Quase não sobrevivi a estes Jogos Olímpicos (a que, de resto, não assisti mais de uma meia hora na totalidade). O problema não foi a falta de medalhas nacional, nem os sobressaltos na trave de Simone Biles. Não: já não aturava o escândalo diário com o titânico e esmagador sexismo que muitos viam a cada hora nos Jogos Olímpicos.

Era gente indignada porque as meninas do vólei de praia se tinham de vestir de bikini enquanto os meninos da mesma modalidade se vestiam modestamente de calções e t-shirt. Porque as ginastas se tinham de maquilhar e os ginastas estavam de pele, quando muito, coberta com um leve hidratante. Porque a menina brasileira que teve sexo na noite antes da prova não se qualificou para não sei o quê e foi criticada por isso, enquanto o menino passou pelos pingos da chuva – o facto de ele se ter qualificado e ela não, e de ela ter desobedecido às regras do treinador, claro, não tiveram nada a ver no tratamento diferenciado.

A que me delicia é a acusação terrível feita à humanidade masculina em geral – menos às boas almas xy que batem no coração contritas enquanto reproduzem estas ignóbeis injustiças nas redes sociais, número, no entanto, mais que compensado pelas colaboracionistas femininas – de avaliar as desportistas pela aparência em vez de pelos feitos desportivos. Onde já se viu um homem, esse verme, pretender olhar para uma mulher e sentir-se agradado com o que vê? Guilhotina com tal criatura.

Ficam os leitores do Observador avisados de que não poder ser. Gosta mais de ver futebol masculino do que feminino? Desde quando acha que é livre de gostar do que lhe apetece? Ou bem que começa a dividir o seu tempo e as suas inclinações irmãmente pelos dois sexos ou precisa de um corretivo doloroso qualquer. Acaso ocorreu-lhe ver o vólei de praia – modalidade a que usualmente dedica uma salutar distância – para apreciar as coxas firmes das atletas? Espero que esteja já a ler manuais de automutilação, para se castigar de ato de tal gravidade inqualificável.

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Não se preocupem os leitores a necessitar de reeducação. Eu acompanho-vos. Não sou grande frequentadora de eventos desportivos, nem na tv, mas sempre que vou a um concerto com orquestra dedico-me a apreciar os rapazes jeitosos que lá tocam. Tenho queda para os contrabaixistas. São geralmente agradáveis à vista – ou então sou eu que acho apelativo dominar musicalmente aquele gigante das cordas. Como não sou de fino ouvido musical, retiro tanto prazer dos músicos giros da orquestra como da sinfonia de Shostakovitch. Estou, por isso, neste momento, a ver se aceitam voluntários nos campos de reeducação pelo trabalho na Coreia do Norte para tentar tirar este meu hábito sexista de reparar nos homens atraentes em vez de nos violinistas de talento. Se encontrar, partilho a informação.

Dir-me-ão: deixe lá os maluquinhos, sem problemas mais graves na sua vida, gastarem o seu tempo com ninharias de sexismo inventado. Ora: não deixo. O sexismo existe, é algo muito sério e pernicioso, e é criminoso diluir-se a luta sem tréguas que merece nestes disparates. Num mundo (fico-me só por um exemplo) onde a violência sexual é ainda tão protegida pela investigação criminal e pelos juízes na hora das sentenças, quando ainda se questiona se a falta de consentimento explícito da mulher é suficiente para haver violação, não há tempo para gastar com os pruridos olímpicos.

E não se pode fazer tudo ao mesmo tempo? Mesmo que fosse lícito supor que se tem de corrigir o gosto subjetivo de um homem perante uma modalidade desportiva feminina (e eu acho que não é), não, não se pode fazer tudo ao mesmo tempo. Porque estas imbecilidades de inventar problemas onde não existem têm como consequência irritar e criar resistências nas pessoas, que assim vão considerar qualquer acusação de sexismo parvoíce desta estirpe e oferecer a sua oposição a todas, mesmo às reais e importantes.

É por esta propensão para as ninharias que temos um governo que em 19 administradores para a CGD consegue o feito de nomear apenas uma mulher. As mulheres pelos vistos não podem ser banqueiras, o que extermina logo a candidatura de Helena Matos. Isto do governo pantomineiro cuja secretária de estado gasta o tempo pago pelos contribuintes a inspecionar ofertas de empresas privadas aos seus clientes.

E agora dou outro salto, rápido, para a proibição dos burkinis em algumas praias de França. É penoso constatar como se convive melhor, nos círculos feministas loucos, com as realidades que determinam que uma mulher se tape toda, inclusive na praia, do que com a mais que natural apreciação masculina das caras e corpos femininos.

É certo que esta oposição à proibição do uso do burkini, ou da burqa e do niqab, se faz esgrimindo o argumento da suposta liberdade das mulheres muçulmanas que, livres como passarinhos, escolhem cobrir-se totalmente (a liberdade de não se entusiasmar com o desporto feminino já é malvista). Mas é muito mais insidioso que isso. As mulheres que escolhem ganhar a sua vida (e assim se tornam independentes) explorando a sua imagem, são atacadas pelas feministas loucas. Já as islâmicas que se cobrem, chega-se ao ponto aviltante de defender, são as verdadeiras feministas porque recusam ser objetivadas, esse pecado maior do século XXI.

A verdade muito feia de certos cantos feministas é esta: a total incompatibilidade do islão com os direitos humanos das mulheres não os perturba, ofensivo mesmo é uma mulher (desportista olímpica ou não) ser olhada com desejo por um homem.