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Como funciona o processo de investidura?

A investidura é agendada depois de o Rei anunciar qual é o candidato político que ele entende estar em melhor posição para formar um Governo.

Depois disso, fica marcado o dia do debate da investidura e a respetiva votação.

Na primeira votação, só poderá ser formado um Governo se este for aprovado com maioria absoluta. Ou seja, se tiver 176 ou mais votos a favor.

Caso a primeira votação falhe, existe ainda uma derradeira hipótese para formar um executivo. 48 horas depois, faz-se a segunda votação, onde pode ser aprovado um Governo, caso este receba mais votos a favor do que contra. Aqui, é essencial que alguns daqueles que votaram contra na primeira votação passem a abster-se, de modo a que os votos a favor vençam com uma maioria simples.

A primeira votação deste debate de investidura está marcada para esta quarta-feira (31 de agosto). Se fracassar, terá de haver uma nova votação 48 horas depois, isto é, na sexta-feira (2 de setembro). Ambas as votações deverão começar às 9h00 locais (8h00 de Lisboa).

Em março do ano passado, depois de várias rondas de negociações anteriores à investidura, o Rei Filipe VI acabou por escolher Pedro Sánchez (PSOE) para apresentar ao Congresso dos Deputados uma solução de Governo — antes disso dirigiu o convite a Mariano Rajoy, do PP, que o rejeitou, alegando falta de condições.

Quer na primeira como na segunda votação, a solução de Governo proposta por Pedro Sánchez recebeu mais votos contra do que a favor, naquela que foi a única votação de investidura a resultar das eleições de 20 de dezembro. Dois meses depois daquela investidura falhada, ainda não havia Governo. Como tal, seguindo as regras, o Rei dissolveu o parlamento e convocou novas eleições.

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Há quanto tempo é que Espanha está à espera de um novo Governo?

Tendo em conta a data de publicação deste explicador e fazendo as contas a partir do dia 20 de dezembro de 2015 — o dia em que Espanha teve eleições gerais desde a vitória por maioria absoluta do Partido Popular, de Mariano Rajoy, em 2011 —, podemos dizer que Espanha já está à espera de um novo Governo há mais de oito meses.

Esta terça-feira, dia em que será debatida a investidura de um novo Governo de Mariano Rajoy, o número exato será de 256 dias.

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Que coligações é que podem ser feitas para se chegar a uma solução de Governo?

176 é o número mágico. É para esse número de deputados que qualquer Governo tem de apontar para ter uma maioria absoluta em Espanha.

Só que, como ultimamente tem sido demonstrado, em Espanha e também um pouco por toda a Europa, os tempos não andam favoráveis para maiorias absolutas. Por isso, resta aos partidos fazerem contas de somar.

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Eis as somas que, teoricamente, poderiam levar à formação de um Governo em Espanha:

Governo liderado pelo PP

  • PP (137) + PSOE (85)= 222 deputados
    Por mais que o PP procure o PSOE, este não parece estar disposto a formar um bloco central. Pedro Sánchez, o líder dos socialistas, tem sido claro e irredutível ao dizer que, por ele, o PP não vai governar.
  • PP (137) + PSOE (85) + Ciudadanos (32) = 254 deputados
    Esta é a opção que, matematicamente, é mais forte. Mas também difícil de obter. As razões são as mesmas de uma combinação PP+PSOE, mesmo que o Ciudadanos esteja envolvido na equação. Pedro Sánchez já disse que não quer ajudar à formação de um Governo do PP.

Governo liderado pelo PSOE

  • PSOE (85) + Ciudadanos (32) + Unidos Podemos (71) = 188 deputados
    Desde as eleições de junho de 2016 o Ciudadanos tem concentrado a maior parte dos seus esforços a negociar com o PP, descurando aqueles partidos que estão à sua esquerda. Se um pacto entre o Ciudadanos o PSOE num futuro próximo não é algo impossível (já o fizeram em março, quando foram chumbados pelo Congresso dos Deputados), será mais improvável que o partido de Albert Rivera se entenda com o Podemos. Pedro Sánchez bem tentou fazê-lo depois do chumbo de março, mas nunca esteve perto de consegui-lo.
  • PSOE (85) + Unidos Podemos (71) + Esquerda Republicana Catalã (9) + Partido Democrático Catalão (8) + Partido Nacional Basco (5) + EH Bildu (2) = 180
    Esta é, tendo em conta o atual quadro do Congresso dos Deputados, a única maneira de o Podemos permitir a formação de um Governo do PSOE sem ter de fazer concessões à direita. Ainda assim, teria uma ginástica muito forte pela frente. É que, ao juntar várias forças regionalistas, algumas com pendor independentista, muito provavelmente lhe seria exigida a realização de referendos à independência das suas regiões. Só que embora o Podemos não se importe com essa ideia — tem-na defendido ao longo dos tempos e nos seus programas eleitorais —, o mesmo já não se pode dizer do PSOE, que é contra qualquer tipo de referendo à independência. Como tal, dificilmente o PSOE se somará ao Podemos e a partidos independentistas para formar Governo.
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O que é que tem acontecido durante este tempo todo?

De forma resumida: ninguém se entende com ninguém, pelo menos ao ponto de formar Governo.

Agora, de forma mais completa. A verdade é que tem havido entendimentos. Depois das primeiras eleições, que aconteceram a 20 de dezembro do ano passado, foram ensaiadas várias coligações, mas nenhuma chegou a ser suficientemente abrangente para ser aprovada pelo Congresso dos Deputados.

No centro disto tudo estiveram os socialistas do PSOE, liderados por Pedro Sánchez, que ficaram em segundo lugar e que podiam ser a chave para desbloquear o impasse político do país. Os socialistas conquistaram este terreno depois de terem fechado a porta a qualquer entendimento com o PP, de Mariano Rajoy, vencedor por maioria simples. Assim, seguiram-se meses em que Pedro Sánchez ora se virou para a sua esquerda (Podemos, de Pablo Iglesias) ora para a sua direita (Ciudadanos, de Albert Rivera), ensaiando várias hipóteses.

O PP ficou de fora de tudo isto e Mariano Rajoy tornou-se numa figura estranhamente ausente do debate político espanhol, ao mesmo tempo que o seu partido ia lidando com as recorrentes acusações e suspeitas de corrupção. Mais tarde, uma personagem de um vídeo de campanha do Ciudadanos dizia que Mariano Rajoy “passou quatro meses a ler o [jornal desportivo] Marca”.

Enquanto isso, pelos lados do PSOE havia a certeza de que os socialistas só podiam chegar ao Governo com a ajuda do Ciudadanos e do Podemos. Mais concretamente, Pedro Sánchez precisava do apoio de um e pelo menos da abstenção do outro. Mas nenhum se mostrou disponível para isso. Pedro Sánchez chegou a apresentar-se ao Congresso dos Deputados com uma solução de Governo respaldada pelo Ciudadanos em março — mas foi chumbado, graças à oposição vincada do Podemos e, claro, do PP.

O avançar do calendário e a falta de entendimento acabou por ditar novas eleições, a 26 de junho. O resultado final foi mais ou menos aquilo que por vezes acontece num jogo de cartas: baralhamos tudo muito bem baralhado, depois partimos e quando pegamos nas cartas reparamos que está quase tudo na mesma.

As eleições de 26 de junho de 2016 acabaram por confirmar a ordem de preferência que resultou das eleições de 20 de dezembro de 2015 — ou seja, PP em primeiro, PSOE em segundo, Podemos em terceiro e Ciudadanos em quarto. Os números de deputados mudaram um pouco, com todos a perderem assentos parlamentares à exceção do Partido Popular, que ganhou 14.

Este novo fôlego — e nova vitória eleitoral — acabou por dar a legitimidade negocial que Mariano Rajoy tardou a reclamar após as primeiras eleições deste ciclo. A seguir a 20 de dezembro de 2015, mal soube que o PSOE não lhe ia dar apoio, Mariano Rajoy tornou-se numa figura pouco presente. Agora, saltava dos bastidores, como que pousando o jornal “Marca”.

Depois das eleições de 26 de junho deste ano, Mariano Rajoy e Albert Rivera têm estado à cabeça de todas as negociações para formar um novo Governo. Enquanto isso, o PSOE manteve o seu não-apoio ao PP, enviando sinais ambíguos tanto para o Ciudadanos como para o Podemos. Já o Podemos, de Pablo Iglesias, tem assistido a tudo isto da bancada. Isto porque as negociações neste momento só existem à direita — e, por isso, longe demais para o Podemos poder acenar com os seus 71 deputados.

Foi neste cenário que Mariano Rajoy e Albert Rivera anunciaram, no domingo, um pacto de investidura que contempla 150 medidas — sendo que 100 delas já tinham feito parte do acordo entre o PSOE e o Ciudadanos que foi chumbado no Congresso dos Deputados em março. Neste pacto, o PP e o Ciudadanos comprometem-se a não aumentar os impostos, preveem uma reversão dos cortes em políticas sociais, defendem a redução de número de senadores, anunciam um aperto do combate à corrupção e opõem-se à realização de referendos para a independência de regiões espanholas.

O acordo entre o PP e Ciudadanos tem um prazo de validade: se não for aprovado no Congresso dos Deputados (por maioria absoluta, numa primeira votação; por maioria simples, numa segunda votação), deixa de fazer efeito.

Certo é que Mariano Rajoy demonstrou pouca confiança quando anunciou o pacto. “É um acordo muito positivo, mas insuficiente”, disse, evitando falar muito das votações desta semana: “Não sei de maneira absoluta o que se vai passar na votação, mas estou cómodo com este acordo”.

Insuficiente ou não, cómodo ou incómodo, a verdade é que Pedro Sánchez já disse que vai votar contra uma investidura de Mariano Rajoy.

E, se esse cenário se confirmar, Espanha volta a confirmar o bloqueio político em que vive, ficando ainda mais próxima de umas terceiras eleições.

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O que diz o acordo do PP com o Ciudadanos?

O acordo entre os partidos de Mariano Rajoy e Albert Rivera contém um total de 150 medidas e serve de base à proposta de Governo que vai a votos esta semana no Congresso dos Deputados.

Entre a centena e meia de propostas, os dois partidos comprometeram-se a não aumentar impostos e a reverter os cortes nas políticas sociais. A nível político, é defendida uma redução do número de senadores e os autarcas passariam a ser escolhidos de forma direta — evitando situações como a de Madrid e Valência, em que o PP foi o mais votado mas não conseguiu governar depois de os outros partidos se terem unido após as eleições.

A nível da corrupção, o pacto prevê a proteção de quem denunciar casos de corrupção e defende pena de prisão em casos de enriquecimento ilícito de detentores de cargos públicos.

Pelo caminho, o Ciudadanos deixou cair a exigência de os partidos terem de fazer eleições primárias para elegerem os seus líderes.

O acordo entre o PP e o Ciudadanos vai a votos esta semana e, caso seja chumbado, será deitado por terra. Quando o anunciou, Mariano Rajoy disse que era “um acordo muito positivo, mas insuficiente”. Antes do anúncio, o porta-voz do Ciudadanos, Juan Carlos Girauta, já tinha falado sobre o acordo com algumas reservas. “Acontece que isto não é um pacto de Governo”, disse, a 18 de agosto. “Portanto, não tem de ser exaustivo. Pode ser amplo e tocar em muitos assuntos, mas não todos os que fazem parte da coisa pública.”

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E o que é que diz o PSOE?

O acordo entre os partidos de Mariano Rajoy e Albert Rivera contém um total de 150 medidas. Segundo o El País, 100 destas medidas já tinham sido incluídas no acordo entre o PSOE e o Ciudadanos, que ambos apresentaram ao Congresso dos Deputados em março e que acabou por ser chumbado.

O PSOE reagiu ao acordo entre dizendo que no pacto apresentado no domingo “o PP não se compromete com nenhum compromisso de fundo na reforma das nossas instituições democráticas nem na luta contra a corrupção”.

De acordo com o El País, os socialistas também criticaram a proposta de eleição direta para os autarcas (impedindo a formação de blocos pós-eleitorais, como aconteceu em Madrid e em Valência, onde o PP venceu mas acabou por não governar), referindo que “não é uma medida exigida pelos cidadãos”.

Na segunda-feira, Mariano Rajoy encontrou-se com Pedro Sánchez, naquela que foi a última tentativa do primeiro-ministro em funções de conseguir o apoio do líder socialista para poder formar Governo. Porém, Pedro Sánchez voltou a não ceder. Disse apenas que “o PSOE estará sempre na solução” e adiantou que, depois do presumível chumbo desta investidura, “a responsabilidade continuará sobre Rajoy, não sobre o PSOE”.

Depois de estar com Mariano Rajoy, recorrendo ao Twitter, Pedro Sánchez escreveu que “a reunião de hoje [segunda-feira] foi uma reunião prescindível, com a única intenção de não oferecer nada e com a clara intenção de nos culparem”. Sobre o pacto do Ciudadanos com o PP, disse: “Depois do seu acordo com o senhor Rivera temos mais razões para votar ‘não’ a Rajoy. É um programa de Governo conservador e continuista“.

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E o que diz o Podemos?

Depois dos resultados de 26 de junho, o Podemos ficou com menos possibilidades de, realisticamente falando, fazer parte de um Governo. Se não quiser entrar em diálogo com o Ciudadanos (bastante à sua direita), a única solução que tem à mão é conseguir juntar vários partidos regionalistas, a maior parte deles independentistas, e esperar que o PSOE se lhes junte — algo que os socialistas têm negado recorrentemente.

Como tal, o Podemos diz pouco ou nada. Pablo Iglesias tem sido um fantasma daquilo que já foi, à semelhança do seu partido, que tem optado por uma postura bastante mais discreta. Têm sido, por isso, espectadores dos últimos desenvolvimentos.

No domingo, quando foi anunciado o pacto entre o PP e o Ciudadanos, Pablo Iglesias reagiu com ironia no Twitter à tomada de posição do partido de Albert Rivera: “Bom, era uma questão de tempo até a filial do PP querer dar um salto até à equipa principal”.

Enquanto isso, o Podemos já se prepara para a próxima fase, depois do presumível chumbo da investidura de Mariano Rajoy desta semana. O passo seguinte passará sempre por um estender de mão ao PSOE — algo que, como já vimos anteriormente, tem enormes fragilidades. Ainda assim, será nessa solução que deverá continuar a insistir no debate da investidura, dirigindo-se diretamente a Pedro Sánchez.

Seja como for, o Podemos já começou a olhar para um futuro não tão próximo mas, ainda assim, bem possível: o de umas terceiras eleições, em dezembro. Até lá, o Podemos terá muito que pensar. Conseguirá finalmente ultrapassar o PSOE em número de deputados, como as sondagens para as eleições de junho chegaram a prever? Continuará a optar por um discurso mais suave, como fez nas eleições de junho de 2016, ou voltará à agressividade que marcou a sua retórica em dezembro de 2015?

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O que mudou das eleições de 20/12/2015 para as eleições de 26/06/2016?

Poucas coisas.

Apesar de as sondagens para as segunda eleições preverem uma subida do Podemos (que então se uniu à Izquierda Unida, formando a coligação Unidos Podemos) ao segundo lugar, a ordem de preferências acabou por ser a mesma das primeiras eleições. A única coisa que mudou foi o número de deputados — com o PP a subir e os outros três principais partidos a descerem.

Partido Popular (número de deputados)
Dezembro 2015 — 123
Junho 2016 — 137

PSOE (número de deputados)
Dezembro 2015 — 90
Junho 2016 — 85

Unidos Podemos (número de deputados)
Dezembro 2015 — 69 (Podemos) / 71 (Podemos + Izquierda Unida)
Junho 2016 — 71

Ciudadanos (número de deputados)
Dezembro 2015 — 40
Junho 2016 — 32

Apesar de algumas nuances, as eleições de 2016 confirmaram o que já tinha sido deixado claro pelas eleições de 2015: ou o PP e o PSOE se unem e formam um Governo de bloco central; ou três dos quatro principais partidos políticos consentem uma solução de Governo, seja de forma ativa (aprovando) ou de forma passiva (abstendo-se).

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Existe a possibilidade de Espanha ir de novo a eleições?

Sim.

Segundo o quinto parágrafo do Artigo 99º da Constituição de Espanha, que diz respeito aos procedimentos de uma investidura, há um prazo máximo de dois meses após o dia da primeira votação da investidura para ser formado um Governo. “Se depois de um prazo de dois meses (…) nenhum candidato tenha conseguido a confiança do Congresso, o Rei dissolverá as duas câmaras [o Congresso dos Deputados e o Senado] e convocará novas eleições”, lê-se na Constituição de Espanha.

Se esse cenário se confirmar — algo que, mantendo-se a atual postura do PSOE, é bem possível —, passa a valer a Lei Orgânica do Regime Eleitoral Geral, que indica que as eleições têm de acontecer 54 dias depois do anúncio de dissolução das Câmaras por parte do Rei, Filipe VI. Mandam as regras que as eleições são ao domingo. Assim, na prática, as eleições terão de ser no primeiro domingo após esses 54 dias.

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E, se houver novas eleições, quando é que elas vão ser?

Agora é que entra a parte “engraçada” disto tudo. Para entender a piada é preciso fazer contas. Vamos por partes, então.

Se a primeira votação para a investidura é dia 30 de agosto, os parlamentares espanhóis têm dois meses (ou seja, até 30 de outubro) para conseguir chegar a uma solução de Governo. Se voltarem a fracassar, o Rei dissolve o Congresso dos Deputados e o Senado e convoca novas eleições. Aí, passa a contar o prazo de 54 dias para marcar novas eleições.

Ora, se contarmos 54 dias de 30 de outubro para a frente, vamos aterrar a 23 de dezembro.

Se houver novas eleições, a data será 23 de dezembro, então?

Não. É que 23 de dezembro é uma sexta-feira. Assim, terão de acontecer no domingo seguinte.

Ou seja, dia 25 de dezembro. Já ouviu falar de uma coisa chamada Natal? Pois, os espanhóis também. Chamam-lhe navidad — e ter eleições nesse dia seria não só inédito como potencialmente uma má ideia.

Por isso é que, neste momento, já há partidos que estão a preparar uma alteração da lei eleitoral de maneira a evitar que as eleições aconteçam a 25 de dezembro. Essa hipótese já foi abertamente assumida pelo PSOE, pelo Podemos e pelo Ciudadanos, que deverão propor uma redução da duração da campanha eleitoral (aquela que seria a terceira em 12 meses), permitindo que as eleições fossem a 18 de dezembro e não no dia de Natal. Juntos, estes três partidos têm os votos suficientes para aprovar esta alteração — somam 188, mais dos que os 176 necessários.

Em teoria, o Partido Popular pode bloquear esta alteração, uma vez que o Governo tem um mês para se pronunciar sobre os projetos de lei. Além disso, tem maioria absoluta no Senado, que também terá de aprovar a alteração da lei eleitoral. Segundo o El País, o vice-secretário do PP disse que “é profundamente triste, dececionante e até escandaloso que alguns pretendam falar de terceiras eleições e não queiram falar sobre como formar um Governo para evitá-las”. Sobre a posição do PP e do Governo, foi pouco claro: “Nós vamos trabalhar para evitar novas eleições e quando chegar o momento, se surgir essa proposta, falaremos”.

Para já, Mariano Rajoy tem estado silencioso sobre este assunto. Porém, segundo o El País, o Governo espanhol também já está a preparar uma maneira de evitar que umas hipotéticas terceiras eleições calhem a 25 de dezembro. Seja como for, esse será um tema secundário no discurso dos populares enquanto continuarem a achar que têm margem de manobra para formar Governo.

A possibilidade de imobilismo por parte do PP e do Governo nesta questão também já tem sido encarada como uma manobra dos populares para fragilizarem Pedro Sánchez, tornando-o aos olhos dos espanhóis numa espécie de Grinch, que lhes roubou o Natal por não permitir a investidura do Governo de Mariano Rajoy. Pablo Echenique, do Podemos, até brincou com essa situação, referindo que algumas figuras de proa (e cada vez mais contrárias a Pedro Sánchez) dentro do PSOE iriam fazer disso bandeira: “Sai a Susana Díaz, juntamente com [Javier] Lambán e [Felipe] González, dizendo que o PSOE não pode ser culpado por dar cabo do Natal ao espanhóis em 3, 2, 1…”.

https://twitter.com/pnique/status/766321817388711936

A data limite para formar Governo é 30 de outubro — a mesma que os partidos têm para aprovar a alteração da lei eleitoral.

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O que é que o Governo em funções pode fazer e onde é que a sua ação é limitada?

O anterior recorde para um Governo em funções em Espanha tinha sido o de Felipe González, depois de ter perdido para o Partido Popular de José María Aznar, em 1996. Nessa altura, o PP não conseguiu a maioria absoluta, sendo que teve de ir buscar apoios a alguns partidos de pequena dimensão (Partido Nacional Basco, Coligação Canária e Convergência e União). Esse acordo, conhecido como o Pacto do Majestic, demorou 62 dias a ser concretizado e aprovado no Congresso dos Deputados.

Ora, o recorde de Aznar (ou González, consoante a ótica) já foi há muito quebrado no atual estado da política espanhola. Esta terça-feira, já são 255 dias com um Governo em funções, à falta de um novo executivo.

Segundo a lei espanhola, um Governo em funções “facilitará o normal desenvolvimento da formação do novo Governo e a transferência de poderes ao mesmo e limitará a sua gestão ao despacho ordinário de assuntos públicos, abstendo-se de adotar, excetuando casos urgentes devidamente acreditados ou por razões de interesse geral cuja acreditação expressão assim o justifique, quaisquer outras medidas”. Nestes casos de caráter urgente, o Congresso dos Deputados teria de aprovar as medidas propostas pelo Governo no prazo de 30 dias. O Governo também precisa da autorização daquela câmara para declarar o Estado de urgência.

O Governo em funções está igualmente impedido de fazer nomeações, ou destituir, detentores de altos cargos da administração pública.

Neste período, o alcance do poder do Presidente do Governo em funções (neste caso, Mariano Rajoy) também é limitado. Além de não poder apresentar projetos-lei ao Congresso dos Deputados e ao Senado, também não pode aprovar o Orçamento do Estado.

A questão do Orçamento do Estado tem merecido maior atenção por parte de Mariano Rajoy. “Se a situação económica não se ressentiu ainda foi porque no ano passado fizemos um orçamento”, disse no início de agosto. “Por isso considero prioritário ter [um novo orçamento] e com isto não se pode brincar”, acrescentou, apontando 15 de outubro como uma data importante. “É crucial elaborar um orçamento e aprovar um limite para a despesa.”

Será a 15 de outubro que Espanha terá de informar a Comissão Europeia como pretende baixar o défice público — atualmente nos 5,1% do PIB — para o objetivo acordado de 4,6% já este ano e, posteriormente para 3,1% em 2017 e para 2,2% em 2018. Mas haverá governo para o fazer?

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O que diz Bruxelas do impasse em Espanha?

Pouco.

No dia seguinte às eleições de 26 de junho, o porta-voz do executivo da Comissão Europeia, Margaritis Schinas, expressou o desejo de que um Governo fosse encontrado em breve. “Esperamos que um Governo estável possa agora ser formado, de modo a que a Espanha possa continuar a trabalhar de perto com as instituições europeias e os seus parceiros da União Europeia”, disse Schinas, citando uma mensagem de Jean-Claude Juncker enviada a Mariano Rajoy.

Porém, Bruxelas tem assistido em relativo silêncio ao impasse em Espanha. Com tarefas de peso em mãos — por um lado, está o processo que se seguirá ao referendo do Brexit; por outro há a crise dos refugiados e aparente instabilidade do acordo da UE com a Turquia — Bruxelas tem desviado as suas atenções de Madrid.

Ainda assim, Espanha não passou ao lado do episódio em torno da aplicação de sanções por incumprimento das metas do défice — abaixo dos 3% —, à semelhança de Portugal. “Nos últimos tempos Espanha tem dado passos atrás na correção do seu défice excessivo e não tem cumprido os seus objetivos orçamentais”, disse o vice-Presidente da Comissão Europeia e Comissário para o Euro, o letão Valdis Dombrovkis, em julho, quando foi aberto o procedimento para a aplicação de sanções a Portugal e Espanha.

No final de contas, Bruxelas alargou o prazo de correção do défice para Espanha em dois anos (Portugal teve um ano), aplicando-lhe uma “sanção-zero”. Segundo o acordado pelo Eurogrupo, o défice espanhol (atualmente nos 5,1% do PIB), terá de baixar até 4,6% ainda este ano. Depois, em 2017 terá de chegar aos 3,1% — uma descida considerável, mas ainda acima do limite imposto pelo Tratado Orçamental. Só em 2018 é que terá de descer abaixo dos 3%, chegando aos 2,2%.