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José Justino, neto do fundador da empresa, presidente do Conselho de Administração
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José Justino, neto do fundador da empresa, presidente do Conselho de Administração

José Justino, neto do fundador da empresa, presidente do Conselho de Administração

Esta startup tem quase 100 anos

Começou como uma pequena oficina especializada em arados e charruas de tração animal. Um século depois, a Galucho é líder de mercado, está em quase 100 países e continua a ser uma empresa familiar

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A história da Galucho confunde-se com a da agricultura do último século em Portugal. Uma e outra encontram-se e desafiam-se. Umas vezes, é a empresa de máquinas agrícolas que encontra soluções para as necessidades dos agricultores, outras, é ela que antecipa novos caminhos. Faltam três anos para a Galucho comemorar o primeiro centenário, mas já está a preparar o segundo século de vida.

“A Galucho foi fundada pelo meu avô José Francisco Justino, por volta de 1920. Abriu uma oficina de ferreiro, aqui em São João das Lampas [concelho de Sintra], e especializou-se no fabrico de arados, charruas, alfaias de tração animal, carroças e carros de bois”, diz José Justino, presidente do Conselho de Administração da Galucho e neto do fundador.

Nessa altura, a agricultura em Portugal ainda não era mecanizada e não havia qualquer produção de máquinas agrícolas no país. Os primeiros tratores chegam só nos anos 40 e eram importados de Inglaterra, mas não estavam adequados aos terrenos portugueses, muito mais duros e difíceis de trabalhar do que os britânicos. “As máquinas partiam-se com frequência e os agricultores recorriam à oficina do meu avô para fazer as reparações”. Apesar de não vir de uma família de empreendedores, José Francisco Justino tinha grande capacidade para identificar as oportunidades de negócio e de as aproveitar. O próximo passo foi produzir estas máquinas, para que se mostrassem mais eficazes no terreno. São feitos os primeiros protótipos desses equipamentos mais robustos e, de repente, a fábrica ficou pequena para o aumento da procura.

A década de 60 iniciava-se, assim, com a construção da nova unidade fabril. “A Galucho foi atrás da mecanização, mas foi também o polo de desenvolvimento da agricultura portuguesa, pois criou condições para ter máquinas mais adequadas”. O neto do fundador acredita que o progresso deste setor em Portugal se deve muito ao facto de ter existido na altura uma fábrica com a tecnologia e a dimensão da Galucho.

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A evolução do negócio trouxe não só a aposta em equipamento mais sofisticado, mas também o envolvimento dos filhos mais velhos no negócio. Segundo José Justino, se foi o avô que iniciou a Galucho, quem a projetou e a transformou no que é hoje, foram os filhos. “Cada um tinha uma função muito importante que ainda hoje corresponde à tradicional divisão das tarefas de gestão: havia o visionário, o homem das finanças, o da engenharia e dois mais direcionados para a área da produção – de transporte e de máquinas agrícolas. Era uma divisão perfeita e acho que foi isso que permitiu que a empresa tivesse este desenvolvimento. Eles eram todos muito bons no que faziam”, garante.

Galucho: de uma escala familiar para a industrial

Nos anos 50, a agricultura era a atividade de quase metade da população portuguesa, mas a mecanização tinha ainda pouca expressão, bem como o consumo de adubos químicos e de pesticidas. É a partir desta década que se começa a fazer um esforço para a industrialização do setor. Timidamente, a mecanização foi tomando posse da terra “e a Galucho foi-se adaptando, introduzindo as máquinas, até se tornar numa empresa de primeira linha”, garante.

Joaquim Pedro Torres, diretor-geral da Valinveste, Investimento e Gestão Agrícola, um dos maiores produtores de milho em Portugal e responsável pela Agroglobal – Feira das Grandes Culturas (um certame bienal profissionalizado). “Hoje, representa o que há de mais moderno, com material muito competitivo, sobretudo ao nível da resistência e da durabilidade.”

Nos anos 60, a empresa continua a desenvolver-se e começa a produzir à escala industrial. O fabrico das carroças em que começara por se especializar – ainda na oficina de José Francisco Justino – deu origem aos equipamentos de transporte: aos reboques agrícolas e às caixas de carga para os camiões. “Com esta dupla valência, conseguimos desde cedo fazer, mais facilmente, face às crises, pois quando há problemas num negócio, não há no outro”, explica o neto do fundador.

Esta nova etapa desenvolveu também a freguesia onde a fábrica se encontra, a vários níveis, nomeadamente no acesso à eletricidade: “No final dos anos 50, a nossa fábrica trabalhava com geradores, mas como precisava de crescer, necessitava de mais energia. Daí que tenha trazido a eletrificação, não só para as suas instalações, mas também para aqui, para São João das Lampas.”

Nessa época, as máquinas da Galucho penetraram com facilidade nas explorações agrícolas portuguesas. Por um lado, não tinham concorrência, por outro, não encontraram resistência, já que vinham facilitar o trabalho e aumentar a produção. A empresa iniciava a sua liderança do mercado, que continuou a garantir nos 50 anos seguintes, até hoje.

O crescimento prosseguia na metrópole, mas também nas antigas províncias ultramarinas, onde a agricultura era mais intensiva. “Começámos a fabricar as grades de disco pesadas, um novo tipo de produto, desenhado para ir ao encontro das necessidades daqueles terrenos. Conseguimos fazer máquinas muito grandes, com tratores de maior potência, mais robustas, mas também mais sofisticadas”, lembra José Justino.

A tempestade de Abril de 74

A revolução de Abril de 1974 acabou por travar a evolução da empresa nos territórios ultramarinos, tal como tinha sido desenhada. Em Angola, a fábrica acabada de construir não chegou a ser inaugurada, embora alguns negócios se mantivessem.

Na mesma época, em Portugal, a empresa – que acabara de duplicar o espaço de fabrico dos equipamentos – acompanhava com apreensão os tempos conturbados. “Depois de algumas incertezas, conseguimos as garantias necessárias do Governo para manter a fábrica no país. Mas já tínhamos algumas alternativas: podíamos ir para Marrocos ou para o Brasil.”

A fábrica em meados do século passado

Considerou-se que tinha interesse nacional, pelo que a empresa conhece, então, uma fase de grande expansão, começando a exportar para a Europa e, mais tarde, para o mundo inteiro, como a Argélia, Marrocos, Nigéria, Quénia, Vietname, Equador.

A relação com Joaquim Pedro Torres teve início nestes idos anos 70. É um dos principais produtores de milho do país – um total de 1300 hectares no Ribatejo e no Alentejo – e profundo conhecedor da história e dos equipamentos Galucho. A sua incursão no mundo agrícola começa ainda nos tempos da universidade quando, com um amigo, dá início a uma produção de melão. “O meu pai – com experiência nesta área – a certa altura, perguntou-me: «não tens dúvidas? Não tens nada para me perguntar?». Eu disse que não. Aceitou a minha resposta mas, como ele – sem o dizer – antecipava, foi um fracasso. De qualquer forma, aprendi muito. Lição que não doa, não ensina nada”, garante. E uma dessas lições foi, precisamente que “o saber de experiência feito é importantíssimo. A união de um pai que tenha trabalhado a terra com o conhecimento teórico de última geração do seu filho, são a mistura perfeita para trabalhar a terra”. De qualquer forma, acredita que este saber ancestral tem de saber aproveitar as tecnologias e o conhecimento científico que hoje são colocados à disposição dos agricultores de uma forma permanentemente renovada. Em nome de um futuro continuamente produtivo.

“O grande desafio da organização é associar esta experiência histórica e de grande valia, que as pessoas mais antigas da organização têm, aos modernos sistemas de gestão"
Fernando Romana, CEO da Galucho

Passar o testemunho

Esta forma de ver a passagem de conhecimento e evolução do setor vai ao encontro da visão da Galucho, que considera que foi precisamente a sua acumulação de experiências e de conhecimento transmitidos ao longo das gerações, que trouxe a empresa ao lugar de topo onde hoje se encontra. Segundo Fernando Romana, CEO da Galucho, “o grande desafio da organização é precisamente esse: associar esta experiência histórica e de grande valia que as pessoas mais antigas da organização têm, aos modernos sistemas de gestão, de forma a fazê-los chegar a um nível de competitividade mais flexível, que se consiga adaptar com muita rapidez às várias regiões, aos vários mercados e, inclusive, aos desafios de qualidade, que alguns clientes nos vão colocando”.

A verdade é que, se a empresa não investiu diretamente na propriedade agrícola, não deixa de sentir uma forte ligação a quem a trabalha, “não só em Portugal, mas também noutros países. Sobretudo porque uma parte muito importante do desenvolvimento do nosso produto tem a ver com o intercâmbio com os agricultores, sobre o que têm a dizer das nossas máquinas”, refere José Justino.

O novo agricultor português

A agir num setor que lhes diz respeito, o envolvimento dos agricultores é determinante. E são estes que a empresa tenta conhecer, de forma a ir ao encontro das suas necessidades. Para melhor identificar o seu cliente final desenvolveu, em conjunto com a revista Abolsamia, um “barómetro para a agricultura”. Foram realizados inquéritos aos 20 mil utilizadores da revista (agricultores, comerciantes, prestadores de serviços, professores, entre outros) e apresentados os dados para 2017. No próximo ano o estudo será repetido, para identificação de tendências.

Os resultados apresentados agora mostram que, até aos 54 anos, a maioria dos inquiridos vê o futuro do setor com otimismo. No entanto, a partir desta idade instala-se a descrença. Curiosamente, verificou-se que, quanto maior o grau académico apresentado, maior é a tendência para perspetivar o futuro da agricultura de forma positiva. Talvez Joaquim Pedro Torres tenha antecipado esta realidade: se juntarmos a experiência dos mais velhos – aliada a uma certa desconfiança e resistência aos novos tempos – ao otimismo e vontade de arriscar dos mais novos, podemos estar perante o bem-sucedido agricultor do futuro.

Joaquim Pedro Torres, diretor-geral da Valinveste, Investimento e Gestão Agrícola, um dos maiores produtores de milho em Portugal

HENRIQUE CASINHAS/OBSERVADOR

Na realidade, segundo o mesmo Joaquim Torres, este novo agricultor já existe e pode ser encontrado nas maiores feiras agrícolas de Portugal e do mundo. É interessado nas novas soluções, tem desejo de experimentar e quer ter sucesso. Feiras como a Agroglobal “vieram dar esta outra cara ao agricultor português”, afirma o responsável pelo certame. “Há uma abordagem ao negócio agrícola muito semelhante a outras áreas económicas que, apesar de não ser muito recente, ainda não se identificava como tendência. A terra já não é um ativo que as pessoas têm dificuldade em deixar de ter. Ela é cedida, alugada e vendida”, explica. E continua: “Incomodava-me que a imagem da agricultura portuguesa, e do agricultor, não fosse adequada à realidade. Acredito que a Agroglobal veio ajudar a tornar o reflexo deste profissional mais próximo do real”. Acrescenta ainda que “até os bancos reconhecem hoje no investimento agrícola uma segurança que não se costumava encontrar”. Serão estes, ventos de mudança?

Uma empresa com olhos no futuro

Neste caminho iniciado há quase 100 anos, a Galucho tem conseguido perceber o cliente final, preparando o seu terreno e procurando maximizar a sua produção, literalmente. Talvez por isso, já esteja presente em mais de 100 países do mundo. “Somos líderes deste setor com 60% de quota de mercado; temos uma operação em França e em Espanha e também na Argélia”, lembra o Presidente do Conselho de Administração. Mas não fica por aqui. Têm uma sucursal na Bulgária, que serve o mercado do Sudeste Europeu, e continuam à procura de novos mercados e soluções. Na Argélia vai avançar para a área do transporte e do ambiente: “Já temos as parcerias assinadas e vamos começar este ano o nosso negócio”, acrescenta o neto do fundador.

"“Fiz grande parte da minha carreira fora da empresa, voltei depois de 20 anos e sinto um grande orgulho em continuar esta obra de família”
José Justino, neto do fundador

“Eu nasci no perímetro desta fábrica, em casa. Foi aqui que brinquei e que cresci”, lembra. “Fiz grande parte da minha carreira fora da empresa, voltei depois de 20 anos e sinto um grande orgulho em continuar esta obra de família”. Para José Justino, as empresas familiares apresentam vantagens adicionais em alguns países que valorizam a componente histórica: “trabalhar com uma empresa portuguesa com 100 anos, dá uma garantia de solidez que outra empresa com menos tempo de existência não consegue dar”. Mas não esquece que uma empresa familiar não tem o futuro garantido só por si, limitando-se a passar o testemunho de geração em geração. “As pessoas têm de estar preparadas. Nesta altura, sou o único membro da minha geração que está na administração executiva, mas já estão no conselho de administração três membros da geração seguinte, como não executivos. Estão numa fase de preparação.”

Para levar a empresa para o próximo século, a Galucho conta ainda com um recém-criado conselho consultivo, com cerca de 20 membros de diversas áreas, que vão desde professores universitários a agricultores, passando por representantes dos seus concessionários e das autarquias envolventes. “Logo na primeira reunião deram-nos uma série de sugestões e ideias que vão ser aproveitadas para melhorarmos os nossos produtos, a nossa atuação, o nosso esforço de marketing e as nossas vendas”, explica o gestor.

Para a Galucho, o segredo para o futuro é, assim, o mesmo que o do passado: reconhecer e antecipar as necessidades dos clientes, identificar oportunidades de negócio e reinventar-se permanentemente. Deu bons resultados nos últimos 100 anos.

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