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© Hugo Amaral/Observador

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Governo deve evitar favorecer PME. Crescimento está nas grandes e nas 'gazela'

É um erro achar que as pequenas empresas são o motor da economia, disse o especialista em inovação da Casa Branca e líder da fundação que promove as políticas públicas de inovação tecnológica nos EUA.

Conselheiro da Casa Branca, presidente da Fundação para a Inovação e Informação Tecnológica norte-americana – cuja missão é criar e promover políticas públicas que permitam avançar com a inovação e produtividade tecnológica – e autor de livros como Innovation Economics: The Race for Global Advantage, Robert Atkinson é um dos nomes que faz soar o alarme quando o assunto é inovação. Em entrevista ao Observador, adiantou que é importante que Portugal se foque naquilo em que é bom, que as inovações não têm necessariamente de incluir tecnologia e que a biotecnologia aplicada à genética pode ser um dos caminhos para o futuro. Expressões que devem ficar retidas quando o pensamento for o do crescimento económico: especialização e agro cultura.

O homem que foi nomeado por Bill Clinton, ex-presidente dos Estados Unidos da América (EUA), para fazer parte da comissão que se dedica à “Nova Economia” (ligada à internet e à revolução da informação) falou com o Observador à margem do Dia da Inovação, evento organizado pela Associação Industrial Portuguesa. Sobre os gigantes da tecnologia, como a Google ou o Facebook, disse que podem “ficar presos no caminho”, que as empresas que atuam na economia das app podem estar sobrevalorizadas e que as políticas de privacidade de dados europeias estão a prejudicar a economia do Velho Continente.

Membro de vários departamentos estatais norte-americanos para as políticas de comunicação, inovação e empreendedorismo, Robert Atkinson adiantou que a atenção dos agentes económicos deve estar centrada nos “anormais”: aqueles que seguem em frente, mesmo quando lhes dizem que é errado, que são “estranhos”, num sentido positivo, e que lutam contra o status quo. Os olhos devem estar postos nos empreendedores.

"Acho que um país como o vosso não deve perder de vista que a inovação pode ser construída sob coisas que já existem e em que o país tem dado provas de ser bom"
Robert Atkinson

Fala-se muito em produtos inovadores. Na verdade, o que são ou qual é o seu segredo?

São aqueles que têm valor para o consumidor, que resolvem um problema que ainda ninguém conseguiu resolver. E que o fazem de uma forma nova. Tem que ser algo que as pessoas queiram realmente e que estejam dispostas a pagar para tê-lo. Ter uma ideia muito boa é importante, mas se não estiver a ser requisitada no mercado, então não é realmente inovação. E os produtos inovadores não têm de ter necessariamente tecnologia, apesar de esta ser cada vez mais uma componente da inovação. Há muitas inovações que são não tecnológicas.

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E o que é que pode ser uma ideia muito boa?

Aquela cadeira em cortiça que foi impressa numa impressora 3D é uma ideia boa, por exemplo [refere-se a uma cadeira que estava em exibição no Centro de Congressos de Lisboa].

Porquê?

Bem, porque combina duas coisas: um material muito tradicional… A verdade é que quando estava na escola, aprendi duas coisas sobre Portugal: uma foi o vinho, a outra foi a cortiça. Por isso, quando penso em Portugal, penso em cortiça. Mas agora, espera: uma impressa 3D para cortiça? Isso é muito doido! É selvagem! Acho que um país como o vosso não deve perder de vista que a inovação pode ser construída sobre coisas que já existem e em que o país tem dado provas de ser bom.

E em que é que Portugal é bom?

Não posso responder a essa pergunta, porque não tenho um conhecimento profundo sobre o que tem estado a ser feito. Mas acho que posso dizer duas coisas. Uma delas é esta: há países que estão a cometer o erro de tentar fazer demasiadas coisas ao mesmo tempo. O Brasil, por exemplo. E devem, antes, focar-se em dez ou 20 coisas em que se considerem bons e construam algo a partir daí. Tentem especializar-se. Se começarem a dispersar, vai ser muito mais difícil. A segunda coisa é: não assumam que as inovações são sempre tecnológicas. O que é que pode ser um bom exemplo disto? A Dinamarca. A Dinamarca é um dos países líderes do mundo na produção de energia eólica. É um país pequeno, que por acaso tem muito vento e empresas que puderam construir algo a partir daí. E está a tornar-se numa indústria de nicho muito importante.

"Há países que estão a cometer o erro de tentar fazer demasiadas coisas ao mesmo tempo. O Brasil, por exemplo. E devem, antes, focar-se em dez ou 20 coisas em que se considerem bons e construam algo a partir daí"
Robert Atkinson

E, em Portugal, faz ideia de qual poderia ser esse nicho?

Acho que o nicho pode estar nos negócios relacionados com agro cultura, mas existem já muitas coisas a acontecer nesse campo. Como criar inovação aí? Francamente, acho que vai ser possível com a biotecnologia aplicada à genética. Totalmente.

Só na agricultura? Ou também no mar?

Sim. No mar, completamente. Sem dúvida. Todas as coisas que estejam relacionadas com a Vida, seja agro cultura ou árvores, madeira, etc. Vai ser inovação genética, o que é algo difícil de fazer na Europa. Mas é a chave. Quer saber porque é que os EUA estão à frente na biotecnologia? Porque nós gostamos de biotecnologia.

Então, acha que a Europa devia promover mais a biotecnologia?

Absolutamente. Não temos de ser todos doidos por biotecnologia e é um setor que tem de ser regulado pelo Governo, como é óbvio. Mas acho que a forma como a Europa tem diabolizado o setor é um grande erro.

Robert Atkinson acha que Portugal deveria olhar para a biotecnologia como um futuro

© Hugo Amaral/Observador

Segundo dados recentes, as empresas portuguesas ainda estão muito dependentes do crédito bancário e de capitais próprios para financiarem a Investigação & Desenvolvimento. O que é que pode ser feito para atrair mais investimento estrangeiro?

Acho que vai ser muito difícil atrair investimento, porque Bruxelas está a diabolizar as empresas de tecnologia norte-americanas. Algumas autoridades da Comissão Europeia chegaram a dizer que empresas como a Google são uma ameaça fundamental à democracia, o que é pura demagogia. Não faz sentido nenhum dizer uma coisa desse tipo. A Europa, por cada passo que dá em frente, dá dois para trás, ou, pelo menos, um. O Governo francês fala, por exemplo, em impor uma taxa sobre a recolha de dados [por parte de empresas como a Google ou Facebook], quando estes dados são impulsionadores do crescimento, da inovação, e capaz de resolver grandes problemas da sociedade. Ainda assim, França fala em impostos. Bruxelas, por outro lado, também tem falado em desenvolver aquilo a que chamam uma “nuvem europeia”, uma cloud de computadores que só vai ter autorização para atuar na Europa. Quando a Europa faz isto, parece-me que estão a enviar um sinal claro para as grandes empresas de tecnologia mundiais: não venham para cá, porque vão ficar sujeitos a este tipo de perseguição ou restrições.

E comparemos isto com o Chile, por exemplo, ou com a Colômbia. São países que querem atrair empresas e que têm toda uma série de facilidades para que nomes como a HP ou a Google possam ter lá um pé. Penso que isso é algo que Portugal pode fazer, enviar uma mensagem clara de que quer dar as boas-vindas ao investimento estrangeiro. E aí os investidores chegam, investem no país e comprometem-se. Também penso outra coisa, que pode gerar alguma controvérsia: não acho que o Governo deva favorecer as empresas pequenas [PME]. Acho que é diferente se quiserem favorecer startups que planeiam crescer, mas o que acontece é que existem várias ideologias que afirmam que as pequenas empresas é que são o motor da economia, mas não são. Os dois motores da economia são as grandes empresas, tecnologicamente avançadas e de escala global, como a Siemens ou a Philips, e as empresas mais pequenas, que começam com zero euros, mas podem crescer para 200, 500 ou 10 mil. Esses são os verdadeiros agentes de inovação, aquilo que nos EUA chamamos de “gazelas”, empresas que duplicam resultados de quatro em quatro anos. Mas nem todas as startups têm este perfil.

E que perfil pode ter uma empresa gazela em Portugal?

Número 1: deve ser uma empresa que consiga vender fora de Portugal, porque o mercado português é muito pequeno. Se quiser crescer, tem de crescer globalmente. Nos EUA, existe uma expressão que diz que “as empresas nascem globais” e a ideia é essa: começar logo a pensar que vão estar a servir o mercado global. Por isso, devem nascer globais e num período muito curto de tempo. Li recentemente um artigo sobre um livro de Peter Thiel, fundador do PayPal, que descrevia os empreendedores como se eles fossem psicologicamente desequilibrados. Porque estão dispostos a avançar com algo, mesmo quando toda a gente lhes diz que está errado. De certa forma, os empreendedores não são normais. São anormais. E é isso que devem andar à procura: de alguém que vai estar disposto a correr esses riscos e a lutar contra o status quo. Como se fossem fora da caixa, um pouco estranhos, mas no bom sentido.

"Penso que isso é algo que Portugal pode fazer, enviar uma mensagem clara de que quer dar as boas-vindas ao investimento estrangeiro. E aí os investidores chegam, investem no país e comprometem-se" 
Robert Atkinson

Falando agora de gigantes da tecnologia, como a Google ou Facebook. Quais podem ser as fraquezas de empresas deste tipo?

Existe uma frase famosa de Joseph Schumpeter, que diz que a ameaça da competição pela inovação está na pessoa nova que chega e que pode destruir o que já existe com algo completamente diferente. E isto tem a ver com a noção que Clayton Christensen, professor em Harvard, tem e que diz o seguinte: vai surgir alguém, em determinada altura, que vai colocar o Facebook fora do jogo. Não faço ideia de quem vai ser, mas vai surgir alguém que vai desenvolver algo melhor, que o Facebook não vai conseguir ver. E também é possível que a Google saia do jogo. Nalgum momento, isso vai acontecer. Daqui a cem anos ou dez anos. Quem sabe?

As redes sociais, por exemplo, podem ter os dias contados?

Acho que, no futuro, vai surgir alguma coisa diferente. É possível que essas empresas consigam adaptar-se, mas, diz-nos a história, que as empresas sentem dificuldades na adaptação. É como se ficassem presas no caminho, mesmo que saibam que a inovação disruptiva pode estar a chegar a qualquer momento. Mas podemos olhar para uma empresa como a Kodak, que inventou a câmara digital e canibalizou a empresa toda. Não me preocuparia muito com estas empresas, porque há sempre algum competidor que vai fazer com que sejam disruptivas.

Mas há alguma coisa que poderiam estar a fazer melhor?

Temos de olhar para estas empresas como se fossem adolescentes. A IBM é um adulto, por exemplo, mas muitas destas empresas ainda se estão a conhecer à medida que vão crescendo. Eu acho que andam a fazer o que é correto e, para ser franco, uma das razões pelas quais os EUA lideram nesse espaço é que essas empresas… Diga-me uma coisa: quanto é que paga por subscrever o Google?

Por subscrever o Google? Nada.

Exato. Você não paga nada por utilizar o Google porque o Google tem anúncios de publicidade. Não paga nada por utilizar o Facebook porque tem anúncios. Também não paga nada por utilizar o Twitter. Na Europa, é muito mais difícil lucrar com a publicidade, por causa das regras europeias sobre a privacidade. Nos EUA, é muito mais fácil. E eu acho que é por isso é que a Europa não tem uma empresa destas. Tem de de haver o equilíbrio certo: as empresas devem ser transparentes, mas não vejo problema nenhum, por exemplo, em a Google colocar um anúncio no meu email. Não é que eles estejam a lê-lo.

Para o presidente da fundação norte-americana, muitas das empresas tecnológicas ainda são adolescentes

© Hugo Amaral/Observador

E porque é que a Europa não é como os EUA?

Eu acho que a Comissão Europeia tem uma visão muito unilateral sobre o bem-estar do consumidor. Eu, enquanto consumidor, penso duas coisas. A primeira é que posso utilizar o Google, Facebook, Twitter, de graça. “Uau!” E a outra é: “ah! Eu sou um consumidor, por isso tenho informação pessoal que quero proteger” e eu acho que os EUA estão mais próximos de fazer este equilíbrio. Na Europa, o balanço está totalmente na última parte, em proteger a pessoa, o que pode fazer com que não seja possível ter todas estas coisas gratuitas. Há um estudo feito pela professora Catherine Tucker, que é minha colega no MIT, sobre a diretiva da privacidade europeia e ela descobriu que, na Europa, as pessoas têm uma propensão 60% menor para clicar nos anúncios. Ou seja, é 60% menos dinheiro que entra. Fizemos um pequeno estudo, há duas semanas, sobre os custos que acarreta a política de cookies europeia – detesto ir a sites europeus por causa disso, acho que aqueles avisos são uma coisa estúpida – e estimámos que esta política pode custar à Europa um par de mil milhões de euros.

E depois há outra coisa. Na Europa, já existiram Estados totalitários que abusaram da informação. E eu compreendo a história da Europa, mas também penso: vá, a sério? A sério que acham que vai surgir um Estado totalitário a emergir na Europa em 2015? Isso não vai acontecer. Deviam respirar fundo e perceber isto. O que sei é que uma parte da Europa está a desenvolver uma nova estratégia de inovação da utilização de dados, o que é muito bom. Tentar perceber: como é que construímos uma economia de dados? Como é que retiramos valor disto? E a outra parte está a dizer que quer restringir a utilização dos dados, que quer regular. Estas duas partes estão em conflito e há que escolher um lado. A Europa parece estar a escolher aquela que quer restringir.

Já falámos de redes sociais, mas o que pensa sobre todas as empresas de aplicações móveis que surgiram entretanto. Acha que podemos estar perante uma bolha?

Penso que, em termos de avaliação, algumas destas empresas que estão a fazer Ofertas Públicas Inicias enormes ou a ser adquiridas por valores muito elevados. E, por isso, sim… Provavelmente, existe uma bolha. Mas, já que disse isto, também quero dizer que a economia das app já gerou centenas e centenas de postos de trabalho nos EUA e tenho a certeza de que na Europa também. E a verdade é que cada vez mais as pessoas vão utilizar dispositivos móveis e este número vai continuar a crescer. Acho que a economia das apps vai continuar a crescer, pelo menos, durante mais uma década. Se elas estão sobrevalorizadas já é outra questão.

"Provavelmente, existe uma bolha. Mas, já que disse isto, também quero dizer que a economia das app já gerou centenas e centenas de postos de trabalho nos EUA e tenho a certeza de que na Europa também"
Robert Atkinson

E em relação à indústria da música e empresas como a Spotify?

Não sou grande especialista, mas acho que o grande desafio desse modelo de negócio é mesmo a pirataria, porque enquanto estiverem a competir com conteúdos gratuitos vai ser mais difícil.

Se fosse um investidor e quisesse fazer uma OPA, que empresa escolheria?

Eu sou um investidor terrível. Mas posso dizer quais são as tecnologias que considero boas e interessantes.

E quais são?

Se eu quisesse investir no longo prazo, a dez anos, escolheria a robótica, porque acho que vai ser uma tecnologia importante e transformadora. Nos últimos anos, foi responsável por grandes avanços e acho que vai melhorar ainda mais. E a machine learning [ramo da inteligência artificial, que reconhece padrões e toma decisões inteligentes baseadas em dados], que é uma tecnologia brilhante e importante, que faz coisas como a IBM Watson [tecnologia cognitiva que processa informação como se fosse um ser humano, porque entende a linguagem natural, gera hipóteses baseadas em evidências e está em contínua aprendizagem]. O programa de televisão norte-americano, o Jeopardy!, fez o seguinte desafio: colocaram as duas pessoas que tinham vencido o maior número de Jeopardy! de sempre a competir contra o computador o IBM Watson, que é um máquina de machine learning. E perderam.

Esta tecnologia já está a ser utilizada na saúde, por exemplo, para elaborar diagnósticos. E, nalguns casos, conseguiu provar que é capaz de fazer melhores diagnósticos do que os próprios médicos. Porque conhece cinco milhões ou dez milhões de casos diferentes. Não estou é tão convicto sobre a área da energia limpa, porque é um setor muito mais difícil do que aquilo que as pessoas pensam. É certo que vamos ter de inovar para um futuro com menos carbono, não há dúvidas sobre isso, mas acho que ainda não chegámos lá. Ainda é muito difícil de concretizar. Vai ser uma indústria de crescimento, mas não acho que vá transformar a economia, substituir o petróleo, por exemplo. Enquanto a machine learning vai permitir que se façam coisas de uma forma totalmente nova.

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