As teorias da conspiração sobre a criação do Sars-CoV2 começaram a circular a partir do momento em que a China sinalizou à Organização Mundial de Saúde um novo vírus, que atacava a parte respiratória, e desde então não têm parado de se multiplicar.

Uma das publicações mais recentes no Facebook diz que a “instituição” que esteve no planeamento da pandemia é responsável por fabricar os testes que são depois distribuídos aos países para deteção da doença Covid-19. A instituição em causa seria a Charité, o Hospital Universitário em Berlim, e até haveria um “peluche”, distribuído “em Nova Iorque” aos participantes do evento de exercício contra uma pandemia virtual.

O problema é que a publicação mistura factos com falsidades.

Por partes. Efetivamente existiu um exercício de pandemia virtual, mas este foi organizado pela John Hopkins Center for Health Security, em Nova Iorque e não em Berlim. Em março, o Observador explicou no que tinha consistido e o que tinham os participantes aprendido com ele.

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Como os especialistas simularam uma pandemia no final de 2019

No exercício designado “Event 201”, que reuniu à mesa, durante três horas e meia, 15 indivíduos proeminentes associados a negócios à escala global, governos e saúde pública, a proposta era ilustrar áreas onde parcerias público-privadas seriam necessárias para dar resposta a uma “pandemia severa” e diminuir as consequências económicas e sociais de larga escala.

Em outubro, a John Hopkins Center for Health Security partilhou no Twitter uma imagem do peluche, onde apelava ao registo de “todos os interessados” no evento (que ficariam habilitados a ganhar um peluche de um ‘micróbio gigante’).

Confrontada mais tarde com o surgimento da Covid-19, o seu contágio à escala global — mesmo antes de ser sido declarada a pandemia — e questionada sobre se o exercício estava relacionado com o surgimento de um vírus na China, a John Hopkins Center for Health Security publicou um comunicado para esclarecer que a simulação realizada em outubro nada tinha que ver com o que o mundo enfrenta atualmente. “O Center for Health Security e parceiros não fizeram uma previsão durante o exercício. Para o cenário, modelámos uma pandemia de coronavírus fictícia, mas declaramos explicitamente que não era uma previsão.”

Publicação no Facebook sobre pandemia da Covid-19 ter sido criada num “exercício de pandemia virtual”.

Já no que diz respeito à imagem que surge associada ao Hospital Universitário de Berlim, que aparece na etiqueta, e que tem parecenças com o peluche que a John Hopkins Center for Health Security ofereceu por ocasião do evento, trata-se de uma imagem de uma micrografia eletrónica de transmissão colorida de uma partícula do coronavírus MERS, que está disponível num banco de imagens acessível a qualquer pessoa ou empresa que a compre.

O Sars-Cov2 é outro tipo de coronavírus, o mais recentemente descoberto, daí continuar a distinguir-se dos demais como “novo coronavírus”.

Atualmente, o Hospital Universitário de Berlim utiliza a imagem no seu site, numa das páginas dedicadas à Covid-19, mas não faz, nem nunca fez, parte do logotipo do hospital como a publicação sugere.

Website do Hospital Universitário de Berlim, Charité, com a imagem disponível no banco de imagens. (https://www.charite.de/en/)

Conclusão

A publicação quer sugerir que o Hospital Universitário de Berlim foi o responsável pelo exercício de pandemia virtual, cuja responsabilidade, pelo contrário, foi da John Hopkins Center for Health Security, que há meses negou qualquer relação entre o exercício virtual e o novo coronavírus que surgiu na China. O logotipo da Charité também foi manipulado para remeter para o símbolo usado no peluche de divulgação do evento, mas trata-se apenas da utilização de uma imagem do coronavírus MERS, disponível num banco de imagens e acessível a qualquer pessoa que o deseje utilizar. Todo o conteúdo da publicação foi manipulado para levar os utilizadores a pensar, uma vez mais, que o Sars-Cov2 foi criado em laboratório por humanos.

Assim, segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:

Errado

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

Nota 2: O Observador faz parte da Aliança CoronaVirusFacts / DatosCoronaVirus, um grupo que junta mais de 100 fact-checkers que combatem a desinformação relacionada com a pandemia da COVID-19. Leia mais sobre esta aliança aqui.

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