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MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Suceder a um líder carismático. Haverá coisa pior?

Assunção Cristas é a nova líder do CDS, depois de 16 anos de Paulo Portas. Ser indicada pelo antigo líder e manter a herança podem garantir uma liderança tranquila - mas tudo depende dos resultados.

Assunção Cristas sucedeu a Paulo Portas, mas não é o primeiro caso de sucessão de um líder carismático na história da democracia em Portugal. Antes disso, houve quem tentasse substituir Álvaro Cunhal — que bate Portas em longevidade –, Cavaco Silva ou Mário Soares, nem sempre com sucesso. A receita para manter um partido unido, depois da saída de uma figura de topo, parece ser manter a linha e não contestar a herança. Mas isto pode não ser suficiente. Qual é a melhor maneira de suceder a uma figura histórica? Resultados.

“Tudo vai depender dos resultados eleitorais e das sondagens”, diz Carlos Jalali, professor auxiliar da Universidade de Aveiro, ao Observador. Antes de Assunção Cristas, outras figuras em Portugal passaram pela experiência de suceder a líderes carismáticas de partidos — alguns até fundadores — e as dificuldades encontradas nessas lideranças que se seguiram parecem ser as mesmas: quando o novo líder tenta romper com a liderança anterior e se o antigo líder tem ou não intenção de voltar. O académico lembra ao Observador as tentativas dos renovadores no Partido Comunista de tentarem contrariar as posições de Cunhal nos anos 90 e a mais recente tentativa de António José Seguro cortar com o PS de José Sócrates.

Sobre o regresso do líder carismático Paulo Portas, José Ribeiro e Castro — que manteve a liderança do CDS entre 2005 e 2007, quando Paulo Portas abandonou o partido depois das legislativas que deram maioria absoluta a Sócrates — disse que essa foi a sua maior dificuldade. “A minha dificuldade é que Paulo Portas quis voltar. Saiu em abril e em julho já queria regressar à liderança. Houve um contra-ataque e o regresso do antigo líder, que ninguém queria que se tivesse ido embora”, argumentou Ribeiro e Castro em declarações ao Observador. O centrista lembra até que aquando a saída de portas, nalgumas peças de televisão, aparecia um jovem a chorar e era o seu próprio filho.

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Paulo Portas comoveu-se no adeus final em Gondomar

Ribeiro e Castro e Paulo Portas chegaram mesmo a encontrar-se depois de este lhe ter sucedido na liderança do CDS. “Depois de ele ter ido para os Estados Unidos, chegámos a conversar. Penso que foi em maio. Aconselhou-me e falou-me até da índole de algumas pessoas no partido”, contou Ribeiro e Castro. E depois tudo mudou. O grupo parlamentar escolhido por Portas começou a enfrentar o líder e Portas regressou em 2007. “Assunção Cristas não terá este problema, já que é a sucessora favorita do líder e, embora não faça parte da sua direção, será cooperante”, afirma Ribeiro e Castro.

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Paulo Portas volta agora a ser protagonista, e desta vez de novo como o ator que sai de cena do partido. Mas agora, tudo parece diferente de quando saiu da primeira vez da liderança do CDS para dar lugar a Ribeiro e Castro. Agora, Paulo Portas já está a estudar possíveis saídas para se afastar da política nacional (mas não muito). O Expresso avançou que o centrista, que insistiu no seu discurso final no congresso que não diria adeus ao partido, pode vir a ter um programa num canal de cabo sobre política internacional. Certa é já a vice-presidência da Câmara de Comércio e Indústria, onde terá a seu cargo o pelouro da internacionalização e, segundo também noticiou o Expresso, o cargo não é remunerado. Seja como for, sairá do seu lugar como deputado, no Parlamento, até ao final de abril.

A dificuldade de suceder, mesmo quando o líder decide sair

A saída definitiva de um líder forte é mesmo uma das maneiras mais rápidas de regenerar um partido, mas só se for um verdadeiro corte. Segundo Carlos Jalali, a saída definitiva de Cavaco Silva é que permitiu que o cavaquismo e as suas figuras “se diluíssem”. Esta versão é também apoiada por António Capucho, agora desfiliado do PSD, mas histórico do partido. “Fundamentalmente houve uma sucessão natural de Fernando Nogueira. Ele dominava o partido e conhecia os dossiers“, afirma o antigo autarca de Cascais ao Observador sobre Fernando Nogueira, que sucedeu a Cavaco Silva depois deste ter estado 10 anos na liderança do PSD.

Capucho relembra que Nogueira tinha boa imagem, mas neste caso, as circunstâncias acabaram por estar contra ele – sucedeu a Cavaco em 1995, ano de eleições legislativas. “Fosse quem fosse que sucedesse a Cavaco ia ser complexo. Não só porque havia do lado socialista um adversário forte [António Guterres], mas porque havia uma clara vontade de alternância no poder”, relembrou o social-democrata. Fernando Nogueira, depois de defrontar Durão Barroso – então jovem ministro dos Negócios Estrangeiros que se candidatou à liderança do partido -, foi cabeça de lista do PSD às legislativas de 1995 e perdeu com 34,12% dos votos para o socialista.

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Cavaco Silva e Fernando Nogueira juntos em 1995

Capucho diz que apesar da derrota “foi um bom resultado” e que não havia pressões no partido para que o recém-eleito líder saísse. Mas em 1996, Fernando Nogueira não só abandonou a liderança do partido, como o mundo da política. “Apesar de ter perdido as eleições, ele podia ter-se mantido se fosse essa a sua vontade”, comenta António Capucho. No entanto, para a história fica um incidente com o antigo líder, Cavaco Silva, e que terá marcado profundamente Fernando Nogueira. Na altura, durante uma visita ao Algarve anunciou a candidatura de Cavaco Silva às presidenciais e este desmentiu-o. “Foi um incidente que ficou mal ao candidato e destruiu a dinâmica da campanha eleitoral, criando desconfiança face a Nogueira”, relatou Capucho. O tabu mais conhecido da democracia portuguesa ainda estava no seu auge e Cavaco nem o desfaria para salvar a face do sucessor. Aconteceu depois: Cavaco Silva acabaria mesmo por ser candidato às eleições presidenciais de 1996, que perdeu para Jorge Sampaio.

Quando a herança é um tabu

Romper ou não romper com o líder anterior? “Embora romper possa ser politicamente sensato, em termos eleitorais, pode não ser politicamente viável”, afirma Carlos Jalali. O politólogo dá dois exemplos recentes e contraditórios: o caso de António José Seguro, que sucedeu a José Sócrates e tentou romper com o líder anterior; e o caso da liderança bicéfala de Catarina Martins e de João Semedo, que se sucedeu a Francisco Louçã e que “nunca se meteu” no legado do antigo número um do partido.

“José Sócrates tinha carisma, algo que vem também muito com o poder e conseguiu uma maioria absoluta, a primeira do PS. Isso é algo que marca”, diz Álvaro Beleza

Álvaro Beleza, que integrou a direção de Seguro, reconhece que o antigo secretário-geral do PS teve dificuldades em afirmar a sua liderança por não ter conseguido chegar a cargos de poder político numa época política conturbada, o contrário do que alcançou o anterior primeiro-ministro socialista. “José Sócrates tinha carisma, algo que vem também muito com o poder e conseguiu uma maioria absoluta, a primeira do PS. Isso é algo que marca”, lembra o socialista. As épocas são diferentes, mas Sócrates conseguiu chegar a São Bento depois de anos de instabilidade política, com a queda do Governo de Durão Barroso, a substituição por Santana Lopes e a sequente queda do seu Executivo. E Seguro foi pressionado por não conseguir fazer frente a um Executivo PSD/CDS sob tutela da troika. António José Seguro acabou por ter três anos na oposição, sem se conseguir libertar dos críticos internos, e estes acabariam por provocar a sua saída e substituição por António Costa.

Mas no PS, as dificuldades de sucessão são mais antigas e começaram logo quando foi preciso arranjar um substituto para o fundador do partido, Mário Soares, em 1986. Vítor Constâncio ficou à frente do partido, mas não se manteve por muito tempo. Perdeu as eleições de 1987 para Cavaco Silva e acabou por sair da liderança em 1989.

Depois de Vítor Constâncio foi a vez de Jorge Sampaio, que se manteve no cargo até 1992. “O ex-Secretariado, do qual fazia parte Constâncio, Sampaio e Guterres, era muito forte e até muito crítico em relação a Soares nos seus últimos anos na liderança. Este conflito com o soarismo só foi ultrapassado com Guterres, que pacificou o PS. Mas até hoje ainda existe essa divisão“, argumenta Beleza em declarações ao Observador. Beleza que chegou a candidatar-se à liderança do partido em 1992 contra António Guterres, e perdeu para o atual candidato a secretário-geral da ONU.

Europeias 2014: campanha eleitoral do Partido Socialista

António José Seguro sucedeu a José Sócrates em 2011

A seguir a todas as lideranças marcantes, Álvaro Beleza considera que “há um luto muito difícil de fazer”. “Há sempre uma rutura com a linha anterior e a nova linha faz tabu da anterior. Na era de Seguro não se falava sobre Sócrates apesar de ele ter acabado de estar no poder como primeiro-ministro. Agora não se fala de Seguro. Nunca se faz um balanço do que aconteceu na liderança anterior talvez por pudor. É a nossa cultura“, defende o socialista.

Nos vários partidos, há ainda uma espécie de sucessão ideológica – dependendo se o líder é mais liberal ou menos liberal, mais à esquerda ou mais à direita. É um jogo mais evidente nos partidos do centrão, como PS e PSD, mas a que o CDS não é alheio. Essa luta tem sido evidente nas ultimas movimentações dos partidos. No PS, António Costa sempre se apresentou como o candidato que queria devolver o partido à esquerda do espetro partidário (e conseguiu os acordo com PCP, BE e PEV); Passos Coelho apresentou a sua recandidatura sob o slogan “social-democracia sempre”; e Assunção Cristas faz um discurso de quem quer puxar o partido para o centro.

É essa ideia que Beleza explica acontecer no PS, onde há mais marcadas duas fações: uma a que chama de militantes moderados, mais à direita, e outra de apoiantes mais à esquerda. E essa divisão, acredita tem influência nas lideranças do partido. “Essa tensão mantém-se no PS, porque em Portugal, trata-se do partido que está ao centro e os líderes vão alternando nesta sequência”, acrescenta Beleza.

"Há sempre uma rutura com a linha anterior e a nova linha faz tabu da anterior. Na era de Seguro não se falava sobre Sócrates apesar de ele ter acabado de estar no poder como primeiro-ministro. Agora não se fala de Seguro. Nunca se faz um balanço do que aconteceu na liderança anterior talvez por pudor. É a nossa cultura"
Álvaro Beleza ao Observador

O caso particular do CDS e das suas lideranças

Do ponto de vista ideológico, o CDS, que agora tem uma nova líder, é um partido particular no sistema político português. “O CDS nunca foi um partido marcadamente ideológico. As diferentes lideranças é que foram imprimindo a sua ideologia. Basta pensar no CDS com Lucas Pires e a sua veia europeísta e a seguir no CDS eurocético com Manuel Monteiro”, argumentou o professor universitário, indicando que no “portismo” também existiram estas mudanças ideológicas ao longo do tempo.

Com o apoio inicial de Portas e sem indicações de regresso antecipado, o grande desafio para Assunção Cristas será a popularidade do partido. E como teste, Ribeiro e Castro aponta já as eleições no Açores, que decorrem este ano, e também as eleições autárquicas em 2017 (o CDS conseguiu eleger cinco presidentes da Câmara em 2013). Carlos Jalali lembra que foram sempre os resultados eleitorais que acabaram por derrotar os líderes do CDS, com Freitas do Amaral, Lucas Pires, Adriano Moreira e até Paulo Portas (em 2005) a saírem devido a desilusões nas urnas.

Também Álvaro Beleza considera que a força de Assunção Cristas dentro do partido, vai depender do poder e projeção que esta consiga dar ao CDS. “É uma liderança difícil e só será facilitada com vitórias. A grande vitória de Paulo Portas foi ter levado o partido duas vezes para o Governo. Se ela tiver poder e ser esse poder ao CDS, vai conseguir marcar”, acredita o socialista.

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