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A 7 de setembro o Brasil comemorou o Dia da Independência. Nesse dia é costume o Presidente participar num desfile militar a céu aberto, acompanhado da sua equipa ministerial e das lideranças do país.

Este ano a tradição foi mantida (ou quase), apesar de ter acontecido uma semana depois da aprovação do impeachment de Dilma Rousseff, num clima de instabilidade política. Michel Temer, que fazia a sua primeira aparição pública depois de ter sido empossado Presidente do Brasil, desfilou num carro fechado na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, e não passou revista às tropas, como forma de evitar as vaias e manifestações contrárias ao seu governo.

Houve, no entanto, outro simbolismo que chamou mais a atenção: Temer não usou em nenhum momento a faixa presidencial. “Usar a faixa significaria uma soberba nesse momento”, justificou em entrevista ao jornal O Globo. “Não deixo de ser Presidente por não usar a faixa”, defendeu Temer.

Brazilian President Michel Temer and his wife Marcela (L) attend a National Day parade during the commemoration of the country's Independence Day, in Brasilia on September 7, 2016. / AFP / EVARISTO SA (Photo credit should read EVARISTO SA/AFP/Getty Images)

Michel Temer não usou a faixa presidencial durante os desfiles de 7 de Setembro (EVARISTO SA/AFP/Getty Images)

Com faixa ou sem faixa, Temer prometeu que “vai ser mais Presidente” nos próximos dois anos e quatro meses, período no qual estará à frente do país – mesmo que não se conheça o seu programa de governo. No Brasil, quando os partidos são eleitos em coligação, é o partido do líder da coligação, no caso o partido do Presidente, que historicamente determina o programa de governo. No caso da coligação entre o PT e o PMDB, feita durante a eleição de 2014, era Dilma Rousseff e a sua equipa que tomava as decisões, motivo pelo qual Temer chegou a considerar-se um “vice-Presidente decorativo” numa carta enviada à petista, em 2015.

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Agora que está diante do Palácio do Planalto, terá pela frente alguns desafios como reduzir o desemprego, acelerar a economia e aprovar as reformas do trabalho e das pensões, com um apoio “flutuante” do Congresso e grande oposição nas ruas. Mas o que opina Temer sobre estas matérias? Qual é a sua posição sobre a economia, programas sociais, educação ou relações exteriores?

O Observador tenta antecipar o programa de governo de Michel Temer baseado nas medidas provisórias que assinou como Presidente interino durante o impeachment de Dilma Rousseff e nas últimas entrevistas que deu já como Presidente efetivo. Recuperamos ainda o documento “Uma Ponte para o Futuro”, publicado em outubro de 2015 pelo seu partido, o PMDB, em que apontava “iniciativas” caso estivesse à frente do país.

O que Michel Temer fez nos três meses de governo interino

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(Getty Images)

Na gestão interina, Michel Temer foi “menos Presidente”, utilizando a sua própria definição. Contou com o apoio dos parlamentares, inclusivamente de partidos de oposição ao governo de Dilma Rousseff, mas teve de ceder e fazer concessões em algumas matérias. Ao total, editou como Presidente interino 18 medidas provisórias, entre maio e agosto, um número superior às editadas por Dilma Rousseff nos quatro primeiros meses dos seus dois mandatos, tanto em 2011 como em 2015, segundo apurou a Agência Brasil.

Eis as principais medidas tomadas durante o governo interino:

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A 12 de maio, dia em que assumiu a Presidência interina do Brasil, Michel Temer criou o Programa de Parcerias e Investimento (PPI), que é uma espécie de pacote de medidas para facilitar as parcerias entre a iniciativa privada e o Estado, sobretudo na área das infraestruturas, e a venda de empresas estatais.

A ideia já havia sido avançada em outubro de 2015, no documento “Pontes para o Futuro”, em que apontava que a iniciativa privada seria uma prioridade de um eventual governo Temer. “É necessário executar uma política de desenvolvimento centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessárias, concessões amplas em todas as áreas de logística e infraestrutura, parcerias para complementar a oferta de serviços públicos.”

Em junho, o próprio Temer defendeu a ideia, quando afirmou que “a iniciativa privada é quem ajuda o Estado a crescer”. “Um país forte é um país amparado pela atuação da iniciativa privada”, assegurou.

O primeiro pacote de projetos de infraestruturas a serem concedidas ou vendidas foi anunciado na última semana com o nome de “Projeto Crescer”. Trata-se de 30 projetos nas áreas da energia, aeroportos, rodovias, portos, ferrovias e mineração, a serem leiloados em 2017 e 2018. Segundo Temer, “[o programa] visa, em primeiro lugar, o crescimento económico do país, mas também [a criação de] empregos. A ideia básica é exatamente esta: com vistas para que haja muitos empregos no país”, afirmou, citado pelo site G1. “Vamos cada vez mais ressaltar que o poder público não pode fazer tudo. Tem que ter a presença da iniciativa privada, sempre como agente indutor do desenvolvimento e produtor de empregos no país”, explicou o presidente.

Segundo explica o jornal El País Brasil, o Projeto Crescer é uma “remodelagem” com novas regras do que já tinha sido proposto por Dilma Rousseff, em 2015. A principal diferença entre o modelo de concessões e privatizações entre os dois governos está na participação do estado e nas exigências feitas às empresas privadas para participar nos negócios: Dilma Rousseff interferia mais diretamente nas regras dos contratos e condições impostas aos compradores.

Governo pode gastar mais…

Michel Temer conseguiu que o Congresso alterasse e aprovasse a meta fiscal para 2016, que prevê um défice primário de R$ 170,5 bilhões (equivalente a 46,7 mil milhões de euros). Em termos práticos, significa que o governo espera gastar mais do que vai arrecadar este ano. Este valor é bastante superior à meta de défice de R$ 96,7 bilhões (26,4 mil milhões de euros) que foi sugerida por Dilma Rousseff aos parlamentares e que também previa contas negativas para o Brasil.

A mudança na meta fiscal foi considerada a primeira vitória política do governo de Michel Temer no Congresso. “Foi uma bela vitória”, declarou o Presidente, na altura. Temer considerava importante a revisão pois “várias despesas teriam que ser cortadas [este ano], o que afetaria investimentos e programas sociais”, assegura ao site G1.

… mas a torneira deve ser fechada – com algumas exceções

A aprovação da meta fiscal faz parte de um conjunto de medidas de Michel Temer para reequilibrar as contas públicas.

A principal medida deste pacote é a adoção de um “teto”, ou seja, de um valor máximo permitido para os gastos públicos. Este limite variaria anualmente, de acordo com o valor da inflação do ano anterior. O projeto seria implantado durante 20 anos e representaria uma economia de cerca de 1,91 mil milhões de euros ao ano, segundo cálculos do governo.

“Sem um ajuste de caráter permanente que sinalize um equilíbrio duradouro das contas públicas, a economia não vai retomar seu crescimento e a crise deve se agravar ainda mais. Esta é uma questão prévia, sem cuja solução ou encaminhamento, qualquer esforço para relançar a economia será inútil”, sinalizava o documento “Pontes para o Futuro” já em dezembro de 2015.

A proposta do teto dos gastos públicos foi duramente criticada pelos partidos de oposição ao governo Temer, pois previa como efeito colateral que as despesas com saúde e educação poderiam congelados ou até cortados.

Durante o seu discurso na votação final do impeachment, Dilma Rousseff condenou a proposta. “[O teto nos gastos] É impedir que, por 20 anos, mais crianças e jovens tenham acesso às escolas; que, por 20 anos, as pessoas possam ter melhor atendimento à saúde; que, por 20 anos, as famílias possam sonhar com casa própria”, defendeu.

Atualmente, os gastos com saúde e educação são pré-definidos pela Constituição brasileira. Os gastos com saúde, por exemplo, obedecem a um mínimo de 13,2% da receita líquida anual do governo brasileiro, enquanto a educação conta com 18% das receitas. Em ambos os casos, os gastos superaram o valor da infração, entre 2003 e 2015, segundo as contas do site G1, o que entraria em conflito com a proposta de Temer.

“É necessário em primeiro lugar acabar com as vinculações constitucionais estabelecidas, como no caso dos gastos com saúde e com educação, em razão do receio de que o Executivo pudesse impor limites, ou mesmo cortar esses gastos em caso de necessidade, porque no Brasil o orçamento não é impositivo e o Poder Executivo pode ou não executar a despesa orçada”, lê-se no documento do PMDB.

Para administrar melhor o orçamento, Michel Temer conseguiu que o Congresso aprovasse uma medida que permite gaste livremente 30% daquilo que arrecada como quiser. A proposta tem validade até 2023, o que supera até mesmo o fim do mandato de Temer, em 2018. Anteriormente, a Constituição brasileira previa a utilização livre de apenas 20% da receita de impostos e contribuições sociais.

Para aumentar (ligeiramente) o orçamento, o governo interino propôs a devolução às contas públicas de cerca de 27,3 mil milhões de euros pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Económico e Social (BNDES), empresa pública responsável por financiar a realização de investimentos na economia brasileira. Henrique Meirelles, ministro das Finanças brasileiro, relacionou a medida com a abertura a privatizações e concessões defendida por Temer.

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Henrique Meirelles é o ministro das Finanças brasileiro (FERNANDO BIZERRA JR/EPA)

Toda esta economia e mudança na maneira de gerir os gastos público encontrou um “inimigo” dentro das próprias medidas governamentais. Michel Temer deu aval para aprovação no Congresso brasileiro do reajuste salarial para servidores públicos de diversas categorias profissionais, com um gasto estimado de cerca de 18,6 mil milhões de euros até 2019. O Presidente justificou a decisão ao dizer que os acordos já haviam sido firmados pelo governo de Dilma Rousseff. A medida foi vista como um gesto político conciliador de Temer como Presidente interino para evitar protestos e greves.

“Vocês podem até me perguntar: ‘Ah, mas você não deu aumento para várias categorias?’ Mas cheguei aqui e verifiquei que havia acordos firmados em escrito pelo governo anterior. O que está escrito tem de ser cumprido. Convenhamos, assumi interinamente. Vocês imaginaram servidores do Judiciário parados, do Ministério Público parados, do Tribunal de Contas, Receita, Polícia Federal, com a Olimpíada às portas?”, disse ao jornal O Globo.

Ficou de fora da medida, por enquanto, o reajuste salarial dos ministros do Supremo Tribunal Federal, uma ideia à qual já se mostrou contrário, pois “geraria uma cascata gravíssima” de gastos públicos.

Menos ministérios para mais eficiência

Uma das primeiras medidas tomadas por Michel Temer foi a redução de 32 para 23 do número de ministérios, a partir da fusão ou extinção de algumas pastas, com o objetivo de diminuir os gastos públicos e dar maior eficiência à administração pública. Entre os ministérios extintos estão a Secretaria de Portos, o ministério das Comunicações e o ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos.

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Michel Temer reduziu para 24 o número de pastas ministeriais (Antonio Lacerda/EPA)

Uma das fusões mais polémicas foi a do ministério da Cultura, que passou a fazer parte do ministério da Educação. Após as críticas e protestos da classe artística brasileira, Temer recuou e resolveu recuperar o Ministério da Cultura. “Sei como fazer o governo e saberei como conduzi-lo. Quando perceber que houve um equívoco na fala, na condução do governo, reverei posição. Não tem essa coisa de ‘não erro’. Se o fizer, concertá-lo-ei”, afirmou, na altura.

Dilma Rousseff criticou a falta de diversidade de género e étnica na equipa ministerial de Temer. “Temos um ministério de homens velhos, ricos e brancos, sem negros e sem mulheres. Esta é a cara e a face mais triste do governo”, criticou.

Os programas sociais de Michel Temer

Michel Temer e programas sociais. Para o PT e os outros partidos da oposição, esta é uma combinação impossível, pois implicaria a apropriação de uma das maiores bandeiras dos governos petistas, além de contribuir para mais gastos públicos – o que contrariaria o pensamento do Presidente.

No entanto, numa carta ao Congresso, Temer disse que os programas sociais são “prioridade” para o governo e que quer “aperfeiçoar cada vez mais” os mecanismos de transferência de renda para a população mais pobre.

Para marcar a diferença em relação a Dilma Rousseff sem interromper a continuidade das suas ideias, anunciou o lançamento do programa “Cheque Reforma” em 2017, com o objetivo de beneficiar famílias com renda mensal de zero a três salários mínimos (equivalente a cerca de 715 euros) que desejem reformar, ampliar ou melhorar as condições habitacionais das suas residências. O valor da ajuda pode chegar até cerca de 1.350 euros. A medida foi considerada um contraponto ao programa “Minha Casa, Minha Vida”, responsável pela construção de unidades habitacionais para famílias com rendimento bruto mensal até 423 euros – e um dos principais programas dos governos petistas.

Outro programa social com a assinatura de Temer é o “Criança Feliz”, feito para crianças até aos três anos de idade, filhas de beneficiários do programa Bolsa Família. Essas crianças terão direito a visitas presenciais que acompanharão o seu desenvolvimento. “Vamos focar o desenvolvimento das habilidades e competências nos primeiros anos de vida para que essas crianças tenham um futuro melhor”, disse o ministro do Desenvolvimento Social, Osmar Terra, em declarações ao site UOL. Para a realização do programa, serão contratadas cerca de 80 mil pessoas para fazer o atendimento presencial aos beneficiários, com um custo anual estimado de cerca de 542 milhões de euros, segundo a publicação. Segundo avançou a imprensa brasileira, caberá à primeira-dama, Marcela Temer, coordenar a iniciativa.

O que Michel Temer quer (e espera) fazer como Presidente efetivo

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Michel Temer defende algumas reformas na Constituição brasileira

Após o afastamento definitivo de Dilma Rousseff, Michel Temer assumiu a Presidência do Brasil para terminar o seu mandato até 31 de dezembro de 2018. Temer não possui um plano de governo e não confirmou se pretende divulgar algum documento com as medidas que pretende adotar no comando do país. Os brasileiros e os meios de comunicação estão a descobrir os planos do governo à medida que são anunciados ou citados em discursos do próprio Temer e da sua equipa ministerial.

Estes são as medidas que Michel Temer discutiu ou aprovou até ao momento:

Reforma laboral

O primeiro tema delicado sobre a mesa de Michel Temer é a reforma trabalhista. No seu discurso de posse como Presidente do Brasil, já havia avisado: “Temos que modernizar a legislação trabalhista, para garantir os atuais e gerar novos empregos”. Segundo explica o jornal O Globo, a proposta que está a ser elaborada pelo governo prevê a flexibilização de direitos assegurados aos trabalhadores, mediante negociações coletivas. Temas como a redução de jornada de trabalho e de salários fariam parte destas negociações coletivas, por exemplo, enquanto questões individuais relacionadas com a saúde e segurança dos trabalhadores ficariam de fora dos acordos.

Segundo declarações do ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, a reforma trabalhista também pretende expandir as modalidades permitidas de contrato formal de trabalho, ao incluir as jornadas de trabalho por horas trabalhadas ou por produtividade. Outra possível alteração seria a mudança da jornada de trabalho para um limite de até 48 horas semanais (44 horas regulares e quatro horas extra), desde que se trabalhe até 12 horas diárias. Atualmente, a Constituição brasileira estabelece a quantidade máxima de 8 horas diárias e um total de 44 horas semanais.

"Medidas impopulares" pela falta de "ambição eleitoral para 2018"

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Michel Temer afirmou, numa entrevista, esta quarta-feira, à Bloomberg, que não pretende concorrer às eleições presidenciais de 2018, por isso sentia-se “à vontade” para avançar com “medidas impopulares”.

“Eu não tenho nenhuma ambição eleitoral para 2018, portanto, vou estar à vontade para enfrentar problemas aparentemente impopulares. Estou tomando uma posição mais dura na política e na economia”, assegurou.

De acordo com a última sondagem do instituto Datafolha, divulgada em julho, apenas 14% dos entrevistados avaliam como “bom” o governo de Michel Temer. Na última avaliação feita a Dilma Rousseff, em abril, o índice de “bom” correspondeu a 13%.

O anúncio das medidas que estão a ser estudadas pelo governo já gerou diversas críticas dos partidos da oposição e de centrais sindicais. A Central Única dos Trabalhadores (CUT), uma das maiores do Brasil, afirmou que “o país não precisa agora de uma mudança nas relações de trabalho e sim de uma agenda económica que faça o Brasil voltar a crescer”. “Essa nova agenda trabalhista só vai servir para precarizar ainda mais o trabalho. Precisamos de empregos e de qualidade”, defendeu, num comunicado de imprensa.

A polémica fez com que Nogueira tivesse que conceder várias entrevistas aos media brasileiros para esclarecer a proposta. ” [Trabalhar diariamente] 12 horas é voltar ao tempo da escravidão. Direito você mantém, não retira. Venho do meio sindical, imagina se apresentaria proposta de aumento de jornada. Serão mantidas as 44 horas de trabalho por semana”, destacou ao jornal Estado de S. Paulo.

O governo Temer pretende enviar a proposta final da reforma laboral para o Congresso no próximo ano.

Reforma das pensões

O segundo tema difícil para o governo Temer é a reforma das pensões. De acordo com o site G1, Temer vai propor ao Congresso a implantação de uma idade mínima de 65 anos para a reforma, tanto para homens como para mulheres, válida igualmente para funcionários públicos e para a iniciativa privada. A regra funcionaria para os trabalhadores que têm menos de 50 anos. Aqueles que já ultrapassaram a idade teriam de pagar uma taxa proporcional ao tempo que falta para a reforma.

An elderly couple walks along a street in Paraty, 280km south of Rio de Janeiro, Brazil on April 7, 2012. AFP PHOTO /VANDERLEI ALMEIDA (Photo credit should read VANDERLEI ALMEIDA/AFP/Getty Images)

(VANDERLEI ALMEIDA/AFP/Getty Images)

No documento “Pontes para o Futuro”, o PMDB já avançava a ideia: “É preciso ampliar a idade mínima para a aposentadoria, de sorte que as pessoas passem mais tempo de suas vidas trabalhando e contribuindo, e menos tempo aposentados. Não é uma escolha, mas um ditame da evolução demográfica e do limite de impostos que a sociedade concorda em pagar”.

Atualmente, não há idade mínima para a reforma no Brasil. Para receber o benefício, um homem deve contribuir com a Previdência por 35 anos ou a soma de sua idade mais o tempo de contribuição tem de resultar em 95 anos. Para as mulheres, as contas são diferentes: são 30 anos de contribuição ou 85 anos, se somados os tempos de contribuição e a idade.

Reforma tributária

A reforma tributária é mais um tema difícil para Temer no Congresso brasileiro. No documento “Uma Ponte para o Futuro”, o PMDB citou algumas medidas que acredita serem necessárias para “construir uma trajetória de equilíbrio fiscal duradoura, com superávite e redução progressiva do endividamento público”: reduzir o número de impostos, unificar a legislação do ICMS (imposto sobre operações para a circulação de mercadorias e prestação de serviços entre estados e municípios brasileiros) e racionalizar “procedimentos burocráticos”. Acredita-se que estas serão as medidas adotadas pelo governo.

Até ao momento, não foi anunciada nenhuma proposta neste sentido. Henrique Meirelles, ministro das Finanças, garantiu, em maio, que não descarta a utilização de impostos para equilibrar as contas públicas ante o défice elevado do setor.

Orçamento "zero"

“No Brasil, a maior parte do orçamento chega ao Congresso para ser discutido e votado, com a maior parte dos recursos já previamente comprometidos ou contratados, seja por meio de vinculações constitucionais, seja por indexação obrigatória dos valores. Assim, a maior parte das despesas públicas tornou-se obrigatória, quer haja recursos ou não. Daí a inevitabilidade dos défices, quando os recursos previstos não se realizam, ou porque as receitas foram superestimadas, ou porque houve retração na atividade económica, e portanto perda de receitas”.

O documento do PMDB já avançava, em 2015, a necessidade mudar a maneira como o governo envia ao Congresso o Orçamento da União, equivalente ao Orçamento do Estado em Portugal. Para isto, defende o fim de todas as predefinições de gastos para salários e benefícios previdenciários, por exemplo, que estão garantidos na Constituição. “A cada ano o Congresso, na votação do orçamento, decidirá, em conjunto com o Executivo, os reajustes que serão concedidos”, propõe.

Revisão dos programas sociais

Ainda nos seus primeiros dias como Presidente interino, Michel Temer pediu uma auditoria de todos os programas sociais do governo. Na altura, Romero Jucá, então ministro do Planeamento, disse que “alguns programas” sociais estariam “com ‘subfuncionamento'” e já estariam progressivamente a receber menos investimentos de Dilma Rousseff.

Em abril, a Fundação Ulysses Guimarães, ligada ao PMDB, divulgou um documento chamado “A Travessia Social”, em que dizia que, caso assumisse a Presidência do Brasil, Michel Temer mudaria o foco do programa Bolsa Família (programa de transferência de renda do governo) para os “5% mais pobres da população, que seriam 10 milhões de brasileiros”, de modo a focar-se na inserção dos beneficiários no mercado de trabalho. Atualmente, o programa atende 45,8 milhões de pessoas, segundo dados do jornal Estado de S. Paulo. Até ao momento, não foram anunciadas medidas de cortes no Bolsa Família.

Pelo contrário, Temer aprovou, em junho, um reajuste médio no benefício de 12,5% durante o governo interino. No entanto, este aumento já estava previsto pelo governo de Dilma Rousseff. A petista havia anunciado em maio um aumento de 9% do valor médio da bolsa.

Já na educação, Temer suspendeu a concessão de novas bolsas para estudantes de graduação para o programa Ciência sem Fronteiras, programa de intercâmbio internacional e abertura de novas vagas para o Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), ProUni (Programa Universidade para Todos), FIES (Fundo de Financiamento Estudantil) e Brasil Alfabetizado (para o combate ao analfabetismo). Todos estes programas foram criados durante os governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff. O argumento utilizado pela equipa de Temer é que é preciso rever os custos e a eficiência destes programas.

No “Pontes para o Futuro”, a ideia da revisão dos programas sociais já era defendida. “A terceira regra nova do orçamento é a ideia de ‘orçamento com base zero’, que significa que a cada ano todos os programas estatais serão avaliados por um comité independente, que poderá sugerir a continuação ou o fim do programa, de acordo com os seus custos e benefícios. Hoje, os programas e projetos tendem a eternizar-se, mesmo quando há uma mudança completa das condições. De qualquer modo, o Congresso será sempre soberano e dará a palavra final sobre a continuação ou fim de cada programa ou projeto”, justifica.

Relações exteriores

“[Devemos] realizar a inserção plena da economia brasileira no comércio internacional, com maior abertura comercial e busca de acordos regionais de comércio em todas as áreas económicas relevantes – Estados Unidos, União Europeia e Ásia – com ou sem a companhia do Mercosul, embora preferencialmente com eles”. É desta maneira que o PMDB defende uma mudança nas relações exteriores do Brasil ao priorizar mercados como Estados Unidos, União Europeia e Ásia, no documento “Pontes para o Futuro”.

Esta seria uma guinada em relação aos governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff, que priorizaram as relações comerciais com a América Latina e com os BRICs (Rússia, Índia, China e África do Sul).

Para efetivar esta mudança, Temer defende que o Mercosul dê mais flexibilidade para que cada um dos seus membros possa fazer acordos comerciais independentemente dos seus parceiros. No modelo atual, qualquer negociação com países que não façam parte do bloco económico deve ser feita com a participação de todos os sócios fundadores (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai).

Durante a sua passagem por Nova Iorque, para a a reunião da Organização das Nações Unidas, Temer teve encontros bilaterais com investidores e chefes de Estado para anunciar o Programa de Parcerias e Investimento. Entre as pessoas que se reuniram com o líder brasileiro esteve o Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, a quem terá pedido que divulgue o plano para parceiros europeus.

Educação em avaliação

Michel Temer pretende fazer a maior reforma já realizada no ensino secundário das escolas públicas do Brasil. Esta quinta-feira, apresentou uma medida provisória que afeta a duração das aulas, os conteúdos ensinados e o exame que dá acesso à maioria das universidades do país.

Esta é a comparação das medidas que Temer propõe para a reforma do ensino secundário:

Como funciona atualmente O que o governo de Michel Temer propõe
Carga horária mínima de 800 horas anuais a tempo parcial (manhã ou tarde) Ampliação progressiva da carga horária para 1.400 horas anuais a tempo integral
Divisão do ensino secundário em três anos Escolas podem adotar um sistema de créditos em algumas disciplinas, como no ensino universitário
13 disciplinas obrigatórias nos três anos de ensino secundário No primeiro ano e na primeira metade do segundo ano continua-se a estudar as 13 disciplinas obrigatórias. A partir do segundo semestre do segundo ano, o aluno escolhe cinco opções de áreas de estudo para aprofundar: linguagens, matemática, ciências da natureza, humanas e ensino técnico
Educação física e artes são disciplinas obrigatórias nos três anos Educação física e artes deixam de ser obrigatórios para todos os alunos
Professores têm de ter formação específica na sua área de ensino e são contratados por concurso público Professores podem ser contratados sem concurso e apenas com notório saber numa área de conhecimento, mesmo que não tenham formação académica específica na matéria
Governo dá incentivos pontuais a alguns programas de incentivo ao ensino secundário integral O governo dá apoio financeiro por quatro anos a todas as escolas que introduzam o ensino a tempo integral

De acordo com o Presidente do Brasil, a ideia é que as mudanças sejam realizadas progressivamente até 2018. Como a proposta foi enviada ao Congresso como medida provisória e não como projeto de lei, passa a ter prioridade para que seja votada pelos parlamentares. Num prazo de 120 dias, é necessário que seja analisada por uma comissão especial e, em seguida, aprovada na Câmara dos Deputados e no Senado.

A proposta de reforma no ensino secundário já está a alimentar discussões sobre as mudanças que implica. O Conselho Federal de Educação Física, por exemplo, criticou a retirada do caráter obrigatório da disciplina. “Acabamos de sair de uma década de eventos desportivos, onde ficou comprovada a importância da prática de desportos e propõem uma medida provisória na contramão disso?”, pergunta o presidente da entidade, Jorge Steinhilber, citado pelo Jornal do Comércio.

Já Ministério Público Federal considerou “pouco democrático” que a reformulação do ensino secundário tenha sido realizada por meio de uma medida provisória.