“Mãe, quando é que a fada boazinha chega e usa a magia para trocar os meus órgãos genitais?“, pergunta feita por Jazz Jennings segundo a mãe conta. Jazz, uma criança de dois anos biologicamente menino, mas em tudo o resto menina. Na altura, a pergunta deixou a mãe petrificada. Este foi um dos primeiros passos na história de dualidade vivida por Jazz, que começou aos 15 meses e está agora nos 14 anos.
Jazz está no Top 25 da TIME dos adolescentes mais influentes de 2014, no Top 14 dos adolescentes “mais destemidos” de 2014 do Huffington Post e no Top 40 das personalidades mais influentes da revista The Advocate. Jazz Jennings é dos mais jovens casos de transição que veio a público. Por isso, esta terça-feira é um pouco o dia dela. É o Dia Internacional da Visibilidade Transgénero e Transexual.
Jazz começou cedo a perceber o que sentia. Só precisava de o conseguir expressar. Desde que começou a falar, “logo aos 15 meses”, Jazz dizia que queria vestidos. Quando os pais lhe chamavam “lindo menino”, Jazz corrigia para “linda menina”, lembra o pai à ABC News, já em 2007.
Renee e Scott Jennings, os pais, decidiram consultar um terapeuta especialista em questões de género e sexualidade. Na consulta, a Dr. Marilyn Volker tinha consigo uma boneca anatomicamente mulher e um boneco anatomicamente homem. Em entrevista à ABC, o médico conta que Jazz apontou para o boneco e disse “isto sou eu agora”. Depois, apontou para a boneca e disse “isto é o que eu quero ser”.
E como se lida com estas manifestações desde tão cedo? Primeiro há alguma negação e alguma confusão. “Afinal os irmãos gémeos dela também gostavam de pintar as unhas quando eram bebés”, conta. Mas Jazz era diferente. Ela insistia que “o pénis era um erro”. Scott Jennings diz: “nós não encorajamos, nós damos apoio. E damos ouvidos àquilo que ela nos diz”.
Hoje Jazz diz muitas coisas que influenciam muita gente. Aos 14 anos, é a protagonista de “I am Jazz – A family in Transition“, um documentário do canal da apresentadora Oprah Winfrey (OWN), é co-autora do livro infantil “I am Jazz”, escrito para “os pais explicarem aos filhos o que é isto de ser transgénero” e será a estrela de um reality-show preparado pela TLC. O canal anunciou que vai começar um programa chamado “All That Jazz”. Deverá estrear este verão e a história vai girar à volta das dúvidas, medos e emoções para a jovem e para a família.
“Será que Jazz gosta de rapazes?” A pergunta pode parecer impertinente, mas foi feita por um fã e respondida pela própria. Tudo no canal de Youtube que a jovem criou para estabelecer maior proximidade com os internautas. Lá estão mais de 20 vídeos, entre sessões de perguntas e respostas e entrevistas que dá à comunicação social.
Uma vida atarefada a tentar simplesmente passar uma mensagem: “love yourself” (ama-te). Por isso, e porque parece que a luta já nasceu com ela, os 14 anos não foram impedimento na altura de criar uma fundação. A TransKids Purple Rainbow Foundation trabalha na área da sensibilização e da educação. Dos media, das famílias, da sociedade. Apoia-se na figura de Jazz que, por sua vez, fantasia com a figura da sereia – as sereias em silicone são uma dos produtos que a fundação vende para financiar várias atividades da fundação.
A figura da sereia não representa uma ponta de ingenuidade que ainda ficou da infância de Jazz. Não. Jazz gosta de sereias “porque elas são diferentes”, mas a mãe tem uma explicação mais precisa. “Todas as crianças transgénero meninos ou meninas gostam de sereias por causa da genitália ambígua. Não há nada ali, é só uma cauda. Quão apelativo pode ser isso para alguém que não gosta do que tem por baixo da cintura?”
Da informação ao marketing, todos querem a jovem americana. A marca de produtos cosméticos Clean&Clear lançou a campanha “See The Real Me” com Jazz Jennings como protagonista. “Eu sempre soube exatamente o que era. Era uma rapariga presa num corpo de rapaz”, diz Jazz no vídeo.
https://www.youtube.com/watch?v=vyNZXQ136oI
Jazz veste-se como menina, deixou crescer o cabelo, furou as orelhas. Aos 11 anos começou a tomar medicamentos para bloquear a produção de testosterona de forma a impedir o crescimento de barba ou pelos em zonas masculinas. Ao mesmo tempo está a tomar estrogénio para, por exemplo, estimular a produção das glândulas mamárias e dar forma às ancas. A cirurgia de mudança de sexo só poderá acontecer aos 18 anos.
Um dos projetos do Ackerman Institute for the Family, uma instituição americana que trabalha na área da terapia familiar, é o Gender & Family Project (GFP) — pretende dar poder às famílias e comunidades através da afirmação de género. O GFP promove a inclusão de género como uma forma de “justiça social” em todos os sistemas envolvidos na vida e na família. Mais uma distinção para a família Jennings.
“A Night of a Thousand Genders” (Uma noite de mil géneros), um evento promovido pelo Ackerman Institute for the Family, realizou-se em Nova Iorque a 23 de março. A mensagem do evento? “Ajude-nos a promover a nossa mensagens: aceitar é proteger”.
É desta forma que Jazz se apresenta num dos vídeos: “Hi. I am Jazz. I’m free”. “Olá. Eu sou a Jazz. Sou livre”. Num outro vídeo em que fala para os seus seguidores, aconselha: “Se alguém te magoar ou disser alguma coisa que te ponha para baixo, tens de manter-te otimista e continuar em frente porque provavelmente eles não sabem assim tanto sobre ti nem compreendem a tua situação”.