A liberdade de expressão não é apenas mais uma liberdade. É a base da nossa sociedade, a única via possível para um futuro verdadeiramente democrático e pluralista. Uma das principais razões da importância da liberdade de expressão é que pessoas com diferentes opiniões possam discutir sem amarras nem receios, de forma a chegarem a conclusões conjuntas e a consensos. Sem a liberdade de expressão, vamos estar a criar grupos gigantescos que se vão colocar à margem da sociedade, dramatizando o discurso e indo irrevogavelmente em direção dos extremos. Calar alguém por ter uma opinião diferente, pode ter o efeito contrário: elevar mais a sua voz. Mas pior que isso, pode estar a levar a sociedade a um totalitarismo que nunca resultou na História da humanidade.

Vivemos num tempo de verdades simplistas e superficiais, com redes sociais controladas por uma ideologia e normalização da censura para quem pensa de forma contrária. As grandes corporações têm de seguir o mesmo pensamento se querem continuar grandes. O governo, a justiça e a comunicação social são concordantes: há o bem e o mal, o preto e o branco, o Estado e a Família, a esquerda e a direita, o liberalismo e o conservadorismo. O bem é científico, avançado e desenvolvido; o mal é antiquado, retrógrado e judaico-cristão. A nova História que está a ser reescrita diz que o progressismo foi o percursor da liberdade, progresso, modernidade, tolerância, fraternidade, desaparecimento da escravidão, o aumento da alfabetização, a redução das desigualdades entre os sexos, a reforma das prisões e o declínio da pobreza. Esta ideia messiânica é obviamente fruto de propaganda sem rigor, sentido ou verdade.

É triste que para se ser bem sucedido na cultura, seja preciso ser progressista, para se ter uma boa carreira seja necessário ser socialista ou pertencer a um grupo de interesse, para se ter uma opinião válida e relevante seja fundamental ser de esquerda. Quem diz que a dicotomia esquerda-direita já não faz sentido é quem quer que haja um só caminho: o verdadeiro, como uma religião ortodoxa, afastando o outro para as trevas da idade média, um local cheio de monstros, bruxas, purgas, mortos em fogueiras – que é evidentemente onde o conservadorismo e a direita residem. A ideologia prevalecente quer ficar sozinha nos debates, excluindo sem razões válidas quem tem opinião diferente credível e não populista – que foi o que eu senti nas últimas eleições autárquicas do Porto. Aliás, a intenção de um debate não devia ser ganhar ou perder (como as manchetes e os estudos de opinião proclamam), mas sim que todos os intervenientes avancem. Não podemos desistir da liberdade de expressão.  “Posso não concordar com o que dizes, mas defenderei até a morte o teu direito de dizê-lo” é a frase com que a biógrafa Evelyn Beatrice Hall resume o pensamento de Voltaire. E é a afirmação que nos deve guiar nos dias atuais

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