Como é sabido, a “geringonça” acabou com a nefasta “austeridade”. Como é igualmente sabido, as finanças públicas continuam em situação crítica e profundamente dependentes das instituições europeias, pelo que se compreende que Mário Centeno tenha vindo prometer “atingir os objetivos no contexto do Orçamento do Estado para 2016, na execução rigorosa e estrita do Orçamento aprovado na Assembleia da República”.

Entalado entre a narrativa que construiu, a extrema-esquerda de cujo apoio depende e a realidade, o Governo vai jogando com as palavras e empurrando com a barriga. Apostando no tratamento bondoso de que beneficia por parte da generalidade da comunicação social, a apresentação e discussão sobre o Programa de Estabilidade insere-se plenamente neste limbo semântico.

Assim, nega-se sistematicamente que haja um “plano B” (o que deveria ser lido como uma declaração pública de irresponsabilidade governativa) ao mesmo tempo que se reitera o “compromisso assumido” com a Comissão Europeia no sentido de que “quando e se for necessário o Governo adotará medidas que coloquem a execução orçamental naquilo que é o Orçamento de Estado de 2016”.

Infelizmente para o país, a execução orçamental tem tudo para correr mal. Como bem sintetizou Alexandre Homem-Cristo, não há Programa de Estabilidade que resista a este modo de governar. As medidas adicionais (que não são um plano B) de adicional rigor (que não é austeridade) não deverão ter grande mistério: carregar ainda mais o saque fiscal para pagar as reversões e satisfazer as clientelas políticas mais influentes da “geringonça”.

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A realidade não se alterará – não há mesmo dinheiro para pagar mais socialismo – mas enquanto o país caminha alegremente para um novo resgate teremos pelo menos a satisfação semântica de concluir que a austeridade acabou porque já não lhe chamamos isso.

André Azevedo Alves é professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa

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