Martin Zweig começou como académico, mas depressa se voltou contra a teoria financeira moderna que se ensina nas maiores universidades do mundo. O guru provou que é possível bater o mercado por um longo prazo e acertar sucessivamente quando é a melhor altura de entrar e sair da bolsa, algo que teoricamente não é possível fazer consistentemente.

A sua tese de doutoramento, que defendeu na Universidade de Michigan em 1969, levantou o véu sobre o seu futuro como oráculo da bolsa. Zweig defendeu o uso do rácio put-call para aferir o sentimento no mercado e os picos da bolsa. Ainda hoje este rácio, que usa o volume transacionado em contratos de derivados, é popular entre os investidores.

15,9%

Foi a rentabilidade anual alcançada pelas estratégias defendidas por Martin Zweig no boletim “The Zweig Forecast”, de acordo com Mark Hulbert.

Fonte: Forbes.

Durante um curto período, Martin Zweig ensinou Finanças na City University, em Nova Iorque. Depois de uma série de previsões certeiras que escreveu na revista Barron’s, o recém-guru lançou um boletim financeiro, “The Zweig Forecast”.

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Após a morte de Martin Zweig, em fevereiro de 2013, Mark Hulbert, um analista que acompanha o desempenho de vários boletins de investimento nos EUA, revelou que o “The Zweig Forecast” bateu consecutivamente os índices bolsistas e ofereceu o maior retorno ajustado pelo risco entre todos os boletins analisados. Ganhou 15,9% por ano ao longo de uma década e meia.

Martin Zweig ascendeu ao topo da lista de gurus quando se tornou um dos comentadores regulares do programa televisivo “Wall Street Week with Louis Rukeyser”. Foi na televisão que o especialista previu a maior queda de sempre na bolsa.

“Não estou a ver um mercado negativo per se”, explicou Martin Zweig na televisão. “Na verdade, estou a ver um crash.” Crédito: YouTube.

Na noite do dia 16 de setembro de 1987, Martin Zweig disse que esperava um crash, mas que não gostaria de falar publicamente sobre o assunto, porque seria como “gritar ‘fogo’ num teatro lotado”. O guru acreditava numa queda violenta, mas que não duraria muito tempo. A sessão bolsista seguinte ao episódio televisivo ficou conhecida por Segunda-Feira Negra: o índice norte-americano Dow Jones Industrial Average, a principal referência na altura, registou a maior queda de sempre, de 22,61%. Nesse dia, a carteira implícita no “The Zweig Forecast” subiu 9%.

Extravagância imobiliária

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Depois da morte de Martin Zweig, a viúva Barbara colocou a residência nova-iorquina à venda por 125 milhões dólares (92 milhões de euros em 2013), um recorde para a cidade. 

A casa, que ocupa os três últimos pisos do hotel The Pierre, na Quinta Avenida, é o auge da extravagância do guru. O The New York Times descreveu: “uma grande escadaria em mármore negro, janelas arqueadas que replicam uma capela de Versalhes, pé-direito de sete metros e lareiras abraçadas por lintéis projetados nos séculos XVII, XVIII e XIX”.

Crédito: Wikipédia.

Zweig, o excêntrico

Martin Zweig transformou o seu reconhecimento público num negócio multimilionário de gestão de ativos. A sua crescente fortuna permitiu-lhe um “estilo de vida extravagante e esbanjador”, de acordo com a revista Forbes.

A sua residência em Nova Iorque – a mais cara dos Estados Unidos da América – era apenas o principal sinal exterior do seu comportamento. A imprensa norte-americana também relatou – embora com menos entusiasmo – a aquisição do equipamento desportivo de Michael Jordan quando o basquetebolista ainda era estreante nos Chicago Bulls, da guitarra de Buddy Holly, da guitarra-baixo de Paul McCartney e do vestido que Marilyn Monroe usou quando cantou “Happy Birthday” ao presidente John Kennedy.

Apesar das estratégias desenvolvidas nos seus boletins financeiros terem sido muito lucrativas, quando Martin Zweig tentou aplicá-las na gestão de fundos tradicionais de investimento, os resultados não foram surpreendentes. O fundo Zweig Strategies rendeu cerca de 10% por ano nos quase dez anos que o guru esteve ao seu leme, menos do que os quase 18% alcançados pelo índice norte-americano Standard & Poor’s.

Martin Zweig acabou por vender o negócio dos fundos tradicionais em 1999 para se focar nos hedge funds, fundos pouco regulados e pouco controlados pelas autoridades financeiras.

Antes, em 1984, o guru tinha lançado com Joseph DiMenna (que Zweig contratou em 1977 quando ainda era um estudante) a Zweig-DiMenna Associates, que geria hedge funds. O Zweig-DiMenna Partners rendeu 12% por ano desde a fundação até ao início de 2014, segundo o boletim “Bloomberg Brief Hedge Funds”. Nos primeiros 15 anos, a rentabilidade anual estava em 25%, segundo a revista BusinessWeek.

Neste artigo, o Observador procurou as ações que Martin Zweig poderia comprar nas bolsas europeias e norte-americanas. É o sexto numa série de dez a publicar até ao início de dezembro.

Estratégias de bolsa
Depois de Zweig, falta publicar as carteiras de quatro gurus – James O’Shaughnessy, Joel Greenblatt, John Neff e David Dreman– até ao dia 10 de dezembro.
Guru Data de publicação
Warren Buffett 8 de outubro
Benjamin Graham 15 de outubro
Peter Lynch 22 de outubro
Joseph Piotroski 29 de outubro
William O’Neil 5 de novembro
Martin Zweig 12 de novembro
James O’Shaughnessy 19 de novembro
Joel Greenblatt 26 de novembro
John Neff 3 de dezembro
David Dreman 10 de dezembro

Uma lição para bater o mercado

Um ano antes da Segunda-Feira Negra, Martin Zweig publicou a sua obra de referência, “Martin Zweig’s Winning on Wall Street”. Mereceu três reedições posteriores, incluindo um novo prefácio que explica como o guru conseguiu ganhar dinheiro enquanto o mercado estava a perder em 1987.

Ganhar em Wall Street

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O primeiro livro de Martin Zweig descreve vários sinais que os investidores podem usar para saber quando devem investir na bolsa e os indicadores bolsistas que o guru usava para decidir em que ações aplicar o seu dinheiro.

São os critérios de seleção de ações descritos no seu livro que o Observador usou para escolher as ações zweiguianas. Convertemos as regras em algoritmos que aplicámos a mil ações – as 500 europeias que compõem o índice Bloomberg European 500 e as 500 norte-americanas que fazem parte do Standard & Poor’s 500 – através da plataforma Bloomberg Professional. O próprio Zweig fazia isto no seu boletim menos conhecido, o “Zweig Performance Ratings Report”, que compilava centenas de ações numa escala de um a nove, de acordo com as suas regras.

A maior parte do livro “Winning on Wall Street” debruça-se sobre indicadores técnicos para saber quando investir e desinvestir na bolsa, incluindo o rácio put-call. Nos reduzidos capítulos em que Zweig explica o seu método para escolher ações, o especialista confessa que o verdadeiro guru é o seu sócio Joseph DiMenna. “Eu faço a previsão geral do mercado. (…) DiMenna trata da análise das ações, estando quase sempre a navegar por documentos financeiros e a falar com analistas e representantes das empresas”, escreveu Zweig.

Apesar disso, Martin Zweig garante que a sua estratégia deverá dar bons frutos à maioria dos pequenos investidores. “O meu processo de escolha de ações envolve a busca das seguintes variáveis: forte crescimento dos lucros e das vendas; um rácio preço-lucros razoável face à taxa de crescimento da empresa; compras pelos administradores ou, pelo menos, a ausência de muitas vendas por administradores; e um forte movimento relativo do preço das ações”, resumiu o guru.

Estes são os critérios que o Observador usou a partir do livro de Zweig:

  • Resultados líquidos positivos no último trimestre, nos últimos 12 meses e no último ano fiscal. Zweig não quer empresas que percam dinheiro.
  • Variação homóloga positiva dos resultados líquidos e das vendas em cada um dos últimos quatro trimestres. Tem de haver crescimento trimestral.
  • Variação anual positiva dos resultados líquidos e das vendas em cada um dos últimos três anos. O crescimento também tem de se verificar no último triénio.
  • Crescimento anual dos resultados líquidos superior a 14,5% no último triénio. Zweig não é claro quando ao mínimo que exige para o crescimento, embora apresente exemplos em “Winning on Wall Street”. Definimos o mínimo igual à média das mil empresas.
  • Crescimento anual das vendas superior a 5% no último trimestre. A faturação também deve ter crescido mais do que a média.
  • Rácio preço-lucros entre 5 e 40. Zweig defende que este rácio (conhecido nas publicações em inglês por price-earnings ratio, PER ou P/E) pode desvendar empresas em dificuldades se for inferior a 5. O guru está disposto a comprar ações cujos rácios se estendem até uma vez e meia a média do mercado, atualmente cerca de 40.
  • Administradores compraram tantas ou mais ações do que venderam nos últimos seis meses. A equipa de gestão não pode estar a vender títulos em massa.
  • Ações devem estar entre as 50% que mais valorizaram no último semestre. Exclui metade dos títulos, aqueles que menos apreciaram nos últimos seis meses.

Estas regras aplicadas às mil sociedades europeias e norte-americanas desvendaram as seis ações no quadro em baixo.

Seis ações zweiguianas
Estas são os títulos que cumprem os requisitos indicados nos ensinamentos de Martin Zweig.
Empresa Variação anual de três anos Rácio preço-lucros Variação do preço
nos últimos 6 meses
Lucros Vendas
Grifols 27,07% 14,12% 25,28 22,01%
Kroger 53,36% 5,42% 18,85 3,09%
Novo Nordisk 20,22% 11,9% 29,53 0,40%
Recordati 16,13% 8,70% 24,64 26,01%
Tractor Supply 17,38% 10,13% 30,56 4,89%
Visa 48,88% 10,03% 37,03 14,72%
Fonte: Bloomberg a 12 de novembro de 2015. Variações na divisa local.

Os investidores que desejem replicar a estratégia de Martin Zweig devem ponderar o facto de esta carteira estar muito concentrada. Além de só contabilizar seis títulos, dois deles (Novo Nordisk e Recordati) pertencem ao mesmo setor (farmacêutico). Antes de investir, não ignore o risco da pouca diversificação que acresce à elevada volatilidade da bolsa.

Embora Zweig não se interessasse pelos negócios das sociedades – “se uma empresa conseguir mostrar uns resultados simpáticos durante quatro ou cinco anos, não quero saber se faz vassouras ou peças de computador”, escreveu –, leia uma descrição das atividades das eleitas. As cotações são as válidas às 12 horas desta quinta-feira, dia 12 de novembro.

Grifols

A espanhola Grifols (Madrid: 43,83 euros) é a maior comercializadora europeia de produtos à base de plasma sanguíneo e outros produtos para o diagnóstico e equipamento relacionada com o sangue. Depois da aquisição da norte-americana Talecris Biotherapeutics em 2011 e da unidade de diagnóstico para transfusão de sangue da Novartis em 2013, a América do Norte representa agora 63% da faturação do grupo catalão.

A carteira que replica a estratégia de William O’Neil, que o Observador publicou há uma semana, também incluía a Grifols.

Kroger

Desde que comprou a Harris Teeter Supermarkets em 2014, a Kroger (Nova Iorque: 37,06 dólares norte-americanos) controla a maior rede de supermercados dos Estados Unidos da América. É, aliás, a companhia cotada que mais fatura com a sua rede de supermercados em todo o mundo (cerca de 81 mil milhões de euros por ano). Na última contagem, a Kroger tinha 2.623 supermercados, 2.116 farmácias, 1.350 postos de abastecimento, 781 lojas de conveniência e 327 joalharias.

Novo Nordisk

Em outubro, quando a Sanofi, que produz o Lantus, a insulina mais receitada a nível mundial, avisou que as vendas de insulina deverão cair 4% a 8% nos próximos três anos, a Novo Nordisk (Copenhaga: 378,40 coroas dinamarquesas) disse que isso não acontecerá aos seus produtos. A Novo Nordisk, o maior fabricante de insulina, revelou que as vendas das suas insulinas de nova geração (incluindo o Tresiba, comercializado na Europa desde 2013 e que começará a ser vendido nos EUA em 2016) mais do que duplicaram no último trimestre, em termos homólogos. Mesmo assim, o NovoRapid, que não é de última geração, representa cerca de um quinto das vendas do grupo dinamarquês especializado nos fármacos utilizados no tratamento de diabetes.

Recordati

A Recordati (Milão: 22,70 euros), que produz medicamentos para doenças cardiovasculares, gastroenterológicas e do sistema nervoso central, tem procurado crescer através de aquisições multinacionais. No início de outubro, a agência Bloomberg noticiou que o grupo italiano comprará a companhia suíça Polichem para expandir o negócio para áreas como a dermatologia, a ginecologia e a neurologia. Em 2006, a Recordati gastou 45 milhões de euros na compra do grupo português Jaba, cuja origem remonta a 1927 pela mão do farmacêutico José António Baptista d’Almeida. Atualmente, a Recordati tem um valor de mercado de 4,7 mil milhões de euros.

Tractor Supply

Começou em 1938 como uma empresa de encomendas por correio de peças para tratores. Hoje, a Tactor Supply (Nasdaq: 91,38 dólares norte-americanos) gere uma cadeia de mais de 1.400 lojas nos Estados Unidos da América dirigidas a pequenos agricultores e aos consumidores que têm uma vida rural. Quase metade das receitas do grupo de Brentwood, no Tennessee, prendem-se com as vendas de produtos para animais, que incluem não são os domésticos mas também outros, como cavalos. A sua segunda unidade de negócio, que absorve mais de um quinto da faturação, é a comercialização de equipamento e veículos, como compressores de ar, produtos de canalização e reboques.

Visa

Após anos de especulação, a Visa (Nova Iorque: 79,20 dólares norte-americanos) confirmou a aquisição da Visa Europe. Desde a ida para a bolsa da Visa em 2007 que a Visa Europe, detida por cerca de três mil bancos, trabalhava sob licença do grupo norte-americano. A operação, que deverá concretizar-se até junho de 2016, custará até 21,2 mil milhões de euros à Visa. É a companhia que gere a maior rede de pagamentos.

As ações da Visa são o quinto maior investimento da Zweig-DiMenna, segundo o relatório do terceiro trimestre submetido pela sociedade gestora à autoridade norte-americana dos mercados de capitais. Nesse trimestre, a posição foi reforçada.

David Almas é analista financeiro independente registado na CMVM com o número oito. O autor trabalha subordinado ao Código Deontológico dos Jornalistas.