Os recentes atentados perpetrados no aeroporto e no metro de Bruxelas e reivindicados pelo autoproclamado Estado Islâmico desencadearam reações díspares. Assim, enquanto no Mundo Ocidental as imagens dos massacres de civis suscitaram uma onda de revolta e comoção, nas zonas do globo onde o Daesh tem seguidores as manifestações foram de júbilo.

Esta discrepância reativa relativamente a um mesmo facto explica-se pelos princípios e interesses em jogo.

De um lado, a civilização ocidental que, malgrado uma história marcada mais pelo conflito do que pela paz, acabou por aceitar que, embora a paz eterna fosse uma utopia, haveria que fazer da defesa dos Direitos do Homem a sua bússola.

Do outro lado, um grupo terrorista que deixou de se rever na matriz inicial da Al-Qaeda e, tendo em conta os estudos de Bernard Haykel, pretende um regresso civilizacional ao século VII, ou seja, aos primórdios da sua fé. Ideia que também já tinha passado pela mente de Fraga Iribarne quando referiu que o hiperterrorismo do século XXI se constrói a partir de uma interpretação radical e violenta do Islão.

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Daesh que se assume como o veículo do apocalipse e cujo fundamentalismo identifica como inimigos, tanto os infiéis como os islâmicos acusados de apostatas, com a agravante de a excomunhão – takfir – ameaçar tornar-se banal no califado.

Sendo consensual que os atentados no coração da União Europeia se inserem numa prática terrorista que implicou um reduzido investimento a nível tecnológico e operacional, não é menos verdade que o resultado de tais ações serviu, por inteiro, os interesses do Daesh.

De facto, se a profusão e o horror das imagens suscitaram repulsa, também constituíram uma forma inequívoca de propaganda do grupo terrorista.

Face ao exposto, talvez seja oportuno o Ocidente passar a olhar para esta realidade com uma atitude mais assertiva. Importa ir além das condolências e das palavras de circunstância. A gravidade da situação exige ação concertada. Aceitar as responsabilidades próprias – o fracasso das políticas de integração e a consequente formação de guetos ou de uma geografia periférica de falta de oportunidades, fonte privilegiada para o recrutamento de jihadistas –, promover a cooperação internacional ao nível da segurança e perceber que o desconhecimento das motivações do inimigo é incompatível com a definição de uma estratégia visando a sua derrota.

Enquanto o Ocidente não assumir que tem tratado o Daesh à luz de paradigmas que não se coadunam com a situação presente, as populações – e não apenas ocidentais – continuarão a ser vítimas de uma insegurança crescente.

O terrorismo alimenta-se da quebra de confianças dos homens nas instituições que edificaram para os representar.

É tempo do Ocidente acordar para a defesa do seu modelo civilizacional.

Professor universitário e politólogo