Uma crença, antiga e venerável, do mundo empresarial é que dinheiro atrai resultados. Uma aplicação desta ideia é a prática de remunerações variáveis elevadas, num vasto leque de ocupações e posições, na convicção de que incentivam a performance. Assim é usual banqueiros públicos e privados, e também CEOs vários, receberem bónus dependentes dos lucros obtidos, que por vezes chegam a múltiplos do valor do seu salário base. Crença semelhante existe nos desportos profissionais e amadores, onde é frequente jogadores de futebol e basquetebol serem pagos prémios exorbitantes caso obtenham vitória em certos jogos, e atletas olímpicos serem prometidos, pelo governo, chorudas remunerações tabeladas de acordo com o tipo de medalha alcançada.

A fundamentação desta crença parece razoável: quanto maior for o prémio maior será o esforço, e quanto maior for o esforço melhor será o resultado. No entanto, o grosso da investigação empírica em psicologia e economia comportamental feita durante os últimos 100 anos indica que não é assim que os seres humanos funcionam. Primeiro porque há situações, mesmo laborais, em que o esforço feito depende primariamente de outras motivações, altruístas ou não, e é, portanto, independente da remuneração monetária; depois, porque nem sempre maior esforço conduz a melhores resultados, o que na gíria psicológica se designa por asfixia sob pressão e, na económica, produtividade marginal negativa.

Geralmente associa-se produtividade marginal negativa ao cansaço decorrente do excesso de trabalho: a partir de certa altura ficamos tão cansados e saturados que, sem querer, começamos a desfazer o que já fizemos. Mas a produtividade marginal negativa pode advir de outros fatores induzidos por um vasto leque de mecanismos psicológicos. Um deles, conhecido como a lei de Yerkes-Dodson, é atingir um nível de excitação para além do ótimo, a partir do qual há diminuição de performance: isto é, quer a sub-excitação com a tarefa, quer a sobrexcitação com ela, são más do ponto de vista do rendimento.

Outro é a passagem dos processos mentais de “automático” para “controlado”: um exemplo clássico é o dos jogadores de basquete falharem mais lances livres em jogos, apesar de receberem prémios pela vitória, que nos treinos, quando não ganham nada, efeito atribuído a consciencializarem os movimentos do lance. Ainda outro envolve o foco da atenção: o aumento da motivação para além do nível ótimo tende a diminuir o horizonte de atenção nas várias dimensões do problema, e a estreitar o espetro das soluções que são consideradas.

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Finalmente, e não menos relevante para o mundo da alta direção, é a preocupação do sujeito com o prémio em si, com o elaborar dos efeitos da sua contingente receção e o ruminar as consequências da sua eventual perda, em vez de se focar na missão que lhe foi confiada, efeito que tende também a diminuir a produtividade.

Num estudo curiosíssimo de Ariely et al. (The Review of Economic Studies, 2009) foram oferecidos prémios a quem conseguisse uma performance extraordinária num conjunto de atividades físicas e cognitivas. Os participantes foram divididos em três grupos diferentes: num recebiam o equivalente a um dia de salário caso conseguissem uma performance extraordinária; no segundo recebiam o equivalente a duas semanas de salário; e no terceiro recebiam o equivalente a seis meses de salário, um montante completamente desalinhado com a importância e dificuldade das tarefas propostas. Verificou-se que, de fato, se nas atividades físicas um maior prémio resultava em melhor performance, o mesmo não acontecia com atividades cognitivas. Nestas, os melhores resultados obtiveram-se com aqueles que eram prometidos prémios de duas semanas de trabalho; infere-se, portanto, que a remuneração excessiva desvia o interesse da tarefa e fixa-a no prémio, resultando numa diminuição da performance.

Conclusão: não faz sentido usar sistemas de remuneração adequados a atividades físicas em atividades de conhecimento, de criação e de direção. A quarta revolução industrial requere sistemas de compensação diferentes das usadas durante a primeira. Será então de proibir o pagamento de bónus a banqueiros e futebolistas, já que se revelam ineficientes quer no laboratório, quer na vida real? Não: qualquer acionista, mesmo o acionista Estado, tem o direito a ter uma gestão tão má para a sua empresa quanto queira. Mas não pode, ao mesmo tempo, querer pagar prémios obscenos e querer obter resultados espetacularmente bons.

Professores na AESE Business School