Com a economia numa velocidade cruzeiro muito moderada, um crescimento do PIB acima de 1% este ano parece cada vez mais improvável, mesmo depois da injeção de autoconfiança que foi a vitória no Europeu de futebol já no inicio do terceiro trimestre. Um défice abaixo dos 3% também parece cada vez mais uma miragem, mas neste caso tudo dependerá da capacidade do Governo em garantir as famosas “poupanças”.

Os números divulgados pelo INE não trouxeram infelizmente grandes surpresas tendo em conta os últimos indicadores mensais de confiança e de atividade.

A economia manteve a mesma taxa de crescimento do trimestre anterior, 0,2%, e continua numa trajetória de desaceleração em termos anuais, para 0,8%, depois de 0,9% no primeiro trimestre. O INE não divulgou ainda o detalhe por componentes, mas tudo indica que os detalhes a divulgar no final do mês não serão propriamente animadores: quer a procura interna (por via do investimento) quer as exportações continuam em desaceleração e a componente externa apenas contribui mais positivamente devido a queda das importações – o que está em linha com uma fraca procura doméstica.

Ou seja, não só a “recuperação de rendimentos” não resultou no desejado “choque de confiança” como até se pode começar a falar num choque negativo no investimento.

Crescimento acima de 1% este ano parece cada vez mais longe

Cada vez é mais certo que as estimativas do Governo de uma expansão de 1,8% do PIB não se irão materializar. Para tal acontecer o PIB teria de crescer 1,8% em cadeia em cada um dos próximos trimestres – um crescimento que não se vê em Portugal pelo menos desde os anos 70 (!) e que só tem paralelo em países como a Irlanda e algumas economias emergentes.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Em maio, depois da divulgação dos dados do primeiro trimestre escrevi que Portugal precisava de crescer como em 2000 para chegar às estimativas do Governo e que mais depressa a seleção chegava às meias-finais do Europeu do que tal número era atingido… Pois bem, Fernando Santos conseguiu o impossível, com um golo de Éder, e nem assim Mário Centeno acertará com as suas previsões.

Pondo os números para o resto do ano em perspetiva: se a economia portuguesa continuar a crescer ao mesmo ritmo por trimestre, chegará ao final do ano com um crescimento próximo dos 0,9%. Mesmo que consiga acelerar para o dobro nos próximos dois trimestres (0,4%), apenas será suficiente para chegar a 1%. Nos dois casos, será sempre um valor abaixo do ano passado (1,5%).

Os dados existentes para o 3º trimestre relativos ao Turismo, a confiança dos consumidores e ao mercado de trabalho são de certa forma animadores, mas, no entanto, não permitem ainda antecipar uma grande aceleração. O mais provável será que até ao final do ano a economia portuguesa se expanda entre os dois cenários em média 0,3%, correspondendo a 0,9% para o ano como um todo. É certo que a continuação do aumento dos salários na função publica e a descida da sobretaxa do IRS irão ajudar o consumo, mas o efeito destas medidas terá sido já antecipado (a julgar pela queda da taxa de poupança). Para além disso, as perspetivas para as exportações e principalmente para o investimento dificilmente irão melhorar substancialmente a julgar pelos últimos indicadores.

Menos crescimento… piores finanças públicas?

À partida, mesmo não sendo possível ter uma noção exata, será sempre negativo e os objetivos parecem também cada vez mais difíceis de atingir. Tendo em conta que não existe ainda informação não só quanto ao detalhe, mas também quanto as componentes nominais e preços, não é possível verificar em que medida é que a evolução da economia diverge do cenário do Ministério das Finanças. Partindo de um crescimento do PIB real de 0,9%, e assumindo que o objetivo do défice (em valor) é atingido, chega-se a um défice praticamente em linha com o objetivo (apenas 0,02% do PIB acima).

No entanto, tendo em conta os dados da execução orçamental em contas nacionais para o primeiro trimestre, a execução orçamental nos últimos trimestres do ano terá de ser melhor que nos últimos seis anos para conseguir reduzir o défice abaixo dos 3% do PIB. A melhoria do mercado de trabalho poderá ajudar, mas medidas como os aumentos de salários da função publica e a redução do IRS referidos acima, combinados com a redução do IVA da restauração e principalmente, uma economia cada vez mais estagnada e sujeita a cada vez maiores riscos fazem com que esta seja cada vez mais uma tarefa quase impossível.

Restam os cortes na despesa e as poupanças prometidas por todos os ministros das finanças – mas mesmo neste campo, as recentes notícias sobre novas contratações para compensar a redução do horário na função publica deverão moderar mesmo os otimistas mais “irritantes”.

Economista