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O que significa o termo "cidadania 2.0"?

O termo serve para descrever projetos de cidadania que recorrem às redes e ferramentas sociais, como o Facebook, Twitter ou Instagram, para se propagarem com maior impacto. O objetivo é o de viabilizarem e potenciarem o diálogo e a participação em sociedade.

O termo surgiu em 2010, a par da primeira edição do evento que tem o mesmo nome. O Cidadania 2.0 é um evento sem fins lucrativos, organizado por três cidadãos, que pretende inspirar, informar e impulsionar projetos que, através das redes e ferramentas sociais, dados abertos e aplicações móveis, promovem o diálogo em sociedade e a participação ativa dos cidadãos.

A quarta edição do Cidadania 2.0 realiza-se nos dias 26 e 27 de setembro, no Porto.

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De que forma é que as redes sociais podem promover uma maior participação cívica?

Não são só as redes sociais que permitem um maior diálogo entre cidadãos, mesmo a nível da tecnologia (web). Conceitos como o de “dados abertos” – dados que não têm restrições de utilização e publicação, como direitos autorais ou patentes – e tecnologias como os smartphones também o fazem. Todos permitem aumentar a partilha de informação, a transparência da informação, simplificar interações e recriar comportamentos sociais. Isto facilita a participação de todos os cidadãos em qualquer lugar e momento e a adaptação aos novos ritmos de vida.

“Isto acontece porque estamos, em muitos casos, a falar de iniciativas que assentam em espaços digitais que os cidadãos já utilizam, para questões pessoais ou relacionadas com trabalho, onde já ‘estão’ e com os quais se sentem confortáveis”, explica Ana Neves, uma das organizadoras do evento Cidadania 2.0.

O caráter de novidade e coolness associados a estas iniciativas torna-as capazes de atrair a atenção e participação das camadas mais jovens, que, segundo a especialista, estão geralmente mais alheadas dos processos democráticos de cidadania ativa.

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Como é que o Governo e autarquias podem utilizar este conceito para se aproximarem dos cidadãos?

Podem apostar em iniciativas de cidadania 2.0 para criar novos canais de diálogo com os cidadãos. As plataformas sociais são espaços multidirecionais de troca de informação e podem ser utilizados para, por exemplo, perceber a opinião dos cidadãos relativamente a assuntos críticos, que, muitas vezes, não é transmitida através de canais formais.

Dados sobre investimentos já realizados, planeamento de projetos, despesas públicas, taxas de utilização de equipamentos públicos, receitas fiscais geradas pelos vários setores de atividade são algumas das informações que podem ser ser disponibilizadas pelos poderes locais e central dentro de iniciativas de cidadania 2.0, permitindo a sua reutilização.

A divulgação de iniciativas em redes e ferramentas sociais também pode servir para aumentar a transparência de dados referentes à atuação do Governo e autarquias e aos da vida pública, como a taxa de utilização dos sanitários públicos ou gastos com os candeeiros de iluminação pública.

Os poderes locais e centrais também podem utilizar a cidadania 2.0 para envolver os cidadãos na identificação e avaliação de ideias para projetos futuros, partindo, por exemplo, dos dados públicos disponibilizados.

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O que fazer para promover mais o conceito nos vários agentes económicos?

Propagá-lo. “É necessário dar a conhecer de forma mais ampla as iniciativas já existentes, em Portugal e no estrangeiro, e o impacto que cada uma delas pode ter”, explica Ana Silva, outra das organizadoras do evento que ocorre a 26 e a 27 de setembro no Porto.

A plataforma Cidadania 2.0 tem disponível uma listagem de projetos, todos em língua portuguesa, que podem servir de referência ou dar resposta às necessidades sentidas pelos diversos agentes, explica Ana Neves. Estes devem servir como ponto de partida e inspiração para novas abordagens.

As empresas privadas já começaram a aderir ao conceito e Ana Neves explica que este movimento tem sido “crescente”, no âmbito do compromisso que as empresas estabelecem em termos de responsabilidade social e como forma de promover a sua marca. Segundo a especialista, é importante dar a conhecer e valorizar esse trabalho.

Na plataforma Cidadania 2.0 existem vários projetos que são apoiados por empresas privadas, como o Baably, Zizabi, Adoeci.com e Um país como nós.

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Quem é que pode beneficiar mais com estas iniciativas?

As Organizações Não Governamentais (ONG) e as instituições públicas, explica Ana Neves, uma das organizadoras do evento Cidadania 2.0. Porquê? Porque contribuem para uma redução de custos, maior dinamização da comunidade e uma melhor resposta aos direitos dos cidadãos.

Contudo, ainda existe algum receio provocado, sobretudo, pelo desconhecimento. Ana Neves explica que também é frequente associar estas tecnologias a canais para a manifestação pública de desagrado, a fóruns para a organização de manifestações, e a “perda de tempo” e acrescenta que os cidadãos têm abraçado estes conceitos de “forma extraordinária”, sendo responsáveis por lançar várias iniciativas.

Na plataforma Cidadania 2.0, existem 26 projetos lançados por cidadãos portugueses, uma “prova” de que os cidadãos se preocupam, que querem participar, mas que ambicionam novos canais e formas de o fazer, explica Ana Neves.

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Quais são as principais dificuldades dos cidadãos?

Falta de recursos e de competências que acompanhem o projeto da sua fase inicial à respetiva dinamização, passando pela fase de implementação e de comunicação, explica Ana Neves, um dos rostos por detrás da organização do Cidadania 2.0. As parcerias são outra das dificuldades apontadas, bem como a “fraca adesão” das instituições públicas e Organizações Não Governamentais.

Ana Neves adianta que é preciso abrir portas às iniciativas que nascem dos cidadãos e que não têm interesses económicos. E dá um exemplo: aqueles que procuram recolher e dar visibilidade a dados públicos. Contudo, explica, os promotores deste tipo de iniciativas são confrontados com a falta de disponibilidade das autarquias em fornecer os dados em formatos adequados e a falta de interesse em tirar partido dos dados que estas plataformas conseguem gerar. Estes dados poderiam ser utilizados para enriquecer a base de trabalho das instituições.

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Como é que estes projetos podem ser financiados?

Através de uma plataforma de crowdfunding, por exemplo. Neste sistema de financiamento coletivo online, que também consiste numa abordagem social e colaborativa, qualquer pessoa interessada no projeto em causa pode investir. Mas não só. A Comissão Europeia também disponibiliza fundos que se enquadram no âmbito da estratégia de crescimento para a União Europeia (UE) “Europa 2020”, que visa torná-la numa economia inteligente, sustentável e inclusiva. Muitos dos projetos de cidadania 2.0 encaixam nos objetivos da estratégia.

Os projetos de cidadania 2.0 são, regra geral, menos dispendiosos do que os tradicionais projetos de desenvolvimento de software, segundo Ana Neves. Isso prende-se com o facto de estes projetos assentarem, frequentemente, em software aberto e por terem uma abordagem ágil de desenvolvimento.

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Que países são uma referência em projetos de cidadania 2.0?

Os Estados Unidos da América, o Reino Unido e o Brasil. Porquê? Pela qualidade e volume de iniciativas que é possível encontrar nestes países, de acordo com Ana Neves, da organização do evento Cidadania 2.0. A especialista destaca o trabalho de organizações como a Code for America, Open Knowledge Foundation, FutureGov e MySociety, nos dois primeiros países.

Quanto ao Brasil, explica que é uma referência, com projetos que apostam no design e no conteúdo, criando instrumentos úteis, atrativos e fáceis de usar, e que representam investimentos “avultados”. Na plataforma Cidadania 2.0 estão presentes 19 projetos brasileiros, como o Voto x VetoCentral do Cidadão ou o QEdu, projeto que será apresentado no evento Cidadania 2.0 2014.

O Brasil, explica Ana Neves, é um país que está a beneficiar de uma dinâmica positiva, que dá grande visibilidade a este tipo de iniciativas, em publicações digitais de referência ou através de prémios, inspirando e impulsionando outros semelhantes.

E deixa outro exemplo: o caso da Islândia, que reescreveu a sua Constituição com os contributos dos cidadãos através de redes sociais.

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Quais são os projetos de maior sucesso?

Ana Neves deixa sete exemplos:

  • A nova Constituição islandesa, que foi criada com a contribuição dos cidadãos atavés do Facebook e do Twitter. Foi através destas redes sociais que os islandeses opinaram sobre as mudanças que gostariam de ver no país e sugeriram itens.
  • O Vote Na Web, um projeto brasileiro, que apresenta, numa versão mais simples e resumida, os vários projetos de lei propostos no Congresso Nacional.
  • O Minhas Cidades, outro projeto brasileiro, no qual qualquer pessoa pode começar uma mobilização, participar em mobilizações iniciadas por outras pessoas, colaborar com as comunidades para desenvolver soluções urbanas, registar-se para vigiar espaços públicos, entre outros.
  • O britânico FixMyStreet, uma plataforma onde os cidadãos podem reportar e discutir problemas da rua onde moram, e que inspirou o projeto português A Minha Rua.
  • O Avaaz, plataforma norte-americana para lançar e subscrever petições.
  • O QEdu, portal aberto com informação sobre a qualidade do ensino em cada escola, município e Estado do Brasil.
  • O norte-americano Data.gov, a “casa” onde moram todos os dados abertos do Governo dos Estados Unidos da América (EUA).

Em Portugal, Ana Neves destaca projetos que estão maioritariamente relacionados com a questão dos dados abertos e transparência, como o publicos.pt, PORDATA, o Má Despesa Pública e o LXAmanhã.

Mais recentemente, foram lançados projetos noutras áreas, como o Maps Crime, um serviço de partilha de informação criminal, que possibilita ao cidadão aceder e registar as ocorrências criminais de furto e roubo; o Adoeci, plataforma gratuita que promove a união de pessoas que tenham sido diagnosticadas com a mesma patologia; e o Portal de Transparência Municipal, uma ferramenta que disponibiliza informação detalhada sobre cada município.

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