Nos últimos quatro anos, o sistema de ensino foi objeto de um regresso ao passado e a uma primitiva visão do “back to basics”, em que se criou uma ruptura preocupante com as políticas educativas prosseguidas pelos sucessivos governos nos pós-25 de abril.

O ex-ministro Nuno Crato disse claramente que queria mudar o paradigma e centrar a escolas nos exames, porque era preciso disciplinar alunos, professores e todo o sistema educativo. O português e a matemática foram erigidas disciplinas de primeira linha e as restantes foram encaradas como disciplinas menos relevantes, desvalorizando- se as ciências sociais e humanas, as expressões e a atividade física.

Assistiu- se a um estreitamento curricular penoso e nocivo para o sistema educativo e para os alunos que temos que preparar para os desafios de uma sociedade complexa e exigente como a do Século XXI. Nesta era de profunda e complexa mudança à escala global, em que as novas tecnologias ganham relevo e transformam o planeta, a diversos níveis, desde o laboral ao lúdico, a Educação continua a desempenhar um papel fundamental ao serviço do conhecimento. Sabemos como o conhecimento é importante e está na base do progresso social, económico, cultural, científico.

Contudo, todas as medidas implementadas pelo anterior Governo ao nível do modelo de avaliação, da alteração da matriz curricular, o aumento do número de alunos por turma, o afundamento do ensino de adultos, a anemia criada na educação especial e no ensino artístico, o desmantelamento da escola a tempo inteiro, a descentralização da educação para os municípios (invadindo a autonomia das escolas e o desinvestimento continuado na escola pública que os Orçamentos de Estado bem evidenciaram) deixaram a escola pública sem esperança e em colapso.

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O Partido Socialista, quer pela voz do seu secretário-geral, António Costa, quer no quadro do Grupo Parlamentar da Assembleia da República, demonstrou e denunciou durante todo esse tempo que essas mudanças teriam graves consequências e iriam criar retrocessos ao nível da equidade, sucesso educativo, escolarização e educação digital. O relatório do CNE “Estado da Educação 2014”, identifica esses retrocessos e os sinais de alarme.

Nos últimos quatro anos letivos, a taxa de retenção e de desistência, que mede os “chumbos”, aumentou em todos os ciclos do ensino básico: de 3,3% para 5% no primeiro ciclo (o insucesso escolar no segundo ano do primeiro ciclo regista uns preocupantes 11%), de 7,4% para 11,4% no segundo e de 13,3% para 15,1% no terceiro ciclo.

A evolução positiva que o país vinha a registar desde 1974, em que a taxa de retenção, apesar de elevada, apresentava uma tendência descendente consolidada, foi assim interrompida com as políticas “científicas ” de Nuno Crato. Por outro lado, mais recentemente, o Tribunal de Contas, através do relatório da auditoria sobre o Acompanhamento dos Mecanismos de Assistência Financeira a Portugal no Sector da Educação 15 de dezembro último, confirma que os cortes orçamentais realizados na educação foram muito além do acordo com a troika e traduz um cenário muito preocupante face ao esvaziamento de recursos humanos ao nível do pessoal docente e não docente de forma desproporcional face ao número de alunos existentes.

Todo este novo edifício foi construído contra tudo e contra todos.

Tendo agora o PS responsabilidades governativas deveria, porventura, resignar-se e conformar-se com as retrógradas alterações introduzidas no sistema? Seria expectável que cumprisse o programa da educação da coligação da direita? Deveria continuar a deixar definhar a Escola Pública e o acentuar da dualização precoce?

Dever-se-iam manter os exames de 4ª ano que pela sua prematuridade nada acrescentavam na qualidade das aprendizagens e que apenas introduziram perturbação na organização escolar? Deveríamos continuar centrados nos exames durante todo o 1º e 2º períodos escolares e a “treinar” crianças para exames de português e matemática? Ou dever-se-ia retomar a aferição e introduzi-la nos anos em que efetivamente é mais eficaz para o despiste e diagnóstico precoce de situações de risco e assim travar a taxa de retenção que se acentuou desde 2011 nos 1º e 2º ciclos do ensino básico?

Ora, o que é natural, expectável e legítimo será cumprir o Programa do Governo para a área educativa; o que se espera é que sejamos coerentes com o nosso património histórico em termos de educação e o que se deseja é que retomemos o que foi bruscamente interrompido em 2011, designadamente, em termos de construção da escola pública como garante da coesão social, competitividade e motor da igualdade de oportunidades.

Obviamente que, por força desse mesmo programa e da defesa da escola, dos alunos dos pais e dos professores, há que retomar o diálogo e afirmar uma escola centrada na qualidade das aprendizagens, da diversidade curricular e no reconhecimento da autonomia da escola e dos professores, cujo reconhecimento, formação e estabilidade profissional urge sublinhar.

Esse é o caminho que o ministro da Educação, escolheu (e bem). Um caminho que se inspira nas melhores experiências e boas práticas educativas. Um caminho que exige mudanças, porque, infelizmente, o legado herdado não nos conduziria a elevados padrões de qualidade educativa, nem a uma escola integradora e inclusiva, onde o saber SER deve ser um dos principais pilares. A equidade, a qualidade e a eficiência ficaram “à porta” da escola e têm que voltar “a entrar” e o sucesso educativo tem que ser o eixo central e um desígnio nacional. ..porque estamos em 2016!

Deputada/Vice Presidente do grupo parlamento do PS