Espanha não se pode dar ao luxo de prolongar a sua instabilidade política. Depois de seis meses com um governo de gestão e com os resultados das eleições de Dezembro passado – que, em bom rigor, só serviram para aumentar o desgaste dos líderes partidários e para contribuir para um afastamento dos eleitores da esfera política – teria sido fundamental que os partidos políticos espanhóis tivessem aprendido a lição e explicado aos seus cidadãos a importância das eleições do próximo domingo para a estabilidade de Espanha, tanto a nível económico, como financeiro e político. Tal não aconteceu. E a verdade é que, provavelmente, a abstenção irá sofrer um aumento de cerca de 3-5% devido não apenas ao cansaço pela repetição de todo o processo eleitoral, mas também aos casos de corrupção nos quais estão envolvidos vários partidos e à ideia de que é possível Espanha sobreviver com um governo de gestão.

Sabemos que, para além da diminuição dos níveis de participação nestas eleições, o segmento dos indecisos terá, talvez mais do que no passado, uma enorme importância, a par do aumento substancial do poder do voto útil, no qual os eleitores não votam no partido que preferem mas sim naquele que julgam que irá obter melhores resultados. Ao mesmo tempo, o voto de rejeição ganha também especial força porque se, por um lado serve de castigo aos partidos que não foram suficientemente proactivos no pós-eleições, por outro funciona como um voto de retorno, ou seja, as pessoas que no 20-D deixaram de votar nas opões partidárias habituais e deram uma hipótese à nova política, nestas eleições provavelmente voltarão às opções partidárias habituais, ou seja, ao terreno do Partido Popular e do PSOE.

Nesse sentido, a estimativa de votos que terão os partidos rondará os 31% para o Partido Popular, os 24% para o Unidos-Podemos, 21% para o PSOE e 14% para os Ciudadanos. Como tal, parece-nos que nas eleições deste domingo haverá dois vencedores: o Partido Popular; e o Unidos-Podemos, ganhador moral ao obter um crescimento de votos como o que se prevê. Através desta previsão e estando a nossa análise correcta, os eixos da direita (PP e Ciudadanos) e da esquerda (PSOE e Unidos-Podemos) manter-se-ão equilibrados (cerca de 45% cada um), pelo que continuarão a não conseguir obter a maioria para formar governo. Neste cenário, tal como aconteceu em Portugal nas últimas eleições, pode-se chegar a um acordo a três, sem obviamente deixar de fora da negociação os partidos nacionalistas, que são maioritários no eixo da direita, mas sem esquecer que nestes casos há que ter em consideração o factor identidade pois estes encontram-se mais afastados do eixo da direita nacional que do eixo da esquerda.

A confirmarem-se estes resultados e este cenário de empate, os espanhóis viverão uma sensação de déjà vu, pelo que o líder menos prejudicado será aquele que conseguir compreender que é mesmo necessário escutar a mensagem dos eleitores e, pelo interesse nacional, agir com rapidez e colocar todas as forças na formação de um acordo de governo estável.

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A verdade é que os líderes conseguirem esquecer o seu umbigo e seguir a mensagem dos eleitores pode ser complicado, uma vez que a maioria dos temas que trataram durante esta campanha eleitoral foram similares aos da anterior, o que demonstrou que continuam sem estar preparados para responder ao desafio que lhes foi lançado pelos espanhóis.

Os tempos da nova política são também tempos de incerteza um pouco por todo o mundo mas sobretudo na Europa. O que se passará no futuro próximo não é fácil de prever, por toda a volatilidade e todas as mudanças e transformações deste século XXI, que afectam necessariamente os votantes. Na passada sexta-feira, o Reino Unido decidiu abandonar a União Europeia e para além de todas as consequências para os outros países europeus, o possível efeito de contágio às autonomias espanholas é um factor que os partidos não poderão deixar de ter em consideração na noite eleitoral. Isto porque, instabilidade, incerteza, imprevisibilidade e a mesma receita não são uma boa combinação para nem para conseguir alcançar um resultado diferente daquele que conduziu Espanha a este nova acto eleitoral, nem para manter a unidade do país.

Para que as eleições de hoje sirvam os interesses dos espanhóis é pois necessário que os líderes políticos acabem com esta sensação de déjà vu e que deixem de acreditar em contos de fadas, onde os casamentos se celebram por amor, e passem a seguir os ensinamentos da realpolitik. A unidade de Espanha justifica os meios.

José Luis Sanchís é ex-presidente mundial da Associação Internacional de Consultores Políticos (AICP) e Constança Martins da Cunha é consultora de comunicação