Logo na sua intervenção inicial no Parlamento, no debate do Estado da Nação, o primeiro-ministro António Costa — que o Presidente da República define como “otimista irritante” — traçou cinco indicadores positivos que diz que provam que havia uma “alternativa” às políticas de PSD/CDS.

Um desses indicadores foi relativo ao emprego, com o primeiro-ministro a dizer que “são mais de 175 mil os novos postos de trabalho criados desde 2016 e a taxa de desemprego recuou para 9,5%”. A taxa de desemprego é factual que está nos 9,5%, segundo dados do INE referentes a abril de 2017 publicados no final de junho. Aliás, os dados provisórios de maio apontam para os 9,4%. E quanto aos postos de trabalho?

O que está em causa?

A criação de emprego é, desde há muito, uma bandeira de vários Governos. José Sócrates chegou a prometer, antes de obter uma maioria absoluta, que iria criar 150 mil empregos. Falhou e foi motivo de chacota por essa promessa não cumprida. Neste caso, António Costa foi prudente e — na campanha para as legislativas, em agosto de 2015 — fez questão de dizer que a estimativa de criar 207 mil postos de trabalho era isso mesmo: “uma estimativa” do programa eleitoral e não uma promessa.

Mas as coisas nem têm corrido mal ao Governo a este nível. António Costa disse, esta quarta-feira à tarde no Parlamento, durante o debate do Estado da Nação, que desde 2016 “já foram criados mais de 175 mil novos postos de trabalho“. Depois disso, sem qualquer referência temporal, o vice-presidente da bancada do PS, João Paulo Correia, reforçou que “têm sido criados 264 empregos líquidos por dia, 11 empregos por hora” com o atual Governo.

Também Catarina Martins ajudou a solidificar a tese de António Costa dizendo que “passado um ano com um crescimento económico indesmentível” e que foram criados “mais de 150 mil postos de trabalho“. Acusou ainda a direita — que no passado acusava a “geringonça” de destruir o emprego e a economia — de querer os louros dos bons resultados económicos. O número de Catarina Martins não contradiz o de Costa já que o período referido pela líder do Bloco de Esquerda se situa entre maio de 2016 e maio de 2017, enquanto o do primeiro-ministro cobre o intervalo entre janeiro de 2016 e maio de 2017.

Estão os dois certos ou ambos errados?

Quais são os factos?

A única forma de perceber se desde 2016 foram criados 175 mil postos de trabalho é analisar os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) relativos à população empregada no final de dezembro de 2015 (ou seja, no início de janeiro de 2016) e ir aos últimos dados disponíveis, referentes a maio de 2017 (embora ainda sejam provisórios, já foram divulgados pelo INE a 30 de junho de 2017).

Olhando para os dados do INE, a nível de população empregada entre os 15 e os 64 anos (valores ajustados de sazonalidade) eram contabilizadas, em dezembro de 2015, 4.489.200 pessoas. Ora, em maio de 2017, a população empregada subiu para 4.658.9oo pessoas. Isto significa um aumento de 169 700 postos de trabalho líquidos. Portanto, menos 5.300 postos de trabalho do que os anunciados por António Costa.

Também Catarina Martins pecou por excesso. Os 150 mil postos de emprego que a líder do Bloco de Esquerda disse serem criados num ano foram na verdade 134.700 (olhando para os mesmos dados do INE entre maio de 2016 e maio de 2017). Os números aqui foram empolados em 15.300 postos de trabalho.

Conclusões

Embora o desvio não seja gritante, António Costa parece ter empolado os números. O primeiro-ministro disse que tinham sido mais de 175 mil postos trabalho, quando o número foi, pelo menos, inferior em mais de cinco mil postos de trabalho. É possível que tenha alguma indicação (que só mais tarde será publicada pelo INE) de que em junho o número tenha crescido. É certo que Costa errou por pouco, mas esticou os números conhecidos: que eram mais de 175 mil, quando não chegavam sequer aos 170 mil. Catarina Martins, com um período diferente, ainda empolou mais os dados do que o primeiro-ministro.

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