Em Julho de 2013, como que numa resposta (política e moral!) às crises económica e financeira iniciada em 2008, a OCDE, com o apoio político do G20, isto é, das vinte maiores economias do mundo, apresentou um plano de acção, traduzido em quinze action plans, de combate à erosão da base tributária e ao desvio de lucros para jurisdições de baixa (ou de nenhuma) tributação.

Passados pouco mais de dois anos, o Projecto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting), como é vulgar e tecnicamente chamado, foi finalmente concluído e publicado. Em rigor, as quinze BEPS actions não são mais do que recomendações da OCDE aos Governos, no combate à erosão da base tributária e ao desvio de lucros para jurisdições de baixa tributação. Tais recomendações são igualmente o resultado de um consenso político alargado entre os países da OCDE e o G20.

Perante isto, poderíamos dissertar sobre as causas deste importante e alargado acordo político, e justificá-lo com as necessidades crescentes de financiamento dos Estados através da cobrança de impostos. Contudo, já vários se debruçaram sobre o assunto. Falemos antes da resposta que alguns Estados (e/ou conjunto de Estados) estão a dar ao Projecto BEPS.

O último ECOFIN de 2015, isto é, na última reunião dos Ministros das Finanças dos Estados membros da União Europeia, que teve lugar a 2 de Dezembro, preparou-se um draft que se espera que se torne público já no ínicio de 2016, com a resposta europeia ao Projecto BEPS. Essa resposta traduzir-se-á numa nova directiva comunitária (anti-BEPS Directive) a ser proposta pela Comissão Europeia, e a ser adoptada pelos Estados membros até ao final de Dezembro de 2016. Ou seja, até ao final de 2016, todos os Estados europeus verão os seus sistemas fiscais mudarem substancialmente.

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A directiva anti-BEPS, a manter-se o draft preparado pelo ECOFIN, e claro, a ser aprovada por todos os Estados membros (tarefa difícil, visto que a Irlanda e os Estados Bálticos têm revelado algumas resistências à sua aprovação tal como está), terá um impacto muito significativo em áreas tão distintas como o tratamento fiscal a dar aos instrumentos híbridos, o financimento de subsidiárias sediadas em países comunitários e não comunitários, ou ainda, nas estruturas holding sediadas em Estados da União Europeia. Mais, a adopção da Directiva anti-BEPS representará um um avanço significativo no sentido da uniformização das regras de tributação directa no seio da União Europeia.

Entre outras, o draft prevê a adopção das seguintes medidas por parte dos 28 Estados membros:

  • Uma definição e um conceito comuns de estabelecimento estável/estabelecimento permanente, tentando eliminar potenciais estruturas artificiais e sem qualquer substância económica;
  • Uma regra comum em matéria de limitação da dedução de juros;
  • Uma regra comum em matéria de exit taxation;
  • A criação de diversas normas anti-abuso, em particular ao nível da “dupla dedução” em situações cross border; e,
  • A obrigação de tributação de dividendos que tenham origem em jurisdições (Estados terceiros) de baixa ou de nenhuma tributação.

Ora, se por um lado o draft da Directiva leverá a uma uniformização de alguns normativos fiscais no quadro dos países membros da União, facto positivo no sentido da integração comunitária e da competitividade europeia, enquanto bloco económico; por outro lado, não responde a (pelo menos) duas questões (práticas) fundamentais.

Primeiro, é omissa quanto à tributação de dividendos e rendimentos vindos de Estados terceiros, isto é, de Estados não comunitários, com taxas normais/elevadas de tributação, e que, estão temporariamente isentos, quer por uma qualquer isenção fiscal, ou por um benefício temporário.

Pode parecer um exemplo meramente académico, mas não. É comum, ver muitas multinacionais europeias, ao investirem em países em vias de desenvolvimento, nomeadamente em África, negociarem isenções temporárias de tributação directa, pelo que será importante que a versão final da Directiva anti-BEPS preveja tais situações.

Segundo, se o propósito principal deste novo quadro legal é o combate à erosão da base tributária e ao desvio de lucros para jurisdições de baixa tributação, não me parece que tal se consiga sem a introdução da (tão esperada) Directiva CCCTB (Common Consolidated Corporate Tax Base).

Mais, a medida que prevê a tributação de dividendos que tenham origem em jurisdições (Estados terceiros) de baixa ou de nenhuma tributação, levará apenas a que se altere a forma como as empresas estruturam os seus investimentos e não, ao combate real à erosão da base tributária. Em última análise, o Estado comunitário que tiver a taxa de tributação directa mais baixa, será sempre o destino preferencial, em detrimento dos demais.

Em todo o caso, a adopção desta Directiva será um importante passo no combate à erosão fiscal, na medida em que uniformiza regras e conceitos (tal como enunciados anteriormente) ao nível Europeu.

Irónico (ou não), a Holanda, um dos Estados mais entusiastas da Directiva anti-BEPS assumirá a presidência rotativa da UE no primeiro semestre de 2016, e, já afirmou que a adopção deste diploma por parte dos Estados membros é uma das suas prioridades.

Jurista/fiscalista, tem 26 anos e vive e trabalha em Londres