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Os debates presidenciais podem mudar o rumo de uma campanha histórica. O primeiro é esta noite, às 2h00. Conseguirá Clinton domar o imprevisível Trump?

A época eleitoral dos EUA já começou há tanto tempo e tem sido tão acesa que nem a conta do número de dias que estão para trás será consensual. Se formos pelo número de dias que passaram desde que Hillary Clinton anunciou a sua candidatura, a 12 de abril do ano passado, a calculadora indica a passagem de 534 dias. Por outro lado, Donald Trump já disse que ia concorrer para ser o 45.º Presidente dos EUA há 469 dias. E a primeira fez que ambos foram a votos (nas primárias de cada um dos seus partidos), a 1 de fevereiro deste ano, no Iowa, já foi há uns distantes 239 dias.

Durante este tempo, foram várias as certezas que se foram esboroando, a começar pelas de jornalistas, analistas, académicos e comentadores, e acabando na opinião pública em geral. Afinal de contas, o caminho de Hillary Clinton até à nomeação do Partido Democrata esteve longe de ser um passeio, graças a um tal de Bernie Sanders, um senador socialista de 75 anos que lhe roubou tempo de antena e algum eleitorado jovem. E o que dizer de Donald Trump? Apenas conhecido, até ao verão de 2015, pela fortuna no ramo imobiliário e pelos seus reality shows, conseguiu derrotar de forma sistemática e implacável todos os 16 adversários — alguns com experiência política — que teve nas primárias do Partido Republicano.

O primeiro debate entre Trump e Clinton deverá ser o mais visto de sempre. Até agora, o recorde pertence ao primeiro encontro entre Reagan e Carter, em 1980, que foi visto por 80,6 milhões de pessoas. Agora, o número pode chegar aos 100 milhões.

Depois de tudo isto, Clinton e Trump vão finalmente encontrar-se para debaterem as suas diferenças naquilo que será o primeiro de três encontros entre os dois candidatos — haverá um quarto debate entre os candidatos a vice-Presidente, o democrata Tim Kaine e o republicano Mike Pence. Todos serão acompanhados em direto aqui, no Observador, em liveblog.

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A expectativa em torno do debate desta madrugada (começa às 2h00 de Lisboa) é tanta que alguns arriscam que vai ser o mais visto de sempre. Até agora, o recorde pertence ao primeiro embate entre o Presidente Jimmy Carter e o republicano Ronald Reagan, em 1980, que teve uma assistência de 80,6 milhões de pessoas. O duelo entre Clinton e Trump poderá chegar aos 100 milhões. Mais do que isso, só a transmissão em 1983 do último episódio da série M.A.S.H. (105,9 milhões) e as finais da Super Bowl desde 2010.

Perante tanta gente, será Clinton capaz de usar a sua experiência de mais de duas décadas junto das mais altas esferas do poder a seu favor para se sobrepor a um candidato visto como volátil e inexperiente? Conseguirá Trump explorar de forma eficaz as fragilidades da sua adversária, que a maior parte dos eleitores veem como desonesta, e ao mesmo tempo ganhar pontos em segmentos do eleitorado que até agora lhe têm escapado, como as minorias?

À medida que as eleições de 8 de novembro ficam cada vez mais próximas, as sondagens têm vindo a aproximar cada vez mais os dois candidatos, reduzindo a vantagem de Clinton para valores que já não podem ser considerados como confortáveis. O Huffington Post Pollster dá-lhe 4% de vantagem, o Real Clear Politics calcula a margem em 2,1% e o FiveThirtyEight em apenas 1,6%.

Difícil de ganhar, fácil de perder

Nem sempre os debates são decisivos para determinar o vencedor das eleições presidenciais norte-americanas. As exceções apareceram de 20 em 20 anos, com a vitória de Kennedy sobre Nixon em 1960; de Reagan contra Carter em 1980; e de Bush frente a Gore em 2000. No entanto, de acordo com os especialistas em debates presidenciais dos EUA contactados pelo Observador, 2020 pode esperar. É já nestas eleições, atípicas em vários domínios, que os debates podem ser cruciais. Tudo graças aos eleitores que ainda não decidiram em quem vão votar — e que poderão encontrar nos próximos debates as razões que até agora lhes faltavam para se inclinarem para um dos dois lados.

“Para quem ainda não decidiu em qual candidato votar, os debates podem ser particularmente significativos, porque neste momento eles ainda estão à espera, estão às voltas pela loja e ainda não sabem exatamente o que é que vão comprar”, disse ao Observador Alan Schroeder, autor do livro Presidential Debates: Risky Business on the Campaign Trail, numa entrevista por telefone. “90 minutos de televisão podem não ser suficientes para mudar a perceção de todos, mas alguns, pelo menos os que vão votar, terão de tomar uma decisão num futuro próximo.”

De acordo com uma sondagem da ABC e do Washington Post publicada na véspera do primeiro debate, 18% dos inquiridos disseram que “podem mudar de ideias” em função da prestação dos dois candidatos nos debates. Entre estes, 12% disseram que há uma “pequena possibilidade” de mudarem de ideias e 6% disseram que existe uma “possibilidade considerável” de alterarem a sua perceção após o debate.

"A maioria dos candidatos vai para os debates a rezar para que nada corra mal."
Alan Schroeder, autor do livro "Presidential Debates: Risky Business on the Campaign Trail"

“É muito difícil ganhar um debate e é muito fácil perdê-lo”, diz ao Observador Craig Lamay, autor do livro Inside the Presidential Debates. “Por vezes, já bastou a um candidato dizer qualquer coisa errada, ou até suspirar, para ser completamente afastado de uma vitória eleitoral”, diz, em alusão a Gerard Ford, que em 1976 disse que “não há um domínio soviético da Europa de leste”, e a Al Gore, cujos suspiros num debate contra George W. Bush deram a ideia de ser um candidato exasperado que encarava o seu adversário com desdém.

“É um formato muito arriscado e de certa forma o objetivo é sobreviver sem quaisquer danos. Se, pelo caminho, se conseguir causar danos no adversário, menos mal”, garante Schroeder. “Mas eu acho que a maioria dos candidatos vai para os debates a rezar para que nada corra mal.”

Segundo Lamay, “Hillary Clinton tem muito mais a perder do que Donald Trump”. “Há toda uma expectativa em torno da performance dela, porque é ela quem vai à frente nas sondagens”, explica. “E, geralmente, quem vai à frente nas sondagens não quer debater, porque, lá está, é muito difícil ganhar um debate e é muito fácil perdê-lo. Qualquer passo em falso pode arruinar as coisas como elas estão e alterar o rumo daí para a frente.”

Poderá Trump não ser… Trump?

“A personalidade conta muito”, resume Lamay. “Um deles será a pessoa que vai estar sentado frente a frente, na mesma mesa, com Putin. É a pessoa de quem se espera seriedade e uma postura correta, que não entre em pânico”, explica. Por oposição, o “conteúdo” dos debates é algo que por norma não merece tanta atenção por parte dos espectadores. “O que é dito nos debates já foi dito mil vezes antes, em comícios, discursos e entrevistas.”

É, pois, tudo uma questão de comportamento. E, aqui, as atenções viram-se para Trump. Nos debates das primárias republicanas, foi eficaz em conseguir desviar o centro da discussão da política para atirá-lo para um híbrido entre acusações (nem sempre) de cariz político para insultos e insinuações brejeiras. “Eu acho que o senhor Trump não estaria aqui se não tivessem sido os debates das primárias republicanas, que tiveram tanto de caóticos como de ordinários. Os pais tiveram de proibir os filhos de verem os debates porque às tantas eles estavam a discutir os tamanhos dos pénis uns dos outros”, recorda Lamay.

Agora, a conversa é outra, garante Lamay: “Os debates das primárias são — e os republicanos foram-no em particular — puro entretenimento. Os debates que agora vão começar são muito mais substanciais e sérios. Não é que sejam académicos, mas há um nível que tem de ser mantido”.

“Ele não pode evitar ser o Donald Trump, o homem tem 70 anos, já é tarde demais para mudar de personalidade até segunda-feira”, diz Schroeder, garantindo que a postura de Trump nunca poderá ser radicalmente diferente daquela que já lhe é conhecida.

"Trump é uma personalidade da televisão, sem a qual ele nunca estaria onde está hoje. Ele tem essa vantagem natural. Ele tem um conhecimento enraizado do que é que funciona naquele meio, daí haver muita gente que o elogia por 'não falar como um político', 'por dizer as coisas como elas são' e por aí em diante'."
Craig Lamay, autor do livro "Inside the Presidential Debates"

Uma coisa é certa: Trump nunca fez isto. É verdade que já entrou em debates políticos — 11, ao todo — durante as primárias republicanas, mas estes estiveram longe de ser de um para um, chegando a ter dez candidatos no mesmo palco. Assim, apesar de alguns desequilíbrios na distribuição de tempo, nenhum candidato teve de falar durante vários minutos de seguida.

“Trump é uma personalidade da televisão, sem a qual ele nunca estaria onde está hoje. Ele tem essa vantagem natural. Ele tem um conhecimento enraizado do que é que funciona naquele meio, daí haver muita gente que o elogia por ‘não falar como um político’, por ‘dizer as coisas como elas são’ e por aí em diante”, concede Lamay. “O problema para ele será arranjar maneira de falar para além dos slogans.”

Sobre a propensão de Trump para gaffes — quase uma imagem de marca do candidato, que recusa ser “politicamente correto” — Schroeder acredita que este não será um problema para o candidato republicano. “Em eleições anteriores, eram precisos dias para recuperar de um debate mal conseguido, porque ninguém quer que os títulos das notícias sobre os debates sejam sobre uma gaffe“, diz o especialista. “Mas desta vez é diferente, porque o número de gaffes de Trump já é tão grande que as pessoas já não vão ficar surpreendidas”, contrapõe.

Quanto a desafios para Trump neste debate, os dois especialistas estão de acordo. “Não pode ser um palhaço”, diz Schroeder. “Tem de convencer mais gente de que ele é a escolha sensata, mais sã, e por isso tem de adotar uma postura mais presidenciável”, explica Lamay.

47% acham que Clinton vai ganhar o debate, apenas 33% apostam em Trump

Segundo a sondagem que a ABC e o Washington Post lançaram na véspera do debate, 47% dos inquiridos acham que Clinton vai ter a melhor prestação no debate desta madrugada, ao passo que só 33% apostam numa vitória de Donald Trump.

No mesmo estudo, ficou mais uma vez demonstrado um dos maiores paradoxos destas eleições: apesar de os eleitores reconhecerem a Clinton maiores capacidades em vários tópicos, por vezes com uma vantagem considerável, essas mesmas pessoas dão a vitória à candidata democrata de uma forma muito pouco conclusiva.

Segundo aquela sondagem, o assunto mais importante das eleições — com 32% de escolhas — é a “economia e o mercado de trabalho”. Para os inquiridos, este é o único dossier (entre aqueles escolhidos pela ABC e pelo Washington Post) em que Trump é tido como mais competente do que a sua adversária, com uma vantagem de 47% para 45%.

De resto, Clinton vence em todas as categorias, por ordem de importância: terrorismo (46%-45%); ética e corrupção (44%-41%) e imigração (51%-42%). Noutros temas, que não figuram na lista de temas que mais preocupam os eleitores, a democrata continua a surgir na frente. É o caso de questões sociais como o aborto e o casamento homossexual (58%-30%); política de saúde (50%-39%); gestão de uma crise internacional (55%-36%) e capacidade de zelar pela classe média (50%-39%).

As sondagens demonstram que os eleitores acreditam que Hillary Clinton lhe reconhecem capacidade para lidar com varios dossiers, mas ao mesmo tempo estão reticentes em darem-lhe o seu voto. Porquê? Não confiam nela. 

No entanto, quando questionados sobre em quem é que devem votar, os inquiridos dão uma vantagem de apenas dois pontos percentuais a Clinton, que venceria com 46% dos votos, à frente dos 44% de Trump. Além destes, sobram 5% para Gary Johnson, do Partido Libertário; 1% para Gill Stein, do Partido Verde; 1% para nenhum deles; 3% de indecisos.

A pergunta parece óbvia: se os eleitores confiam de forma clara nas capacidades de Clinton para lidar com os dossiers presidenciais, porque é que não são claros na sua eleição?

Qual a resposta? Pista: avançar um pouco mais na sondagem, na parte em que se fala de honestidade” e confiança.

À pergunta “Acha que Hillary Clinton é honesta e confiável ou não?”, apenas 36% disseram que “sim” e outros 60% responderam que “não”. Trump não tem razões para ficar a rir — apenas 38% acham que ele é honesto e confiável, ao passo que 57% discordam —, mas pelo menos não está tão mal como Clinton.

“Aqui está um tipo que inventa factos, muda histórias, não assume responsabilidade por nada, não liga a políticas e a medidas e todos os dias diz coisas que são racistas ou sexistas. É um tipo fora do normal. Mas ao menos nós sabemos quem é que ele é”, diz Lamay. O mesmo não pode ser dito de Clinton. “Ela tem sido apresentada como uma mulher misteriosa, que esconde os seus e-mails, que tem algumas práticas manhosas com a sua fundação [a Clinton Foundation], que esconde problemas de saúde”, diz, apenas para enumerar algumas das várias polémicas com o carimbo Clinton.

Como entrar na cabeça de Donald Trump?

Enfrentar Trump, e lidar com o seu estilo de forma calma, sem se enervar, poderá ser o maior desafio para Hillary nos debates que se seguem. “O facto de ela ser mulher é garantia de que ela tem sempre algo a perder”, diz Lamay, depois de fazer uma declaração de interesses: vai votar na candidata democrata. “Se ela for firme na resposta, vai dar uma ideia de mulher histérica. Se for pensativa e mais recatada, vai haver gente que vai dizer que ela não é forte o suficiente.”

Também Schroeder acredita que o facto de ser “mais experiente e versada nos temas pode tornar-se numa desvantagem para Clinton, caso ela queira manter o debate num tom sério e ele [Trump] tenha uma estratégia diferente”. Ainda assim, acredita que Clinton será capaz de atingir um equilíbrio entre “charme” e “conteúdo”. “Em termos de estilo, ela está longe de ser má, ela já fez isto muitas vezes”, sublinha. (Apesar de nunca ter entrado em debates inter-partidários para presidenciais, é um facto que Hillary tem experiência de debates de um para um, como foi contra Barack Obama nas primárias de 2008 e nas primárias deste ano contra Sanders). “Ela consegue usar charme nos debates, ela sabe dizer uma piada de vez em quando, sabe ser espontânea… Já deu muitas provas disso”, garante Schroeder.

Mas, por mais provas que já tenha dado no passado, Clinton nunca esteve frente a frente com Trump. E Trump, já vimos, é único. Talvez por isso, parte da sua preparação para o debate tenha sido com Tony Schwartz, o ghostwriter do bestseller de Trump, The Art of The Deal (A Arte do Negócio, sem edição portuguesa). Talvez seja uma boa maneira de começar a entrar na cabeça de Trump.

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