O Estado português tem um modelo de gestão: Penélope. O que faz de dia desfaz de noite. Se de manhãzinha começa a fomentar a criação de emprego, ao anoitecer inicia o desfomento. Se com luz desenvolve o mercado de arrendamento, na obscuridade desincentiva-o.

Um exemplo. Há empresas que não têm capital para empatar em imobiliário. Por isso egrégias instituições públicas, agentes do Estado, têm-se especializado em planear, construir, gerir e alugar espaços fabris e de escritórios com o objetivo de incentivar a atividade económica e criar emprego. “Que não seja por falta de instalações que não se crie uma empresa; nem seja por isso que ela não se venha instalar no nosso Concelho de Cascos de Rolha!”— é a filosofia subjacente. Também há famílias que similarmente não têm meios para comprar uma casa. Outras beneméritas instituições públicas têm-se dedicado em construir habitações que alugam, a rendas abaixo das praticadas no mercado, a famílias delas carentes com o fim de garantir que todos possam ter uma habitação, algo essencial a uma vida digna.

No entanto não são só instituições públicas que prestam este serviço. Bancos e não-bancos, seguradoras e outras empresas financeiras, também ganham o seu investindo em imobiliário que depois emprestam, alugam, e fazem o leasing a empresas e particulares. Este serviço é valioso e cria valor para os seus clientes. Porque lhes permite não investir em imobiliário e não ter que contrair empréstimos para comprar casa ou escritório. Porque permite evitar os riscos associados à posse de imóveis, desde terramotos à gestão jurídica dos imóveis, e evitar as trabalheiras de gerir e conservar as estruturas. Esta atividade do sector privado, que também fomenta a atividade económica e o emprego, liberta fundos do setor público para este poder acorrer a outras situações difíceis. Que este serviço é importante demonstra-o a preocupação cíclica dos governos com o atrofiamento do mercado de aluguer habitacional, e em fomentar o investimento e o emprego através da disponibilização dos espaços necessários para a atividade das empresas, através de investimento público em parques industriais e de serviços.

No entanto, a introdução de um imposto sobre o património acima dos 600 mil euros vem gripar este mecanismo ao desincentivar a criação de carteiras de imobiliário para arrendamento. Senão veja-se: se cada uma de cem empresas investir 600 mil euros em imóveis, não têm de pagar nada devido a este imposto; mas se uma instituição financeira investir 100 vezes 600 mil euros em 100 imóveis para alugar a 100 empresas, não será tributada nos primeiros 600 mil euros, mas será tributada nos restantes 59,4 milhões de euros a uma taxa previsível de 0,3%. Consequências previsíveis: o negócio de comprar para alugar vai diminuir, e empresas comerciais, agrícolas e de serviços, não vocacionadas para a gestão imobiliária vão passar a ter que investir em imóveis e a geri-los; e, como não têm os capitais necessários, o seu endividamento vai aumentar; e, se não conseguirem os empréstimos necessários, ou os não quiserem contrair, não lançarão novos produtos e serviços nem criarão emprego. Tal, por agora, não sucederá nas empresas industriais ou de turismo, numa espécie de plano de condicionamento industrial através do qual empresas próximas do governo escapam à respectiva voracidade fiscal.

Impostos, para além de financiar o Estado, alteram comportamentos. Quantos absurdos não fazem as empresas, as famílias e os mercados que são induzidos pelos impostos?

Professor de Finanças na AESE Business School

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