A zona Euro enfrenta muitos e grandes problemas, desde as dívidas até ao fraco crescimento económico, mas nada é mais sério do que as divergências entre a Alemanha e a França. Se as duas maiores economias da zona Euro não se entenderem sobre o modo de ultrapassar a crise económica, a união monetária a prazo estará condenada. A verdade é que desde 2009, início da crise na Grécia, Paris e Berlim raramente se entendem. A crise expôs dois problemas complicados, que os bons tempos tinham escondido. Devido a uma combinação de identidades culturais e ideológicas distintas e de experiências históricas diferentes, alemães e franceses olham para a economia de modos bem diferentes. Pensam de maneiras diferentes sobre a dívida, as políticas monetárias, a inflação, o investimento público, as questões laborais, as relações comerciais. Enfim, não se entendem sobre muita coisa.

Custa reconhecer, mas é absolutamente necessário fazê-lo, que mais de cinquenta anos de integração económica na Europa não foi suficiente para criar uma cultura económica comum entre os dois países. Partilham uma moeda comum mas, por exemplo, há mais profissionais alemães e franceses a trabalhar em Londres do que a emigrarem para o país vizinho. A integração profissional e cultural entre alemães e franceses é reduzida. Londres é uma cidade muito mais ‘francesa’ do que Berlim, e bem mais ‘alemã’ do que Paris.

A criação do Euro foi a resposta a um problema geopolítico: a reunificação da Alemanha. A geopolítica leva-nos ao segundo problema: a diferença de poder entre a Alemanha e a França está a crescer. O contrato original da integração europeia apoiava-se na superioridade da França sobre a Alemanha. A França liderava e a Alemanha seguia (e pagava). A situação inverteu-se com a reunificação e com a crise da zona Euro. Mas, entretanto, ninguém disse aos franceses que estão na União Europeia para seguirem os alemães. Sempre lhes disseram o contrário. A Europa servia para aumentar o poder da França e para controlar a Alemanha; e não para diminuir o poder francês e ser controlado por Berlim.

A Alemanha, por seu lado, não quer pagar os privilégios sociais dos franceses. Os trabalhadores alemães trabalham mais horas semanais do que os franceses, têm menos férias, reformam-se mais tarde, pagam mais pelos serviços públicos e os subsídios de desemprego são mais baixos. E pensam, por que havemos de pagar para os franceses gozarem de privilégios de que nós não gozamos.

Claro que a Alemanha tem grande parte da razão. O país fez reformas que os franceses se recusam a fazer. Cumpre uma disciplina orçamental que os franceses acham desnecessária, pelo menos até agora. Adaptou-se muito melhor ao mercado e ao comércio global do que a França. Mas, por vezes, em política não é suficiente ter razão. O que adianta estar certo e a maioria dos franceses tornarem-se anti-europeus, contra o Euro e votarem na Marine Le Pen para Presidente? É difícil, mas é necessário saber fazer compromissos quando se tem razão (por vezes, sobretudo quando se tem razão).

Estou convencido que o governo alemão está disposto a fazer compromissos. O problema é que se recusa a explicar isso aos alemães. E essa recusa tem custos políticos internos. Berlim tem que ajudar a França a reformar-se, o que exige tempo, e a sua classe política deve explicar internamente as vantagens do Euro para a economia alemã. A maioria dos políticos alemães admite em privado que o país tem beneficiado muito do mercado comum e do Euro. Devem dizê-lo em voz alta e a todos os alemães. Ninguém me precisa de explicar como a França e a classe política francesa podem ser exasperantes. Podem levar qualquer pessoa ao desespero. Mas a Europa não se pode construir contra a França. Esperemos que não seja necessário o Euro acabar para Berlim perceber isso. Mesmo tendo razão.

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