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Ken Ishii/Getty Images

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O investigador de leveduras que ganhou o Prémio Nobel da Medicina

Yoshinori Ohsumi sempre quis fazer algo diferente: deixar as áreas de investigação mais populares e seguir caminhos menos desejados. Mas foi isso que lhe valeu um prémio Nobel.

Que as suas descobertas tinham sido importantes já se sabia, mas o selo do Prémio Nobel da Medicina atribuído este ano veio garanti-lo para que não restem dúvidas. No seu trabalho com leveduras, Yoshinori Ohsumi estudou não só o processo de autofagia (degradação de componentes do interior das células) per se, mas também os genes envolvidos neste mecanismo. O reconhecimento da academia sueca veio mais de 20 anos depois da descoberta, mas com um gosto especial: é de tal forma importante que Yoshinori Ohsumi foi o único laureado na Medicina este ano.

A primeira reação do cientista japonês foi quase de incredulidade: “Ouvi aquilo, sozinho, eu! Também foi uma surpresa para mim”, disse o laureado numa entrevista ao site do Prémio Nobel. “Foi a minha verdadeira surpresa, porque há tantas pessoas a trabalhar na área da autofagia.” Saber que o mau funcionamento do mecanismo de autofagia pode ser responsável por algumas doenças, como Parkinson ou diabetes tipo 2, parece ter contribuído para fazer avançar esta área de investigação nos últimos anos. “Quando comecei o meu trabalho apareciam anualmente 20 artigos científicos em autofagia, ou menos. Agora são publicados cinco mil ou algo do género.”

Ainda que já trabalhe na área há vários anos, o trabalho de Yoshinori Ohsumi está longe de estar concluído. “Ainda temos tantas questões. Mesmo agora temos mais questões do que quando eu comecei.” Longe de imaginar que as descobertas nesta área lhe poderiam granjear prémios científicos, o cientista japonês confessa que escolheu esta área, porque não era um assunto muito apelativo e ele queria trabalhar em algo diferente, referiu The Guardian.

"Não me sinto confortável a competir com muitas pessoas, pelo contrário, sinto mais prazer a fazer coisas que mais ninguém esteja a fazer. No fundo, a Ciência é isso, e a alegria de descobrir algo inspira-me."
Yoshinori Ohsumi, citado pelo The Guardian

As leveduras (Saccharomyces cerevisae, como as usadas na fermentação da cerveja, por exemplo) são o objeto de estudo de Yoshinori Ohsumi desde o pós-doutoramento, mas antes disso o percurso do investigador correu outros caminhos. A primeira escolha do japonês tinha sido a Química, mas o campo já estava tão bem estabelecido que decidiu mudar para a Biologia Molecular à procura de desafios maiores, contou The New York Times. Não teve contudo sorte: a tese de doutoramento, completada em 1974 na Universidade de Tóquio, era tão pouco interessante que não conseguiu encontrar emprego.

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O supervisor aconselhou-lhe um pós-doutoramento na Universidade Rockefeller, em Nova Iorque, para estudar fertilização in vitro nos ratos. Mas Ohsumi não estava satisfeito e decidiu mudar para a duplicação do ADN das leveduras. E, pelos vistos, foi uma boa escolha. A Universidade de Tóquio convidou-o, em 1977, para regressar ao Japão e foi aí que iniciou a investigação com as vesículas que degradam componentes celulares nas leveduras, o trabalho que lhe viria a garantir o prémio anunciado esta segunda-feira. Em 1996, seguiu para o Instituto Nacional de Biologia Básica, em Okazaki, e, desde 2009, que é professor no Instituto de Tecnologia de Tóquio.

O investigador antes da grande descoberta

Yoshinori Ohsumi nasceu em Fukuoka, no Japão, em 1945. Não teve de enfrentar a Segunda Guerra Mundial, mas viveu os tempos de privação que se seguiram. Talvez aí tenha nascido a capacidade de perseverança que tem demonstrado ao longo dos anos no seu trabalho de investigação.

O interesse pela Ciência, esse agradece-o ao pai, como contou numa entrevista à revista científica The Journal of Cell Biology. O pai era professor de engenharia na Universidade Kyushu, o que permitiu ao filho familiarizar-se com a vida académica. Apesar da influência paterna, o jovem Yoshinori preferia as ciências naturais vertente mais industrial seguida pelo pai. Começou pela Química, ainda no secundário, mas decidiu que preferia um campo menos explorado e mudou para Biologia Molecular.

O percurso de Yoshinori Ohsumi tem sido trilhado pelos caminhos diferentes, aqueles que os outros não seguiram. Por isso deixou os mamíferos para estudar as leveduras durante o pós-doutoramento nos Estados Unidos. E, mesmo aí, escolheu um caminho menos convencional: “Naquela altura, muitas pessoas estavam a estudar o transporte de iões e pequenas moléculas na membrana plasmática [da célula], mas poucas pessoas tinham começado a olhar para o transporte através da membrana de outros organelos [compartimentos dentro das células]”. Os vacúolos (vesículas no interior das células) eram tidos como o caixote do lixo das células, logo despertavam pouco interesse da comunidade científica, o que para Ohsumi foi interessante – assim não teria muita competição. Mais, bastava-lhe um simples microscópio ótico para dar início às suas observações.

"Todos os meus resultados de investigação começaram com observações ao microscópio. Por isso, mesmo agora, levo sempre os alunos ao meu laboratório para trabalhar com um microscópio."
Yoshinori Ohsumi em entrevista ao Instituto de Tecnologia de Tóquio

Apesar de fazer um trabalho com pouco destaque, o investigador japonês manteve-se fiel ao trabalho que tinha decidido desenvolver. Ohsumi confessa que aos 43 anos — altura em que fez a descoberta que agora que lhe valeu o Prémio Nobel — a sua carreira científica tinha tido poucos sucessos. Na altura, o cientista fez algo que algo que agora vê poucas vezes nas gerações mais novas: arriscou tudo.

“Infelizmente, ultimamente, pelo menos no Japão, os jovens cientistas querem um emprego estável e por isso têm medo de correr riscos. A maior parte das pessoas decidem trabalhar nos campos mais populares porque acham que é a maneira mais fácil de conseguir publicar artigos científicos”, disse ao The Journal of Cell Biology. “Mas eu sou precisamente o oposto. Não sou muito competitivo, por isso procuro sempre novos temas para estudar, mesmo que não sejam tão populares. Se começares por uma observação básica nova, terás sempre muito com que trabalhar.”

"Quando era uma criança, o Prémio Nobel era um sonho, mas depois de começar a minha investigação, estava longe da minha ideia."
Yoshinori Ohsumi, citado pelo The Guardian

Uma distinção merecida

Atribuir o Prémio Nobel a Yoshinori Ohsumi “era inevitável”, disse Beth Levine, directora do grupo de investigação em autofagia na Universidade do Texas, ainda que o próprio se defina como alguém que faz investigação básica com leveduras. “Ele é venerado na área da autofagia”, acrescenta a investigadora. Tanto que muitos laboratórios trabalham direta ou indiretamente com aquilo que descobriu, referiu David Rubinsztein, vice-diretor do Instituto Cambridge para a Investigação Médica na Universidade de Cambridge, citado pelo The Guardian. “Estou muito feliz que ele [Ohsumi] tenha ganho o Prémio Nobel este ano, é muito merecido.”

Outros prémios atribuídos a Yoshinori Ohsumi

Mostrar Esconder

2016: Paul Janssen Award
15th Wiley Prize
45th Rosenstiel Award

2015: The Person of Cultural Merit
The Keio Medical Science Prize, Keio University Medical Science Fund
International Prize for Biology, The Japan Society
Canada Gairdner International Award, The Gairdner Foundation

2013: Thomson Reuters Citation Laureates
2012: Kyoto Prize, The Inamori Foundation
2008: Asahi Prize, The Asahi Shimbun
2007: Science Award of the Botanical Society of Japan
2006: Japan Academy Prize, The Japan Academy
2005: Fujiwara Award, The Fujiwara Foundation of Science

Instituto de Tecnologia de Tóquio

A autofagia é uma palavra com origem grega que significa “comer-se a si próprio”, mas, na verdade, é mais do que a capacidade da célula vencer os períodos de privação de alimento. Este mecanismo permite reciclar componentes celulares, eliminar aqueles que têm defeitos e combater vírus e bactérias, só para dar alguns exemplos. “Todos os dias precisamos de repor 200 a 300 gramas de proteína nos nossos corpos”, lembrou Juleen Zierath, membro do Comité do Nobel, citada pelo The Guardian. Mas a quantidade de proteína que ingerimos diariamente não chega. “Podemos confiar que algumas das nossas proteínas, talvez as que estejam danificadas ou que já estão envelhecidas, sejam recicladas com esta maquinaria sofisticada para que possamos sustentar-nos e sobreviver.”

Importante é também notar que se o mecanismo de autofagia não funcionar corretamente isso pode ter implicações graves para o organismo, como o aparecimento de determinadas doenças. O trabalho de Ohsumi acaba por contribuir para a investigação e tratamento para doenças que vão do cancro às doenças autoimunes, referiu Giovanna Mallucci, professora de neurociência clínica na Universidade de Cambridge, citada pelo The Guardian. “O princípio importante aqui é procurar mecanismos comuns na doença. Abre caminhos para o tratamento de desordens que é diferente das abordagens mais convencionais que são específicas para cada doença.”

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