A data para o aparecimento de um novo Hospital na zona oriental de Lisboa, desejavelmente com a designação de Todos os Santos, parece ser 2024. Contudo, há várias questões que merecem ser esclarecidas e isso só poderá ser feito à luz de relatórios e estudos que devem ter sido feitos e não são do conhecimento público. A questão maior e que eu nunca vi devidamente esclarecida, nem durante o tempo em que estive na João Crisóstomo, é a de saber porque se opta por uma PPP apenas de construção e não de construção e gestão?

Lamentavelmente, mesmo sabendo que as PPP na saúde têm sido geradoras de ganhos para o Estado – nem tanto para as entidades gestoras – a coligação PSD/CDS reiterou a decisão, tomada no último Governo de José Sócrates, de apenas prosseguir com a PPP para construção. Com o actual Governo, cheio de bloquistas, nem sei bem como passou a ideia da construção em PPP. Bem sei que os termos do concurso que existia à época, em 2011, eram péssimos para o Estado que teria de assumir a factura do incumprimento do consórcio construtor face aos credores internacionais, como seria o caso do BEI. Bem sei que seria difícil conseguir a construção de um sindicato bancário que estivesse disposto a financiar a construção do Hospital e não estou ainda certo de que agora seja mais fácil. Bem sei que o “ambiente” político não era favorável a correr riscos na área da construção hospitalar. Todavia, não estou convencido, por falta de conhecer a evidência, de que uma opção de PPP, também para a gestão, não seria o melhor modelo para o futuro um hospital em Lisboa e em mais localizações no País.

Interessa também conhecer, sem margem para dúvidas, os cálculos que determinaram a nova lotação do Hospital Oriental e as valências que lá se vão colocar. Chegarão, as 875 camas, ou será como o Metro de Lisboa que vai sendo ampliado, ou o Hospital de Almada que já era pequeno quando foi terminado? Reavaliaram a possibilidade de integrar, sem encerrar, o Hospital Curry Cabral no conjunto de Santa Maria e Pulido Valente? Não seria o Curry Cabral o pólo de excelência para um centro cirúrgico de transplantação em Lisboa? O novo hospital terá uma unidade de isolamento, para doentes infectados, maior e com as características da que existe no Curry? A ampliação do Hospital de Almada será melhor do que a construção de um hospital, digno desse nome, no Seixal? Será que o modelo, proposto para o Seixal e Sintra, de construção de unidades de cuidados continuados – vocação que não deve ser do Estado – junto com um serviço de urgência – mais um – e umas quantas consultas, será suficiente e adequado? Face ao crescimento das necessidades das pessoas dos concelhos de Sintra e da margem sul do Tejo, não seria melhor dotar o SNS de unidades completamente autónomas e suficientes para as necessidades de cuidados hospitalares? Precisamos de ler o que determinou as decisões tomadas. Onde estão a verbas destinadas ao Seixal na proposta de Orçamento para 2018? Quanto ao Hospital de Sintra, na versão minimalista, tudo indica que será feito pala autarquia. Não faz mal, pedirão ao governo central que trate da ampliação, daqui a uns anos.

O ministro não pode garantir que S. José e Estefânia continuarão a ser/ter qualquer coisa ligada à saúde que ainda nem percebemos bem o que será. Os antigos Hospitais Civis de Lisboa foram vendidos à ESTAMO, a quem o Centro Hospitalar de Lisboa Norte devia uns milhões de rendas não pagas. Já está tudo regularizado? Já desocupados, depois de vendidos, estão os edifícios do Miguel Bombarda e do seu pólo na Ajuda, bem como parte do Curry Cabral, sendo que há edifícios deste último que ameaçam ruína. O ministro não pode garantir o seu futuro, nem prometer nada quanto ao seu destino final. A ESTAMO – Participações Imobiliárias, SA é uma empresa de gestão imobiliária, não é outra coisa.

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A Alfredo da Costa ainda é da Saúde e, idealmente, poderia ser uma nova sede para o ministério, direcção-geral da saúde ou de outra agência central. Ora, o mais interessante é que a venda dos Hospitais Civis à ESTAMO, ocorrida durante o tempo do Engº Sócrates, sem nada de ilegal que se conheça, foi feita, salvo o erro, com o meritório objectivo de financiar a construção do novo hospital de Lisboa. Quando chegámos ao Governo, em junho de 2011, o dinheiro já tinha sido gasto noutras coisas, seguramente necessárias, levado pela voragem da bancarrota. Isto é história.

E qual é a posição do Governo face às necessidades de outros hospitais? O que vai acontecer no Algarve? E em Évora? E o Centro Hospitalar que congrega Torres Vedras, Caldas da Rainha e Peniche, o do Oeste? Passa a EPE? Remodela-se ou constrói-se um novo hospital de substituição no Bombarral, entre as localizações atuais, como já foi proposto? Entre 2011 e 2015 havia um resgate financeiro para ultrapassar, salários para pagar, medicamentos que não podiam faltar e dívidas a liquidar. Agora há mais dívida, mais salários para manter, novas despesas com medicamentos, equipamentos mais velhos e a necessitarem de substituição e maiores necessidades de saúde. Quais são as opções políticas do Governo actual quanto à revitalização estrutural do parque hospitalar?

E o IPO de Lisboa? Agora, quando a página da austeridade já foi virada, deve ter chegado o tempo de se construir o novo e ambicionado edifício, já prometido quando para lá fui trabalhar, há 24 anos, e que foi impossível construir durante os anos da Tróika ou por Governos anteriores. Chegou a haver uma “inauguração” de um projecto qualquer, no Parque da Belavista, com Engº Sócrates e tudo. Pelos vistos, ainda nem o dinheiro da remodelação para o bloco operatório foi libertado, apesar de ter sido, ou por causa disso, entregue pelo XIX Governo.

Quanto aos hospitais já existentes também surgiram umas notícias referentes a novas regras de contratualização para 2018.

Há matérias confusas que urge esclarecer. Como pretendem pagar a prestação de cuidados nos serviços de urgência? Por doente atendido? Certamente saberão que as experiências deste tipo conduzem a mais e piores consultas de urgência, ganhando a velocidade à custa da qualidade clínica. A sobrevivência de doentes críticos também é mencionada. Com que parâmetros de avaliação de risco? Abrirão uma arca de Pandora para futuras litigações judiciais? O pagador – o Estado – não pagará por actos que forem considerados de qualidade inferior à contratada. Estará na disposição de indemnizar a vítima – o utente – desses procedimentos que entendeu terem qualidade abaixo da prevista? Querem pagar menos aos hospitais que recebam doentes e não sejam centro de referência para determinadas patologias? O bem-estar e a segurança do doente ficam onde, nesta equação financeira? Não seria mais honesto simplesmente financiar de forma adequada os centros de referência, que não podem ser tantos como são agora, e canalizar os doentes apropriados para o sítio onde serão melhor tratados? Não seria clinicamente correto, em vez de lhes cortar no financiamento, simplesmente impedir os menos capazes, com menor competência ou experiencia, de tratar quem não deve? Quem fizer mais cesarianas não receberá por elas? Que tal avaliar e auditar procedimentos e decisões antes de decidir, de forma cega e acéfala – a tal palavra que tantos usam para falar dos cortes de antanho -, que fazer mais de 30% de cesarianas corresponderá a não serem pagas. Felizmente, os nossos médicos não tomam decisões com base em ameaças de corte de financiamento mas sim em função do melhor juízo clínico. É esse, o bom juízo clínico, que deve ser reforçado e apoiado. Mais do que penalizar desvios, que até podem ser clinicamente justificáveis, convirá premiar o bom desempenho.

Vai haver verbas para rastreio do cancro. Magnífico. E os doentes que forem rastreados como “positivos” vão ser todos investigados e tratados no mês seguinte? É que 90 dias de tempo máximo de resposta garantida para que tem um cancro, ou suspeita dele, é inaceitável, tal como operar tardiamente é eticamente reprovável. Contudo, o número de doentes com cancro à espera de cirurgia não pára de aumentar. Que tal resolver isso antes de aumentar rastreios? Os manuais de prevenção dizem que fazer rastreios sem capacidade de intervir imediatamente sobre os casos detectados é errado e reprovável.

Aumentar as primeiras consultas em 5% é boa ideia, não fosse o caso de haver hospitais onde a segunda consulta, depois de passada a barreira da primeira, é marcada para daí a um ano. E não se trata de doentes para seguimento sem tratamento. Muitas vezes são consultas para ver se o tratamento funcionou. Que tal auditar isto?

E, louve-se a intenção, pretendem, como é hábito todos os anos, reduzir as urgências em 2%. Parece bem. Em especial depois de ter lido num diário que “há 9800 pessoas sem garantia de apoio médico no centro de Saúde de Corroios (Seixal) por “ordem superior” e que se necessitarem de uma consulta devem ir ao Hospital Garcia de Orta ou, por opção própria acabam por procurar um médico particular”. Imagino que o PCP e BE apoiem, já que a decisão terá vindo do seu Governo.