As políticas económicas e o setor da educação são as áreas mais vulneráveis em Portugal, segundo um estudo alemão dos ‘Indicadores de Sustentabilidade Governativa‘ (SGI, na sigla inglesa), que avalia os progressos político-económicos nos vários países da OCDE. Ou seja, se o atual Executivo de Passos Coelho fosse a exame, passava à tangente com uma nota de 5,75 em 10, o equivalente a algo como ‘satisfaz menos’. Porquê? “Porque as medidas de austeridade dos últimos anos foram muito pesadas e não permitem para já uma recuperação”, disse ao Observador Daniel Schraad-Tischler, o especialista alemão que coordena o estudo.

O projeto, que já vai na sua terceira edição anual, foi divulgado pela Fundação Bertelsmann, detentora de uma das maiores multinacionais da área dos media, onde se encontra por exemplo o canal de televisão RTL e a conceituada editora Penguim Random House. Para além do alemão Daniel Schraad-Tischler, a investigação sobre Portugal foi desenvolvida pelo professor e investigador português Carlos Jalali e pelo investigador norte-americano Thomas Bruneau, sob a coordenação do espanhol César Colino, especialista nas economias do sul da Europa, que faz a ponderação das notas datas.

Numa escala de um a 10, o estudo avalia individualmente os 41 países da OCDE com base em três pilares: o desempenho das políticas – económicas, sociais e ambientais -, a qualidade do sistema democrático e a capacidade do Governo para executar reformas. Segundo Daniel Schraad-Tischler, a educação foi o setor mais prejudicado em Portugal ao longo dos últimos três anos.

“Os orçamentos das escolas e das universidades caíram, as propinas aumentaram, perderam-se professores e, desta forma, a qualidade da educação piora de ano para ano”, sustenta o investigador, sublinhando que “cortar na educação, que é uma área em que se deve investir por ser voltada para o futuro, é um erro”.

De facto, Portugal foi avaliado apenas com 4,1 no desempenho do setor da Educação, a nota mais baixa de toda a União Europeia – só a Grécia teve a mesma cotação. Os restantes países do sul tiveram todos uma nota superior.

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indicadores_sociais O desemprego, especialmente o desemprego jovem, é outro dos indicadores que mais estraga o retrato das políticas portuguesas. Entre maio de 2011, antes da troika, e abril de 2013, a taxa de desemprego passou de 12,6% para 17,8%, e no espaço de uma década aumentou mais do que quatro vezes (era 4,3% em 2002) – “uma pesada herança destes anos de austeridade”, diz Daniel Schraad-Tischler.

Aliás, a generalidade das políticas económicas atira Portugal para os últimos lugares do ranking e deixa à vista uma clara tendência de declínio. Em 2011, os indicadores de desempenho económico foram avaliados numa média de 5,2, e em 2014 (ano de publicação, referindo-se a 2013) caíram para 3,8.

Se olharmos para os 41 países avaliados, uma média global de 5,75 em 10 deixa Portugal no 27º posto da tabela. “No geral, Portugal inclui-se no grupo dos países que tiveram piores resultados, devido à recessão e às medidas de austeridade, mas conseguiu, por exemplo, melhores notas do que Espanha”, acrescenta o especialista alemão. Mas não em todos os alguns indicadores.

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Estas más notas, lê-se no estudo, têm uma explicação óbvia: o Programa de Ajustamento assinado em maio de 2011, que obrigou o país a pesadas medidas de austeridade para cumprir as obrigações fechadas com os credores. Ainda assim, a qualidade da democracia aparece bem cotada, com uma média de 7,5, que é igual à média da OCDE, sendo o indicador onde Portugal consegue as melhores notas. Neste ponto surge mesmo à frente de países como Reino Unido, Espanha, França ou Itália.

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Na capacidade de executar medidas e conduzir o país, o Governo teve uma avaliação geral positiva (6,1). Mas há aqui um parâmetro onde chumba com a negativa mais baixa de todas (1,7): a apresentação de provas que sustentem a tomada de decisões. E os autores do estudo apresentam um exemplo: quando o Governo propôs, em setembro de 2012, um aumento da contribuição para a segurança social, o ministro das Finanças (ainda Vítor Gaspar) sustentou que essa medida “iria fazer o emprego aumentar em 1% no espaço de dois anos”. “Mas esse relatório nunca foi tornado público, mesmo quando outros estudos académicos provaram que a medida iria ter um impacto contrário”. A medida acabou por cair.

Nas conclusões finais, o trabalho lembra ainda que Portugal enfrenta problemas de base, como as desigualdades sócio-económicas, que são “tanto a causa como a consequência do fraco crescimento económico”, a dificuldade de “converter legislação em políticas públicas de facto” e a lentidão do sistema judicial, que não só diminui a confiança dos cidadãos na justiça, como “enfraquece o poder das leis”.

O estudo foi realizado pela primeira vez em 2009, muito antes de Portugal pedir ajuda externa. Em 2011, foi divulgada a segunda edição, que analisa precisamente a prestação do Governo no período antes do pedido de resgate. “Uma coincidência”, diz ao Observador Carlos Jalali, que só entrou na equipa a partir da segunda edição, substituindo o politólogo português Pedro Magalhães.

“Há estudos parecidos mas nenhum com esta amplitude”, explica, acrescentando que este trabalho permite perceber “até que ponto os modelos de governação na OCDE são sustentados” e também fazer comparações directas uma vez que o questionário-base é igual para todos os países.