estável, deve ser com o diabo. Em todo o caso, o que Hollywood aqui nos mostra é que quem muito escolhe pouco acerta. E que, para seitas esquisitas, talvez baste o nosso clube de futebol.

Divine Brown & Hugh Grant (meia hora em 1995)

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Grant era um sex symbol, um actor talentoso e bem sucedido, que namorava há oito anos com a deslumbrante modelo e actriz Elizabeth Hurley. Até ao dia em que foi apanhado pela polícia no carro, em plena via pública, a receber sexo oral de Divine Brown, uma até então anónima prostituta das ruas de Los Angeles. “Que diabo te passou pela cabeça?”, perguntou-lhe, mais ou menos assim, Jay Leno, a abrir uma entrevista no “Tonight Show” que iniciaria a tentativa de remissão pública de Grant. Ele, que naquele ano atingira o ponto mais alto da carreira com “Quatro Casamentos e um Funeral” (valendo-lhe, entre outros, um BAFTA de melhor actor), nunca mais saiu do patamar que então estabeleceu: boas comédias românticas e quase nada mais. Foi como se o caso Brown lhe tivesse colado um rótulo de displicência e que, portanto, não merecia ir além do ponto aonde chegara. Liz Hurley, obviamente, foi à vida dela – reatariam uns anos mais tarde, mas sem sucesso. Já Divine reconhece que o acontecimento lhe mudou a vida. Em entrevista ao Daily Mail em 2010, comparava-se à personagem de Julia Roberts em “Pretty Woman” e explicava que, graças àquela meia hora com Grant em 95, pôde comprar tudo o que alguma vez sonhou. E foi assim que Hollywood nos ensinou que, em princípio, no amor, é importante manter o fecho zipper fechado quando se está fora de casa. Mas tudo depende do lado de que se apresente.

Miss Piggy & Sapo Cocas 1976-2015

2015 Sackler Center First Awards

Viveram uma relação intensa desde a primeira aparição dela n’“Os Marretas”. Era um amor conturbado, amiúde visitado pelo ciúme e, aqui e ali, até por uma alguma agressividade física; porém, sempre corajoso e inspirador. Se até aquelas duas criaturas tão diferentes se podiam entender, então o amor podia vencer tudo – diferenças de raça, religião, aspecto, background. No Verão de 2015, quando estavam à beira do 40º aniversário, surpreenderam o mundo com o anúncio da separação. Continuariam a dar-se bem, a respeitar-se e até a trabalhar juntos, mas Cocas não deixou de aproveitar a oportunidade para comunicar que já tinha uma nova relação: uma outra porca, de nome Denise, funcionária do departamento de marketing da ABC. Foi uma saída limpa, o que, tendo em conta a natureza dos protagonistas, não é dizer pouco. Neste caso, Hollywood dá-nos não uma, mas duas lições muito claras acerca do amor. Lição nº 1: por mais que se tente, certos sapos nunca darão príncipes; lição nº 2: por outro lado, há sempre uma porca.

E os outros

Aparentemente, o recorde para a relação mais longa da história de Hollywood é detido por Bob e Dolores Hope, que foram casados 69 anos, de 1934 até à morte de Bob, aos 100 anos, em 2003. Hoje, damos por nós a escrever artigos nos jornais por causa do fim de uma relação de 11. Mas ainda é cedo para decretar oficialmente extinto em Hollywood o amor eterno. Warren Beatty e Anette Bening, por exemplo, estão juntos há 24 anos – nada mau – e Christopher Walken e Georgianne Walken há uns notáveis 47 – e sem filhos, refira-se por curiosidade. Entre uns e outros, temos Denzel Washington e Pauletta Pearson, casados há 33 respeitáveis anos, os mesmos que o look rock’n’roll de Kurt Russell e Goldie Hawn, porventura, nunca faria adivinhar que já levam de vida em comum. E há ainda Tom Hanks e Rita Wilson, juntos há 28 anos, tal como Kevin Bacon e Kyra Sedgwick, que começaram a namorar andavam pela casa dos vintes, mas que se conheciam já do tempo em que Kyra foi dizer a Kevin que tinha estado muito bem, no fim de uma peça de teatro, tinha ele 19 anos e ela 12… De maneira que, em Hollywood, o amor é exactamente como em Vila Nova de Famalicão, Mesão Frio ou outro sítio qualquer: pode falhar quando tem tudo para dar certo e funcionar quando nada o recomendaria.

Alexandre Borges é escritor e guionista. Assinou os documentários “A Arte no Tempo da Sida” e “O Capitão Desconhecido”. É autor do romance “Todas as Viúvas de Lisboa” (Quetzal).